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Estado de Minas CI�NCIA

Como mudan�as clim�ticas est�o alterando comportamento, reprodu��o e tamanho de animais

Peixes, caranguejos, macacos, lagartos e at� abelhas j� sofrem com os efeitos provocados pelas mudan�as do clima.


09/03/2023 07:03 - atualizado 09/03/2023 12:08


Sapo em folha
(foto: Getty Images)

Asas desproporcionais, aumento de tamanho, reprodu��o de mais f�meas do que machos e dificuldade para reconhecer alimentos devido a modifica��es cognitivas est�o na lista de altera��es sofridas por animais devido �s mudan�as do clima.

Pesquisas mostram que para conseguir sobreviver ao aumento da temperatura, � polui��o de rios e aos eventos clim�ticos extremos, como longos per�odos de seca e de chuvas intensas, esp�cies est�o alterando o seu modo de vida, sua maneira de se reproduzir e at� o seu tamanho.

Na lista de animais mais atingidos pelas altera��es do clima, as abelhas aparecem como um dos mais impactados. N�o � � toa que cada vez mais � dif�cil encontr�-las em diversos pontos do mundo em que eram frequentes.

"Com o aumento das secas, o per�odo de flora��o das plantas diminui. Com isso, muitas abelhas n�o est�o conseguindo n�ctar e p�len, que coletam nas flores. Consequentemente est�o desaparecendo", diz Michael Hrncir, professor do Instituto de Bioci�ncias da Universidade de S�o Paulo (SP).

Contudo, os impactos negativos sobre as abelhas n�o ocorrem apenas por falta de alimento. Pesquisas mostram que o aumento de temperatura tamb�m est� provocando deforma��es nas asas de algumas esp�cies. "Em decorr�ncia do estresse causado pelas mudan�as clim�ticas temos comprova��o que algumas abelhas nascem com uma asa maior que a outra."

Altera��es cognitivas

Diferentemente dos seres humanos, que conseguem controlar a temperatura do corpo, por serem seres endot�rmicos, a temperatura das abelhas equivale � do ambiente em que est�o inseridas mais a que produzem ao bater as asas. "Para se ter uma ideia, uma abelha bate, em m�dia, 250 vezes as asas por segundo", apontou Michael.

Assim, se uma abelha est� em um ambiente a 30 graus, ao bater as asas, o seu m�sculo ativo faz sua temperatura corporal chegar a at� 42 graus. O problema � que a eleva��o da temperatura al�m de provocar um superaquecimento tamb�m ocasiona impactos cognitivos.

Abelha pousada sobre flor amarela
O aumento da temperatura est� levando a perdas cognitivas em algumas esp�cies de abelhas (foto: Getty Images)

"Estudos revelam que algumas esp�cies de abelhas est�o perdendo a capacidade de cogni��o, como reconhecer uma flor ou o caminho de volta para col�nia, por exemplo, por conta da eleva��o da temperatura", ressaltou o pesquisador da USP.

O desaparecimento de abelhas pode provocar um efeito em cascata. Isso porque � atrav�s do seu trabalho de poliniza��o que muitas sementes surgem e flores sobrevivem.

Sua capacidade de aumentar em cerca de 25% o rendimento das colheitas -, consequentemente, dos alimentos que comemos – corre risco � medida que mudan�as dr�sticas no clima ocorrem.

Mais f�meas do que machos

Quem tamb�m � impactado diretamente pelas mudan�as do clima s�o os quel�nios - tartarugas marinhas e de �gua doce.

Diferentemente de outros animais, elas dependem de um fator externo para que o sexo do filhote seja determinado.

� a temperatura da areia onde os ovos s�o colocados que vai estabelecer se nascer� uma f�mea ou um macho. Em regra, temperaturas altas (acima de 30 graus) produzem mais f�meas; temperaturas mais baixas (abaixo de 29 graus) produzem mais machos.


Tartaruga marinha nadando no fundo do oceano
Em quel�nios, como as tartarugas marinhas, o sexo dos filhotes depende da temperatura da areia onde os ovos s�o colocados (foto: Getty Images)

"Entretanto, quando temos aumento da temperatura passamos a ter uma tend�ncia de gera��o apenas de filhotes do sexo feminino. Isso provoca um desequil�brio demogr�fico da esp�cie", afirmou Fernanda Werneck, especialista em anf�bios e r�pteis do Instituto Nacional de Pesquisa da Amaz�nia (Inpa).

Al�m disso, pela reprodu��o dos quel�nios ser sexuada - macho transfere os espermatozoides para dentro do corpo da f�mea. A diminui��o de indiv�duos do sexo masculino provoca uma queda abrupta no n�mero de exemplares da esp�cie, antes mesmo do processo de confec��o dos ninhos.

Anf�bios diminuem de tamanho

Outros animais impactados pelas mudan�as do clima s�o os anf�bios, como sapos, r�s e pererecas. Com o aumento da temperatura, esp�cies est�o mais suscet�veis �s infe��es do fungo quitr�dio - Batrachochytrium dendrobatidis -, respons�vel por decl�nios de diversas esp�cies de anuros, no passado.

O coordenador do Laborat�rio de Herpetologia e Comportamento Animal da Universidade Federal de Goi�s (UFG), Rog�rio Pereira Bastos, aponta que a diminui��o de locais apropriados para reprodu��o (corpos d’�gua), que est�o ficando secos ou escassos, est� fazendo com que algumas esp�cies diminuam de tamanho.

"Como o per�odo seco tende a ficar maior, os anf�bios ter�o menor disponibilidade de presas para se alimentarem. Assim, eles chegar�o � fase adulta com tamanho menor."

O problema � que o tamanho dos anf�bios influencia na vocaliza��o do macho – mecanismo utilizado para atrair as f�meas. Assim, as mudan�as clim�ticas tamb�m est�o alterando a reprodu��o de algumas esp�cies de anf�bios.


Sapo dentro d'água
As popula��es de anf�bios, como sapos, tamb�m s�o afetadas pela eleva��o da temperatura (foto: Getty Images)

"Machos menores t�m vocaliza��es mais agudas (frequ�ncias maiores) e machos maiores t�m vocaliza��o mais grave (frequ�ncias menores). Como a mudan�a clim�tica est� ocorrendo em per�odo de tempo pequeno, ser� que o sistema auditivo das f�meas ainda conseguir� reconhecer as vocaliza��es dos machos de suas esp�cies?", questionou o pesquisador.

Um estudo sobre a perereca Boana goiana, encontrada na Floresta Nacional da Silv�nia (GO), mostrou que, em quase duas d�cadas, caracter�sticas do canto da esp�cie diminu�ram � medida que a quantidade de recursos naturais reduziu na floresta.

"J� temos modelos que preveem como ser� a destrui��o geogr�fica dos anf�bios daqui a 50 anos. Nesta nova distribui��o, teremos unidades de conserva��o? O que se v� � que n�o teremos. Ent�o, seria interessante criar unidades de conserva��o nas �reas que ser�o mais adequadas para os anf�bios. Assim, poderemos conservar mais esp�cies, criando uma rede de prote��o", defendeu Rog�rio.

Lagarto aumenta de tamanho

Ao mesmo tempo que existem esp�cies que est�o diminuindo de tamanho, por conta das mudan�as do clima, outras est�o aumentando. � o que revela um estudo publicado no peri�dico cient�fico Biological Journal of the Linnean Society, que comparou amostras do lagarto sul-americano Tropidurus torquatus, da d�cada de 1960 com as de 2012.

Segundo a pesquisa, o aumento de aproximadamente dois graus na temperatura nas �ltimas d�cadas, fez com que essa esp�cie de lagarto atinja o tamanho adulto m�nimo dois anos antes.


Lagarto em tronco de árvore
Estudo mostrou que o lagarto sul-americano Tropidurus torquatus est� atingindo o tamanho adulto dois anos antes (foto: Getty Images)

"Com as t�cnicas usadas, soubemos que, emm 1960, lagartos se tornavam sexualmente maduros por volta dos 5 anos em locais mais urbanos, e por volta dos 6 ou 7 anos em locais de floresta. No presente, a maturidade acontece ao menos dois anos antes. Se assumimos expectativas de vida similares, uma possibilidade � que o per�odo de reprodu��o tenha sido acelerado", apontou Carlos Navas, professor do Instituto de Bioci�ncias da Universidade de S�o Paulo (USP).

Para chegar � conclus�o, que o aumento de temperatura pode ter influenciado no tamanho do lagarto sul-americano Tropidurus torquatus, os cientistas tomaram por base um estudo similar feito com uma esp�cie de geco - Homonota darwinii - da Patag�nia argentina.

"Nele, encontramos que animais coletados em locais mais frios atingiam a maturidade sexual um ano mais tarde", apontou Navas.

Mais vulner�veis

Carla Piantoni, cientista da Universidade do Hava�, em Manoa (EUA), que tamb�m participou da pesquisa, ressalta que o fato dos lagartos serem animais ectot�rmicos, ou seja, sua temperatura n�o � regulada diretamente pelo metabolismo, como acontece nos mam�feros, os deixa ainda mais vulner�veis ao aumento da temperatura provocado pelas mudan�as clim�ticas.

"Muitos lagartos s�o bons mantendo temperaturas corporais relativamente est�veis, mas sempre que as condi��es de temperatura do ambiente permitem. Contudo, como nem sempre � o caso, terminam sendo expostos � varia��o termal. Essa varia��o pode ter impacto no desenvolvimento deles, na primeira reprodu��o e no n�mero de ovos", apontou.

A especialista em anf�bios e r�pteis, Fernanda Werneck, do Instituto Nacional de Pesquisa da Amaz�nia (Inpa), que h� anos tenta entender como a sele��o natural atua sobre os animais da Amaz�nia, cita como exemplo o lagarto Tropidurus torquatus, popularmente conhecido como calango.

Encontrado em regi�es do Cerrado e nas bordas de floresta, a esp�cie n�o tem conseguido se adaptar ao novo clima e tem desaparecido na �ltima d�cada.

Em contrapartida, o lagarto Cnemidophorus lemniscatus parece estar se ‘beneficiando’ das mudan�as do clima e expandindo sua presen�a. Contudo, o que parece ser ben�fico a longo prazo pode ser ruim.

"Temos que entender que quando uma esp�cie migra para outra regi�o para sobreviver, em busca de alimento ou de um ambiente parecido com o que ela vivia, essa nova esp�cie, normalmente, compete com esp�cies nativas. Isso causa preju�zos a longo prazo", explicou Werneck.

Macacos mudam comportamento

A perda de �reas de Mata Atl�ntica, seja para a pecu�ria ou agricultura tamb�m altera o comportamento dos macacos.

Em busca de sobreviver, o macaco-prego passou a tomar �gua de coco para evitar a desidrata��o. A constata��o foi feita pelo pesquisador Hilton Japyass� da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em parceria com Danilo Sabino e Esa� Marlon.


Macaco-prego com filhote nas costas
Macaco-prego passou a tomar �gua de coco para sobreviver (foto: Getty Images)

"Eles foram expulsos de �reas mais favor�veis � sua sobreviv�ncia, e uma simula��o computacional mostra que em cinquenta anos eles estar�o restritos � Mata Atl�ntica do Sul da Bahia", ressaltou Hilton.

Segundo o pesquisador, atualmente, ao norte da Bahia, resiste uma popula��o que passou a utilizar o mangue regularmente, ao aprender a abrir coco e beber sua �gua.

"Para n�o se expor demais, os macacos usam do coqueiral abandonado. Al�m disso, constatamos que para n�o gastar muita energia, preferem os coqueiros mais baixos, e escolhem o coco pelo seu tamanho, dando prefer�ncia aos intermedi�rios."

Oceano mais quente expulsa caranguejos

No litoral do Sudeste brasileiro, outro animal sofre processo semelhante para se adaptar ao oceano quase um grau mais quente do que h� quarenta anos.

T�nia M�rcia Costa, bi�loga e professora do Instituto de Bioci�ncias da Universidade Estadual Paulista (Unesp), conta que o caranguejo chama-mar� - Leptuca cumulanta – que at� 2010, historicamente, tinha como limite sul o Estado do Rio de Janeiro, passou a habitar o litoral de S�o Paulo, onde as temperaturas s�o mais frias.

"O que vem acontecendo � um processo de tropicaliza��o, com os animais procurando regi�es mais frias. O problema � que quando eles chegam em regi�es a que n�o estavam habituados podem comprometer todo o ecossistema. Levando � redu��o ou extin��o de esp�cies nativas da nova �rea que ele passou a habitar", disse.

Diretamente relacionado com as mudan�as clim�ticas, o aumento da temperatura dos oceanos � causado pela emiss�o de gases do efeito estufa. Em regra, o aquecimento atmosf�rico transmite energia t�rmica para as �guas, que consequentemente aumentam de temperatura.

Dessa forma, como um efeito domin�, o aquecimento provocado pelo homem, culmina no aquecimento do oceano, que interfere diretamente na vida aqu�tica.


Peixes nadando no fundo do oceano
Aumento da temperatura dos oceanos afeta diretamente a vida marinha (foto: Getty Images)

"Temos tr�s efeitos das mudan�as clim�ticas que est�o impactando diretamente os animais: aumento da temperatura; acidifica��o de oceanos e ambientes de �gua doce; e os recorrentes eventos extremos, como tempestades e secas", apontou T�nia.

Segundo a bi�loga, os tr�s efeitos interferem diretamente no organismo das esp�cies marinhas. Isso porque, ao aumentar a temperatura da �gua, a primeira resposta do animal com o metabolismo acelerado, normalmente, � elevar sua alimenta��o.

"Ou seja, ele vai precisar comer mais. Com isso, tamb�m vai ficar mais exposto a preda��o”, ressaltou a bi�loga. “Sem contar que nem todos v�o aguentar uma temperatura t�o alta. Muitas esp�cies j� est�o no limite da temperatura", completou.

Aquecimento pode provocar fome

As in�meras mudan�as em pouco tempo s�o a grande preocupa��o dos pesquisadores que estudam como as altera��es clim�ticas est�o impactando os animais.

No caso dos peixes, que n�o s�o capazes de regular a temperatura do corpo e s�o dependentes interinamente da temperatura da �gua para sobreviver, um aumento de 1,5 grau j� � suficiente para provocar a extin��o de muitos desses seres, que s�o vitais na dieta da popula��o.

"Embora v�rias dessas esp�cies aqu�ticas tenham aprendido a se adaptar a ambientes extremos ao longo de centenas de milhares de anos, elas nunca foram submetidas a uma situa��o t�o complicada como as que est�o sendo provocadas pelo homem", afirma Adalberto Val Luis, bi�logo e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amaz�nia (Inpa).

O bi�logo cita o aumento da acidez da �gua, como um dos problemas que mais est�o comprometendo a vida de peixes nos rios da Amaz�nia.

"Essa polui��o da �gua n�o acontece apenas pelo desmatamento e pelas queimadas, mas tamb�m de como usamos o ambiente e descartamos medicamentos. Um anticoncepcional, por exemplo, descartado em um rio de maneira irregular pode impactar na reprodu��o de peixes e comprometer todo um ecossistema", alertou.

Para se ter uma ideia, 90% da prote�na consumida pelas 25 milh�es de pessoas que vivem na Amaz�nia brasileira adv�m dos peixes. Ou seja, as mesmas a��es humanas que comprometem os animais hoje, podem ser respons�veis por provocar fome no futuro.

Poss�veis solu��es

Fernanda Werneck, do Instituto Nacional de Pesquisa da Amaz�nia (Inpa), alerta que antes de uma esp�cie ser extinta, normalmente, ela concede sinais: muda de habitat, tenta adaptar-se a nova temperatura ou sofre muta��es.

"Uma esp�cie n�o � extinta do dia para a noite, esse processo acontece em cap�tulos. O problema � que j� estamos vendo esses processos acontecendo. Por isso, da import�ncia de medidas como combate ao desmatamento, preserva��o de �reas de conserva��o e incentivo � pesquisa. Toda esp�cie � importante para o ecossistema e para a vida no planeta", afirmou a pesquisadora.


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