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Estado de Minas DINAMARCA

Por que pa�s armazena quase 10 mil c�rebros

�rg�os foram retirados em aut�psias de pacientes que morreram em institutos psiqui�tricos ao longo de quatro d�cadas e j� estiveram no centro de um debate pol�mico no pa�s.


16/04/2023 16:21 - atualizado 16/04/2023 18:47


Homem coloca caixa em prateleira
Martin Wirenfeldt Nielsen � respons�vel pela cole��o de c�rebros da Universidade do Sul da Dinamarca, em Odense (foto: Getty Images)

Em um por�o isolado da Universidade do Sul da Dinamarca, uma das maiores do pa�s, h� fileiras e mais fileiras de prateleiras com milhares de baldes brancos numerados. Em cada um deles, preservado em formol, existe um c�rebro humano. S�o 9.479 no total.

Os c�rebros foram retirados durante aut�psias de pacientes que morreram em institutos psiqui�tricos de todo o pa�s ao longo de quatro d�cadas, at� a d�cada de 1980. Estima-se que seja a maior cole��o desse tipo no mundo.

No entanto, os c�rebros foram preservados sem o consentimento pr�vio dos pacientes ou de seus parentes pr�ximos, gerando um longo debate nacional sobre o que fazer com tamanha quantidade de �rg�os humanos.

Na d�cada de 1990, o Conselho de �tica dinamarqu�s determinou que os tecidos poderiam ser usados para pesquisas cient�ficas, e � nesse sentido que funciona o banco de c�rebros da universidade da cidade de Odense.

Alguns especialistas dizem que, ao longo dos anos, a cole��o facilitou o estudo de muitas doen�as, incluindo dem�ncia e depress�o. Mas sua exist�ncia tamb�m trouxe � tona o debate sobre o estigma da doen�a mental e a falta de direitos dos pacientes em �pocas passadas.

Em detalhes

A cole��o come�ou em 1945, ap�s a Segunda Guerra Mundial, com c�rebros removidos de pacientes com transtornos mentais que morreram em institui��es psiqui�tricas em diferentes partes da Dinamarca.

Originalmente, os �rg�os eram mantidos no Hospital Psiqui�trico Risskov em Aarhaus, onde funcionava o Instituto de Patologia Cerebral.

Ap�s as aut�psias, os m�dicos removiam o �rg�o antes de enterrar o cad�ver em cemit�rios pr�ximos. Eles examinavam o c�rebro faziam anota��es detalhadas.

"Todos esses c�rebros est�o muito bem documentados", disse Martin Wirenfeldt Nielsen, patologista e atual diretor da cole��o de c�rebros da Universidade do Sul da Dinamarca, em Odense, � BBC News Mundo, servi�o de not�cias em espanhol da BBC.

"Sabemos quem eram os pacientes, onde nasceram e quando morreram. Tamb�m temos seus diagn�sticos e relat�rios de exames neuropatol�gicos (post mortem)", explica Nielsen.


Túmulos em um cemitério
Os pacientes foram enterrados em cemit�rios pr�ximos aos hospitais onde estavam internados e seus t�mulos foram marcados (foto: Getty Images)

Muitos dos pacientes estiveram em hospitais psiqui�tricos durante grande parte de suas vidas. Assim, al�m dos relat�rios detalhados do patologista, os cientistas t�m tamb�m o hist�rico m�dico de quase metade dos pacientes.

"Temos muitos metadados. Podemos documentar muito do trabalho que os m�dicos fizeram no paciente naquela �poca, al�m de termos o c�rebro agora", diz Nielsen.

O arquivamento de c�rebros parou em 1982, quando a Universidade de Aarhaus se mudou para um novo pr�dio e n�o havia or�amento para abrigar a cole��o. Em estado de abandono, chegou-se a cogitar a destrui��o de todo o material biol�gico. Mas em uma "opera��o de resgate", a Universidade do Sul da Dinamarca, em Odense, concordou em abrigar o acervo.

A quest�o �tica

Por cinco anos, Nielsen foi diretor da cole��o. Embora tivesse uma no��o vaga, ele desconhecia a magnitude completa do arquivo. "Quando eu vi pela primeira vez, fiquei realmente surpreso."

Embora sua exist�ncia nunca tenha sido um segredo e tenha sido objeto de rumores ocasionais, a cole��o incomum n�o fazia parte da consci�ncia coletiva dinamarquesa, at� que o plano de mudan�a para a universidade em Odense a exp�s completamente.

Um grande debate p�blico — com a participa��o de grupos pol�ticos, religiosos e cient�ficos — foi feito sobre �tica e a forma como se conserva restos humanos, e tamb�m sobre os direitos dos pacientes. O povo dinamarqu�s deparou-se com algo que mantinha � margem: os transtornos mentais.

"Havia um estigma t�o grande em torno dos transtornos mentais que ningu�m que tinha um irm�o, irm�, pai ou m�e em uma ala psiqui�trica sequer os mencionava", diz Knud Kristensen, ex-presidente da Associa��o Nacional de Sa�de Psiqui�trica.

"Naquela �poca, os pacientes ficavam internados a vida toda. N�o havia tratamento, ent�o eles ficavam l�, talvez trabalhando no jardim, na cozinha ou outras coisas. Eles morriam ali e eram enterrados no cemit�rio do hospital", disse ele � BBC News Mundo.

Os pacientes psiqui�tricos tinham poucos direitos. Eles poderiam receber tratamento para um caso espec�fico sem qualquer tipo de aprova��o.

Kristensen comentou que era muito prov�vel que os parentes dos pacientes nem soubessem que seus c�rebros estavam sendo preservados e disse que muitos dos c�rebros da cole��o apresentam sinais de lobotomia.

"Um tratamento ruim, com base no que sabemos hoje, mas bastante normal naquela �poca."


Medicos fazendo cirurgia
Nas d�cadas de 1930 e 1940, a lobotomia era um procedimento que podia ser realizado sem o consentimento dos pacientes ou de seus familiares. Hoje � considerado brutal e desumano (foto: Getty Images)

Decis�o final

Quando Kristensen era presidente da associa��o, ele estava envolvido na decis�o do que fazer com os c�rebros — uma pol�mica que passou por v�rios est�gios de discuss�o.

A principal suposi��o era de que os �rg�os haviam sido coletados sem o consentimento dos pacientes e de seus familiares e, portanto, do ponto de vista �tico, n�o era aconselh�vel manter a cole��o.

Ent�o eles discutiram destruir os materiais ou mesmo enterr�-los ao lado dos pacientes a quem correspondiam. Mas n�o havia como identificar os t�mulos de todos e at� foi proposto fazer um enterro em massa de todos os c�rebros em um s� lugar.

Depois de v�rios anos, o Conselho de �tica da Dinamarca decidiu que era eticamente aceit�vel que eles fossem usados para pesquisa cient�fica sem o consentimento das fam�lias. A associa��o concordou.


Homem olhando imagem de cérebro no computador
O Conselho de �tica dinamarqu�s determinou que os c�rebros poderiam ser usados %u200B%u200Bpara pesquisa (foto: Getty Images)

"Foi dito: 'Fizemos uma coisa muito imoral ao coletar os c�rebros, mas como os temos, tamb�m seria imoral destruir a cole��o e n�o us�-la para fins de pesquisa'", diz Kristensen.

A cole��o de c�rebros e toda a sua documenta��o est�o dispon�veis, com certas restri��es, para qualquer pesquisador que apresente um projeto relevante. Isso inclui cientistas internacionais, embora eles tenham que submeter seus projetos a um comit� de avalia��o e trabalhar em conjunto com cientistas dinamarqueses.

"Minha principal preocupa��o � que, sempre que uma pesquisa cient�fica � aprovada, haja garantias de que o projeto seja executado de maneira �tica", diz Kristensen.

Decis�o 'genial'

Cada c�rebro � preservado em um balde de formol. O tecido adicional retirado durante a aut�psia � envolto em blocos de parafina. Os cientistas conservaram muitas das placas de microscopia originais que foram feitas na �poca.

Nielsen n�o apenas gerencia a cole��o, mas orienta os pesquisadores sobre o melhor uso do material, aplicando novas t�cnicas de biologia molecular para examinar mudan�as no DNA do c�rebro.

"Este � um excelente recurso cient�fico e muito �til se voc� quiser saber mais sobre transtornos mentais", diz Nielsen.

Para o diretor do acervo, o fato de os cientistas terem decidido ficar com os c�rebros dos pacientes tantos anos atr�s foi uma decis�o "genial" para as futuras gera��es de pesquisadores. "Talvez daqui a muito tempo, talvez 50 anos ou mais, algu�m apare�a e saiba mais sobre o c�rebro do que n�s."


Cérebros dentro de caixa
C�rebros e outros tecidos coletados durante as aut�psias est�o dispon�veis para os pesquisadores (foto: Getty Images)

Knud Kristensen concorda que a cole��o tem potencial para novas descobertas sobre transtornos mentais.

"Uma das grandes vantagens � que existem c�rebros t�o antigos que foram removidos de pacientes que n�o receberam drogas antipsic�ticas (porque elas n�o existiam)", disse Kristensen. "Isso significa que voc� pode fazer uma compara��o desses c�rebros antigos com c�rebros novos para ver que mudan�as essas drogas causam (no �rg�o)."

No entanto, ele diz que a cole��o n�o est� sendo muito utilizada. "A pesquisa custa muito dinheiro e a maioria dos estudos psiqui�tricos � financiada pela ind�stria farmac�utica, cujo principal interesse � o desenvolvimento de novas drogas, e n�o a descoberta das raz�es que causam os transtornos mentais."

Nielsen afirma que v�rios projetos para estudar doen�as como dem�ncia e depress�o est�o em andamento. At� agora, entretanto, eles ainda n�o produziram resultados que possam ser considerados "revolucion�rios".

"Mas eles j� est�o come�ando a surgir. Esses projetos exigem um compromisso de longo prazo, e isso significa v�rios anos at� que haja resultados", completa.

"O grande valor desta cole��o � o seu tamanho", diz Nielsen. “� �nico, porque, se quisermos investigar, por exemplo, uma doen�a t�o complicada como a esquizofrenia, n�o precisamos nos limitar a poucos c�rebros. Podemos contar com cem, 500, at� mil c�rebros para o mesmo projeto — o que nos permite ver as varia��es e o tipo de dano ao c�rebro que, de outra forma, passariam despercebidos."


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