(none) || (none)
UAI

Continue lendo os seus conte�dos favoritos.

Assine o Estado de Minas.

price

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e seguran�a do Google para fazer a assinatura.

Assine agora o Estado de Minas por R$ 9,90/m�s. ASSINE AGORA >>

Publicidade

Estado de Minas

Livro de mem�rias revela a atriz Fernanda Montenegro como ela �

Em 'Pr�logo, ato e ep�logo', a diva do teatro brasileiro conta sua trajet�ria no palco e na vida. Relato remonta � chegada de seus antepassados italianos ao Brasil e inclui os trabalhos no r�dio, no teatro, no cinema e na TV, o nascimento dos filhos, a doen�a do marido, os pr�mios e o 'n�o Oscar'


postado em 06/10/2019 04:00 / atualizado em 05/10/2019 20:21

Fernanda Montenegro com o marido, Fernando Torres, e os filhos Claudio e Fernanda, na Lagoa da Pampulha, em 1966(foto: Companhia das Letras/Divulgação)
Fernanda Montenegro com o marido, Fernando Torres, e os filhos Claudio e Fernanda, na Lagoa da Pampulha, em 1966 (foto: Companhia das Letras/Divulga��o)

Como ela se sentiu quando viu a an�dina Gwyneth Paltrow ganhar um Oscar em seu lugar? Qual foi a sensa��o de atuar pela primeira vez ao lado da filha? O que passou por sua cabe�a no momento em que o m�dico lhe disse que o marido tinha um tumor no pulm�o?
 
Nada disso voc� saber� pela leitura de Pr�logo, ato e ep�logo, o livro de mem�rias de Fernanda Montenegro, escrito com a colabora��o de Marta G�es e lan�ado pela Companhia das Letras. Mas percorrer�, ao lado da dona das lembran�as, esses tr�s (e muitos, muitos outros) epis�dios, � maneira dela.

Ou seja, eles ser�o vistos com um olhar generoso sem ser ing�nuo e contados com uma dic��o particular, que fortalece passagens inesperadas e estabelece pontes entre elementos aparentemente divorciados.

Dedicado aos netos de Fernanda e aberto com a hist�ria da chegada de seus antepassados italianos ao Brasil, o livro deixa claro, desde a primeira p�gina, que a grande dama do teatro brasileiro enxerga sua hist�ria com a perspectiva de um antes, um agora e um depois.
 
As polpudas informa��es sobre os colegas com quem Fernanda dividiu os palcos s�o outro atestado de que a atriz v� sua carreira como produto de um contexto e um esfor�o coletivos. Embora o resultado seja absolutamente singular, e isso tamb�m ela n�o ignora.

O maior elogio a Fernanda Montenegro que Pr�logo, ato e ep�logo cont�m est� na p�gina 170 e consiste num depoimento escrito por Gianni Ratto (1916-2005) por ocasi�o dos 50 anos de carreira da atriz. Ratto afirma que “Fernanda � hoje, talvez, a �nica atriz que a cultura, filtrada por sua sensibilidade, torna independente de influ�ncias ou teorias transit�rias, situando-a num plano completamente � parte no campo das grandes int�rpretes-criadoras. N�o se trata aqui de estabelecer se ela � a maior ou a melhor, isso n�o vem ao caso. O que eu quero dizer � que Fernanda � realmente um fen�meno a ser considerado isoladamente mais do que no contexto geral da arte teatral”. 
 
Fernanda Montenegro começou a trabalhar aos 15 anos na rádio MEC, onde exerceu as atividades de radialista, redatora, locutora e radioatriz (foto: acervo Fernanda Montenegro)
Fernanda Montenegro come�ou a trabalhar aos 15 anos na r�dio MEC, onde exerceu as atividades de radialista, redatora, locutora e radioatriz (foto: acervo Fernanda Montenegro)
 
E exemplifica, em 50 anos de palco, com uma �nica cena, da montagem de Eur�dice, de Jean Anouilh, dirigida por ele em 1956, na qual a atriz n�o diz uma palavra, mas cria um “espl�ndido e inesquec�vel momento, no qual passava no fundo do palco, alterando todo um clima dram�tico com uma simples parada e um olhar”.

Antes de chegar a esse ponto, as Mem�rias de Fernanda percorrem a hist�ria de sua rela��o com o diretor Gianni Ratto – como ela aprendeu a admirar seu rigor incomum, como ele se tornou uma esp�cie de guru art�stico para ela, Fernando Torres e seu Grupo dos Sete, como romperam a parceria profissional (num rompante de Ratto) e se afastaram. N�o h� refer�ncia a m�goas e ressentimentos, embora seja de se imaginar que, durante algum tempo, tenha havido um bom bocado de ambos.

E n�o � apenas no caso de Gianni Ratto que o livro deixa de se ocupar do lado sombrio das rela��es. Ao contar sua hist�ria, Fernanda preferiu ressaltar as constru��es, n�o as ru�nas. Reservou palavras de afeto e gratid�o para quem estabeleceu com ela belas parcerias profissionais (lembra “saudosa” os trabalhos feitos com Luiz Fernando Carvalho, no caso da TV) ou humanas (a Edson Celulari ela dirige “um eterno agradecimento” pelo “ombro amigo, a m�o estendida” durante a turn� de Fedra, quando a sa�de de Fernando Torres j� cambaleava).

POL�TICA

Pr�logo, ato e ep�logo cita as duas vezes em que Fernanda Montenegro foi convidada – e recusou – a assumir a pasta da Cultura na Esplanada dos Minist�rios. Mas � sua atua��o sobre o palco e nos bastidores da pol�tica cultural no per�odo mais cinzento dos anos de chumbo que cont�m revela��es surpreendentes, como a de um atentado de que ela foi alvo, em S�o Paulo, em 1979, durante a temporada de �... (Mill�r Fernandes).

Suas rela��es com os dramaturgos Mill�r Fernandes (1923-2012) e Nelson Rodrigues (1912-1980) est�o contempladas, incluindo uma saborosa descri��o de quanta insist�ncia lhe custou arrancar do segundo, que se referia a ela como a “Musa Seren�ssima”, o texto de O beijo no asfalto. Mas � uma comovente troca de cartas com o ator Paulo Autran (1922-2007), j� no fim de sua vida, que d� a medida do afeto de Fernanda por seus pares, deles por ela e da aguda tristeza que � ver uma gera��o de artistas imensos se despedindo dos palcos e da vida.

A atriz em 1953 com o vestido de noiva que ganhou de presente de Eva Todor, cuja companhia de teatro o noivo integrava(foto: Companhia das Letras/Divulgação)
A atriz em 1953 com o vestido de noiva que ganhou de presente de Eva Todor, cuja companhia de teatro o noivo integrava (foto: Companhia das Letras/Divulga��o)
N�o s� o adeus a Paulo Autran, mas tamb�m a morte precoce de Domingos Montagner (1962-2016) doeu em Fernanda, por ver se apagar um ator que “transmitia uma ‘transcend�ncia’ de heran�a c�nica”, que tinha “uma disponibilidade f�sica que alcan�ava do palha�o ao rei” e estava “pronto para um Shakespeare, um Moli�re, um Gil Vicente”.

N�o s�o poucas as vezes em que a trajet�ria de Fernanda Montenegro tem em Minas Gerais um ponto de destaque. Foi de um fazendeiro dono de terras em Passagem de Mariana que a fam�lia da atriz conheceu o primeiro gesto de hospitalidade no Brasil. 

Vindos da It�lia, em 1897, em busca de trabalho e riqueza nas fazendas de caf� de Minas, encontraram descaso, hostilidade e priva��o logo ap�s o desembarque no porto brasileiro. E perambularam como retirantes, at� que o fazendeiro de Minas lhes cedeu um peda�o de terreno, onde puderam se recompor – para mais tarde seguir viagem.

A persist�ncia diante das adversidades e a disposi��o para buscar incessantemente construir para si uma hist�ria melhor marcam o Pr�logo do livro e tamb�m a personalidade de Fernanda, que descreve com gosto sua origem e seus h�bitos de juventude “suburbanos” e o orgulho de ser uma artista mambembe.

Foi em Minas que Arlette – nome dado em homenagem � atriz francesa Arlette Marchal – se alfabetizou, em Ibi�. Na d�cada de 1930, ela viera com os av�s para uma temporada de seis meses na capital mineira, de onde seguiram para o distrito pr�ximo a Arax�.
 
Foi tamb�m na capital mineira que, muitos anos mais tarde, j� nacionalmente conhecida como Fernanda (nome “que tinha um clima de romance do s�culo 19”) Montenegro (como o “m�dico de sub�rbio” capaz de curas milagrosas),  ela ouviu um conselho da amiga m�dica L�cia Mendes que levou � revis�o do tratamento de Fernando Torres. O ator recebera um diagn�stico e uma prescri��o de medicamentos equivocados depois de experimentar uma “pane” em pleno palco.

Numa entrevista ao Estado de Minas, em julho passado, a escritora Marina Colasanti afirmou que “os 80 anos nos avisam que estamos chegando ao quil�metro final da maratona”. 

Prestes a completar 90, Fernanda Montenegro escreve o Ep�logo de seu livro com essa consci�ncia e chega a uma conclus�o digna de aplauso: “Tudo vai se harmonizando para a despedida inevit�vel. Inarred�vel. O que lamento � a vida durar apenas o tempo de um suspiro. Mas, acordo e canto”.


TRECHOS

A NOITE DO OSCAR

"Na noite da premia��o, no Dorothy Chandler Pavilion, Ian McKellen, que tamb�m fora premiado pelo National Board of Review, voltando para o seu lugar depois de um break da cerim�nia, aproximou-se de mim e, muito gentil, perguntou: 'Voc� sabe quem eu sou?'. Como aquele ator glorioso, referencial do teatro ingl�s, podia achar que eu n�o o conhecia? Respondi: 'Claro que sei quem voc� �!'. E ele, s�rio, olho no olho, muito c�mplice, acrescentou: 'Espero que voc� ganhe' – 'I hope you win'. Eu, igualmente c�mplice, respondi: 'Eu tamb�m espero que voc� ganhe'. Por coincid�ncia, nenhum dos indicados que sentara naquela fila de cadeiras, � esquerda da plateia, foi contemplado.Para mim, estar ali foi uma fic��o. Digo isso sem diminuir em nada o valor do nosso filme no seu todo. Como aventura de vida, h� um antes, um durante e um depois de Central do Brasil. Foi uma viagem m�gica. Terr�vel e bela. Penso que conseguimos, Walter e eu, cada um a seu modo, sair melhor do que entramos. Como artistas e seres humanos. Esse 'al�m-fronteira' na arte do cinema me alcan�ou atrav�s dele. A sua sensibilidade e a extrema qualidade votiva de sua dire��o � que me fizeram chegar at� a Berlinale e aquele maravilhoso n�o Oscar."


O DIAGN�STICO DE FERNANDO TORRES

"Em janeiro de 2008, depois de Fernando passar por um exame geral, me informaram, em particular, que havia um tumor num de seus pulm�es. Guardei comigo a triste not�cia. Nenhuma palavra, nem a ele nem aos filhos. O m�dico achou que, no seu caso, a doen�a j� bastante avan�ada, a quimioterapia seria um sofrimento in�til diante da nicotina armazenada em seus pulm�es. Fazia j� muitos anos que tinha parado de fumar. Resolu��o que n�o fora nada f�cil. Mas houve um dia em que, indignada diante de mais um ma�o de cigarros, comecei a gritar, em protesto, como nunca havia gritado – e como jamais voltaria a fazer. Fui uma valqu�ria wagneriana por cima de uma orquestra de 120 m�sicos. Mor�vamos num apartamento. Ele me olhou com muita calma e, com mais calma ainda, pegou o ma�o e jogou pela janela. E nunca mais fumou. Foi um desses gestos que pacificam ou at� anulam, entre dois seres humanos, todos os impasses, todas as crises. Presentes, passadas e futuras."

Pr�logo, ato e ep�logo – mem�rias
. De Fernanda Montenegro (com a colabora��o de Marta G�es)
. Companhia das Letras (344 p�gs.)
R$ 49,90





receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)