
“� sempre infind�vel, pois cada lugar tem uma varia��o”, comenta o jornalista e pesquisador sul-mato-grossense Andriolli Costa, que em seu p�s-doutorado na Universidade do Estado da Bahia (Uneb) estuda a rela��o do folclore e dos jogos anal�gicos. Ele � ainda criador do blog Colecionador de Sacis, que h� tr�s anos conta com uma vers�o em podcast.
Tamb�m jornalista e pesquisador, o mineiro Carlos Felipe, autor de “O grande livro do folclore” (2002), entre dezenas de outros, concorda. “O lend�rio brasileiro � enorme, provavelmente o maior do mundo. Como n�s temos origem ind�gena, negra e portuguesa, e nosso territ�rio � t�o vasto, isso fornece lendas com imagens diferentes em cada parte do Brasil”, comenta ele, que contabiliza pelo menos 200 lendas em todo o pa�s.
Com roupagem de thriller policial, a s�rie acompanha um detetive da pol�cia ambiental do Rio de Janeiro que, ap�s a morte da mulher em uma floresta em chamas e da descoberta de um boto cor-de-rosa morto na praia, come�a uma investiga��o. No processo, vai se deparar com personagens com forma humana que, na verdade, s�o entidades.
“A s�rie foi bem-sucedida, principalmente pela quest�o visual e por ter mostrado para o p�blico que nunca pensou que tais hist�rias poderiam ser contadas pelo meio audiovisual. Mas o recorte do Rio de Janeiro � claro. Muito provavelmente o mercado vai aquecer e buscar hist�rias como essas, ent�o ‘Cidade invis�vel’ provavelmente n�o ser� a �nica (produ��o do g�nero). H� muito mais para explorar”, acrescenta Andriolli.
A seguir, os dois especialistas em folclore nos ajudam a entender de onde vem o lend�rio repaginado pela s�rie:
>> Iara

“Ele morreu de uma febre em Minas Gerais em uma lagoa. Segunda a lenda, quem matou Fern�o Dias n�o foi a doen�a, mas a Iara, pois ele a teria ofendido ao entrar no territ�rio dela procurando esmeraldas, que seriam seus cabelos.”
Protetora da fauna das �guas, ela vai ganhando diferentes nomes e formas. No Centro-Oeste, � o esp�rito M�e d’�gua; nas religi�es afro-brasileiras, � Iemanj�. “A cada leitura, h� um acr�scimo do mito”, continua Carlos Felipe. Na lenda, a pessoa n�o pode ouvir o canto da Iara se estiver sozinha, pois, atra�da por ele, ir� para o fundo do mar e l� morrer�. “Muita gente gravou m�sicas falando da Iara, como Inezita Barroso e Delora Bueno, mas n�o existe o canto da Iara”, acrescenta Felipe.
Na s�rie: interpretada por J�ssica C�res, que vive a cantora Camila
>> Saci
Mais popular dos personagens folcl�ricos brasileiros, mistura elementos das culturas ind�gena e africana. “� sempre arriscado falar em origem, mas, entre aspas, podemos dizer que ele vem do Sul do pa�s, o duende Jaci Jater�, dos povos guaranis, que acabaram reivindicando que o Saci era deles”, afirma Andriolli Costa.
De acordo com o pesquisador, o Saci, como o conhecemos hoje, teve uma mistura do imagin�rio africano – “com a cor e (falta de) uma perna” – com o europeu. “A carapu�a que ele usa � t�pica dos duendes portugueses.”
Para Carlos Felipe, al�m da mistura �tnica, o Saci chama a aten��o pelo lado da malandragem. “Voc� tem que ajudar, dar um cigarro, para que ele n�o mexa com voc�.”
De acordo com o pesquisador, o Saci, como o conhecemos hoje, teve uma mistura do imagin�rio africano – “com a cor e (falta de) uma perna” – com o europeu. “A carapu�a que ele usa � t�pica dos duendes portugueses.”
Para Carlos Felipe, al�m da mistura �tnica, o Saci chama a aten��o pelo lado da malandragem. “Voc� tem que ajudar, dar um cigarro, para que ele n�o mexa com voc�.”
Na s�rie: interpretado por Wesley Guimar�es, que vive o jovem Isac, ele pouco saltita, j� que utiliza uma perna mec�nica
>> Curupira
Um dos personagens folcl�ricos mais antigos do Brasil vem da mitologia ind�gena, j� que sua origem � anterior � chegada dos portugueses. Ser protetor das matas, � citado em carta de 1560 pelo padre Jos� de Anchieta.
“E naquele registro, ele n�o tinha os p�s para tr�s”, comenta Andriolli Costa. Diante disso, ao longo dos s�culos, o esp�rito protetor que batia naqueles que colocavam a floresta em risco foi ganhando diferentes vers�es. Na s�rie, � muito explorado o fogo, que toma o lugar de seus cabelos.
“E naquele registro, ele n�o tinha os p�s para tr�s”, comenta Andriolli Costa. Diante disso, ao longo dos s�culos, o esp�rito protetor que batia naqueles que colocavam a floresta em risco foi ganhando diferentes vers�es. Na s�rie, � muito explorado o fogo, que toma o lugar de seus cabelos.
Na s�rie: interpretado por F�bio Lago, que vive Iber�, um morador de rua
>> Cuca
A Cuca na figura de um jacar� que a maioria das pessoas conhece vem da cria��o de Monteiro Lobato. Ela s� apareceu no livro “O saci” (1921), como uma personagem secund�ria que transformava Narizinho em pedra.
No folclore, ela � um bicho-pap�o presente nas cantigas de ninar, sem apar�ncia precisa. A vers�o da s�rie a misturou com a mitologia das bruxas, em que a s�tima filha mulher se transforma em animais, que podem ser aranha, borboleta (como em “Cidade invis�vel”), gato ou mariposa.
No folclore, ela � um bicho-pap�o presente nas cantigas de ninar, sem apar�ncia precisa. A vers�o da s�rie a misturou com a mitologia das bruxas, em que a s�tima filha mulher se transforma em animais, que podem ser aranha, borboleta (como em “Cidade invis�vel”), gato ou mariposa.
Na s�rie: interpretada por Alessandra Negrini, que vive In�s, dona de um bar
>> Boto-cor-de-rosa
� um ser encantado das �guas que tem forte poder de sedu��o. Sua forma remete � do golfinho, que na mitologia grega era um animal de muita sexualidade. “Muitos ind�genas lembram que a cren�a nos botos � antiga. Mas o boto capaz de se transformar em homem e seduzir mulheres vem do s�culo 18”, explica Andriolli Costa. De acordo com o pesquisador, essa vers�o surge na �poca da coloniza��o, com a imagem do ser que engravida uma mulher e logo depois a abandona.
Na s�rie: interpretado por Victor Sparapane, � apresentado na forma do humano Manaus
>> Tutu
Ele � basicamente um pap�o como a Cuca, e costuma ficar em cima do telhado pronto para comer a crian�a. � frequente das cantigas de ninar, que s�o entoadas pelos pais justamente para que ele n�o pegue a crian�a. A suposi��o mais forte, diz Andriolli Costa, � de que o nome derive da l�ngua africana quinbundo. Tutu seria uma deriva��o de quitutu (ou kitutu), que em quinbundo significa comer. Da� surgiu o nosso quitute. Dependendo do lugar, a lenda, origin�ria da �frica, tem v�rios “sobrenomes”. Pode ser Tutu Maramb�, Tutu Zamb� ou Bicho Tutu.
Na s�rie: interpretado por Jimmy London, Tutu � o bra�o direito de In�s
Maldades de corpo seco
O corpo seco � uma lenda presente em “Cidade invis�vel”, ainda que na s�rie ele n�o tenha um personagem. O mito, popular no Sul e Sudeste, fala de uma pessoa que cometeu tantas maldades em vida que seu corpo foi rejeitado pela terra ao morrer.
Como n�o consegue ser enterrado, n�o vai para o c�u nem para o inferno e retorna como uma esp�cie de zumbi. H� basicamente dois tipos de corpos secos: aquele que se locomove como um zumbi e aquele que n�o consegue se mover, ent�o depende da carona de humanos para chegar aos lugares.
Para escapar desse caroneiro nada bem-vindo, h� algumas a��es poss�veis, como passar uma porteira ou cruzar um riacho.
Como n�o consegue ser enterrado, n�o vai para o c�u nem para o inferno e retorna como uma esp�cie de zumbi. H� basicamente dois tipos de corpos secos: aquele que se locomove como um zumbi e aquele que n�o consegue se mover, ent�o depende da carona de humanos para chegar aos lugares.
Para escapar desse caroneiro nada bem-vindo, h� algumas a��es poss�veis, como passar uma porteira ou cruzar um riacho.