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Estado de Minas LITERATURA

Livro rev� a hist�ria de Jo�o Cabral de Melo Neto em 500 imagens

Fotobiografia registra o trabalho e as amizades do poeta pernambucano no Brasil e nos 13 pa�ses em que serviu como diplomata


20/03/2021 04:00 - atualizado 20/03/2021 07:43

João Cabral de Melo Neto e a esposa, Stella Maria, assistem a uma tourada, em Barcelona(foto: Editora Verso Brasil/Reprodução)
Jo�o Cabral de Melo Neto e a esposa, Stella Maria, assistem a uma tourada, em Barcelona (foto: Editora Verso Brasil/Reprodu��o)
"E embaixo, a realidade prima/t�o violenta, que ao tentar aprision�-la/toda imagem rebenta.” O c�lebre verso de Jo�o Cabral de Melo Neto, grafado em letra firme, clara e desenhada, abre a fotobiografia do poeta pernambucano, organizada por Eucana� Ferraz e com pesquisa de Val�ria Lamego. 

O poema funciona como uma senha para a “Fotobiografia de Jo�o Cabral de Melo Neto” (Editora Verso Brasil), indicando que o poeta era bem menos cerebral, impessoal e alg�brico do que gostaria de ser.

Embora fizesse uma poesia com coisas, Jo�o tinha alma e era confessional em fotos, entrevistas e documentos. Ao longo do livro, constitu�do por 500 imagens, mais da metade in�ditas, o leitor � convidado a um passeio pela vida e pela obra de Jo�o Cabral, do nascimento, no Recife, em 1920, at� a morte, no Rio de Janeiro, em 1999.

Passa por 13 pa�ses onde o poeta serviu como diplomata, mas com primazia para a Espanha, t�o crucial em sua poesia pelas conex�es com o Nordeste. E registra o encontro com os artistas amigos Clarice Lispector, Vinicius de Moraes, Fayga Ostrower, Juan Mir� e Franz Weissmann, entre outros.

O po�o em que o poeta tomava banho na inf�ncia, os colegas de futebol, as amizades, as obras publicadas na editora artesanal Livro Incons�til e os desenhos de Juan Mir� dedicados ao poeta ganham uma impressionante ilustra��o com os versos de Jo�o Cabral.

Em poema sobre o nascimento, “Autobiografia de um s� dia”, Jo�o Cabral escreve: “No Engenho do Po�o n�o nasci;/minha m�e, na v�spera de nascer,/veio de l� para Jaqueira/ que era onde queiram ou n�o queiram/os netos tinham de nascer/no quarto-av�s, frente a mar�. (…) Nasci no quarto-dos-santos/sem querer, nasci blasfemando,/pois s�o blasf�mias sangue e grito/em meio a freirice de l�rios,/mesmo se explodem (gritos, sangue),/da ch�cara entre mar�s, mangues”.

Jo�o Cabral admirava a poeta inglesa Marianne Moore. Mas, contrariando a apologia da impessoalidade, ele estendia essa afinidade a ponto de levar sempre um retrato da poeta. Eucana� flagra no fato e no poema “D�vidas ap�crifas de Marianne Moore” uma admiss�o indireta do singular sentido confessional da obra de Jo�o Cabral: “Sempre evitei falar de mim, falar-me./Quis falar de coisas./Mas na sele��o dessas coisas/n�o haver� um falar de mim?”.

Na entrevista a seguir, Eucana� Ferraz fala sobre a pesquisa, a rela��o esquiva de Jo�o Cabral com a confiss�o e como a fotobiografia contribui para ampliar a vis�o sobre o poeta pernambucano.

O poeta reunido com Francisco Brennand, Aloisio Magalhães e Delson Lima, em Recife(foto: Editora Verso Brasil/Reprodução)
O poeta reunido com Francisco Brennand, Aloisio Magalh�es e Delson Lima, em Recife (foto: Editora Verso Brasil/Reprodu��o)

 
Como fazer a fotobiografia de um poeta avesso a confiss�es sentimentais e que reivindicava ser autor de uma poesia impessoal?
Existem tr�s aspectos a considerar. O primeiro � que Jo�o Cabral � menos confessional do que ele gostaria. Se qualquer pessoa folhear a fotobiografia, perceber� que os poemas acompanham, ilustram e dialogam de uma maneira surpreendente com as imagens. Ele n�o � confessional de uma maneira tradicional. Mas ele � muito memorial�stico. Voc� pode acompanhar a inf�ncia, os po�os onde ele nadava, os rios, a paisagem, as touradas, as caminhadas pelas ruas.

E qual seria o segundo aspecto confessional?
Jo�o concedeu in�meras entrevistas em que fala sobre m�ltiplos aspectos de sua vida: a dor de cabe�a, o gosto pelo futebol, os amigos. E sempre com um senso de humor muito agudo. Ele transformou o mau humor em algo bem-humorado e criou um personagem para brincar com isso. As entrevistas dele s�o engra�ad�ssimas. E o terceiro s�o as fotografias. Uma pessoa que se deixa fotografar t�o � vontade sabe que aquele registro ser� levado adiante e far� parte algum dia de uma biografia. Se ele fosse realmente t�o avesso � biografia, ele n�o se deixaria fotografar com tanta frequ�ncia em in�meros momentos do cotidiano.

Existem muitas imagens de Jo�o Cabral?
Sim, est� registrada a trajet�ria de poeta, as viagens pelo Itamaraty, os lan�amentos de livros, toda uma agenda p�blica por v�rios pa�ses. Eu n�o coloquei mais registros confessionais porque n�o quis. Separamos 500 imagens. Se ele achasse rid�culo, por que sempre levava um porta-retrato com a foto da Mariane Moore, que ele admirava muito. Claro que as fotos n�o revelam a verdadeira intimidade, n�o temos acesso a esta dimens�o da vida dele. Mas, de qualquer maneira, essas fotos revelam que ele n�o recusava a intimidade.

Ent�o, Jo�o Cabral n�o era o homem sem alma?
Ele quis fazer uma poesia sem alma, descarnada, voltada para a mat�ria. N�o existe saudade, tristeza ou melancolia em Jo�o Cabral. N�o se compara com Drummond, Murilo Mendes, Vinicius de Moraes. Esse � um projeto po�tico que ele tem todo o direito de inventar e realizou de maneira magistral.

A amizade com Juan Miró foi um dos frutos de sua relação com a Espanha(foto: Editora Verso Brasil/Reprodução)
A amizade com Juan Mir� foi um dos frutos de sua rela��o com a Espanha (foto: Editora Verso Brasil/Reprodu��o)


Durante a pesquisa, voc�s descobriram muito material in�dito?
Sim, das 500 imagens, cerca de metade � in�dita. Existem algumas coisas preciosas. Publicamos dois desenhos de Juan Mir� dedicados a Jo�o Cabral. E, tamb�m, a reprodu��o de um cat�logo do artista pl�stico Franz Weissmann, onde foi publicado um famoso poema de Jo�o Cabral, escrito especialmente para o folheto. S�o pequenos tesouros.

Jo�o Cabral � consagrado, mas ele � um poeta para poetas ou pode ser apreciado por todos?
N�o sei se existe um poeta para todos. A gera��o da poesia marginal n�o tinha muita afinidade com Jo�o Cabral. A minha, da d�cada de 1990, foi muito marcada pela for�a da poesia de Jo�o. As pessoas leem t�o pouco poesia. Mas acho que, quando uma pessoa chega a ler poesia, ela est� em um est�gio especial, em rela��o a outros leitores, que a torna apta a apreciar Jo�o Cabral. O importante � que ele � um gigante e est� l� no momento em que estivermos preparados para o encontro de poesia. � um gigante, n�o apenas no Brasil, mas em qualquer l�ngua. Voc� pode n�o perceber, mas ele est� l�, da mesma maneira que Drummond, Vinicius, Cec�lia Meirelles. E os gigantes nos ajudam a ser poetas e pessoas melhores.

O que mudou em sua vis�o depois de conhecer as outras facetas de Jo�o Cabral reveladas pela fotobiografia?
Olha, embora eu tenha feito uma tese de doutorado sobre Jo�o Cabral, eu conhecia pouco o personagem. Ele era muito engra�ado, muito vibrante, muito vivo com a fam�lia, a poesia, os livros, a arte e o Brasil. Era direto, n�o tinha intermedia��o em suas rela��es. N�o gosto de Jo�o Cabral porque ele se parece, necessariamente, comigo. Depois de mergulhar em sua vida, descobri que ele � um grande amigo meu.
(foto: Editora Verso Brasil/Reprodução)
(foto: Editora Verso Brasil/Reprodu��o)

“Fotobiografia de Jo�o Cabral”
• Organiza��o de Eucana� Ferraz
• Ed. Verso Brasil (224 p�gs.)
• R$ 128


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