
Em 28 de junho de 1992 ocorreu o primeiro ataque de tubar�o na Grande Recife, matando um banhista em frente � igreja da Praia de Piedade. Desde ent�o, houve 66 ocorr�ncias na regi�o, a mais recente no �ltimo dia 10 de julho, na mesma altura da orla – em quase 30 anos, 26 pessoas morreram. O aumento dos ataques � atribu�do � constru��o do Porto de Suape, que, inaugurado em 1983 na regi�o metropolitana, teria contribu�do para a mudan�a de rota dos peixes.
“Piedade”, s�timo longa-metragem do cineasta pernambucano Cl�udio Assis, que estreia nesta quinta-feira (05/08) em BH, no Cine Belas Artes, coloca outro tipo de tubar�o no ataque. Uma empresa petrol�fera, Petrogreen, quer comprar a �rea onde est� localizado o bar Para�so do Mar, casa e sustento de Carminha (Fernanda Montenegro), seu filho Omar Sharif (Irandhir Santos) e seu neto Rams�s (Francisco Assis). A atividade petrol�fera impossibilitou o banho e a pesca naquela praia, que n�o tem mais os turistas do passado.
Agora, as pessoas se veem encurraladas com o ass�dio de um peixe pequeno da Petrogreen, mas um tubar�o diante da amea�a que carrega. Aur�lio (Matheus Nachtergaele) � um executivo que vai tentar um acordo com a popula��o local. Joga sujo, trazendo uma perda familiar � tona, personificado na figura de Sandro (Cau� Reymond), o dono de um cinema porn�, pai de Marlon Brando (Gabriel Leone), um ativista que luta contra a presen�a da petrol�fera no local. O drama do filho perdido foi algo tirado da hist�ria da pr�pria fam�lia de Assis.
"A vida � assim e o filme foi feito das coisas que estamos vivendo, com que convivemos todos os dias. E nada est� �s mil maravilhas, com o presidente falando besteiras, destruindo tudo. Vivemos em um mundo que n�o tem sa�da. Estamos ali para o tubar�o pegar mesmo, j� que estamos enquadrados"
Cl�udio Assis, cineasta
PANDEMIA
Lan�ado em 2019 no Festival de Cinema de Bras�lia, “Piedade” teve algumas exibi��es on-line no ano passado, pela impossibilidade de chegar �s salas, devido � pandemia. “Lan�ar agora significa certo arremesso. Um projeto desses voc� tem que mostrar, mas, enfim, estou aqui em Olinda e n�o vou acompanhar o lan�amento do filme nos cinemas. Com essa loucura da pandemia, n�o tem muito tes�o”, diz Assis.
Por outro lado, a narrativa leva para o espectador uma mensagem clara de um pa�s � deriva – o que diz muito sobre o tempo presente. Ainda que seja o melodrama o fio condutor da hist�ria, aqueles que t�m familiaridade com o tom visceral da obra de Cl�udio Assis reconhecer�o em “Piedade” tamb�m o submundo de “Amarelo manga” (2002) e “Febre do rato” (2011).
Cabines para encontros sexuais para os frequentadores do cinema de Sandro – que leva o nome de Mercy (piedade, em portugu�s) – t�m c�meras, e o propriet�rio acompanha o ir e vir de corpos “por causa de seguran�a”. O cheiro de sexo impregna todo o lugar.
As presen�as de Matheus Nachtergaele e Irandhir Santos n�o s�o novidade na filmografia de Assis. Aqui, s�o Fernanda Montenegro e Cau� Reymond que chamam a aten��o. E os dois foram convidados praticamente ao mesmo tempo, conta o cineasta.
“Imaginei Dona Fernanda como a m�e, e ela aceitou numa boa. Estava no Rio de Janeiro conversando com ela quando quem senta do outro lado de onde est�vamos? Cau� Reymond. Eu fui at� ele, me apresentei, e perguntei: ‘N�o quer fazer parte do meu filme, n�o?’ Ele topou na hora.”
O filme traz uma anunciada sequ�ncia de sexo entre os personagens de Nachtergaele e Reymond. “A gente coloca os atores para fazer a sequ�ncia. A gente imagina, como � que vai ‘enganar’ o espectador, como vai montar. A� discuto com os atores. N�o sou um diretor de dizer ‘tem que fazer assim’, sempre chego num senso comum”, diz Assis, que mostra um longo plano do corpo de Reymond – quando chega no traseiro, a c�mera explora o desejo que Sandro desperta em Aur�lio (Nachtergaele).
“Piedade” � um filme sobre resist�ncia, mas com um vi�s realista, pessimista, o que fica claro na sequ�ncia final. “A vida � assim e o filme foi feito das coisas que estamos vivendo, com que convivemos todos os dias. E nada est� �s mil maravilhas, com o presidente falando besteiras, destruindo tudo. Vivemos em um mundo que n�o tem sa�da. Estamos ali para o tubar�o pegar mesmo, j� que estamos enquadrados”, afirma Assis.
“PIEDADE”
(Brasil, 2019, de Cl�udio Assis, com Irandhir Santos, Cau� Reymond, Fernanda Montenegro, Matheus Nachtergaele) – A rotina dos moradores da cidade de Piedade � abalada pela chegada de uma grande empresa petrol�fera. Em cartaz no Cine Belas Artes 1, �s 16h, 18h e 20h, a partir desta quinta-feira (05/08).