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Estado de Minas LITERATURA

Menalton Braff foge de clich�s ga�chos no romance ''Al�m do Rio dos Sinos''

Livro semifinalista do Pr�mio Oceanos 2021 revela o Rio Grande do Sul in�spito, marcado pela pobreza da regi�o onde viveu a fam�lia do escritor


18/10/2021 04:00 - atualizado 18/10/2021 07:25

Imagem mostra o escritor gaúcho Menalton Braff, de 83 anos, que disputa o Prêmio Oceanos com o livro 'Além do Rio dos Sinos'
Livro do ga�cho Menalton Braff dialoga com 'Torto arado', romance sobre a saga de negros na Bahia (foto: Global/reprodu��o)

"Sempre gostei de uma narrativa em que as coisas s�o sugeridas, n�o s�o explicitadas, cheia de elipses. Isso d� oportunidade ao leitor de tamb�m criar"

Menalton Braff, escritor


Eleito o melhor romance brasileiro em 2020 pelo pr�mio da Biblioteca Nacional, “Al�m do Rio dos Sinos” (Editora Reformat�rio), do escritor Menalton Braff, trata de um Rio Grande do Sul sem hero�smo, onde a pobreza predomina.

“Li muito a literatura do Sul. At� meus 20 e poucos anos, vivi em Porto Alegre. Com exce��es como o escritor Dyonelio Machado, era um neg�cio meio �pico. A maioria das obras tratava do pampa, das lutas, dos estancieiros. Era uma coisa que me incomodava um pouco, porque conhe�o um Rio Grande do Sul que n�o � nada disso, onde a vida � muito dif�cil”, explica Braff. O livro � semifinalista do Pr�mio Oceanos.

PEDRAS

Inspirado pelas paisagens dos vales da nascente do Rio dos Sinos, que d� nome ao romance, Braff situou seus personagens no Morro do Caipora. Seja pela altura, onde o carro de boi n�o consegue subir, seja pelo solo repleto de pedras, a fam�lia que ali vive pouco consegue extrair da terra.

Cada palmo de terreno sem as pedras caracter�sticas do morro � celebrado por essa fam�lia por possibilitar algum plantio e dele retirar a fonte para sua subsist�ncia. Os habitantes das faixas da v�rzea, aos p�s dos vales, s�o mais pr�speros do que aqueles isolados nas alturas.

“Havia uma diferen�a entre quem mora no morro e quem mora na v�rzea. O pessoal da v�rzea, n�o digo que era rico, mas � mais bem aquinhoado, com mais recursos. Quem mora no morro, derrubando pedra e mato, � levado a uma pobreza bastante grande”, conta Braff sobre a paisagem que revisitou em 2018, durante uma viagem � regi�o onde passava a inf�ncia na casa dos av�s.

Natural de Taquara, escritor o ga�cho mudou-se para S�o Paulo durante a ditadura militar, para escapar da repress�o.

“Fiquei impressionado com a topografia da regi�o. S�o muitos morros cobertos de rocha, de mata. H� muito tempo n�o via uma paisagem t�o agreste”, conta Braff. O lugar n�o lhe saiu da cabe�a. “Para me livrar daquilo, precisava ficcionalizar. Primeiro, descrevendo a regi�o e recriando alguns retalhos ouvidos na viagem. Era um modo de me aliviar daquela paisagem in�spita”, explica.

O morro pedregoso, ali�s, permite uma compara��o com Dyonelio Machado, citado por Braff como exce��o ao tom �pico que marcou a literatura ga�cha no passado.

Em “Fada” (Zouk, 2020), republicado quase 40 anos depois de sua primeira edi��o, as personagens de Dyonelio tamb�m convivem com um monte, “produto de rochas vulc�nicas” e “inacess�vel”.

Nesse romance, o cerro fascina tanto que inspira teorias m�sticas, estudos cient�ficos e at� um livro escrito pelo protagonista. “Aquele pesado bloco irrompe a campina macia com a consci�ncia tranquila de quem domina. O basalto, o arenito, alternando-se na sua composi��o geol�gica, d�-lhe, ao sol, fulgura��es de a�o”, descreve o narrador de “Fada”.

Em ambos os livros, acidentes geogr�ficos s�o importantes para as narrativas, cada um a seu modo. Mas as compara��es poss�veis entre “Fada” e “Al�m do Rio dos Sinos” param por a�. O di�logo mais pertinente entre obras de fic��o � justamente com o fen�meno do momento, “Torto arado” (Todavia, 2019), do baiano Itamar Vieira J�nior.

IRM�S

Assim como em “Torto arado”, vemos em “Al�m do Rio dos Sinos” a quest�o da terra que imp�e dificuldades para seu cultivo. Nos dois livros, o relacionamento de irm�s tamb�m est� presente. Em “Torto arado”, as quilombolas Belon�sia e Bibiana narram suas hist�rias. Por sua vez, em “Al�m do Rio dos Sinos”, o narrador em terceira pessoa conta a saga de Florinda e Marialva.

Braff concorda com a aproxima��o entre seu livro e o de Vieira J�nior. “N�o s� no plano do conte�do, mas no plano da express�o tamb�m cabe o di�logo entre os dois romances”, afirma.

Em um primeiro momento, o narrador de “Al�m do Rio dos Sinos” leva a crer que o protagonista � Nicanor, o jovem que se v� �rf�o e propriet�rio do Morro do Caipora. Sozinho, ele sai em busca da prosperidade na v�rzea. L�, conhece Marialva, com quem noivar�. Com a evolu��o do conv�vio familiar, por�m, revela-se a verdadeira protagonista: Florinda. Ela � a irm� mais nova de Marialva e se apaixonar� por Nicanor.

“Sempre gostei de uma narrativa em que as coisas s�o sugeridas, n�o s�o explicitadas, cheia de elipses. Isso d� oportunidade ao leitor de tamb�m criar. A maior satisfa��o de quem l�, no meu caso, � ajudar a criar a hist�ria. Se n�o tenho nada a acrescentar, isso me emburrece, n�o gosto de autor que diz tudo. Como leitor, quero preencher lacunas. Como escritor, gosto de deixar lacunas para que o leitor preencha”, explica.

As elipses s�o a marca de outro romance do autor ga�cho, “O casar�o da Rua do Ros�rio” (Bertrand Brasil, 2012). Nele, Braff conta a hist�ria de uma fam�lia cujos conflitos s�o acentuados com a chegada da irm� mais nova e seus tr�s filhos para morar no casar�o da fam�lia, ocupado pelas irm�s mais velhas e solteironas. Bernardo, o pai das crian�as, fora levado pela ditadura militar, permanecendo desaparecido. A pris�o, a poss�vel tortura e morte s�o a grande elipse presente no livro.

A aus�ncia paterna, consequ�ncia devastadora da ditadura militar em fam�lias brasileiras, ecoa tamb�m no romance “S� os diamantes s�o eternos (Folhas de Relva, 2020), de outro ga�cho, Tailor Diniz. “Se vivesse 100 anos, viveria sempre � espera de algu�m que jamais iria voltar”, reflete o menino narrador dessa obra de Diniz.

PR�MIO JABUTI

Braff tem 83 anos. Em 2000, venceu o Jabuti na categoria melhor obra de fic��o, com “� sombra do cipreste”. In�meras vezes foi finalista tanto do Jabuti quanto dos pr�mios S�o Paulo e Portugal Telecom.

O ga�cho reserva todas as noites � leitura de obras liter�rias, escreve todas as manh�s o seu novo romance e costuma ler teoria �s tardes, acompanhado da mulher, Roseli Deienno Braff.

Doutora em letras, Roseli foi a respons�vel pela inscri��o de “Al�m do Rio do Sinos” no pr�mio da Biblioteca Nacional. “Agora estamos lendo Tzvetan Todorov”, conta, sobre os estudos em dupla.

Nas ter�as, quartas e quintas-feiras, o autor costuma assistir � televis�o. S�o os dias de transmiss�o da CPI da COVID-19. “Esta CPI � a minha esperan�a”, diz ele, sobre o atual momento do pa�s.

Para manter a sa�de, Braff caminha diariamente ao menos 60 minutos em um parque de Serrana, a cidade no interior de S�o Paulo onde vive.

J� tomou as duas doses da vacina contra a COVID-19 e se orgulha da vacina��o em massa promovida por Serrana em toda a popula��o adulta. Por�m, lamenta a situa��o pol�tica nacional. “O Brasil nunca foi governado por gente t�o fraca. O Brasil n�o merecia isso. � o riso do mundo, estamos fazendo um papel rid�culo”, desabafa.
Capa do livro 'Além do Rio dos Sinos' tem a foto de uma carroça quebrada no meio do mato
(foto: Reformat�rio/reprodu��o)

“AL�M DO RIO DOS SINOS”

De Menalton Braff
Reformat�rio
278 p�ginas
R$ 44


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