(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas LITERATURA

Mulheres dominam disputa pelo pr�mio Jabuti de poesia

As cinco indica��es na categoria foram para obras de escritoras. Resultado sai nesta quinta-feira (25/11)


25/11/2021 04:00 - atualizado 25/11/2021 07:41

de colar e blusa pretos, Jussara Salazar sorri
A escritora pernambucana Jussara Salazar (foto: Jo�o Urban / divulga��o)
O an�ncio dos vencedores da 63ª edi��o do Pr�mio Jabuti ser� feito nesta quinta-feira (25/11), �s 19h, com transmiss�o pelo canal da C�mara Brasileira do Livro no YouTube, que exibe ao vivo a cerim�nia de premia��o. 

Algo, no entanto, j� � sabido, desde que sa�ram os nomes dos finalistas, no �ltimo dia 16: na categoria poesia, a escolhida ser� uma escritora. Isso pelo simples fato de que s�o mulheres as cinco concorrentes deste ano.

Est�o na disputa a mineira Maria L�cia Alvim, que morreu em fevereiro deste ano, aos 88 anos, v�tima da COVID-19, com “Batendo pasto” (editora Relic�rio); a ga�cha Mar Becker, de 35 anos, com “A mulher submersa” (editora Urutau); a su��a radicada no Brasil Prisca Agustoni Pereira, de 46, com “O mundo mutilado” (editora Quel�nio); e as pernambucanas Jussara Salazar, de 62, com “O dia em que fui Santa Joana dos Matadouros” (editora Cepe), e Micheliny Verunschk,  de 49, com “O movimento dos p�ssaros” (editora Martelo).

O pr�mio ao primeiro lugar de categoria � de R$ 5 mil, al�m da estatueta do Jabuti. As obras vencedoras dos eixos Literatura e N�o Fic��o concorrem ao Livro do Ano, com pr�mio no valor de R$ 100 mil. Vale observar que foi da categoria poesia que saiu, em 2020, o Livro do Ano, “Solo para Vialejo” (Cepe), da pernambucana Cida Pedrosa.

“� um momento bem especial para mim, principalmente porque � uma final com outras mulheres, que s�o poetas, e isso n�o � comum. Ao longo da hist�ria do Jabuti e de outras premia��es liter�rias, os contemplados sempre foram majoritariamente homens”, diz Jussara Salazar, cujo livro concorrente foi escrito sob a inspira��o de tr�s hist�rias tr�gicas de mulheres que sofreram viol�ncia.

A primeira � a da tia-av� da escritora, que teve seus pertences queimados em pra�a p�blica e seu nome proibido de ser pronunciado na cidade em que morava porque fugiu com seu grande amor. A segunda � a de Maria da Concei��o Bueno, degolada por um soldado enciumado no s�culo 19, e que veio a ser posteriormente cultuada como santa popular no estado do Paran�. A terceira � Beatriz, nome fict�cio criado pela autora para uma soprano que foi atingida na boca por uma bala vinda da arma de um homem que atirava a esmo do 10º andar de um edif�cio.

selfie de Prisca Agustoni, com blusa de pois
Nascida na Su��a, Prisca Agustoni Pereira se radicou no Brasil (foto: Arquivo pessoal )

REPRESENTATIVIDADE 

Jussara considera que � bastante simb�lico que um livro centrado em mulheres esteja entre os finalistas de um Pr�mio Jabuti com essa caracter�stica - a de ter uma categoria t�o prestigiosa disputada apenas por mulheres. 

“O Jabuti vem desde 1959, j� tem mais de 60 anos, e � s� observar os resultados ao longo desse tempo. Os homens s�o maioria esmagadora entre os contemplados n�o s� pelo Jabuti, mas por todos os pr�mios liter�rios do pa�s. � um fato in�dito, s�o cinco poetas contempor�neas, que se conhecem, que trocam ideias, e tr�s de n�s somos de uma mesma gera��o, come�amos a escrever juntas”, diz, excetuando a veterana L�cia Alvim e a estreante Mar Becker. “Acredito que seja uma representatividade sem precedentes.”

Para Prisca Agustoni, ser finalista na categoria poesia da 63ª edi��o do Pr�mio Jabuti tem um sentido de j�bilo duplo. O primeiro tem a ver com o fato de ela n�o ser uma poeta de l�ngua materna portuguesa. 

“Vejo no meu pa�s de origem muitos autores n�o su��os participarem e ganharem pr�mios liter�rios escrevendo na l�ngua da terra que os acolheu. Ver que o Brasil abriu essa perspectiva nos �ltimos anos, permitindo aos estrangeiros estarem presentes em concursos liter�rios, por exemplo, � muito bom. Eu acho fenomenal poder fazer parte disso”, afirma.

Essa observa��o reverbera o mote de seu livro, cujos poemas se inspiram em movimentos migrat�rios. “Eu sou uma migrante de classe A, n�o fugi do meu pa�s, tenho documentos, mas a experi�ncia da imigra��o n�o te abandona, voc� vive simbolicamente dividido. Eu quis reunir um pouco dessas viv�ncias, pegando tamb�m a dimens�o tr�gica desse fen�meno. Por ser su��a de cultura italiana, h� 20 anos acompanho de perto, pelas not�cias di�rias, o drama dos refugiados e conhe�o muitas dessas pessoas”, comenta.

Ela ressalta que,especialmente entre 2013 e 2017, os jornais europeus relataram cotidianamente a trag�dia dos barcos cheios de pessoas fugindo do litoral norte-africano tentando entrar na Europa pelas fronteiras mar�timas do Mediterr�neo. As not�cias traziam imagens e relatos de muitos barcos afundando e de corpos – a maioria, negros – se avolumando numa enorme lista de mortos, abandonados perto do continente europeu.

close no rosto de Maria Lúcia Alvim, de olhos fechados e com as mãos na face
Maria L�cia Alvim foi indicada postumamente por 'Batendo pasto' (foto: Arquivo pessoal )

SENTIDO COLETIVO 

A outra raz�o do contentamento de Prisca por estar entre as finalistas na categoria poesia do Pr�mio Jabuti � o fato de dividir a disputa com outras mulheres. Tem, portanto, como ela diz, um significado pessoal e outro coletivo. 

“Eu tinha uma conviv�ncia pr�xima com a Maria L�cia, n�s nos correspond�amos, e das outras tr�s sou tamb�m muito amiga. A gente se l�, convive, conversa, mesmo a Mar Becker, que � uma jovem estreante. Estar entre as finalistas nos traz um sentimento coletivo de alegria”, aponta.

Ela considera que o atual panorama da literatura produzida por mulheres no Brasil, de modo geral, � de uma pot�ncia retumbante. “Estamos vivendo um momento espetacular, fabuloso, n�o poupo adjetivos. Sempre escrevemos, algumas com mais �xito do que outras, s� que agora isso � mais vis�vel, � uma onda grande, que vem trazendo muita gente. As gera��es se misturam, e isso � muito bom. E tem v�rias outras autoras que n�o est�o nesse p�reo do Jabuti, mas que escrevem muito bem. O mais importante � que temos consci�ncia disso”, afirma.

Prisca observa que, sim, o cen�rio hoje � bem diferente do que era h� 10 anos, e que isso � fruto de uma constru��o paulatina. Ela afirma que � um trabalho que vem sendo realizado ao longo dos �ltimos 10 anos, que chega neste momento em que apenas mulheres disputam uma das categorias do Jabuti, mas que ainda demanda uma longa caminhada para que a seara da literatura seja mais igualit�ria, em todos os sentidos.

CONJUNTURA 

“Na �ltima edi��o do Jabuti o destaque foi o bel�ssimo ‘Solo para Vialejo’, da Cida Pedrosa, que al�m da categoria poesia foi eleito o livro do ano. Al�m dela, entre os finalistas tinha mais uma ou duas mulheres, se n�o me engano, quer dizer, a presen�a feminina nas finais desses pr�mios j� vem acontecendo.” Ela considera que essa presen�a � reflexo de um quadro mais conjuntural, que vai al�m da simples escrita.

“Tem a ver com o fato de a produ��o liter�ria feminina encontrar hoje um solo mais f�rtil, porque tem mais editoras mulheres, tem mais mulheres nos j�ris, tem mais mulheres exercendo a cr�tica liter�ria. � todo um trabalho subterr�neo que j� vem de uns 10 anos para c�”, comenta.

Ainda sobre o tema, a poeta afirma: “Como visibilizar uma produ��o feminina? N�o basta escrever bem, precisa criar esses canais, com mulheres nesses diversos setores, com olhares mais sens�veis, atentos � pluralidade. Essa lista deu visibilidade a algo que est� em curso. N�o � sinal de que a gente chegou, � uma luta constante para que essas condi��es de base estejam presentes no futuro”.

de blusa branca, Marcela Dantés
Natural de BH, Marcela Dant�s foi indicada por seu livro de estreia (foto: Rafael Motta / divulga��o)

Mineira na disputa de melhor romance liter�rio

A categoria romance liter�rio, a mais prestigiada do Pr�mio Jabuti, que em 2020 consagrou o escritor Itamar Vieira Junior, com seu “Torto arado”, tem neste ano apenas uma mulher entre os finalistas. 

Mineira de Belo Horizonte, Marcela Dant�s concorre com seu primeiro romance, “Nem sinal de asas” (editora Patu�), ao lado de Santiago Nazarian, com “F� no inferno” (editora Cia. das Letras); Jeferson Ten�rio, com “O avesso da pele” (editora Cia. das Letras); Jos� Falero, com “Os supridores” (editora Todavia), e Michel Laub, com “Solu��o de dois Estados” (editora Cia. das Letras).

Marcela destaca que estar nesse p�reo representa um marco em sua trajet�ria. “Os pr�mios s�o uma forma de valida��o e tamb�m uma forma de fazer o livro chegar a mais leitores. A repercuss�o do pr�mio � importante. E, para mim, � especial em fun��o do contexto, porque estou ali concorrendo com outros quatro grandes autores, gente que admiro demais e que leio h� muito tempo. Sou a �nica mulher nessa lista, com um livro lan�ado por uma editora independente, ent�o, claro, isso � motivo de muito orgulho para mim”, diz.

REPORTAGEM 

O embri�o de “Nem sinal de asas” foi uma reportagem que Marcela leu em 2017 sobre uma mulher que foi encontrada mumificada em seu apartamento, na cidade de Culleredo, na Espanha, cinco anos ap�s sua morte.

O romance come�ou a ser escrito naquele mesmo ano e foi finalizado em abril de 2020, j� durante o per�odo de distanciamento social provocado pela pandemia. “� curioso, porque escrevi uma narrativa anterior � pandemia, mas que trata de uma mulher sozinha, confinada em seu apartamento. E a protagonista, Anja, tem uma rela��o forte com a casa dela, o que, at� h� pouco tempo, parecia impens�vel e hoje � nossa rotina”, diz a escritora, de 35 anos.

“Fiquei obcecada com essa hist�ria, quais seriam os caminhos e as escolhas que essa mulher fez, no sentido de chegar a essa solid�o t�o absoluta e esmagadora, de se passarem cinco anos sem ningu�m se dar conta da morte dela? N�s, escritores, sempre tentamos resolver quest�es e obsess�es por meio da literatura. A partir do momento em que li aquela reportagem, comecei a escrever um conto, que foi crescendo e achei que poderia render um romance.”

ESCRITORAS 

O fato de cinco mulheres disputarem na categoria poesia tamb�m n�o passou despercebido aos olhos de Marcela. Ela acredita que isso � o resultado de um movimento das pr�prias escritoras, no sentido de estarem se lendo, se apoiando, indicando umas �s outras. “Estamos nos sentindo mais fortes para nos posicionar, e isso tem feito o mercado nos enxergar com olhos justos, porque para n�s sempre foi mais dif�cil conquistar espa�o”, aponta.

Sobre as finalistas na categoria poesia, ela diz que gerou uma como��o muito bonita. “S�o todas pr�ximas, amigas, conhecem as obras umas das outras e ficaram todas muito emocionadas de saber que, de qualquer jeito, o pr�mio vai para uma mulher. Na categoria do romance ainda temos que caminhar, mas ver essa lista de poesia � uma conquista muito grande para todas n�s.”


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)