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Estado de Minas LITERATURA

Sai no Brasil livro com trechos in�ditos dos di�rios de Virginia Woolf

Organizado por Flora Sussekind, volume tem 430 p�ginas, divis�o cronol�gica por d�cadas, textos introdut�rios e 850 notas de rodap�


11/12/2021 04:00 - atualizado 11/12/2021 07:19

Virginia Woolf olha para a câmera, com um cigarro entre os dedos
Virginia Woolf posou para as lentes da fot�grafa Gisele Freund em 1939, dois anos antes de sua morte. Imagem integrou exposi��o promovida pela National Portrait Gallery, em Londres, em 2009 (foto: Gisele Freund/National Portrait Gallery/Reuters)

"O marido cortou muita coisa na primeira colet�nea, mas o di�rio de escritor que ele fez mostrou para as pessoas n�o s� a qualidade do texto, como tamb�m como ela era uma autora que pensava a escrita"

Flora S�ssekind, organizadora do volume


Em 8 de mar�o de 1941, a escritora Virginia Woolf assistiu a uma palestra do marido, Leonard Woolf, em Brighton, Inglaterra. Naquele primeiro dia da primavera, observou as mulheres saindo �s ruas, comprou ingresso para um museu, andou de bicicleta. � noite, preparou hadoque e lingui�a para o jantar. 

Exatos 20 dias depois, ela encheu de pedras os bolsos de seu casaco, foi at� o Rio Ouse, pr�ximo � sua casa, e se afogou. Seu corpo foi encontrado no m�s seguinte, em 18 de abril.

Lan�ado nesta semana, “Os di�rios de Virginia Woolf – Uma sele��o” (Rocco, 430 p�ginas) traz um apanhado in�dito no Brasil dos escritos pessoais a que a autora de “Mrs. Dalloway” (1925) se dedicou, desde seus 15 anos, em 1897, at� quatro dias antes de seu suic�dio, aos 59. 

“Gosto demais dos textos, que s�o espetaculares. T�m um grau de autoexposi��o muito forte. Ela, de fato, faz um di�rio”, comenta a cr�tica liter�ria e pesquisadora Flora S�ssekind, respons�vel pela sele��o.

Qualquer que seja a edi��o dos escritos pessoais de Woolf, o trabalho, quase de ourivesaria, � grande, j� que ela produziu 38 volumes – nem todos foram editados em livro. A maior parte dos manuscritos, 27 volumes, integra a Cole��o Berg da Biblioteca P�blica de Nova York – foi adquirida em 1971 por US$ 20 mil. Outra parte relevante do material original est� na Universidade de Sussex, na Inglaterra, no arquivo Monks House Papers. 

BLOOMSBURY 

A autora foi figura central na reuni�o de intelectuais da aristocracia inglesa que ficou conhecida como o “Grupo de Bloomsbury”. De uma maneira geral, eles pregavam a liberdade de comportamento e contestavam o puritanismo da �poca.

Parte desse material come�ou a vir a p�blico em 1953, quando Leonard Woolf organizou a compila��o “A writer’s diary”. Sobrinho da escritora, Quentin Bell, tamb�m autor de biografia seminal da brit�nica, organizou posteriormente, ao lado da mulher, Anne Olivier Bell, um material mais extenso dos di�rios. 

“O marido cortou muita coisa na primeira colet�nea, mas o di�rio de escritor que ele fez mostrou para as pessoas n�o s� a qualidade do texto, como tamb�m como ela era uma autora que pensava a escrita”, acrescenta Flora.

Para o volume, com tradu��o de Ang�lica Freitas, Flora escreveu o posf�cio (“Virginia Woolf, os trabalhos & os dias”) e algumas das 850 notas. Fez a divis�o por d�cadas: “Os di�rios de juventude” (de 1897 a 1909), e as d�cadas de 1910, 1920 e 1930. Antecedendo cada parte, h� um pequeno texto da organizadora localizando os principais acontecimentos na vida da escritora e no mundo.

“Tem coisas que parecem engra�adas que fiz quest�o de manter. S�o entradas di�rias bem do cotidiano, pequenas coisas, como ‘coloquei isto no correio’, ‘minha irm� est� pintando e eu andando a p� sozinha’. As repeti��es s�o marcas da escrita do di�rio, j� que voc� entra no cotidiano da pessoa”, diz Flora. 

HUMOR 

Em 4 de janeiro de 1897, Virginia Woolf, prestes a completar 15 anos, conheceu a Ag�ncia Central dos Correios. “Faziam tanto barulho que eu n�o conseguia escutar a explica��o do guia sobre o que estava acontecendo: ent�o � imposs�vel descrever-te qualquer coisa, querido di�rio.”

Outro aspecto mais comezinho da vida da escritora que Flora destaca era a rela��o dela com as empregadas que trabalhavam em sua casa. “Mas o fato do dia para mim foi um vago inc�modo causado pelo car�ter exc�ntrico da nova empregada, Maud. Quando falamos com ela, ela se det�m e olha para o teto. Entra no quarto abruptamente ‘s� para ver se voc� est� a�’”, escreveu em 29 de janeiro de 1915.

“Tem uma coisa interessante sobre (o romance) ‘Ao farol’ (1927). Na segunda parte, voc� sabe o que se passou no intervalo de tempo por meio das senhoras que fazem a faxina. E � lindo perceber isto no texto, a limpeza, o abrir das janelas para deixar o vento entrar”, comenta Flora.

As duas guerras se fazem muito presentes, obviamente. “Nos �ltimos anos dela, em que tudo parece muito absurdo, voc� v� como Virginia Woolf mant�m for�a para continuar escrevendo com bombas a pouqu�ssimos metros de casa, ou seja, com uma disciplina de escrita no di�rio”, diz Flora, que selecionou tamb�m textos que destacam a ascens�o do fascismo. 

A depress�o, que a acompanhou por toda a vida, � tratada em primeira pessoa sem meios tons. “Para mim � t�o estranho n�o entend�-la direito – a depress�o, isto �, que n�o vem de algo concreto, mas do nada”, anotou, em 28 de setembro de 1926.

Para a organizadora, no entanto, o prazer maior est� em fazer a liga��o do que Virginia Woolf escreveu em seus di�rios com seus romances. “� muito interessante, por exemplo, acompanhar a escrita dela durante o per�odo em que escreveu ‘Os anos’ (1937). Ela pensou o livro como algo que misturasse ensaio e fic��o, not�cias, fatos, com coisas ligadas ao cotidiano”, afirma Flora.

N�o foi um processo f�cil, como Virginia Woolf descreveu em entrada de 5 de setembro de 1935, bem antes da publica��o. “N�o consigo escrever uma palavra. Mesmo assim sou capaz de ver que existe algo ali; ent�o vou esperar um dia ou dois e deixar o po�o encher. Desta vez tem que ser bastante profundo – 740 p�ginas. Psicologicamente, esta � a mais estranha das minhas aventuras, acho.” 

“Os anos” foi o �ltimo romance publicado em vida de Virginia Woolf. Foi lan�ado em 1937, com a metade das p�ginas que ela previu dois anos antes. Na verdade, gerou outro volume, o ensaio “Tr�s guin�us” (1938), este, sim, com a parte n�o ficcional do romance. 

OUTRAS PUBLICA��ES  

O lan�amento da Rocco finaliza o ano da oitava d�cada de morte de Virginia Woolf. Um dos marcos no pa�s, em 2021, foi a publica��o de “Os di�rios – Volume 1”, da Editora N�s, que re�ne os escritos integrais entre 1915 e 1918 e promete um segundo volume para um futuro pr�ximo. A editora tamb�m lan�ou neste ano tr�s volumes de ensaios: “A morte da mariposa”, “Pensamentos de paz durante um ataque a�reo” e “Sobre estar doente”. 

O cl�ssico ensaio “Um quarto s� seu”, de 1928, (ou “Um teto todo seu”, como � mais conhecido), ganhou nova tradu��o da Bazar do Tempo, em volume que contempla escritoras brit�nicas como Jane Austen e as irm�s Bront�. A Aut�ntica, que vem, nos �ltimos anos, investindo em edi��es de luxo da obra da autora, publicou, tamb�m recentemente, o romance “As ondas”.

TRECHO


. �ltima entrada que Virginia Woolf fez em seu di�rio
“Segunda-feira, 24 de mar�o de 1941

Ela tinha um nariz como o do Duque de Wellington e grandes dentes de cavalo e olhos frios e salientes. Quando entramos estava sentada numa cadeira triangular com seu tric� nas m�os. Uma seta abotoava o seu colarinho. E antes que se passassem 5 minutos ela nos contou que dois de seus filhos foram mortos na guerra. Isto, pudemos sentir, era um orgulho para ela. Ela era professora de costura. Tudo na sala era vermelho marrom e brilhante. Sentada l�, tentei fazer alguns elogios. Mas estes pereceram no mar gelado entre n�s. E depois n�o houve mais nada. Uma curiosa sensa��o de estar � beira-mar, hoje. Isso me fez lembrar dos alojamentos num desfile de P�scoa. Todos se equilibrando contra o vento, com frio, em sil�ncio. Toda a polpa removida.” 

“OS DI�RIOS DE VIRGINIA WOOLF – UMA SELE��O”
Organiza��o: Flora S�ssekind
Tradu��o: Ang�lica Freitas
Rocco (430 p�gs.)
R$ 129,90 
















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