Ângela Diniz com os filhos

�ngela Diniz com os filhos, na d�cada de 1960

Arquivo EM/D.A Press


Lan�ado h� tr�s anos – o primeiro dos oito epis�dios foi ao ar em 11 de setembro de 2020 –, o podcast “Praia dos Ossos” ser� transmitido pela Inconfid�ncia. Pela primeira vez, o projeto, que j� ultrapassou os quatro milh�es de downloads, ser� veiculado no r�dio. Os epis�dios ser�o semanais, sempre �s segundas-feiras, a partir de 25 de setembro, �s 21h na AM e �s 22h na FM.
 
A parceria entre a emissora mineira e a produtora de podcasts jornal�sticos R�dio Novelo vai compreender outros dois projetos. Depois de “Praia dos Ossos”, a Inconfid�ncia transmitir� “Crime e castigo”, sobre a Justi�a no pa�s, e “Tempo quente”, sobre a crise clim�tica.
 
Quando a R�dio Novelo foi criada, em 2019, o terreno de podcasts narrativos era “mato” no Brasil. At� ent�o, com uma s� hist�ria desenvolvida em v�rios epis�dios, s� havia o Projeto Humanos, criado pelo curitibano Ivan Mizanzuk e que gerou, em 2018, o “Caso Evandro”. Este virou uma s�rie documental, lan�ada pelo Globoplay em 2021.

A R�dio Novelo tamb�m licenciou “Praia dos Ossos”. A Conspira��o Filmes est� desenvolvendo miniss�rie em torno desta hist�ria.
 
Ângela Diniz debutante

�ngela, debutante na alta sociedade da capital mineira

Arquivo EM/D.A Press
 
 
Projeto de estreia da R�dio Novelo, “Praia dos Ossos”  foi produzido por quase dois anos. Idealizado por Branca Vianna, dona da voz que conduz a narrativa, e produzido por Flora Thomson-DeVeaux, reconstitui o crime que parou o Brasil. O cuidado e a pesquisa jornal�stica v�o muito al�m da noite de 30 de dezembro de 1976.

Cada epis�dio se det�m sob um aspecto dos principais envolvidos. Ouvimos sobre a trajet�ria de �ngela Diniz muito antes de se tornar a “Pantera de Minas”, ent�o uma jovem da alta sociedade belo-horizontina dos anos 1960. Tamb�m acompanhamos os dois julgamentos de Doca Street.
 
Ângela Diniz vestida de noiva no dia de seu casamento

�ngela Diniz no dia de seu casamento com Milton Villas Boas, em BH

Arquivo EM/D.A Press

 
Morto em dezembro de 2020 aos 86 anos, o r�u confesso, que no segundo julgamento (em 1981) foi condenado a 15 anos, falou ao podcast em entrevista dif�cil de ser realizada, concedida � revelia dos filhos dele.

Filha de Branca Moreira Alves, uma das pioneiras do movimento feminista no Brasil, Branca Vianna voltou a se interessar pelo caso que conheceu na juventude, entre outras raz�es, pela import�ncia que ele teve para o feminismo no pa�s.

“Mas n�o s�, como tamb�m a quest�o da opini�o p�blica. O Doca saiu do primeiro julgamento ovacionado, justificou (o crime) dizendo que matou por amor. A defesa colocou a culpa do crime na pr�pria v�tima. Como tudo isso colou com o j�ri e tamb�m com a imprensa? Era isso que interessava � gente. Sem isso, seria mais um feminic�dio tr�gico, que acontece at� hoje”, diz Branca.
 
Doca Street

Doca Street deu entrevista para o podcast 'Praia dos Ossos'

Jorge Gontijo/EM/D.A Press/4/11/81
 

"Aus�ncia da v�tima"

Durante a elabora��o do podcast, Branca se surpreendeu com o que chama de “aus�ncia da v�tima”. “Qu�o pouco se sabia sobre a �ngela, como ela era como pessoa, o que queria da vida. Tudo, desde a morte at� o segundo julgamento, foi muito noticiado. Mesmo essa ampla cobertura n�o consegue descobrir como ela era. Apesar da aus�ncia, foi considerada culpada pela pr�pria morte”, comenta.

A Belo Horizonte dos anos 1950 e 1960 se faz muito presente no terceiro epis�dio de “Praia dos Ossos”, intitulado “�ngela”. Tamb�m est� no pen�ltimo, “Quem ama n�o mata”, que acompanha o julgamento de 1981 e aborda a import�ncia do movimento de mulheres que se organizavam tanto na capital mineira quanto em outros grandes centros.

Branca Vianna e a jornalista Myrian Christus, que participou deste epis�dio e � uma das fundadoras do movimento Quem Ama n�o Mata em BH, participam de duas entrevistas na R�dio Inconfid�ncia – na pr�xima ter�a (12/9), �s 16h, no programa “Almanaque”, e em 23/9, no “Radiozine”.

Entre o primeiro e o segundo julgamentos de Street, houve dois feminic�dios marcantes em BH. Em 25 de julho de 1980, M�rcio Stancioli matou a tiros a mulher, Elo�sa Ballesteros, enquanto ela dormia.
 
Duas semanas mais tarde, Eduardo Souza Rocha assassinou a mulher, Maria Regina Santos Souza Rocha. Os assassinatos foram motivados por ci�me – Elo�sa queria se separar; Maria Regina queria ter uma vida pr�pria, estudar e trabalhar.
 
Branca Vianna narra o podcast 'Praia dos Ossos'

Branca Vianna narra o podcast 'Praia dos Ossos'

Acervo pessoal
 
 

Quem Ama n�o Mata

Em 18 de agosto daquele ano, um grupo de mulheres organizou o ato “Quem ama n�o mata” na Igreja S�o Jos�, na Avenida Afonso Pena, contra todas as formas de viol�ncia e questionando o conceito de amor. Quatro dias mais tarde, foi criado o Centro de Defesa dos Direitos da Mulher.

“Desde a morte da �ngela, estabeleceu-se um equ�voco grande. Quem Ama n�o Mata n�o � consequ�ncia da movimenta��o feminista em protesto pelo (crime) do Doca Street. Veio pela como��o causada pela morte das duas mulheres pelos respectivos maridos em 1980”, explica Myrian.

Ela diz que a indigna��o causada pela defesa de Street no primeiro julgamento – “o advogado achincalhou a mem�ria da �ngela, o que foi muito chocante para as mulheres do pa�s, principalmente para as feministas” – fazia parte do “ar do tempo”, numa cita��o � express�o de Rimbaud.

Em BH, o movimento feminista s� come�ou a se organizar naqueles anos. No entanto, o ponto seminal foi um debate, realizado na UFMG, em 1975, sobre a quest�o da mulher. Uma das palestrantes foi Branca Moreira Alves.

O movimento Quem Ama n�o Mata continua ativo, hoje com n�cleo central de 15 mulheres. “Nossa atividade � pol�tico-cultural, sempre quisemos ocupar o espa�o discursivo”, finaliza Myrian Christus.