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Estado de Minas PESCARIA MINEIRA

Chef Bruna Martins mostra o potencial de peixes de rio em novo menu

'Comida mineira n�o � s� frango com quiabo e costelinha com canjiquinha', defende a chef do Birosca, que, literalmente, mergulhou nos rios de Minas


30/07/2023 04:00 - atualizado 28/07/2023 11:40
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surubim, pamonha, quiabo e iogurte menu degustacao milagre dos peixes birosca
A combina��o improv�vel de peixe com milho est� no prato mais ousado do menu (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
N�o fazia mais sentido trabalhar com peixes de mar. Quando decidiu regionalizar a cozinha do restaurante Birosca, a chef Bruna Martins direcionou a sua pescaria para as �guas do rio S�o Francisco. No rec�m-lan�ado menu degusta��o “Milagre dos Peixes”, ela mostra o valor gastron�mico do que � pescado em territ�rio mineiro. “Peixe de �gua doce n�o perde em nada para o de mar”, atesta.


Nos �ltimos tempos, o Birosca vem mirando em uma cozinha menos internacional e mais mineira. Com o desejo de voltar o olhar para Minas, a chef come�ou a andar em c�rculos, aprisionada em um repert�rio repetitivo de receitas mineiras. S� encontrou um caminho diferente quando se lembrou da Bruna crian�a, comendo lambari frito na beira do rio. A� veio a ideia de explorar os peixes de �gua doce.

“Entendi que, se quisesse contar uma hist�ria atrav�s do menu, precisava fazer uma pesquisa a fundo, n�o ficar s� na superf�cie. Comida mineira n�o � s� frango com quiabo e costelinha com canjiquinha”, defende a chef, que, literalmente, mergulhou nos rios de Minas.

pudim de peixe, tucunaré defumado e quiabo menu degustacao milagre dos peixes birosca
O pudim de peixe tem a consist�ncia do doce, mas sabor de tucunar� defumado (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
V�rios acontecimentos levaram seu “barco” a navegar nessa mesma dire��o. Bruna estava cada vez mais entusiasmada com as hist�rias de pescador de Maur�lio Mendon�a, que � seu treinador na academia. Faziam aumentar seu apetite pelos peixes vindos de Tr�s Marias. Em paralelo, leu dois livros do chef australiano Josh Niland, um dos maiores especialistas em peixes do mundo.

Nas pesquisas, iniciadas h� quase um ano, ela percebeu que o uso de t�cnicas de charcutaria em peixes � uma tend�ncia gastron�mica mundial. Mas tinha um detalhe: s� se falava em peixes do mar, tanto aqui quanto no exterior. “N�o tinha como saber se as t�cnicas funcionavam em peixes de �gua doce, ent�o fui comprando e testando at� come�ar a dar certo”, conta.

Os peixes passam pelo processo de cura. Falando de um jeito bem simples, � como carne de sol: ficam na salmoura e depois v�o para a geladeira. Claro que o peixe fresco tem seu valor, mas Bruna explica que a t�cnica valoriza a carne, al�m de funcionar como m�todo de conserva��o. “Conforme passam os dias, o peixe vai 'apresuntando'. Fica com sabor concentrado e uma textura muito interessante.”

At� encontrar bons fornecedores, os peixes que chegavam ao restaurante eram de baixa qualidade. Por isso, a chef come�ou a desenvolver receitas que n�o dependiam do frescor da carne. Assim surgiu a empada de pir�o, que normalmente se faz com a cabe�a. Dentro da massa sabl�e de fub�, peixes picadinhos s�o envolvidos por um molho bem temperado.

Leia: Florestal: Bruna Martins se desafia a provar que carne n�o faz falta

Outro chef expert em peixes entrou nessa hist�ria. Ger�nimo Athuel, do Ocy�, no Rio de Janeiro, foi quem passou a receita da lingui�a. Depois de muitos testes (e algumas adapta��es), Bruna ficou satisfeita com o resultado. O desafio era driblar a falta da gordura de porco, que ajuda a deixar a lingui�a firme. Nessa, s� tem a tripa de porco, que se enche com v�rios peixes, sendo os principais surubim (por ter a carne mais gordurosa) e tucunar�.

linguiça de peixe, tropeiro de broa e castanha de baru menu degustacao milagre dos peixes birosca
A lingui�a de peixe � servida com tropeiro de dois feij�es, farelo de broa e farinha de castanha de baru (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
Molho de moqueca e picles de mam�o verde completam o prato, que resgata o h�bito de incluir a fruta antes de amadurecer em receitas ensopadas.
Na sequ�ncia, quando ainda n�o conseguia trabalhar com pescados de qualidade, veio a ideia do churrasco de tucunar�, chamado assim porque a carne � curada e defumada.

O peixe chega � mesa com o tropeiro de farelo de broa de fub�, feij�o-de-corda verde, feij�o andu e farinha de castanha de baru, que traz o sabor do cerrado. Esses tr�s pratos est�o no card�pio a la carte do Birosca.

Nas viagens a Tr�s Marias e Pirapora para conhecer pessoalmente pescadores, peixarias e restaurantes, Bruna foi tendo acesso a peixes de mais qualidade e conquistando uma log�stica que fizesse com que chegassem ao restaurante. S� depois disso ela se arriscou a criar o menu degusta��o “Milagre dos Peixes”, servido nas noites de quinta-feira para at� 20 pessoas.

Doce Pescaria

Disso nasceu o projeto “Doce Pescaria”, que busca a valoriza��o da cultura ribeirinha e dos peixes de rio. A chef pretende desenvolver pesquisas para entender quest�es ambientais (como a piracema, per�odo de reprodu��o dos peixes, em que a pesca � proibida) e log�sticas (como fazer com que esses peixes cheguem regularmente a restaurantes da capital).

lambari frito broa coalhada com misso menu degustacao milagre dos peixes birosca
Com cabe�a e tudo: o lambari frito vai por cima de um peda�o de broa (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
“� uma mistura de possibilidades e questionamentos”, resume, ao constatar que “buraco � fundo” e que vai levar anos para “colher frutos”.

Por enquanto, o que ela consegue fazer � buscar pessoalmente os peixes ou combinar com um taxista para trazer no porta-malas do carro, armazenados em caixas com gelo.

“Hoje tenho uma log�stica que estou disposta a fazer, mas que � muito dif�cil, por isso ainda n�o estou dividindo com outros chefs”, avisa Bruna, que tem o objetivo de ensinar o caminho da pesca de rio para outros restaurantes da cidade. Tamb�m fazem parte dos planos visitar outras cidades, capacitar pescadores e produzir um document�rio.

Mesmo que pequena, essa j� � uma conquista a ser comemorada. Bruna tamb�m est� feliz de ver, nessas viagens, que a cultura de peixe de �guas doce n�o se perdeu em Minas Gerais. Por onde passou, viu que as pessoas comem o que se pesca nos rios. Nos restaurantes, encontrou de moqueca a churrasco.

“O que a gente n�o tem � isso sendo valorizado na gastronomia mineira. Fala-se muito do porco e da galinha e pouco peixe de rio. Acho que � porque os chefs com destaque no cen�rio nacional est�o em BH e n�o t�m acesso a essa log�stica e tamb�m poucos est�o interessados em fazer pesquisas”, analisa Bruna, lamentando que o acesso aos peixes do mar seja muito mais f�cil.

No momento, chegam ao restaurante desde os peixes mais nobres, como dourado, surubim e tucunar� (apesar de ser originalmente da Amaz�nia, virou morador da represa de Tr�s Marias e a chef considera um dos mais gostosos), at� piranha, pacu, tra�ra e matrinx�.

bruna martins chef birosca em pirapora segurando surubim
Em viagens a Pirapora, Bruna Martins identificou fornecedores de peixes como o surubim (foto: Daniel Iglesias/Divulga��o)
Com esse trabalho, ela quer dar oportunidade para o p�blico de BH de voltar a comer peixes do rio, que fazem parte da nossa mem�ria. “Todo mineiro tem alguma hist�ria de sabor para contar com peixe de rio, mas n�o tem acesso aqui na cidade”, comenta a chef, que tem uma rela��o afetiva com a pescaria. Em Sete Lagoas, terra do seu pai, o programa de fim de semana era pescar e comer peixe.

Al�m disso, os pratos mostram todo o potencial gastron�mico dos peixes mineiros. Usando formas diferentes de preparo, fica claro que d� para ir muito al�m da tra�ra frita e da moqueca.

Novo repert�rio

“Eu tenho esses peixes e dou de cora��o.” A m�sica “Milagre dos Peixes”, de Fernando Brant, interpretada por Milton Nascimento, diz muito sobre o que Bruna est� fazendo. N�o por acaso, ela inspira e d� nome ao primeiro menu degusta��o do Birosca totalmente dedicado aos peixes de rio, que marca o novo momento do restaurante. A chef quer ampliar o repert�rio da cozinha mineira.

snacks menu degustacao milagre dos peixes birosca
Esculpida em madeira, a canoa com carranca transporta os snacks (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
“Estou falando de Minas Gerais com o olhar de uma nova gera��o que est� tentando fazer a ponte entre o tradicional e o autoral. Dentro disso, quis fazer uma trabalho fora da superf�cie da comida mineira tradicional, por isso coloco os peixes de �gua doce.”

O menu come�a com o pudim de peixe. A ideia veio de um jantar em Madrid no Chispa Bistr�, do chef mineiro Gabriel Sodr�, citado no Guia Michelin. L�, ela comeu um flan de galinha e voltou com a receita. “Fiquei impressionada com a textura, nunca tinha comido nada igual. Adaptei para o caldo de peixe e chamei de pudim, que � mais mineiro”, explica.

A entrada lembra pudim pela consist�ncia. Mas, de sabor, voc� sente o defumado dos cubos de tucunar�, que at� parecem ser bacon, combinados com esferas de quiabo.

Os snacks s�o servidos em uma lou�a de madeira esculpida pelo pai de Bruna. Em formato de canoa, com uma carranca na ponta, j� atrai olhares no caminho para a mesa. Enquanto desenvolvia as receitas, ela pesquisou qual arte representava o povo ribeirinho e se lembrou das carrancas, o amuleto do pescador. Em Pirapora, conheceu carranqueiros que seguem a tradi��o.

Como j� recebe peixes frescos, a chef consegue servir sashimi de surubim (que passa por cura m�nima), envolvendo um bolinho cremoso de curau. Ao lado, o lambari frito, com cabe�a e tudo, que est� na sua mem�ria. “Quando era crian�a, comia muito lambari empanado no fub�, frito e com lim�o espremido.” Ele vai por cima de um peda�o de broa com coalhada de miss�. A canoa ainda transporta o dourado frito com pimenta-de-cheiro e pequi.

Em seguida, vem a empada, que em Minas � ribeirinha, e n�o praiana, com recheio de pir�o de pacu. Dif�cil imaginar que daria certo comer uma massa crocante submersa em um molho de lim�o. No menu degusta��o, a lingui�a de peixe vai acompanhada pelo tropeiro de broa.

empada de pirao de pacu menu degustacao milagre dos peixes birosca
Submersa em molho de lim�o, a empadinha tem recheio de pir�o de pacu (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
A combina��o improv�vel de peixe com milho volta no �ltimo prato antes da sobremesa. “Esse card�pio foi pensado para equilibrar a ambi��o que se tem quando � jovem, de ser criativo, de estar na ponta o tempo inteiro e a necessidade de dar um passo para tr�s, em dire��o ao tradicional. Ent�o, ao mesmo tempo em que tem tropeiro e empadinha, tem um prato mais arriscado, mais de vanguarda.”

A posta de surubim curado se destaca por cima de pamonha cremosa da casa, quiabos tostados e iogurte, que entra para levar a acidez normalmente procurada no lim�o na hora de comer peixe. O menu s� tem peixe, mas � muito Minas Gerais.

Empada de pir�o de pacu

Ingredientes
1,2kg de piment�o vermelho; 500g de piment�o amarelo; 300g de piment�o verde; 650g de cebola branca (forno); 300g de cebola (brunoise na panela); 600g de tomate pelati; 85g de talo e raiz coentro; 4g de pimenta dedo-de-mo�a; 40g de pimenta-de-cheiro; 2kg de fil� pacu; 200g de farinha de mandioca; sal e pimenta-do-reino a gosto; 500g farinha de trigo; 125g de fub�; 15g de sal; 300g de manteiga; 100g de �gua gelada 
Modo de fazer
No forno, doure os piment�es, a cebola e o tomate pelati separados. Na panela, refogue a cebola brunoise, o talo e a raiz de coentro, a pimenta dedo-de-mo�a e a pimenta-de-cheiro. Adicione os itens que estavam no forno e deixe ferver. Bata tudo no liquidificador e volte para a panela. Em uma frigideira quente, sele os peixes e tempere com sal e pimenta-do-reino. Junte o peixe no molho e deixe ferver. V� desmanchando o peixe com a ajuda de um fouet. Adicione a farinha de mandioca e deixe engrossar. Acerte o sal e a pimenta-do-reino. Para a massa sabl�e de fub�, junte em um bowl a farinha, o sal e o fub�. Corte a manteiga gelada em cubos e v� incorporando com as pontas dos dedos. Quando formar uma farofa, junte a �gua, aos poucos, at� formar uma massa homog�nea. N�o sove. Deixe descansar na geladeira por 2h. Em uma forma de empada, molde a massa sabl�e. Fure o fundo da massa com o garfo. Coloque papel-manteiga e peso de gr�os. Asse em forno preaquecido a 180ºC por 12 minutos.

Servi�o

Birosca (@biroscas2)
Rua Silvian�polis, 483, Santa Tereza
(31) 99957-7267

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