Nhoque: chefs exploram a variedade de ingredientes para criar novos sabores
Requeij�o moreno, banana-da-terra e baroa s�o usados para fazer a massa italiana, que tamb�m se transforma com molhos que v�o muito al�m da tradi��o
Cantim D'or Noir tem um card�pio extenso dedicado � massa (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
Num passado bem distante, era uma mistura “m�gica” de farinha com �gua. Depois a batata entrou para deixar a receita mais interessante. Aqui no Brasil a hist�ria continua com muita criatividade. O nhoque ganha diferentes cores e sabores na mesma medida da nossa diversidade de ingredientes. Requeij�o moreno, banana-da-terra e batata-baroa s�o usados por chefs para fazer a massa italiana, que tamb�m se transforma com molhos que v�o muito al�m da tradi��o.
Nhoque para Gabriel Trillo tem sabor de mem�ria afetiva. O chef dos restaurantes Omil�a e P�tria aprendeu a receita “alla romana” com uma tia-av�, que era casada com um italiano. Tradicional de Roma, a receita n�o leva batata, � uma mistura de semolina, leite aromatizado com noz-moscada e pimenta-do-reino, gema de ovo, parmes�o e azeite. “Coincidentemente, foi essa minha tia-av� que me trouxe para a gastronomia. Quando eu era crian�a, ela me trazia receitas cozinhar”, conta.
Quando decidiu servir nhoque no Omil�a, pensou em como “amineirar” a receita, j� que a casa tem a proposta de valorizar produtos e produtores locais. Ent�o, chegou ao requeij�o moreno do Serro.
Assim como a tia-av� ensinou, ele dissolve os ingredientes no leite temperado com especiarias e mexe na panela at� dar o ponto. Espalha a massa num tabuleiro untado, corta em quadradinhos e grelha na manteiga para dar uma tostada e acentuar o sabor. “A textura lembra a do nhoque tradicional de batata, s� que com um sabor muito presente do requeij�o moreno. � como se voc� estivesse comendo um quadradinho de requeij�o moreno grelhado”, descreve.
Gabriel Trillo "amineira" a receita romana com requeij�o moreno do Serro (foto: Daphne Carvalho/Divulga��o)
Servido com bife ancho grelhado ao molho de frutas vermelhas, o nhoque de requeij�o moreno virou queridinho do Om�lia. Na mudan�a recente de endere�o, o prato saiu do card�pio. Gabriel ouviu tantos apelos apaixonados que j� entendeu: com cl�ssico n�o se mexe.
No P�tria, o chef segue um caminho diferente. Por ser um restaurante de cozinha brasileira, faz uma vers�o do nhoque tradicional de batata “al burro (manteiga em italiano) e s�lvia”. “Preparo o molho com manteiga de garrafa e s�lvia e a baroa entra no lugar da batata”, explica. Para acompanhar, costela de boi cozida, desfiada, prensada e grelhada, que faz refer�ncia ao costel�o ga�cho.
O amor de Marcelo Pace, do Gero, por nhoque tamb�m vem de uma hist�ria familiar. “Para mim, � um prato acolhedor e afetivo, que me traz muitas lembran�as boas da casa da minha av�”, justifica. Os almo�os de domingo eram uma festa, ela colocava todo mundo para ajudar a fazer o nhoque. O molho alternava entre pomodoro e bolonhesa. Quando entrou para o Grupo Fasano, o chef, que vinha de experi�ncias com a cozinha francesa, realizou o sonho de se aproximar das suas ra�zes italianas.
Esta � a primeira vez que o nhoque entra no card�pio do Gero como op��o fixa (antes s� aparecia como sugest�o do dia). Marcelo segue os ensinamentos da av�: batata e pouqu�ssima farinha. “O grande segredo � acertar a propor��o para n�o ficar pesado. A farinha s� entra para dar liga”, esclarece. “O nhoque tem que ficar leve, macio, esvair-se na boca e voc� tem que sentir o sabor da batata."
Envolvido por um molho de queijos, o nhoque do Ancora ganha sabor marcante com manteiga trufada (foto: Diego Lucena/Divulga��o)
No novo menu, o chef d� destaque para os frutos do mar. Por isso, leva para o nhoque an�is de lula, combinados com guanciale (bochecha su�na), o mesmo usado no carbonara. A cl�ssica combina��o de porco com frutos do mar � envolvida pelo molho pesto de manjeric�o. Segundo Marcelo, a uni�o de todos esses elementos resulta em um prato fresco e ao mesmo tempo intenso. “Estamos apostando em cl�ssicos italianos com um toque de modernidade e muito sabor para que o mineiro se sinta acolhido.”
J� velhos conhecidos, os dois pratos de nhoque de batata do Ancora n�o podem sair de jeito nenhum do card�pio. O restaurante, inclusive, � muito lembrado pela massa. Desde o in�cio, quando era Un'Altra Volta, eles apostaram na fabrica��o pr�pria, e com o m�nimo de farinha. Muitas vezes, chegam a produzir tr�s vezes por semana, para que esteja sempre fresco. “Temos mais trabalho para fazer, mas conseguimos entregamos muito mais sabor e leveza para o cliente.”
Em dias frios, o nhoque Cistino costuma ser campe�o de vendas. Envolvido por um molho branco � base de parmes�o e gruy�re, ganha sabor marcante com manteiga trufada. Completam o prato a pot�ncia do carr� de cordeiro grelhado ao molho de vinho tinto e o adocicado da cebola roxa cozida. A outra op��o � o nhoque Del�cia, nome do surpreendente molho que acompanha a massa, uma mistura de bolonhesa com pesto. “S� a gente que faz o molho, ent�o temos clientes fi�is, que s� v�m para comer esse nhoque.”
Boa not�cia para os f�s do nhoque do Ancora: Pedro pretende come�ar a vender a massa congelada ainda este ano.
Servido como petisco, o nhoque frito do Hacienda 1979 fica crocante por fora e macio por dentro (foto: Victor Schwaner/Divulga��o)
Cl�vis Viana, do Patuscada Gastrobar, nunca deixa de ter pelo menos uma op��o de nhoque no card�pio. Atualmente, destaca-se o de banana-da-terra. A inspira��o veio de um prato do antigo Patuscada, que fez muito sucesso: nhoque grelhado de banana-da-terra e lagosta ao forno com ervas. S� que a massa ressurgiu bem diferente. Agora � cozida na �gua, servida com creme de queijo e coberta com mu�arela e parmes�o ma�aricados.
Segundo o chef, a banana tem que estar madura e deve ser assada no forno, com casca e tudo. “Como a banana-da-terra � mais seca e consistente que a batata, o nhoque leva ainda menos farinha, ent�o voc� sente o gosto da banana mesmo”, aponta. Nessa receita, ele carrega mais no sal e na pimenta-do-reino (mo�da na hora) para equilibrar o dul�or da fruta, que se mistura a farinha de trigo, gema de ovo e queijo parmes�o. De acompanhamento, fraldinha assada ao molho de vinho tinto.
Esse � um dos pratos mais pedidos do card�pio. Cl�vis costuma sugerir aos clientes como petisco. Como a por��o � generosa, serve de tr�s a quatro pessoas.
Para petiscar
Quem disse que nhoque tem que ser cozido e envolvido por molho? De cozinha �talo-argentina, o Hacienda 1979 surpreende com o �hoquito, nhoque frito em formato de petisco, o que tamb�m n�o � nada comum. Um dos s�cios trouxe a ideia de uma viagem.
Lula, guanciale e pesto formam um molho fresco e intenso para o nhoque do Gero (foto: Victor Schwaner/Divulga��o
)
“Todo cozinheiro � um pouco curioso e gosta de novidades. Fui testando at� chegar a essa receita”, diz o chef Kaique Soares, que � do interior de S�o Paulo e estava trabalhando no Rio de Janeiro quando o Grupo Chalezinho o convidou para vir para BH.
O processo � o mesmo do nhoque tradicional. Kaique brinca que tem uma “nonna” na cozinha, a Elizabeth Lara, que fica por conta das massas. Levam-se ao forno as batatas embrulhadas em papel-alum�nio. Quando j� est�o cozidas, s�o amassadas e se juntam a “um pouquinho” de farinha, ovo e parmes�o. “Antes de fritar, passamos o nhoque na farinha de trigo. Ele fica crocante por fora e macio por dentro.”
O nhoque frito chega � mesa salpicado com queijo parmes�o. Dois molhos tipicamente italianos fazem as vezes de acompanhamento. Um � o pesto de manjeric�o e o outro, a sardela (pasta � base de piment�o vermelho, tomate e aliche). A ideia � mergulhar neles os quadradinhos de massa.
A forma diferente de comer nhoque agradou tanto que essa � uma das entradas mais pedidas. “Acho que a curiosidade das pessoas faz com que o prato saiba bem. Ele tamb�m surpreende pela leveza e pelo sabor”, observa Kaique, garantindo que a massa fica bem sequinha. Com a proposta de fugir do comum, a casa oferece tamb�m o nhoque de ab�bora com molho de carne e lascas de parmes�o.
Vers�o brasileira: a baroa entra no lugar da batata no nhoque do P�tria (foto: Victor Schwaner/Divulga��o
)
O nhoque n�o tem frescura quanto aos seus companheiros de prato. Que o digam Ione Romualdo e Israel J�nior, do Cantim D’or Noir, conhecido pelo card�pio extenso dedicado � massa. O casal resgatou receitas da fam�lia italiana dele e enche a boca para falar que serve “o melhor nhoque de BH”: leve, macio e com gosto de batata e parmes�o, e n�o farinha de trigo.
“A batata tem que ser assada. Quanto menos �gua no feito, menos farinha voc� usa para dar o ponto. Outro segredo � a semolina, que vai dar leveza e permitir que a massa incorpore o molho”, orienta Ione. Sem entrar em detalhes, ela conta que aprendeu com a fam�lia uma forma de congelar o nhoque que mant�m intactas todas as suas caracter�sticas. Quando servem, parece que foi feito na hora.
A casa produz o nhoque de batata tradicional e com folhas de espinafre (que fica com pontinhos verdes). O cliente pode escolher o molho. Entre as op��es, est�o desde o cl�ssico bolonhesa at� inven��es como o de demi-glace com iscas de fil�-mignon e cogumelos. Ao longo do tempo, j� criaram v�rias receitas que v�o al�m do tradicional, como carne de sol com ab�bora, ragu de rabada, gorgonzola com nozes e passas e frango defumado com molho de tomate.
Nhoque de baroa com manteiga e s�lvia (P�tria)
Ingredientes
1,5kg de baroa; 500g de farinha de trigo; 200g de queijo parmes�o ralado fino; 4 gemas de ovo; sal e pimenta-do-reino a gosto; 150g de manteiga; 20g de alho picado; 1 ma�o de s�lvia
Modo de fazer
Asse a baroa em forno a 170 graus durante 30 minutos. Descasque e amasse em peneira ou amassador de batata. Numa tigela, misture com a ponta dos dedos, sem sovar, farinha de trigo, parmes�o e gemas. Reserve um pouco da farinha de trigo para dar o ponto da massa. Ela deve estar uniforme e sem grudar nos dedos. Fa�a rolinhos compridos de 2cm de espessura e corte em peda�os de aproximadamente 2cm de comprimento. Coloque �gua para ferver numa panela. Quando entrar em ebuli��o, abaixe o fogo e, com o aux�lio de uma escumadeira, coloque o nhoque na �gua. Quando boiar, conte 15 segundos e retire com a escumadeira. Mergulhe o nhoque imediatamente em �gua gelada para bloquear o cozimento. Quando “decantar”, retire e reserve. Numa saut�, derreta a manteiga e agregue o nhoque. Deixe at� grelhar e formar uma casquinha dourada. Pingue um pouco da �gua do cozimento e envolva a massa. O molho ser� preparado com este l�quido. Finalize com a s�lvia picada, sal e pimenta-do-reino.