'Estou muito feliz, n�o posso reclamar', diz o chef Ivo Faria, revelando seu entusiasmo com o que vem por a� (foto: Nereu Jr/Divulga��o
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Aos 70 anos, Ivo Faria inicia um novo cap�tulo da sua hist�ria. Dois anos depois de fechar o restaurante Vecchio Sogno, ele inaugura o Instituto Ivo Faria, com o objetivo de desenvolver projetos sociais de forma��o de m�o de obra qualificada para o mercado de gastronomia e trabalhar pela valoriza��o dos ingredientes regionais. Ao mesmo tempo, a sede da organiza��o, no Bairro Belvedere, em Belo Horizonte, funciona como espa�o para eventos.
Quando fechou o Vecchio Sogno, em janeiro de 2021, o chef ainda n�o tinha planos. A ideia do instituto surgiu depois, ancorada no desejo de se dedicar a um trabalho social.
“Fiz a minha forma��o dentro do Senac e sei o quanto � importante dar condi��es para uma pessoa entrar no ramo da gastronomia e viver experi�ncias que nunca viveria em outra profiss�o”, justifica.
Ivo cresceu no Bairro Primeiro de Maio, Regi�o Norte de BH, e foi fazer o curso de cozinha aos 14 anos, por “necessidade”, como conta. “Era a �nica oportunidade que tinha naquele momento.”
Com sal�o, cozinha, bar e adega, a sede do instituto � aberta para eventos (foto: Nereu Jr/Divulga��o)
Al�m de custear a alimenta��o, o Senac pagava as passagens de ida e volta para que todos pudessem frequentar as aulas no Centro, oferecidas gratuitamente. Era uma forma de atrair alunos, j� que, nos anos 1960, ningu�m se interessava em estudar para ser cozinheiro.
O curso mudou a vida daquele jovem: serviu de ponte para uma profiss�o e uma vida melhor. Grato pela oportunidade, Ivo sempre fez pelos outros o que o Senac fez por ele.
Nos 25 anos do Vecchio Sogno, sua cozinha funcionou como uma escola de forma��o. Com orgulho, ele contabiliza que muitos profissionais se formaram ali. Alguns entraram como servi�os gerais e chegaram a ser chefs.
“Vejo que a maioria das pessoas que entram nesse ramo s�o de fam�lia simples, com uma situa��o financeira dif�cil e precisam trabalhar. Ent�o, queremos montar um esquema de forma��o com cursos r�pidos e custo zero para o aluno”, revela.
Ceviche de peixe branco com pupunha e maracuj� (foto: Nereu Jr/Divulga��o)
Se, por um lado, o instituto vai dar oportunidade para quem precisa de forma��o, por outro lado, ser� um aliado de quem contrata.
Segundo Ivo, uma das grandes dificuldades do setor de gastronomia, n�o s� em BH, mas no mundo inteiro, � encontrar m�o de obra qualificada. Isso vale tanto para a cozinha quanto para o sal�o, que sofre com a falta de gar�ons.
Para driblar essa car�ncia de m�o de obra, muitos restaurantes acabam contratando pessoas sem experi�ncia e oferecem o treinamento no dia a dia, como o chef fazia no Vecchio Sogno.
Quem ajudou a formatar a ideia foi Rodrigo Ferreira, que assumiu como vice-presidente e diretor de projetos.
“O Ivo j� colocou o nome dele na gastronomia mineira, mas pode fazer muito mais, por tudo o que viveu, com o instituto. � consolidar o trabalho de uma vida”, aponta o professor, pesquisador e cozinheiro, lembrando que v�rios chefs renomados do Brasil e do mundo seguiram esse caminho, como Alex Atala (Instituto AT�), Morena Leite (Instituto Capim Santo) e Paul Bocuse (Instituto Paul Bocuse).
Transforma��o social
Para ele, a trajet�ria do chef � exemplo de como a gastronomia pode ser um meio de transforma��o social.
“O Ivo cresceu em uma �rea marginalizada, teve a oportunidade de se formar no Senac, foi ganhando espa�o, comandou um restaurante muito premiado e rodou o mundo. Conseguiu tudo isso atrav�s da cozinha”, aponta Rodrigo, que � amigo da fam�lia (formou-se com a filha dele, Naiara), fez est�gio na cozinha do Vecchio Sogno e foi o gerente da extinta Casa Infinita.
Camar�o estufado com creme de baroa e tucupi (foto: Nereu Jr/Divulga��o)
O Instituto Ivo Faria tem o objetivo de fomentar o desenvolvimento gastron�mico em tr�s frentes: forma��o e valoriza��o dos profissionais da gastronomia, apoio a pesquisas para difundir o saber gastron�mico e intera��o com a cadeia produtiva local, levando produtos regionais para o prato.
No momento, a equipe se dedica ao planejamento das a��es, mapeando em quais �reas podem atuar e onde existe demanda, em todo o estado.
Daqui tr�s meses, eles j� querem ter os projetos formatados para sair em busca de parceiros (empresas privadas e �rg�os p�blicos) e recursos. Algumas pessoas j� se dispuseram a ajudar nessa caminhada.
Provavelmente, o trabalho vai come�ar pela capacita��o, tendo em vista que m�o de obra � uma quest�o sens�vel para o setor de gastronomia. Comunidades carentes devem ser priorizadas.
Segundo Rodrigo, Ivo tem vontade de criar uma escola no Primeiro de Maio, onde cresceu. Com os cursos, eles planejam, n�o apenas ensinar a parte t�cnica, mas tamb�m promover o desenvolvimento humano, com acompanhamento psicol�gico e orienta��o para ingressar no mercado de trabalho.
“Estou muito feliz, n�o posso reclamar”, diz Ivo, revelando seu entusiasmo com o que vem por a�. Dias de muito trabalho, certamente, mas tamb�m de muitas realiza��es. “Ningu�m faz nada sozinho. Estou ao lado de outras pessoas que v�o escrever comigo essa hist�ria. � muito gratificante.”
Agenda de eventos
N�o por acaso, o Instituto Ivo Faria tem uma sede com amplo sal�o, cozinha, bar e adega. Parece at� um restaurante, mas n�o �.
Ravi�li de frango caipira com quiabo (foto: Nereu Jr/Divulga��o)
Com paredes de vidro, que se abrem para um jardim, o espa�o foi projetado para receber eventos, desde anivers�rios e encontros empresariais at� cursos livres, workshops e outras experi�ncias gastron�micas, reunindo at� 50 pessoas.
A agenda de atividades (por enquanto, apenas durante a noite) come�ou no in�cio deste m�s. Ivo explica que esta � uma forma de arrecadar fundos para manter o espa�o e viabilizar projetos.
“Montei essa estrutura para n�o ter um ritmo pesado de restaurante, mas estou na cozinha o tempo todo, envolvido com todos os processos. N�o quero parar de trabalhar”, avisa o chef.
Os menus v�o acompanhar o trabalho do instituto com ingredientes locais. “Queremos valorizar pequenos produtores, os artes�os da gastronomia, exibindo nos pratos os produtos artesanais que Minas Gerais tem”, pontua o vice-presidente, Rodrigo Ferreira.
Com isso, eles esperam apresentar descobertas ao p�blico e incentivar o uso do que est� mais pr�ximo, respeitando a sazonalidade e a busca pelo frescor.
Na primeira semana, Ivo j� deu uma prova do que est� por vir. “Quis fazer um menu bem brasileiro e mineiro, mas usando a criatividade para aproveitar ao m�ximo os nossos produtos”, explica.
Torta de banana, coco e doce de leite com calda de laranja (foto: Nereu Jr/Divulga��o)
O ceviche se distancia do Peru e fica bem brasileiro com o palmito pupunha e o toque de maracuj�. J� o camar�o, servido aberto, ocupa o centro do prato com creme de baroa e tucupi.
Minas Gerais se faz presente em uma vers�o italiana de frango caipira com quiabo. O chef preparou um ravi�li recheado com a carne desfiada, envolvido por bastante molho com quiabo.
Outro prato com sotaque mineiro � a costela desfiada enrolada em folha de taioba com requeij�o moreno, feij�o-vermelho e tostado de inhame (pode ser comparado a um nhoque).
De sobremesa, uma torta batizada de Tenta��o das Gerais, com camadas de banana, coco e doce de leite. Por cima, calda de laranja.
Boa not�cia para os saudosistas: o famoso pastel de vento (massa sem recheio) do Vecchio Sogno faz parte do couvert e o chef avisa que servir� pratos para relembrar outros sucessos do longevo restaurante.
Ceviche de peixe branco com pupunha e maracuj�
Ingredientes
600g de til�pia; 400g de palmito pupunha; 5 unidades de lim�o; 70ml de vinho branco; 100g de cebola roxa cortada em tiras finas; 1 pimenta dedo-de-mo�a; 60ml de azeite; 2 unidades
de maracuj� azedo; coentro picado, sal e pimenta-do-reino a gosto
Modo de fazer
Corte o peixe em cubos m�dios. Corte o palmito em cubos pequenos. Adicione 3 lim�es ao peixe e deixe repousar por 10 minutos. Misture o palmito com o peixe. Acrescente a cebola. Bata rapidamente a polpa de maracuj� no mixer para liberar as sementes e acrescente ao peixe. Adicione o vinho e tempere aos poucos com sal, pimenta e coentro, equilibrando o sabor desejado. Sirva em por��es individuais.