
� a segunda vez em um ano que uma decis�o do colegiado altera pol�ticas sens�veis no pa�s —em junho do ano passado, a Suprema Corte mudou entendimento de quase 50 anos e passou a considerar que o acesso ao aborto n�o � um direito constitucional.
Embora cotas raciais sejam proibidas nos EUA, universidades podiam at� aqui, na maioria dos estados, criar m�todos para estimular o ingresso de estudantes negros e hisp�nicos, o que era alvo de questionamentos da justi�a. A decis�o desta quinta foi tomada a partir de duas a��es movidas contra as universidades Harvard e da Carolina do Norte.
As institui��es foram acusadas de discriminarem alunos brancos e de ascend�ncia asi�tica em favor de negros, hisp�nicos e ind�genas —o que as universidades negam.
Os casos foram impetrados pela SFFA (estudantes pela admiss�o justa, da sigla em ingl�s), que diz representar 20 mil estudantes e pais que discordam das a��es afirmativas. A entidade foi criada pelo estrategista conservador Edward Blum, que questiona esse tipo de medida desde os anos 1990.
"Muitas universidades conclu�ram erroneamente por muito tempo que o crit�rio de avalia��o da identidade de um indiv�duo n�o s�o os desafios superados, as habilidades constru�das ou as li��es aprendidas, mas a cor de sua pele. A hist�ria constitucional desta na��o n�o tolera essa escolha", escreveu o presidente da Suprema Corte, John Roberts.
Em voto de dissenso, a ju�za Ketanji Brown Jackson, a primeira mulher negra no tribunal, chamou a decis�o de "uma verdadeira trag�dia para todos".
A decis�o desta quinta deve mudar de maneira expressiva a composi��o das universidades americanas, mostram as experi�ncias at� aqui. Hoje, nove estados americanos j� impedem o uso de a��es afirmativas a partir de leis estaduais ou decis�es de tribunais locais. Michigan � um deles. Em 2006, um referendo aprovado por 58% da popula��o proibiu o uso de ra�a, g�nero e religi�o em processos seletivos de universidades e vagas de empregos. A mudan�a teve impacto imediato no perfil demogr�fico dos alunos universit�rios no estado. A propor��o de estudantes negros na Universidade de Michigan caiu de cerca de 8% na �poca para 2,5% hoje —o n�mero de alunos hisp�nicos, no entanto, permaneceu similar.
Em entrevista � Folha no come�o do m�s, Erica Sanders, vice-reitora assistente e diretora-executiva de admiss�o de graduandos da institui��o, contou que a universidade passou a adotar pol�ticas focadas em classe social para aumentar a diversidade, com "campanhas de recrutamento em locais com popula��es historicamente sub-representadas, focando alunos de baixa renda e cujos pais n�o t�m gradua��o, mesmo sabendo que isso n�o necessariamente se sobrep�e a crit�rios de ra�a."
Na Calif�rnia, o primeiro a proibir a��es afirmativas, em 1996, os censos demogr�ficos tamb�m apontam que as universidades embranqueceram ap�s a medida.
J� os argumentos contr�rios �s pol�ticas afirmativas incluem, al�m de suposta discrimina��o contra alunos brancos, a falta de perspectiva para o fim dessas a��es, utilizadas nos EUA desde os anos 1960.
A maioria dos americanos � favor�vel � manuten��o das a��es afirmativas, segundo pesquisa da Associated Press e da Universidade de Chicago divulgada no fim de maio. Ao todo, 63% da popula��o defende que a Suprema Corte n�o pro�ba o mecanismo nos sistemas de admiss�o.
Apesar disso, entre os pontos que devem ser considerados importantes para as universidades aceitarem novos alunos, os americanos citam como crit�rios mais relevantes do que a ra�a o hist�rico escolar, o desempenho no vestibular, a capacidade de pagar o curso e as habilidades esportivas.
No Brasil, lei de 2012 que reserva metade das vagas em institui��es federais para cotas (divididas entre crit�rios raciais e sociais) j� teve sua constitucionalidade confirmada pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos EUA, o sistema de admiss�o � diferente. Enquanto a ampla maioria das universidades brasileiras utilizam apenas o vestibular como crit�rio de admiss�o, as americanas podem usar, al�m de uma prova, crit�rios como hist�rico escolar do candidato e cartas de apresenta��o e recomenda��o. Assim, � comum que o processo seja menos objetivo, sobretudo porque muitas institui��es n�o divulgam seus m�todos.
O uso de a��es afirmativas remonta � luta pelos direitos civis, primeiro como uma maneira de impedir que pessoas de minorias raciais fossem exclu�das do mercado de trabalhos. Um decreto de John Kennedy em 1961 dizia que empresas com contratos com o governo federal deveriam adotar "a��es afirmativas para garantir que os candidatos sejam tratados igualmente sem distin��o de ra�a, cor, religi�o, sexo ou origem nacional".
Em 1978, no entanto, uma decis�o da Suprema Corte considerou ilegal a reserva de cotas para minorias raciais ao analisar um caso da Universidade da Calif�rnia em Davis, que havia reservado 16 de 100 vagas de medicinas para grupos minorit�rios. A mesma decis�o, por�m, considerou leg�timas a��es afirmativas que considerassem ra�a como um dos crit�rios para admitir alunos. Decis�es posteriores do tribunal confirmaram a legalidade da medida, ainda que com eventuais restri��es.
Trinta e cinco anos depois, em 2003, um novo caso em Michigan levou a discuss�o novamente � mais alta inst�ncia da Justi�a americana. O colegiado, � �poca, manteve o entendimento vigente.