Na Zona Sul de Belo Horizonte, os terrenos virgens s�o raros. A �nica forma encontrada para construir algum edif�cio � com a demoli��o de outro ou dos casar�es antigos. Os propriet�rios desses im�veis, no entanto, pedem pre�os milion�rios, o que inviabiliza os neg�cios. Agora, o movimento que ocorreu na Zona Sul da capital se repete em bairros fora do cintur�o da Avenida Contorno. Mas a disponibilidade dos moradores para deixar as casas onde moraram por toda a vida, no entanto, tamb�m tem sido pequena. N�o sai barato adquirir os cobi�ados casar�es de ruas at� ent�o tranquilas e tradicionais. � o que trata a �ltima reportagem da s�rie “Fora do eixo” publicada pelo Estado de Minas desde sexta-feira.
A escassez de terrenos em Belo Horizonte leva as imobili�rias e construtoras a voltar os olhos para os casar�es de bairro fora da Zona Sul da capital. Os im�veis, muitas vezes de moradores antigos, que criaram a fam�lia na regi�o, n�o est�o � venda. Mas come�am a ser cobi�ados, assim como ocorreu com os casar�es da Zona Sul, onde o cadeado hoje nos port�es e a campainha em local escondido mostram que os im�veis est�o fechados para intrusos, desconhecidos e principalmente quem pretende compr�-los, n�o importa o valor.
Bairros como Itapo�, Prado, Cidade Nova, Floresta, Santa Tereza e Santa Efig�nia s�o os novos alvos das empreiteiras, que buscam achar o “rato” (apelido dado aos terrenos dispon�veis para constru��o). “O setor est� � procura do rato, que pode estar em qualquer lugar. Na Zona Sul n�o existe mais terreno, at� os pequenos pr�dios est�o sendo substitu�dos”, afirma Teodomiro Diniz Camargos, presidente da C�mara da Ind�stria da Constru��o da Federa��o das Ind�strias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). Mesmo fora da Zona Sul, diz, a demoli��o tem sido a alternativa encontrada por muitas construtoras.
Se forem depender da boa vontade dos moradores dos casar�es, no entanto, os interessados nos terrenos v�o ter que abrir a m�o na hora de pagar. Por enquanto, o assunto de venda chega a ser motivo de desgosto para muitos propriet�rios. “Quase todos os anos as construtoras me procuram, mas nunca cheguei nem a discutir valores. Sempre falei n�o”, afirma o artista pl�stico M�ximo Soalheiro, dono de duas casas no Santa Tereza.
Em uma das casas, Soalheiro tem seu ateli�, em �rea de 1 mil metros quadrados na esquina das ruas Almandina com Cristal, �rea nobre do bairro. “Aqui est� perto de tudo e tem uma caracter�stica um pouco interiorana. Eu n�o uso dinheiro e nem cart�o de cr�dito para as compras no bairro. Anoto a conta na caderneta no a�ougue, supermercado, sacol�o e nas lojas de material de constru��o”, conta Soalheiro.
O ateli� do artista ocupa dois terrenos, que s�o bem aproveitados com a oficina de cer�mica, m�quinas tipogr�ficas, prepara��o da argila e confec��o de embalagens. “Tudo � feito l�, o que est� at� um pouco em desuso. Hoje tudo � terceirizado”, observa Soalheiro, que � um amante do bairro. “� bom estar em um lugar onde n�o tem muito pr�dio, h� uma humaniza��o.”
DESBRAVADOR O aposentado Mauro Secundino Moreira guarda at� hoje o jornal no qual ele tem seu nome impresso informando que foi o quarto comprador de lote no Vairro Cidade Nova, onde est� h� 44 anos. “Aqui era uma fazenda da fam�lia Silveira”, lembra. Na casa que construiu em terreno de 360 metros quadrados, ele criou as quatro filhas, com a esposa. Em novembro do ano passado, o aposentado recebeu uma proposta tentadora de uma imobili�ria: vender a casa por R$ 1 milh�o. Mas resistiu.
“A minha filha ia ganhar um filho e est�vamos na expectativa de que ela viria para c�, mas n�o veio”, conta Mauro. De qualquer forma, ele n�o mostra sinais de querer deixar a resid�ncia. “A casa foi uma conquista importante, gosto muito de morar aqui. S� sinto falta de teatro e cinema no bairro, mas aqui tem a Feira dos Produtores, supermercado, cl�nicas, igrejas, tem tudo”, diz.
Sem verticaliza��o
O aposentado Eust�quio Roberto de Paula prefere morar em lugar com casas mais baixas, em vez dos arranha-c�us. Ele e a fam�lia t�m duas casas vizinhas na rua Cura d’Ars, no Prado. Cada uma tem 300 metros quadrados. H� pouco tempo, no entanto, uma casa vizinha em frente � dele deu lugar a um edif�cio. “Eu preferia que ficasse com casas mais baixas, para manter o estilo. Mas n�o adianta, estamos com um pr�dio em frente”, diz.
Eust�quio de Paula conta que chegou a ser sondado pelos construtores do pr�dio para a venda do seu im�vel, mas a fam�lia n�o teve interesse. “N�o faz parte dos nossos objetivos sair daqui. Mas se o bairro verticalizar muito, pode ser que n�o seja mais interessante morar em casa”, conclui.
A aposentada Cec�lia Corr�a tentou n�o ceder ao ass�dio das construtoras, mas foi vencida pela vizinhan�a. Ela tinha uma casa no Bairro Itapo�, onde morou por 10 anos. “Uma construtora me ligou com oferta de comprar minha casa. No in�cio, recusei imediatamente”, diz.
A resist�ncia de Cec�lia, no entanto, durou pouco. Depois de alguns meses, come�ou a ser constru�do um edif�cio atr�s da casa dela. Em seguida, outro na contraesquina. “A� entrei de f�rias. Quando voltei, a casa ao lado tinha sido derrubada para dar espa�o a uma torre de 10 andares. Ou seja, eram tr�s pr�dios e a minha casa estava sofrendo muito com o bate-estaca das obras. Acabei vendendo”, afirma Cec�lia. Com o dinheiro, ela comprou um apartamento no Bairro Padre Eust�quio. “Morar em casa � melhor do que em apartamento. Mas os pr�dios muito altos no Itapo� tiraram a minha privacidade na varanda e no terreiro”, conta.
O diretor da �rea imobili�ria do Sindicato da Ind�stria da Constru��o Civil de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Br�ulio Franco Garcia, afirma que da mesma forma que ocorreu na Zona Sul, os terrenos est�o escassos nos bairros fora da avenida Contorno. “E nos bairros antigos h� casas mais antigas, que n�o compensam a reforma. � melhor vender”, diz.
Depois da Lei 9.959, de Uso e Ocupa��o do Solo, o potencial construtivo dos terrenos foi reduzido entre 20% e 30%. Antes da lei, as construtoras tinham �rea maior para construir e podiam at� pagar valor acima do pre�o de mercado pelo terreno. E os donos dos lotes compravam um im�vel melhor. Hoje, se o dono do terreno reduzir o pre�o cobrado, n�o consegue adquirir outro na mesma regi�o ou similar. Ou seja, a equa��o ficou mais dif�cil de fechar. (GC)