
Roberto Ferreira, de 51 anos, conhece como poucos as etapas de fabrica��o de bolas de futebol. Das mais simples �s mais complicadas: “Estou na linha de produ��o desde mar�o de 2011, quando esse galp�o foi montado”. O im�vel a que ele se refere foi constru�do no p�tio da penitenci�ria Nelson Hungria, em Contagem, na Grande Belo Horizonte, onde Roberto cumpre pena. L� funciona a f�brica das bolas Trivella, usadas pela Federa��o Mineira de Futebol (FMF) em competi��es amadoras. Roberto � um dos 79 detentos que trabalham na fabrica��o de bolas em quatro penitenci�rias do estado – as outras tr�s est�o em Guaxup� (Regi�o Sul), Ponte Nova (Zona da Mata) e S�o Joaquim de Bicas (Grande BH).
Ao todo, 13 mil detentos prestam servi�os a 450 empresas em 144 pres�dios mineiros. A m�o-de-obra no sistema prisional beneficia tanto os presos – que t�m direito a um dia a menos na pena a cada tr�s trabalhados, al�m da oportunidade de ressocializa��o – quanto o Estado, em raz�o de os detentos terem uma ocupa��o. Beneficiam-se tamb�m as empresas. Um dos motivos � a m�o de obra certa, em tempos de baixo �ndice de desemprego, mas n�o � o �nico.
As empresas t�m v�rios outros benef�cios ao contratar a m�o de obra prisional. Fazendo isso, os empreendedores precisam seguir a Lei de Execu��o Penal (LEP), e n�o a Consolida��o das Leis do Trabalho (CLT). Em outras palavras, as empresas est�o livres de pagar o d�cimo-terceiro sal�rio, Fundo de Garantia por Tempo de Servi�o (FGTS), horas extras, entre outros direitos assegurados aos empregados formais. “A empresa n�o paga aluguel e alguns impostos (uma vez que a linha de montagem est� em terreno do estado). Ela tamb�m se beneficia do fato de o ‘funcion�rio’ n�o chegar atrasado”, diz Murilo Andrade Oliveira, subsecret�rio de Administra��o Prisional em Minas.
Outra vantagem do acordo � a remunera��o: a LEP exige que as empresas paguem o m�nimo de tr�s quartos do sal�rio m�nimo ao empregado. Desse valor, 25% s�o destinados ao poder p�blico, para ressarcimento de gastos, 50% s�o entregues ao detento ou a sua fam�lia, por meio do cart�o Trabalhando a Cidadania, e o restante (25%) � destinado a pec�lio (entregue ao preso quando ele se desliga do sistema prisional). Roberto, o detento que trabalha na Nelson Hungria, entrega sua remunera��o � esposa e � filha. “Vou sair daqui no fim do ano, mas vou continuar no trabalho com as bolas”, conta orgulhoso.
As palavras de Roberto podem soar estranhas num primeiro momento, mas fazem sentido. Quem explica � Tarc�sio Rodrigues, um dos respons�veis pela Trivella: “Ele se destacou tanto (na linha de montagem) que o convidamos para ser o gerente. � um senhor disciplinado, honesto e boa pra�a. O queremos como gerente. Ele sabe todas as etapas da produ��o de bolas”.
Do gol � agulha
Atualmente, 35 detentos trabalham no galp�o da Trivella. V�rios outros j� passaram por l� ou costuraram bolas no interior das celas, como fez o ex-goleiro Bruno, que vestiu a camisa de Atl�tico e Flamengo e chegou a ser cotado para disputar a Copa de 2014, mas acabou preso, acusado de participa��o na morte da modelo Eliza Sam�dio. “O Bruno costurou bolas no interior da cela e disse que as redondas feitas aqui s�o de excelente qualidade. Ele tem moral para avaliar se uma bola � boa ou n�o, concorda?”, indagou um agente penitenci�rio.
O detento Elbert Batista Costa, de 29, � outro que preenche parte da pena no galp�o de bolas. “Estou h� quatro meses na f�brica. As bolas s�o de qualidade. Vou enviar uma para o meu filho, de 14 anos, em junho, quando est� prevista minha sa�da. Se n�o fosse a remiss�o, eu ficaria at� agosto. O dinheiro que vou retirar no fim da pena (pec�lio) ser� usado na constru��o de mais um c�modo na casa da minha tia, onde vou morar”, planeja o rapaz.
A expectativa do governo de Minas � aumentar o n�mero de detentos que se beneficiam da remiss�o. At� o fim do ano, acredita o subsecret�rio de Administra��o Prisional no estado, mais 1 mil presos estar�o prestando servi�os a empresas no sistema penitenci�rio. “Para as empresas, al�m do custo satisfat�rio h� o papel social”, disse. A pedido dos detentos, a reportagem manteve em sigilo os crimes pelos quais eles cumprem pena.
LEIA AMANH�
Invas�o chinesa prejudica a produ��o nacional