(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas

Mem�ria inflacion�ria assombra os brasileiros

�ndices que corrigem alugu�is, sal�rios e pre�os sustentam o drag�o e d�o f�lego para reajustes que alimentam indicadores. Economia indexada carrega risco de descontrole


postado em 02/06/2014 06:00 / atualizado em 02/06/2014 08:04

Pedro Paulo Pettersen, Vice-presidente do Corecon-MG e professor da PUC-Minas(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Pedro Paulo Pettersen, Vice-presidente do Corecon-MG e professor da PUC-Minas (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
IGP-M, IGP-DI, INPC, IPCA, INCC. Depois de quase 20 anos do Plano Real a economia brasileira ainda n�o conseguiu se libertar dos �ndices econ�micos que servem de par�metro para balizar sal�rios e reajustes de pre�os. E at� o sal�rio m�nimo entra no rol dos indexadores econ�micos. � mais f�cil perceber o fen�meno da indexa��o quando o custo de vida se torna persistentemente alto, acendendo, assim, a mem�ria inflacion�ria do pa�s. Apesar de ser uma esp�cie de heran�a ruim de uma �poca de descontrole de pre�os, ainda hoje a indexa��o serve como refer�ncia para reajustes que v�o do aluguel � mensalidade escolar.

A indexa��o � muito mal vista na economia porque alimenta o drag�o da infla��o. A alta de pre�os � usada como refer�ncia para calcular o percentual de reajustes de produtos e servi�os, que por sua vez s�o corrigidos porque houve alta no per�odo anterior, alimentando um ciclo econ�mico ruim, de que o pa�s torce para se ver livre. “A indexa��o � um componente de nossa infla��o que traz o reajuste passado para o futuro. Os pre�os s�o reajustados hoje porque eles subiram ontem. � uma infla��o que pode ser tamb�m de expectativa”, explica Virene Roxo Matesco, professora de MBA em economia da Funda��o Getulio Vargas/Faculdade IBS. Segundo ela, essa cultura da indexa��o � defensiva e forte no pa�s, que ao longo de muitos anos desenvolveu mecanismos para lidar com a press�o dos pre�os. “Esse tipo de infla��o � muito ruim. Ela acontece tamb�m quando um segmento passa a reajustar seus pre�os por preven��o, porque ele tem uma expectativa ruim de que os custos v�o subir.”

Os indicadores econ�micos s�o muitos no Brasil. O �ndice Geral de Pre�os do Mercado (IGP-M), por exemplo, � bem conhecido da popula��o porque � utilizado para fixar corre��o nos contratos de aluguel, o �ndice Geral de Pre�os de Disponibilidade Interna (IGP-DI) � refer�ncia para a d�vida p�blica, o �ndice Nacional de Pre�os ao Consumidor (INPC) � usado nas campanhas salariais. Para o vice-presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG) e professor da PUC Minas Pedro Paulo Pettersen, a rigor, a economia brasileira nunca deixou de ser indexada. “As d�vidas dos estados foram renegociadas com base no IGP-DI. O pr�prio sal�rio m�nimo que tem grande impacto na folha do INSS (maioria dos benefici�rios recebe o m�nimo) e nos sal�rios de categorias como o do trabalhador dom�stico, tamb�m � usado como refer�ncia.”

Segundo Pettersen, como o brasileiro conviveu muito tempo com a infla��o, a indexa��o se tornou uma ferramenta de prote��o contra a alta dos pre�os, mas que, contraditoriamente, fomenta a infla��o. O especialista acredita que, a curto prazo, h� possibilidade de alguma redu��o do �mpeto indexador no pa�s j� que o custo de vida d� sinais de perda de for�a. “Quando a infla��o � mais persistente, essa mem�ria � reativada, quando arrefece, o mecanismo tamb�m perde for�a.” Segundo Pettersen, um dos riscos da economia indexada � que, apesar de ser uma “defesa” contra a alta de pre�os, ela se torna resistente aos choques do Banco Central para redu��o do custo de vida. “Quando a infla��o � reduzida a economia responde rapidamente.”

Sal�rio indexado dissemina pr�tica

Virene Matesco aponta que, ao atrelar o sal�rio m�nimo a um indexador (�ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA) mais o crescimento do PIB), o governo disseminou a indexa��o. “Isso � uma mem�ria inflacion�ria que desejamos romper.” Segundo ela, o sal�rio m�nimo contamina grande parte da economia que, hoje, com maior ou menor intensidade, sofre reflexo de seus reajustes, at� mesmo nos pre�os livres, como mensalidade escolar, alimentos, roupas e lazer.

Empres�ria do setor da beleza e est�tica, Cida Santos, � propriet�ria do Instituto Beleza Fashion, em Belo Horizonte. Segundo ela, um dos grandes pesos que pressionam a alta dos servi�os � o reajuste do sal�rio m�nimo. “Percebemos que os produtos usados no sal�o s�o reajustados na mesma propor��o ou pouco mais que o sal�rio m�nimo. Por isso, esse � um indicador muito importante para nosso segmento”, avalia. Cida aponta ainda que o sal�rio m�nimo tamb�m influencia no pre�o da m�o de obra, outra press�o em seus custos, que se somam aos investimentos feitos em infraestrutura e qualifica��o.

Entre os diversos setores da economia pressionados pela indexa��o est� a mensalidade escolar. Emiro Barbini, presidente do Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG), informa que um dos principais custos da escola vem da folha de pagamento. “Os reajustes salariais sempre se baseiam no INPC, mais algum ganho real.” Segundo o professor, o sal�rio m�nimo tamb�m � uma press�o forte. “Compramos insumos, por exemplo, material de limpeza, onde os sal�rios das f�bricas s�o reajustados na propor��o do reajuste do sal�rio m�nimo, e, consequentemente, isso � repassado aos produtos.”

Perspectiva melhor para os pr�ximos anos

O economista e professor da Universidade de Bras�lia (UnB) Roberto Piscitelli acredita que a tend�ncia da economia brasileira � se tornar cada vez menos indexada. “� medida que h� uma desacelera��o da infla��o, essas press�es diminuem.” A pol�tica de valoriza��o do sal�rio m�nimo, que reduziu as desigualdades sociais, deve mostrar nova trajet�ria nos pr�ximos anos, segundo o economista.

Para Piscitelli, a partir de 2016, o reajuste do sal�rio m�nimo deve adotar uma f�rmula “menos amarrada”, assim como deve ocorrer redu��o gradual da meta inflacion�ria. Para o especialista, a toler�ncia em rela��o ao centro da meta deve ser reduzida de 2 para 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo a partir de 2016. “O pa�s n�o � o para�so que o governo diz, nem o inferno que a oposi��o pinta.”

Uma das refer�ncias para o reajuste de pre�os de produtos e servi�os, o sal�rio m�nimo � tamb�m indicador utilizado para estipular o valor das pens�es de alimentos. Nos �ltimos dez anos, o indicador acumulou alta de 182%, enquanto no mesmo per�odo o �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a infla��o oficial do pa�s, cresceu 87%. A alta do m�nimo que reduziu desigualdades em todo pa�s garantiu tamb�m �s crian�as reajustes acima da infla��o, j� que a maioria desses benef�cios � fixada tendo como base o menor valor pago a um trabalhador no pa�s. Quest�es financeiras, envolvendo valores mensais pagos aos filhos menores s�o l�deres nas varas de fam�lia de Belo Horizonte. No f�rum da capital, mais de 5,5 mil a��es relacionadas � mat�ria aguardam por julgamento.

Na �ltima d�cada, o sal�rio m�nimo vem inspirando mudan�as no formato das pens�es, que j� n�o s�o cem por cento fixadas com base no indexador. Pais assalariados, em vez de estabelecerem valores com base no indexador, podem ter descontado percentual estipulado pela Justi�a em seu contracheque. H�, tamb�m, na Justi�a, casos de pedidos de revis�o para substituir o indicador. O juiz titular da 5ª Vara de Fam�lia Cleyton Rosa de Resende explica que, pelo c�digo civil, as pens�es devem ser fixadas em valores que possam ser atualizados segundo um �ndice oficial regularmente estabelecido. “O sal�rio m�nimo � o indicador mais utilizado para fixar o valor de pens�es de pais que atuam na economia informal”, aponta. Segundo o magistrado, os pedidos de revis�o para substituir o sal�rio m�nimo t�m ocorrido, mas cerca de 60% das a��es de alimentos s�o consensuais. Resende informa ainda que, em m�dia, as pens�es ligadas ao m�nimo s�o fixadas entre 30% e 40% do valor do sal�rio e reajustadas automaticamente de acordo com a corre��o do indicador.

Mudan�as

Se no passado o sal�rio m�nimo j� foi praticamente uma regra geral para estabelecer o valor das pens�es, na �ltima d�cada o modelo foi alterado. “Geralmente os assalariados t�m um percentual descontado em folha, que pode atingir at� um ter�o do que recebe o devedor. O c�lculo � feito caso a caso, de acordo com o perfil de cada pai ou m�e, observando tamb�m o tamanho da necessidade do filho”, diz o juiz. Ele explica que pedidos de revis�o podem ocorrer quando surgem dificuldades que comprometem a renda do pagador.

O empres�rio M.G est� na Justi�a tentando revisar a pens�o que paga para o filho adolescente. A motiva��o � exatamente o reajuste do sal�rio m�nimo. Segundo ele, desde que a pens�o foi estabelecida, o sal�rio m�nimo valorizou praticamente o dobro da infla��o e trouxe um descompasso em sua renda. “Em primeiro lugar olho o bem estar do meu filho. No entanto, percebo que os custos com boa escola, alimenta��o, lazer n�o cresceram na mesma propor��o do sal�rio m�nimo.” O que M.G tenta agora � que o indicador utilizado para reajustar os valores seja substitu�do pelo IPCA.

O advogado especializado em direito de fam�lia e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Fam�lia (Ibdfam), Rodrigo da Cunha, explica que o sal�rio m�nimo � uma refer�ncia positiva para quem recebe, no caso as crian�as e adolescentes. Ele explica que existe decis�o do Supremo Tribunal Federal (STF) que permite a indexa��o das pens�es aliment�cias ao sal�rio m�nimo. “Esse � o indicador mais utilizado. Diria que 8 a cada 10 pens�es s�o ligadas ao sal�rio m�nimo”, observa.” Segundo Rodrigo, j� h� casos de pens�es que n�o utilizam percentuais do sal�rio e nem o m�nimo, mas o IGP-M.

Nos alimentos

O sal�rio m�nimo, quando usado como indexador, tamb�m � um indicador com forte repercuss�o no campo, onde os sal�rios de atividades tradicionais como vaqueiros, trabalhadores da agropecu�ria, caseiros, ainda s�o fortemente influenciados pelo percentual de reajuste do m�nimo, mesmo estando em patamares superiores ao menor rendimento permitido. Aline Veloso, coordenadora da assessoria t�cnica da Federa��o da Agricultura de Minas Gerais (Faemg), informa que os sal�rios no campo, em muitos casos, s�o definidos pela produtividade mas tamb�m s�o balizados pelo sal�rio m�nimo. “A valoriza��o trouxe muitos ganhos sociais, foi uma boa medida no sentido que reduziu as desigualdades sociais no campo. O outro lado, � que houve grande press�o nos custos do produtor de alimentos, que n�o consegue repassar os pre�os na mesma propor��o, j� que quem precifica seus produtos � o mercado. ”

Altera��o necess�ria

Quebrar o ciclo da indexa��o � um dos caminhos mais saud�veis que deve ser perseguido pela economia brasileira, segundo especialistas ouvidos pelo Estado de Minas. Pettersen aponta que o consumo cresce mais depressa que a produ��o, gerando infla��o. Para atender a demanda do consumo, � preciso destravar os investimentos no pa�s.

“Em segundo lugar, o pa�s precisa estabelecer regras que permitam que empresas possam calcular sua taxa de retorno crescendo o investimento na produ��o.” Um dos pontos positivos citados pelo especialista foi MP dos portos, medida provis�ria que quebrou o monop�lio e pretende ampliar investimentos e modernizar o setor. Para M�rcio Salvato, professor de economia do Ibmec, para quebrar o ciclo da indexa��o a curto prazo o caminho � reduzir os gastos p�blicos e desaquecer a demanda.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)