
Dois dias depois de afirmar que “Deus � brasileiro” e que n�o h� risco de faltar energia, ap�s apag�o que atingiu 11 estados e o Distrito Federal na segunda-feira, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, afirmou que, caso os reservat�rios brasileiros cheguem a 10% de sua capacidade, o pa�s ter� “problemas graves” e poder� tomar medidas dr�sticas. O chefe da pasta sinalizou que este seria o limite para que sejam tomadas medidas de racionamento, mas garantiu que o pa�s est� “longe disso”. Essa � a primeira vez que o governo federal admite a possibilidade de racionamento de energia. Nos reservat�rios que atendem o Sudeste e o Centro-Oeste, os principais do Brasil, os n�veis est�o hoje em 17,43%, bem pr�ximo ao piso estimado pelo Operador Nacional do Sistema El�trico (ONS) para o m�s, de 16,9%.
Como o ministro j� admite problemas, o aumento do consumo associado � crise h�drica acende a perspectiva de nova restri��o no consumo. A insufici�ncia de chuvas em pleno per�odo �mido deixa alguns dos principais reservat�rios do pa�s em n�vel inferior ao registrado em janeiro de 2001, meses antes de ser decretado o racionamento. Na �poca a represa de Furnas tinha 23,55% do volume �til. Ontem, o total armazenado era de 11,25%. O mesmo se repete em Nova Ponte, Emborca��o, Tr�s Marias e Itumbiara (veja quadro). Todas est�o com volume inferior ao daquele per�odo. Segundo o ONS, caso n�o chova, a �gua armazenada daria apenas para um m�s de consumo de energia no Brasil.
Questionado, reiteradas vezes, se esse seria o limite para racionaliza��o e racionamento, o ministro respondeu afirmativamente e sinalizou que, � medida que os reservat�rios se aproximarem de 10%, medidas prudenciais ser�o tomadas. Sobre a importa��o de energia da Argentina, que ocorreu por dois motivos consecutivos ap�s o apag�o de segunda-feira, Braga garantiu que “o Brasil tem, desde 2006, um sistema interligado com a Argentina. � normal usarmos a energia deles e eles a nossa. Isso sequer � tratado como compra de energia”. A importa��o, no entanto, n�o ocorre desde 2010, segundos os relat�rios do ONS.

Consumo retomado
A possibilidade de racionamento traz � mem�ria a crise no in�cio da d�cada passada. Na marra, o brasileiro foi obrigado a aprender a usar a energia com o racionamento de 2001 e 2002. No per�odo, quem n�o se adequasse a um novo padr�o de consumo sentiria no bolso. Fez efeito. Em casa, l�mpadas foram trocadas por outras que gastavam menos; freezeres foram aposentados e muitos aparelhos, desligados. Mas, com o crescimento da economia e mais dinheiro na conta, muitos esqueceram de poupar e, antigos temores, aprendidos durante o apag�o, foram reacesos. Segundo n�meros da Cemig, o consumo m�dio do mineiro j� ultrapassou o indicador de 2001 e caminha a passos largos para atingir o n�vel anterior ao per�odo pr�-crise.
Levantamento da companhia energ�tica feito a pedido do Estado de Minas mostra que em 2000 o consumo residencial m�dio era de 151,6 KWh por m�s. No ano seguinte, com o racionamento iniciado no segundo semestre, o consumo caiu 17,82%. Ano a ano, os n�meros foram mostrando certo al�vio no consumo at� atingir o menor patamar em 2007 – 110,6 KWh/m�s. A partir do ano seguinte, no entanto, inicia-se uma acelera��o do consumo em casas e apartamentos. De l� para c�, subiu 18,26% o uso residencial, tendo superado o patamar de 2001 em 2013. Uma altera��o no perfil do consumidor � que o chuveiro el�trico deixou de ser o principal vil�o. Com o aumento do poder aquisitivo, o ar-condicionado assumiu o posto.
Durante o apag�o, a gerente de opera��es Selma de Lima recorda-se de ter participado de um projeto com a Cemig para aprender h�bitos para reduzir o consumo. Simples a��es eram importantes para reduzir a conta de luz. Ela lembra que entre as medidas estava desligar o r�dio ao sair da cozinha. Pode parecer impens�vel hoje, mas raros eram os que preocupavam-se em evitar o desperd�cio. “Sabe aquela coisa de sair do quarto e n�o apagar a luz? Absorvi tudo e at� hoje continuo com eles no meu dia a dia”, afirma Selma.
Temor na ind�stria
Com a possibilidade de racionamento batendo � porta, importantes setores da economia tamb�m temem pela repeti��o de problemas e criticam a falta de clareza sobre a situa��o energ�tica e h�drica do pa�s. O presidente do Sindicato da Ind�stria de Fundi��o do Estado de Minas Gerais (Sifumg), Afonso Gonzaga, afirma que falta transpar�ncia do governo federal em rela��o � pol�tica energ�tica, o que impede o setor de tra�ar o planejamento do ano. Apesar do posicionamento de porta-vozes de que n�o haver� racionamento, Gonzaga diz que o apag�o de segunda-feira p�e em d�vida. “Estamos �vidos por informa��o. As coisas est�o acontecendo e n�o sabemos nada. N�o vai ter racionamento, mas falta energia?”, questiona. O representante diz que o setor encerrou 2014 com retra��o de 12% na produ��o e o impacto de um hipot�tico racionamento pode ser o agravamento da crise neste ano.
A desacelera��o da ind�stria � fator preponderante para o c�lculo de consumo energ�tico no pa�s. O �ltimo relat�rio do Operador Nacional do Sistema El�trico (ONS) afirma que “nos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e Sul, as varia��es previstas da carga para o m�s de janeiro refletem o baixo desempenho da ind�stria. Alguns setores industriais concederam f�rias coletivas desde o fim do ano passado para reequilibrar os estoques, que se encontram elevados”, diz trecho do documento referente � semana de 17 a 23 de janeiro. No per�odo, a proje��o de alta de consumo nas regi�es foi apenas de 1,1% e 0,9%, respectivamente.
No campo A ind�stria, no entanto, n�o � o �nico setor afetado por um poss�vel racionamento de energia. O presidente da Federa��o da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg), Roberto Sim�es, diz haver um grande n�mero de produtos perec�veis, como leite e carne. Todos necessitam de refrigera��o. Mas n�o � s�. Vacinas, medicamentos e insumos usados na produ��o agr�cola tamb�m precisam de energia el�trica para n�o serem perdidos. Sim�es adverte que � preciso avaliar os riscos em setores priorit�rios para evitar danos maiores. “Se n�o houver uma considera��o espec�fica de consumo, podemos ter preju�zos grandes”, adverte. E lembra que o problema n�o impacta somente na produ��o, mas tamb�m no com�rcio. (PRF)