
S�o Paulo — Da safra de ex-presidentes da Rep�blica eleitos diretamente desde o processo de redemocratiza��o do pa�s, Fernando Henrique Cardoso � o �nico que tem o que comemorar neste 1º de julho.
H� 25 anos, ele estava em agenda de campanha em Minas Gerais, tr�s meses depois de deixar o Minist�rio da Fazenda, onde liderou o plano que resultou na mais longeva moeda brasileira e alavancou sua candidatura.
Nesta entrevista ao Estado de Minas, na sede funda��o que dirige, ele recorda com carinho o apoio do presidente Itamar Franco � �poca e tra�a um paralelo entre aqueles primeiros passos do real e os dias atuais.
Aproveita para fazer um alerta: “A popula��o tem que perceber que esse governo vai nos levar para algum futuro. O presidente Itamar opinava muito no come�o. A bolsa oscilava. Depois, perceberam que ele n�o usaria a vontade dele para atrapalhar um processo econ�mico. Aqui, n�o temos muita certeza ainda. A gente v�, de vez em quando, uns impulsos presidenciais que assustam. D� a impress�o de que o ministro da Economia (Paulo Guedes) n�o tem tanto poder quanto � necess�rio para levar adiante o pa�s”, diz.
FHC tamb�m faz um alerta sobre os riscos para a democracia e afirma que Bolsonaro precisa entender que o Congresso tem poder — e muito.
H� 25 anos, ele estava em agenda de campanha em Minas Gerais, tr�s meses depois de deixar o Minist�rio da Fazenda, onde liderou o plano que resultou na mais longeva moeda brasileira e alavancou sua candidatura.
Nesta entrevista ao Estado de Minas, na sede funda��o que dirige, ele recorda com carinho o apoio do presidente Itamar Franco � �poca e tra�a um paralelo entre aqueles primeiros passos do real e os dias atuais.
Aproveita para fazer um alerta: “A popula��o tem que perceber que esse governo vai nos levar para algum futuro. O presidente Itamar opinava muito no come�o. A bolsa oscilava. Depois, perceberam que ele n�o usaria a vontade dele para atrapalhar um processo econ�mico. Aqui, n�o temos muita certeza ainda. A gente v�, de vez em quando, uns impulsos presidenciais que assustam. D� a impress�o de que o ministro da Economia (Paulo Guedes) n�o tem tanto poder quanto � necess�rio para levar adiante o pa�s”, diz.
FHC tamb�m faz um alerta sobre os riscos para a democracia e afirma que Bolsonaro precisa entender que o Congresso tem poder — e muito.
BODAS DE PRATA DO REAL
Primeiro, n�s nunca imagin�vamos, no come�o, que seria poss�vel estabilizar a economia do jeito que foi. S�o 25 anos com a mesma moeda. Est�vamos acostumados com um vaiv�m de muda moeda, muda taxa de c�mbio, muda tudo. E de surpresa. Ningu�m imaginava que fosse poss�vel uma certa tranquilidade. O Real deu uma certa tranquilidade ao pa�s. O sal�rio, no fim do m�s, voc� recebia menos do que imaginava. Como � que se calculava or�amento? Era palpite. Qual seria a taxa de infla��o do ano que vem? Sei l�. O Congresso mudava, aumentava a receita e aumentava os gastos tamb�m. Era uma grande confus�o. Isso foi muito importante para dar uma certa normalidade ao Brasil. Voc� pode prever o pre�o real das coisas. Voc� pode prever o que vai acontecer com mais precis�o, o dinheiro de que pode dispor e tal. Isso veio do real.
''D� a impress�o de que o ministro da Economia (Paulo Guedes) n�o tem tanto poder quanto � necess�rio''
UM PA�S QUE N�O CRESCE
Crescimento � investimento. E investimento depende de confian�a. Os fatores de cren�a e confian�a tiveram mais for�a na vida econ�mica contempor�nea. Expectativas. N�o havendo investimento, n�o h� crescimento. N�o havendo crescimento, h� desemprego, h� mal-estar. N�o adianta apenas ter a economia est�vel. Voc� tem que ter a economia crescendo. A estabilidade � condi��o. Por exemplo, fui ministro da Fazenda na �poca de infla��o alta. Fui ao Chile, pa�s no qual vivi por muitos anos, e ningu�m acreditava que o Brasil estava crescendo. E estava. A infla��o n�o permitia que as pessoas percebessem a taxa real do crescimento. Voc� pode ter crescimento com infla��o. O bom � voc� ter crescimento sem infla��o. Agora, n�o temos infla��o, mas tamb�m n�o temos crescimento. Precisa ter estabilidade, ou seja, confian�a, rumo para o pa�s outra vez, para haver crescimento. A infla��o deveria voltar para ter crescimento? N�o, essa receita n�o. Mas h� quem diga. Aumenta o consumo, que, a�, aumenta investimento. N�o acontece.
PAULO GUEDES VOLUNTARIOSO
Vejo o ministro Paulo Guedes de vez em quando na tev�. Ele cr�, � uma coisa importante. N�o vou discutir se est� certo ou est� errado, mas ele acredita naquilo. S� que n�o tem jeito para lidar com o Congresso. A diferen�a que havia naquela �poca em que eu fui ministro da Fazenda � que eu era senador. Ent�o, eu me reunia com as bancadas todas, discutia com elas. Eu sabia o jeit�o, e o Itamar tamb�m. Agora, eu acho que � mais voluntarioso do que propriamente de conquistar o apoio. Essa � uma diferen�a importante. Em segundo, fomos pouco a pouco estabelecendo regras fiscais que funcionaram. Aqui, ainda estamos para ver se v�o funcionar ou n�o. Primeiro teste importante � a Previd�ncia. Se passar de uma maneira aceit�vel, j� d� um certo respiro. Agora, repito: O Brasil n�o vai acabar. Tem que ter a confian�a da popula��o. A popula��o tem que perceber que esse governo vai nos levar para algum futuro. O presidente Itamar opinava muito no come�o. A bolsa oscilava. Depois, perceberam que n�o era para oscilar em fun��o das opini�es dele, porque ele n�o usaria a vontade dele para atrapalhar um processo econ�mico. Aqui, n�s n�o temos muita certeza ainda. A gente v�, de vez em quando, uns impulsos presidenciais que assustam. Demite, prende. Prender n�o, mas demitir, mudar. D� a impress�o de que o ministro da Economia n�o tem tanto poder quanto � necess�rio para levar adiante o pa�s.
CONSELHO AO PRESIDENTE BOLSONARO
Eu n�o dou conselho nenhum. O presidente tem que entender quais s�o os constrangimentos do cargo. � dif�cil ser presidente. O pessoal quer muito ser presidente, mas n�o � bom, n�o. � uma dureza. O presidente atual, qualquer presidente, tem que entender, primeiro, que o Congresso tem for�a. Os partidos s�o fracos. O Congresso, n�o. � dif�cil, porque os partidos n�o t�m tanta for�a assim, mas o Congresso como institui��o, tem. Voc� tem, portanto, que respeitar o Congresso. Tem que entender que as institui��es do Estado brasileiro s�o antigas e funcionam. O Itamaraty, as For�as Armadas, o Judici�rio. Voc� tem que entender que eles t�m a l�gica deles. E tem que respeitar, compreend�-los. E n�o expuls�-los. E o principal: o povo conta.
ITAMARATY N�O IDEOL�GICO
Eu sei, mas acho que est� errado. Tomar partido � voc� se arriscar a perder a guerra. Para qu�, se a guerra n�o � nossa? O Itamaraty nunca teve uma tradi��o ideol�gica, sempre teve uma tradi��o negociadora, n�o-ideol�gica. Tenho medo dessas vis�es muito assim, eles contra n�s, crist�os contra os n�o-crist�os, porque esse � um mundo fantasmag�rico. O Itamaraty tem outra tradi��o, n�o s� de entendimento entre os pa�ses, entre os Estados, mas tamb�m de defesa, como � natural, dos interesses brasileiros. S�o, no caso, basicamente comerciais, n�o s�o b�licos. E tem que manter a defesa desses interesses. Eu tenho alguma preocupa��o. N�o � a correta essa pauta mais ideol�gica. � claro que, em algumas circunst�ncias, voc�… N�s tivemos contra o eixo, contra o nazismo. Mas n�o � o que est� se apresentando no mundo de hoje. N�o � uma guerra t�o acirrada, um lado � civiliza��o o outro � anti-civiliza��o. N�o �. S�o dois modelos de organizar politicamente os pa�ses. E que se baseiam em sociedades tamb�m diferentes. V�o ser sempre diferentes, porque, apesar da globaliza��o, que � um fato, voc� tem a exist�ncia da cultura dos pa�ses, que � vari�vel. Mesmo que seja globaliza��o, capitalismo, comunismo, v�o existir diferen�as. E temos que entender esse processo da diversidade do mundo. E o Brasil n�o tem por que imaginar que o mundo � cara ou coroa. N�o �.
REFORMAS
� s� ver os dados para saber que � necess�ria. E essas reformas no Brasil n�o se fazem de supet�o, elas v�o acontecendo. Quando perdemos por um voto a idade m�nima (esse voto foi do ent�o deputado Antonio Kandir, do PSDB), o que fizemos? O fator previdenci�rio foi a Solange Vieira quem inventou. J� derrubaram duas vezes, e o presidente vetou, inclusive o Lula teve que vetar, porque precisa um freio. J� que n�o tem a idade m�nima, faz-se uma composi��o entre tempo de contribui��o e tempo de trabalho, que � o fator previdenci�rio. Tem que fazer. Tem que olhar mais pelo lado da igualdade do que do fiscal. O fiscal � importante, mas, para o povo, o importante � ver que estamos nos aproximando uns dos outros. A dire��o da reforma � correta. � preciso avan�ar com essa pauta. E nisso n�o se pode pensar em governo e oposi��o. � o interesse nacional. Minha experi�ncia de reforma � que, quando voc� quer mudar tudo, n�o se faz nada. � melhor voc� ver qual a reforma que ter� consequ�ncias ao longo do tempo.
CAPITALIZA��O
� um problema. No meu tempo, j� se falava disso. Tinha o Chile. Mandei calcular. Naquela �poca, custaria um PIB para poder pagar o processo de transforma��o. N�o sei como est� sendo proposto agora. O relator tirou da pauta porque h� uma rea��o grande a isso. O problema � como voc� faz com quem n�o capitalizou at� agora. Vai come�ar do zero? N�o pode. Ent�o, ou voc� tem dinheiro para financiar ou... No Chile, eles tiveram numa certa altura e, mesmo l�, houve muito problema com a capitaliza��o. Ent�o, acho que tem que ir com jeito, tem que estudar melhor.
GERA��O DE EMPREGOS
Primeiro, a economia precisa de credibilidade para haver investimentos p�blicos e privados. E mais privado que p�blico, no nosso caso. Temos um campo enorme, que � a infraestrutura, que tem que ser refeita. Tem capital sobrando no mundo. Agora, para atrair, n�s temos que acreditar em n�s pr�prios, no nosso rumo. H� uma mudan�a, que � estrutural, na organiza��o da produ��o no mundo contempor�neo. Mesmo que a pessoa n�o tenha consci�ncia, d� uma certa d�vida sobre o que vai acontecer com ela no futuro. Na Fran�a, uma parte das pessoas que est�o revoltadas t�m medo. Medo do futuro. Aqui, como n�o chegamos a esse ponto de avan�o, n�o sei se as pessoas t�m tanto medo do futuro. T�m medo do presente, porque a taxa de desemprego cresceu muito. No meu tempo, quando chegou a 7% foi uma gritaria infernal. Agora, est� o dobro.