Sa�de mental dos empregados na quarentena preocupa as empresas
Com o home office e a pandemia afetando a vida dos funcion�rios, empresas monitoram situa��o e criam canais para atendimento psicol�gico a colaboradores
postado em 09/05/2020 04:00 / atualizado em 09/05/2020 18:04
Trabalho sem conv�vio social: companhias se estruturam para enfrentar eventuais dist�rbios psicol�gicos causados pelo isolamento (foto: Ina Fasbiner/AFP)
Com milhares de brasileiros trabalhando de suas casas como medida para conten��o da pandemia do novo coronav�rus, as empresas passaram a ter uma preocupa��o maior com a sa�de mental dos colaboradores e adotaram medidas para evitar que os transtornos ocorridos na China, onde parte da popula��o desenvolveu dist�rbios ps�quicos com a quarentena e isolamento social adotados no pa�s, ocorram tamb�m no Brasil. “A preocupa��o com a sa�de mental atinge dois grupos, tanto os profissionais que est�o em isolamento, quanto os que est�o nas opera��es que n�o podem parar e o importante � construir canais para dar vaz�o ao estresse dessa situa��o”, afirma a psic�loga Isabel Pimenta Castro Spinola, professora nos cursos de psicologia do Centro Universit�rio Una e Uni-BH.
O estresse do confinamento vem preocupando autoridades em todo o mundo, onde bilh�es de pessoas est�o em isolamento social. Em Minas, grandes empresas adotaram programas e medidas para mitigar o impacto da nova realidade imposta pela pandemia de COVID-19. E n�o apenas elas. Tamb�m institui��es agem para evitar danos com o aumento da ansiedade e da depress�o que as mudan�as naturalmente provocam. Na Una e Uni-BH foi montado desde mar�o um grupo de alunos de psicologia do 9º e 10º per�odos do curso sob supervis�o dos professores para dar apoio aos 120 mil alunos e professores e colaboradores dos centros universit�rios. “Se a pessoa tem irritabilidade e depress�o em excesso ela deve procurar ajuda de um plant�o psicol�gico, que vai fazer o acolhimento para o esvaziamento dessa ang�stia”, orienta Isabel Spinola.
Ela lembra que o trabalho em home office � uma mudan�a de h�bito que gera ansiedade e muitas vezes com aumento da carga de trabalho em fun��o do on-line e que o profissional tem de ter estrutura emocional para atuar nessa situa��o. “Se n�o tiver uma aten��o especial para a sa�de mental, o que era dif�cil pode ficar imposs�vel”, alerta Isabel. A psic�loga acredita que com essa situa��o (isolamento social) as pessoas do setor de gest�o de recursos humanos das empresas est�o tendo que se reinventar e uma s�rie delas oferece agora atendimento psicol�gico de um profissional on-line.
Rute Melo Ara�jo, diretora de Gente e Servi�os da VLI: "Em 12 de mar�o, a empresa come�ou a se mobilizar e fez a ado��o de medidas como cancelamento de viagens. No dia 16, intensificou o home office, e no dia 18 j� come�ou o trabalho com a preocupa��o com a sa�de mental" (foto: Gustavo Andrade/Divulga��o)
Teleatendimento A sider�rgica Gerdau ampliou seu programa +Cuidado desde mar�o para que a rede credenciada de psic�logos realize sess�es via teleatendimento. O programa da empresa prev� atendimento de sa�de, social, financeiro e jur�dico para os funcion�rios e dependentes da empresa. “Durante a pandemia da COVID-19 o programa tem realizado seu atendimento assistencial e psicol�gico por um telefone 0800, com teleatendimentos seguindo as orienta��es do Conselho Nacional de Psicologia”, afirma a gerente de Desenvolvimento Humano e coordenadora do Cuidado da Gerdau, Adriana Mansueto.
Segundo Adriana, l�deres e gestores de pessoas na empresa est�o treinados para identificar pessoas que est�o com dificuldades em lidar com esse momento de crise, “que traz inseguran�a, ansiedade e estresse para todos”. De acordo com ela, “quando identificado (o quadro de dificuldade), esse colaborador � contatado por um especialista que oferece o atendimento e o acolhimento, ficando a cargo dele aceitar a ajuda.” Ela revela que a empresa tamb�m vem promovendo webinars (semin�rios on-line) que o funcion�rio pode acessar quando quiser ou precisar. “No primeiro curso abordamos a quest�o do home office e a sa�de mental. Afinal, as pessoas t�m que trabalhar em casa com a presen�a de familiares, com crian�as pequenas e sem apoio externo, lidando com os cuidados da casa e da alimenta��o. E ningu�m estava preparado para trabalhar em casa, nesse formato”, afirma a gerente da Gerdau.
Acompanhamento mais detalhado
“Desde 2012 a empresa acompanha a sa�de mental e dependendo da intensidade do problema h� a possibi- lidade de concess�o de folga ou licen�a. Isso � acompanhado por todos os ge- rentes e pela diretoria que tem que ter contato com todos os diretores para ver como cada um est� se sentindo e isso tem um efeito positivo e est� se reconhecendo isso”, afirmou o presidente da Aperam South America, Fre- derico Ayres, em entrevista recente. Ele ressaltou que al�m da prote��o para o trabalhador em home office, a empresa foca na atividade essencial exercida com um n�mero menor de contatos e nos efeitos que isso pode causar. “Tamb�m nesse caso temos preocupa��o com a sa�de mental”, refor�a Ayres.
Uma das medidas adotadas pela Aperam no combate ao novo coro- nav�rus foi exatamente determinar o “acompanhamento mais pr�ximo das lideran�as e equipe m�dica/psicol�gica junto aos empregados para avalia��o constante da sa�de emocional e mental dos mesmos, de forma que possam oferecer todo aux�lio necess�rio para enfrentarem este momento”. Na VLI Log�stica tamb�m o cuidado com a sa�de mental dos 7.500 trabalhadores inclui n�o apenas os mais de 1.200 que est�o em home office, mas tamb�m os que est�o nas ferrovias, portos e terminais de carga.
Seguran�a “No dia 12 de mar�o, a empresa come�ou a se mobilizar e fez a ado��o de medidas como cancelamento de viagens. No dia 16, intensificou o home office, e no dia 18 j� come�ou o trabalho com a preocupa��o com a sa�de mental”, afirma a diretora de Gente e Servi�os da VLI, Rute Melo Ara�jo. De acordo com ela, a preocupa��o com o equil�brio emocional dos funcion�rios passou pelo treinamento com os l�deres de equipes e pela instala��o de canais e mecanismos que os trabalhadores podem acessar em busca de ajuda.
Para os funcion�rios da �rea operacional h� uma participa��o intensiva dos gestores, que, ao come�o de cada turno conversam com suas equipes para saber como eles est�o se sentindo. “Isso � feito por todos os l�deres e aumenta o sentimento de prote��o com o empregado porque quanto menos medo a pessoa tivera � mais f�cil de sair mais forte dessa situa��o”, afirma Rute Ara�jo.
Ainda de acordo com ela h� ainda bate-papos em canais internos (WhatsApp, lives e a universidade corporativa). “O importante � as pessoas terem um canal de apoio para conversar, porque isso faz muito bem”, afirma a gerente da VLI. Rute lembra ainda que a dire��o da empresa garantiu que n�o haver� cortes e que foi feito um cr�dito extra de 30% de vale-alimenta��o no m�s e pagamento do vale-transporte em dinheiro e n�o no cart�o, o que, segundo ela, d� uma maior seguran�a para os empregados e as fam�lias nesse momento de crise. “Hoje, o sustent�vel � cuidar de cada pessoa”, sintetiza Rute Ara�jo. (MM)
Problema em escala mundial
As consequ�ncias ps�quicas do confinamento, que afeta quase 4,5 bilh�es de pessoas no planeta, preocupam profissionais da sa�de mental, que pedem mais aten��o ao problema. “A prorroga��o do confinamento era esperada, mas a not�cia ser� uma decep��o esmagadora para muitas pessoas”, afirmou Linda Bauld, professora de sa�de p�blica da Universidade de Edimburgo, logo ap�s o an�ncio, em meados de abril, da extens�o por mais tr�s semanas do lockdown na Gr�-Bretanha. “As consequ�ncias mais amplas do confinamento est�o se acumulando rapidamente. Pesquisas recentes mostram aumentos preocupantes de ansiedade e depress�o” na popula��o em geral, completou.
A constata��o se repete em todos os pa�ses submetidos a essa medida dr�stica, que as sociedades modernas haviam esquecido. Na Fran�a, um cons�rcio de unidades de pesquisa, que inclui a Escola de Estudos Superiores em Sa�de P�blica, iniciou o “Coconel” (Coronav�rus e confinamento), um “estudo longitudinal” com mil pessoas. Trata-se de uma pesquisa que observa durante muitos anos o mesmo grupo de pessoas.
Ao final da segunda fase, iniciada em 8 de abril, antes do an�ncio da prorroga��o de outro m�s de confinamento, em vigor desde 17 de mar�o na Fran�a, “37% dos investigados apresentavam ind�cios de ang�stia psicol�gica”, sem uma varia��o not�vel na compara��o com a primeira fase, publicada em mar�o.
“A compara��o com os �ltimos dados coletados entre a popula��o geral em 2017 sugere uma deteriora��o da sa�de mental durante o confinamento. Se a situa��o se prolongar ainda por v�rias semanas, isso pode provocar o surgimento de patologias psiqui�tricas severas e um aumento da necessidade de receber atendimento m�dico quando o confinamento for conclu�do, situa��o para a qual � necess�rio estar preparado”, alertam os coordenadores da pesquisa.
A mesma preocupa��o existe nos Estados Unidos, onde “mais de um ter�o dos americanos (36%) afirmam que o coronav�rus afeta seriamente sua sa�de mental”, destaca a Associa��o Psiqui�trica Americana (APA) em carta enviada em 13 de abril ao Congresso. No texto, a APA alerta para o risco de que existam “ainda mais americanos com necessidade de tratamento psiqui�trico” e pede mais investimentos para as necessidades imediatas “e para o per�odo de recupera��o”, sobretudo para teleconsultas e acesso ao atendimento m�dico.
Na Gr�-Bretanha, 24 profissionais tamb�m fizeram um pedido de a��o na revista Lancet Psychiatry, divulgado em 16 de abril, data do an�ncio da prorroga��o do confinamento no pa�s. Eles reivindicam, sobretudo, refor�o da vi- gil�ncia sobre o impacto psicol�gico gerado pela pandemia, que � maior, segundo as pesquisas, que o pr�prio medo de ser infectado pelo v�rus.
“Isolamento social crescente, solid�o, preocupa��o com a sa�de, estresse e colapso econ�mico: as condi��es est�o reunidas para abalar o bem-estar e a sa�de mental”, resumiu um dos signat�rios, Rory O'Connor, da Universidade de Glasgow, em confer�ncia por telefone. “O problema � muito importante para ser ignorado, tanto em termos humanos como de impacto social mais amplo”, destacou.
“O fim da estigmatiza��o � fundamental”, afirma Anne Giersch, diretora da unidade de Neuropsicologia na Universidade de Estrasburgo. “Por exemplo, h� um v�nculo entre o isolamento e as alucina��es. Quando se apresentam certos sintomas, parece normal fazer uma consulta por um infarto, por que n�o na psiquiatria?” (AFP)