
“Realmente, a pol�tica do governo nos dois �mbitos, no sanit�rio e no econ�mico, que est�o muito inter-relacionados, � catastr�fica”, diz. Para ela, o quadro atual do pa�s � ainda mais grave do que o abordado em seu best seller Valsa brasileira, de 2018, que trata da evolu��o do boom econ�mico ao caos entre 2006 e 2017. “Temos aprendido que sempre d� para piorar. O fato � que, hoje, o pa�s est� rumando para duas d�cadas perdidas na economia em termos de renda m�dia e de renda per capita. O que, por si, j� seria um problema. Mas acho que o que cria mais dificuldades para o futuro � a deteriora��o das nossas institui��es democr�ticas”, explica.
Para ela, ao aumentar a taxa b�sica de juros (Selic) em um momento cr�tico da pandemia da covid-19, o Banco Central ajudar� a jogar a atividade econ�mica para baixo. Contudo, nada ser� pior para a produ��o e o consumo do que a falta de um programa eficiente de vacina��o em massa da popula��o. Sem isso, certamente, o ano de 2021 ser� mais um perdido, do ponto de vista econ�mico, aumentando a pobreza, que j� se encontra em n�veis assustadores.
A especialista em estudos associados � desigualdade macroecon�mica acredita que, diante do agravamento da pandemia, o governo deveria ter dado continuidade ao pagamento do aux�lio emergencial desde janeiro — o benef�cio m�dio de R$ 250 come�ar� a ser pago em abril —, em valores maiores e a um grupo maior de pessoas — desta vez, ser�o beneficiados 45,6 milh�es de cidad�os.
“Parece-me que os R$ 300 que estavam sendo pagos no fim do ano passado deveriam ser o m�nimo nesse novo desenho, porque, ali, j� est�vamos vendo os indicadores de pobreza se deteriorarem. E a situa��o da pandemia �, hoje, muito pior”, lamenta. Ela ressalta que o limite de gastos de R$ 44 bilh�es com aux�lio em quatro meses — as parcelas v�o de abril a julho — representa 15% do valor destinado ao benef�cio em 2020. “O problema � que a pandemia est� em uma situa��o ainda pior”, alerta.
A economista ressalta, ainda, que a polariza��o entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula, que voltou ao cen�rio pol�tico, tem um lado positivo, ao trazer um contraponto ao negacionismo. “A polariza��o que est� colocada � entre um governo que nega a ci�ncia, n�o est� governando em prol da melhoria das condi��es de vida e de sa�de da sua popula��o. E, do outro lado, o contr�rio disso”, resume. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Correio Braziliense:
O Banco Central aumentou os juros em um momento em que o pa�s caminha para uma nova recess�o para conter a infla��o. A alta da Selic, de 2% para 2,75%, � justific�vel neste momento?
A infla��o que vem se acelerando, sobretudo, em itens que s�o consumidos pelos mais pobres, e, portanto, afetam muito a renda da base da pir�mide, tem duas causas principais. A primeira, do ano passado, era a infla��o de alimentos, mas j� est� se dissipando. E a segunda � o pr�prio d�lar, que tem efeitos em v�rios outros pre�os da economia, incluindo os dos combust�veis. A subida de juros pode ter um efeito de amenizar a alta do d�lar. Com a maior taxa de juros, voc� freia os movimentos de sa�da de capitais do pa�s. S� que esses movimentos s�o provocados por outros fatores, como pol�ticos, descontrole da pandemia, falta de uma agenda nesse sentido, falta de vacina��o. Eu compreendo a decis�o do Banco Central, mas eu, tampouco, considero que s� com uma taxa de juros mais alta vamos conseguir resolver essa instabilidade e essa volatilidade da moeda. O problema � que o dano causado com a taxa de juros mais alta na economia, que continua em crise, tamb�m n�o � irris�rio. Com isso, temos dois elementos que v�o, em 2021, puxar a economia para baixo: a pol�tica monet�ria, com os juros mais altos, e a pol�tica fiscal, que ser� mais contracionista do que a de 2020. Isso tudo prejudicar�, bastante, a recupera��o da economia em 2021, somado ao descontrole da pandemia.
O que afeta mais a economia: a alta dos juros ou a falta de vacinas contra a COVID?
A lentid�o da vacina��o vai ser o principal fator a limitar as nossas perspectivas de recupera��o da economia em 2021. Com isso, na verdade, o que eu colocaria como segundo entrave para a nossa retomada mais r�pida � a insufici�ncia do aux�lio emergencial, seguida da resposta fiscal diante do novo cen�rio de emerg�ncia, ainda pior do que o do ano passado, em que n�s estamos. N�o acho que a taxa de juros mais alta ser� mais relevante do que esses dois fatores na limita��o da nossa recupera��o. At� porque, no Brasil, os investimentos privados costumam ser pouco sens�veis a juros, com exce��o do ramo imobili�rio, onde pode haver um efeito um pouco maior.
Esses valores do aux�lio emergencial que foram definidos pelo governo, variando entre R$ 150 e R$ 375, com m�dia de R$ 250, s�o suficientes? O governo teria espa�o para dar um aux�lio maior?
Eles s�o muito insuficientes. O limite para gastos, de R$ 44 bilh�es, que foi aprovado para o ano na PEC Emergencial, � cerca de 15% do valor destinado ao aux�lio em 2020. E a pandemia, na verdade, est� em uma situa��o ainda pior. As medidas restritivas � circula��o de pessoas tomadas por governadores e prefeitos, certamente, ter�o um novo impacto econ�mico. E o aux�lio n�o ser�, neste ano, ao contr�rio do que ocorreu em 2020, uma sa�da para esse dilema, compatibilizando a preserva��o das vidas e, ao mesmo tempo, a preserva��o da renda das pessoas. Esses valores n�o s�o suficientes para isso. Devemos observar um aumento da desigualdade e um aumento da pobreza e uma press�o pol�tica ainda maior contr�ria �s medidas restritivas de lockdown, que s�o necess�rias para o controle da dissemina��o do v�rus, por essa falta de possibilidade de sobreviv�ncia para tantos trabalhadores informais e fam�lias da base da pir�mide.
A que a senhora atribui a limita��o do aux�lio emergencial? H� espa�o fiscal para uma pol�tica de renda maior?
Esse conceito do espa�o fiscal n�o � um conceito absoluto. Como vimos, em 2020, e se a gente pensar no debate econ�mico anterior, parecia que o Brasil j� n�o tinha espa�o fiscal para nada, e, ainda assim, fizemos um aux�lio emergencial, em 2020, de 4,1% do PIB, al�m das outras medidas. Isso foi financiado por d�vida p�blica. E, da mesma forma, esses R$ 44 bilh�es ser�o financiados por d�vida p�blica. A PEC Emergencial n�o cria espa�o imediato no Or�amento do ano para que o aux�lio seja pago. E n�o h� um limite preestabelecido para qual � o tamanho da d�vida p�blica que um pa�s pode ou n�o ter. Como vimos no ano passado, a d�vida subiu em mais de 10 pontos percentuais do PIB e foi poss�vel vender t�tulos p�blicos no mercado. N�o houve dificuldade de pagamento, n�o houve dificuldade de encontrar investidores para adquirir essa d�vida. O fato � que n�s, hoje, ter�amos que emitir mais. Um quadro de crise, de emerg�ncia, � justamente o tipo de situa��o que exige dos governos um aumento do endividamento. Foi assim no ano passado e continuar� sendo assim neste ano ao redor do mundo. N�o h� raz�o para que esses R$ 44 bilh�es tenham sido estabelecidos de antem�o, dada � incerteza muito grande em rela��o ao que ser� da pandemia e da economia neste ano.
De qual valor, na sua avalia��o, deveria ser o aux�lio emergencial para tentar minimizar o flagelo da crise e que, tamb�m, n�o tenha um impacto fiscal t�o grande?
N�o � s� uma quest�o de valor, mas de valor e de universo de benefici�rios. O aux�lio, em 2020, come�ou com um valor mais alto (R$ 600) e caiu pela metade (R$ 300) nos �ltimos quatro meses do ano, quando passamos a ver os indicadores sociais, os �ndices de pobreza, piorando. Mas o universo de benefici�rios se manteve. Nessa pr�xima rodada, tem dois desafios. O primeiro � manter amplo e suficiente o aux�lio para cobrir os trabalhadores informais e n�o apenas os mais pobres, os benefici�rios do Bolsa Fam�lia e as pessoas que est�o abaixo da linha da pobreza. � preciso manter um universo amplo de benefici�rios para conseguir, realmente, implementar as medidas de lockdown e controlar a dissemina��o do v�rus, evitando que as pessoas n�o tenham o que comer. E o segundo desafio � dar um valor que seja adequado para atenuar essa perda de renda dos mais pobres. Os R$ 300 que estavam sendo pagos para aquele universo de benefici�rios deveria ser o m�nimo nesse novo desenho, porque, ali, j� est�vamos vendo os indicadores de pobreza se deteriorarem. E a situa��o da pandemia �, hoje, muito pior. Eu ficaria com um programa que fosse entre o aux�lio emergencial inicial, de R$ 600, que foi o primeiro desenho, e esse de R$ 300 com o qual acabamos o ano. Alguma coisa, mais ou menos, no meio do caminho seria o razo�vel, dada a gravidade da situa��o, pelo menos, enquanto durarem esses n�meros de �bitos e o colapso hospitalar no pa�s.
Em rela��o ao valor do aux�lio, faltou vis�o pol�tica ou foi uma forma de manter o apoio do mercado? Porque � importante para a equipe econ�mica, pelo menos, ter uma boa rela��o com os investidores...
Sim. Foi mais a segunda. Foi uma tentativa de sinaliza��o para o mercado de que o teto de gastos n�o entraria em colapso por mais um ano e que haveria algum controle fiscal em 2021. Agora, a grande quest�o � que, tampouco, estava previsto que viver�amos uma segunda onda do tamanho que estamos vivendo da pandemia. Com isso, o governo nem precisaria dessa PEC Emergencial e desse limite preestabelecido de despesas para, novamente, entrar em uma situa��o de calamidade e fazer os gastos imprevis�veis. Nesse sentido, a equipe econ�mica tentou, tamb�m, for�ar um outro conjunto de medidas que entraram na PEC Emergencial como moeda de troca para aprovar o aux�lio e, ao mesmo tempo, limitar o benef�cio como uma sinaliza��o para agradar uma parte do mercado. Eu s� n�o entendo muito bem o que mudou, entre 2020 e 2021, nesse sentido, porque os consensos, em 2020, no Congresso e no governo aconteceram, no fim das contas, e permitiram que o aux�lio emergencial viesse do tamanho que era demandado pela sociedade. Neste ano de 2021, isso mudou, e eu n�o vejo, no cen�rio macroecon�mico, alguma coisa para justificar essa mudan�a.
O Banco Central afirma que a alta do custo de vida � tempor�ria. � para se preocupar com a infla��o?
De fato, o choque de alimentos est� se dissipando. O problema � que essa infla��o, �s vezes, assume um car�ter de in�rcia e n�o se dissipa t�o rapidamente. E isso, inclusive, prejudica o pr�prio valor do aux�lio emergencial, porque aquilo que valia o aux�lio de R$ 300, no fim do ano passado, j� n�o � exatamente o que vale o aux�lio de R$ 300 hoje, considerando que o poder de compra da popula��o caiu por causa dessa infla��o. Mas, de fato, com o d�lar se estabilizando, se isso ocorrer, tanto pela eleva��o dos juros quanto pela pr�pria recupera��o da economia global, que est� andando com a vacina��o em um ritmo muito melhor do que o nosso, acho que a infla��o n�o tende a se acelerar novamente. Creio que n�o estamos em um iminente processo de retroalimenta��o e descontrole inflacion�rio. A infla��o deve voltar para o centro da meta no ano que vem.
E com rela��o ao d�lar? Com o aumento de juros, o BC consegue jogar o d�lar para baixo de R$ 5, que seria um patamar mais confort�vel para a infla��o?
O d�lar responde a fatores internos e a fatores externos. Entre os internos, a diferen�a entre as taxas de juros brasileira e a internacional � um dos fatores relevantes. E a eleva��o da Selic certamente atua para frear essa desvaloriza��o do real. Agora, h� um conjunto de outros fatores que tamb�m dita esses movimentos da moeda brasileira, que tem a ver com os pre�os de commodities, com o crescimento chin�s, com os riscos no mercado global, com as incertezas globais nesta segunda fase da pandemia. A moeda brasileira � mais vol�til entre as divisas de pa�ses emergentes, mesmo em per�odos em que a d�vida p�blica est� mais baixa e que n�o haja crise econ�mica profunda no Brasil. Isso � recorrente e vem de muitos anos. Tem a ver com a estrutura do nosso mercado de c�mbio. E o cuidado tem que ser para n�o reagir de maneira desproporcional a esse choque no d�lar, elevando demais a taxa de juros e trazendo, com isso, custos para a nossa recupera��o e custos fiscais, porque a taxa de juros impacta na din�mica da d�vida p�blica brasileira.
A senhora est� confiante que o pa�s ter� uma boa recupera��o econ�mica neste ano? Fala-se em recess�o no primeiro semestre.
Considerando a situa��o da pandemia, as medidas que est�o sendo tomadas e a falta do aux�lio emergencial que, vamos lembrar, j� vem desde janeiro, acho que o cen�rio de recess�o no primeiro semestre �, hoje, o mais prov�vel. E, para al�m disso, a recupera��o da economia brasileira, no ano todo, tende a ficar muito abaixo da verificada para a economia global. Ao contr�rio do que aconteceu em 2020, quando, gra�as ao aux�lio emergencial e ao esfor�o fiscal realizado, o pa�s acabou tendo, ainda que com uma das quedas mais profundas da nossa s�rie hist�rica do PIB, um desempenho bom em rela��o a outros pa�ses. Este ano n�o ser� assim. O Brasil ter� todos os fatores atuando contra e fazendo com que a economia cres�a menos do que em outros pa�ses: a vacina��o lenta, a contra��o fiscal e a contra��o monet�ria.
E quanto ao papel do governo? H� muitos questionamentos quanto � atua��o n�o s� na quest�o da pandemia, mas tamb�m na condu��o da pol�tica econ�mica pelos ru�dos pol�ticos criados pelo presidente da Rep�blica.
Certamente, o papel do governo tem sido desastroso, tanto no campo da sa�de quanto ao resolver a causa dessa crise econ�mica, que � a pandemia, diga-se de passagem, e n�o as medidas restritivas de prefeitos e governadores, adotadas justamente para evitar que a situa��o chegasse ao ponto que agora chegou. Foi desastroso, tamb�m, na economia, apesar do esfor�o fiscal, que, tampouco, � m�rito do governo. Na pr�tica, � m�rito do Congresso, com o aux�lio emergencial sendo muito maior do que o desenhado pela equipe econ�mica, com outras medidas aprovadas por estados e munic�pios, recursos para a sa�de etc. Isso acabou amenizando muito o tamanho da queda do PIB em 2020. Realmente, a pol�tica do governo nos dois �mbitos, no sanit�rio e no econ�mico, que est�o muito inter-relacionados, foi catastr�fica, eu diria.
Como a senhora avalia a promessa de uma pol�tica liberal do governo, que acabou n�o se confirmando?
A realidade se imp�s. Tem uma parte da pandemia, que � um problema coletivo. � um problema que, portanto, n�o se resolve pelas for�as do mercado, demanda atua��o do Estado. E esse n�o � um governo que estivesse preparado para uma atua��o do Estado. Pelo contr�rio, � um governo que tinha uma ret�rica — a equipe econ�mica, em particular —, de retirada do Estado nas suas v�rias fun��es. Isso tem um custo bastante alto e, claro, a partir dessa realidade que se imp�s e dos benef�cios pol�ticos que o aux�lio emergencial trouxe, o pr�prio governo entrou em conflito interno sobre os rumos da pol�tica econ�mica. Isso se reflete em uma agenda que, na verdade, � uma falta de agenda. S�o medidas err�ticas, pouco coesas e coerentes, sobretudo, sem um plano de recupera��o da economia brasileira.
A demora do governo em liberar o aux�lio emergencial pode agravar o risco de recess�o neste primeiro semestre?
Sem d�vida. Esse � um dos elementos que demonstram a falta de capacidade de formula��o e de execu��o da pol�tica econ�mica por parte do governo. E outro elemento mostra isso muito claramente: o fato de nem sequer aprovar o Or�amento para 2021. O Or�amento foi enviado em agosto do ano passado e n�o h�, hoje, pe�a or�ament�ria para auxiliar o planejamento das despesas que ser�o realizadas ao longo do ano pelos v�rios minist�rios.
O governo, inclusive, teve que pedir autoriza��o de verba extraordin�ria para pagar sal�rios.
Exatamente. N�o temos rumo algum na pol�tica fiscal. N�o h� previsibilidade. Mesmo a PEC Emergencial, no fim das contas, acrescenta uma incerteza, porque n�o traz medidas imediatas. Prev� que outras leis, outras medidas, sejam enviadas, n�o tendo ainda um desenho de como seria o aux�lio emergencial e nem de como ser�o reduzidos os benef�cios tribut�rios, que � algo que est� previsto na PEC. Estamos meio sem rumo na pol�tica econ�mica e j� estamos quase no fim de mar�o. Isso prejudica as perspectivas de recupera��o da economia.
Por que o mercado ainda est� fechado com o governo, mesmo com o discurso liberal do ministro Paulo Guedes (Economia) se desfazendo?
O mercado financeiro funciona com base em conven��es que seus pr�prios agentes definem. Cada not�cia e cada declara��o servem para que os agentes entendam se aquilo vai levar o pre�o dos ativos a subir ou a cair. Nesse sentido, movimentos da Bolsa ou mesmo no d�lar n�o podem ser tomados como reflexo de uma opini�o de uma determinada pessoa ou mesmo de uma vis�o sobre a realidade da economia. Parece-me que s�o movimentos especulativos baseados nas informa��es e nas conven��es formadas ali. Na verdade, � muito sobre como cada not�cia ser� absorvida e quem vai ganhar com ela primeiro, quem vai vender antes e quem vai comprar antes.
D� para ter confian�a no Brasil?
Eu ainda acredito que d� para ter, enquanto um pa�s continental, com uma s�rie de lacunas e problemas para resolver, sim, sem d�vida. Mas a pr�pria resolu��o dos problemas, como o da desigualdade e o da car�ncia de infraestrutura, � um motor para o crescimento econ�mico. Temos a possibilidade, sim, de pensar em uma agenda tecnicamente bem fundamentada, vi�vel, que permita compatibilizar v�rios objetivos, incluindo a sustentabilidade da d�vida p�blica, o controle inflacion�rio, com esses da redu��o da desigualdade e do crescimento econ�mico sustent�vel. N�o � a economia, vamos dizer, a falta de instrumentos, que est� nos limitando. � a falta de vontade pol�tica. E sempre temos oportunidade de corrigir a falta de vontade pol�tica com processos democr�ticos, de escolha de quem nos governa.
Como � que a senhora v� o papel do Congresso? Com o Centr�o no comando, ser�o aprovadas as medidas necess�rias para o pa�s voltar a crescer?
Parece-me que a gente voltou a um cen�rio que tamb�m vigorou um pouco durante o governo Michel Temer, de um certo fisiologismo fiscal. N�o h�, exatamente, um interesse coeso em uma determinada agenda econ�mica, mas h� uma defesa de parlamentares dos interesses daqueles que os apoiam e que t�m maior poder de influ�ncia. Isso faz com que a gente n�o tenha uma agenda reformista prometida pelo ministro Paulo Guedes, porque isso atuar� contra o interesse desses parlamentares. Nem, tampouco, teremos uma agenda de recupera��o econ�mica, que priorize os gastos nas �reas mais necess�rias, porque, isso, tamb�m, n�o parece estar colocado hoje. Vamos continuar vendo uma agenda err�tica. Outras reformas microecon�micas devem passar, mas n�o vislumbro nenhuma grande reforma substantiva na �rea tribut�ria ou administrativa, que era aquilo que chegou a ser aventado no in�cio de governo.
O cen�rio eleitoral de 2022 foi antecipado com o retorno do ex-presidente Lula ao jogo pol�tico. Como a senhora avalia isso e quais os resultados de se antecipar o processo eleitoral para a economia?
No sentido de trazer algum tipo de incentivo para que o governo Bolsonaro governe e tente produzir algum resultado concreto para a popula��o, essa antecipa��o acaba sendo at� favor�vel. N�s vimos uma mudan�a de postura do presidente, por exemplo, em rela��o �s medidas sanit�rias. A press�o para a aprova��o do aux�lio emergencial tamb�m ficou maior. A necessidade de respostas a uma situa��o da popula��o, que � dram�tica, acaba at� trazendo benef�cios. Agora, acho que tem muito tempo ainda at� 2022 para pensar em um projeto de pa�s. E um projeto de pa�s n�o depende s� de um nome, depende de uma constru��o que seja ampla o suficiente para tirar de cena esse desastre que a gente tem visto no governo Bolsonaro.
A polariza��o entre Lula e Bolsonaro, caso prevale�a, pode ser tumultuada para a economia? Como a senhora avalia o impacto desses dois extremos?
A minha avalia��o � que, neste momento, a polariza��o que est� colocada � entre um governo que nega a ci�ncia, n�o est� governando em prol da melhoria das condi��es de vida e de sa�de da sua popula��o. E, do outro lado, o contr�rio disso, o ant�doto disso, de alguma maneira, e que � pensar no que pode ser feito para que as vacinas saiam, para que tenhamos possibilidade de recuperar a economia. Mas essa � a polariza��o que est� colocada hoje. N�o sabemos o que, de fato, vai ocorrer no pleito eleitoral. A pr�pria elegibilidade do ex-presidente Lula n�o est� ainda 100% definida. Ent�o, eu acho que, hoje, essa polariza��o acaba sendo positiva, porque, antes, havia apenas um dos polos, o que nos colocou nessa trag�dia.
E o impeachment, a senhora trabalha com essa possibilidade ainda ou j� passou o tempo?
A pol�tica n�o permitiu at� aqui que esse caminho se desenhasse. A base que apoia o governo vem se deteriorando, mas ela ainda existe e � significativa, e isso trava, politicamente, essa possibilidade. Mas a trag�dia est� entrando em uma fase exponencial, quando olhamos para o n�mero de mortes, para a falta de vacinas, enfim, para a falta total de perspectivas. A economia vai entrar, tamb�m, em mais um ano ruim. E eu acho que as condi��es pol�ticas sempre podem mudar, mas as condi��es jur�dicas para o impeachment j� existem h� algum tempo.
Como a senhora avalia o governo Bolsonaro? � poss�vel fazer uma analogia do caos econ�mico que a senhora tratou em seu livro?
Sem d�vida, temos aprendido que sempre d� para piorar. O fato � que, hoje, o pa�s est� rumando para duas d�cadas perdidas na economia brasileira, em termos de renda m�dia e de renda per capita. O que j�, por si, seria um problema, mas o que eu acho que cria mais dificuldades para o futuro � a deteriora��o das nossas institui��es democr�ticas. Isso me parece que � um risco ainda maior. Na parte econ�mica, com um programa bem formulado, bem pactuado na sociedade e na esfera pol�tica, o pa�s conseguiria sair dessa situa��o. Mas, de fato, o esgar�amento das institui��es democr�ticas traz um temor de que n�s n�o tenhamos a possibilidade de fazer essa repactua��o. Esse � o principal risco do momento.