
O Sistema Nacional de Meteorologia (SNM) emitiu na sexta (28/05) um alerta de emerg�ncia h�drica entre junho e setembro para cinco Estados — Minas Gerais, Goi�s, Mato Grosso do Sul, S�o Paulo e Paran�.
A falta de chuvas � considerada cr�tica na regi�o da bacia do rio Paran�, que concentra importantes usinas hidrel�tricas, como Jupi�, Ilha Solteira, Porto Primavera e Itaipu.O comunicado se soma a uma sequ�ncia de not�cias que exp�em uma das piores secas que o pa�s j� enfrentou, concentrada na regi�o Centro-Sul.
Dados divulgados em abril pelo Comit� de Monitoramento do Setor El�trico (CMSE) apontaram que, entre setembro de 2020 e mar�o deste ano, as hidrel�tricas do pa�s receberam o menor volume de chuvas em 91 anos.
- 'Bolsocaro'? O que explica infla��o mais alta para os mais pobres durante a pandemia
- 'Passei a cozinhar com carv�o': como a infla��o deve afetar os mais pobres em 2021

A situa��o piorou em abril, conforme o �ndice Integrado de Seca (IIS) do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), com intensifica��o da seca em rela��o a mar�o.
A �rea mais afetada no per�odo estava localizada entre S�o Paulo, Mato Grosso do Sul, sul de Goi�s e oeste de Minas Gerais. Nessa regi�o, 248 munic�pios estavam em condi��es consideradas de seca extrema, uma categoria anterior ao pior da escala de cinco n�veis, a seca excepcional.

Conta de luz mais cara
O impacto mais direto desse quadro � no pre�o da energia el�trica.
"O Sudeste, onde a situa��o dos reservat�rios � pior, responde por cerca de 70% da produ��o de energia hidrel�trica do pa�s", destaca Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital Markets.
Com a menor oferta de energia a partir das hidrel�tricas, o pa�s precisa acionar usinas t�rmicas, cuja produ��o � muito mais cara — e mais poluente.
Nas contas de luz enviadas aos consumidores neste m�s j� aparece o acr�scimo da bandeira vermelha patamar 1 acionada no in�cio de maio pela Ag�ncia Nacional de Energia El�trica (Aneel).
A perspectiva para os pr�ximos meses n�o � de melhora — a cobran�a pode ser ainda mais alta, caso a Aneel considere ser necess�rio adotar a bandeira vermelha patamar 2, a mais cara entre as quatro consideradas pela ag�ncia.
"Dadas as caracter�sticas dos reservat�rios do Sudeste, � dif�cil que haja melhora no curto prazo", diz a economista.
A depender do regime de chuvas nos pr�ximos meses, acrescenta Argenta, o quadro pode demandar "pol�ticas governamentais espec�ficas para contornar a situa��o".
"Um racionamento n�o est� descartado", diz ela, emendando que uma medida como essa, contudo, geralmente est� no fim da fila das op��es avaliadas pelos gestores p�blicos por conta de seu elevado �nus pol�tico.
A lembran�a da �ltima vez que o pa�s usou esse expediente segue viva na mem�ria de muitos brasileiros. Em 2001, no pen�ltimo ano do governo Fernando Henrique Cardoso, o pa�s sofreu uma s�rie de apag�es e teve de passar por um penoso racionamento.
Segundo o jornal Valor Econ�mico, que ouviu fontes do governo ap�s reuni�o desta quinta (27/05) do Conselho de Monitoramento do Setor El�trico, considera-se a necessidade de criar um "comit� de crise" para pensar estrat�gias que possam afastar o risco de apag�o. Nesse sentido, o governo trabalharia por ora com todos os cen�rios, inclusive o de racionamento.
- O tempo em que o Rio de Janeiro secou ap�s destruir floresta por caf�
- O vilarejo perdido revelado por uma seca na Inglaterra
Seca, alta das commodities e efeito d�lar
Os impactos econ�micos da seca, contudo, v�o muito al�m da energia el�trica.
De forma geral, a falta de chuvas tem provocado quebras de safra em importantes regi�es produtoras de alimentos.
Com menor disponibilidade dos produtos, os pre�os sobem. A lista � longa: milho, a��car, caf�, trigo, laranja, carne, ovo, leite e at� combust�veis.

Na atual conjuntura, o efeito-seca � agravado por dois outros fatores. Com o aumento das cota��es internacionais das commodities e o d�lar caro, os produtores t�m um incentivo maior para exportar. Vender para fora se torna financeiramente mais vantajoso.
Essa din�mica reduz ainda mais a oferta dentro do pa�s — e deixa mais cara a tarefa de colocar comida na mesa.
O gerente de consultoria Agro do Ita� BBA, Guilherme Bellotti, d� o exemplo ilustrativo do milho.
Enquanto a seca provocou uma quebra da segunda safra do cereal, reduzindo a expectativa inicial de produ��o de 86 milh�es de toneladas para algo entre 65 milh�es e 70 milh�es de toneladas, a cota��o na Bolsa de Chicago disparou nos �ltimos meses.
Essa equa��o reduziu substancialmente a oferta interna de milho. "As ind�strias v�o ter que competir (pelos contratos)", diz ele.
O efeito da alta do milho � uma esp�cie de rea��o em cadeia, j� que a maior parte da produ��o vira insumo na ind�stria de prote�na animal. Assim, com as ra��es mais caras, a tend�ncia � de aumento tamb�m nos pre�os da carne de porco e de frango.
Bellotti ressalta que, especialmente no caso do frango, muitas empresas t�m absorvido os aumentos de custos porque n�o veem espa�o para repass�-los aos consumidores, j� que o pa�s registra desemprego recorde e convive com uma vers�o bastante reduzida do aux�lio emergencial.
A compress�o das margens de lucros, entretanto, tem chegado ao limite. Assim, na avalia��o do economista, ou os produtores v�o repassar essa alta de custos ou v�o segurar a oferta, de modo a empurrar os pre�os para cima. De um jeito ou de outro, o consumidor vai pagar mais caro.
A carne de boi tamb�m vai ficar mais cara. Al�m do milho, o pre�o interno da soja, outro ingrediente das ra��es, tamb�m tem subido. A seca afetou ainda o pasto em alguns Estados, levando os produtores a antecipar a oferta (ou seja, abater os animais antes do previsto), reduzindo a expectativa de oferta para os demais meses do ano.
O economista chama aten��o para o caso do a��car, que tamb�m gera uma esp�cie de efeito domin�.
A falta de chuvas entre fevereiro e abril atrasou o in�cio da colheita da commodity e diminuiu a expectativa de produ��o. A alta das cota��es da Bolsa de Nova York, por sua vez, estimulou as exporta��es. Resultado: o pre�o m�dio da saca de 50 quilos praticado dentro do pa�s foi 40% maior do que o registrado em abril de 2020, de acordo com o Indicador do A��car Cristal do Cepea.
Essa din�mica tem impacto direto sobre o pre�o do etanol — tanto o anidro, que � misturado � gasolina, quanto o hidratado, usado para abastecer os motores movidos a �lcool.
Bellotti avalia que o aumento pode chegar a tornar a gasolina mais vantajosa que o �lcool em algum momento neste ano. Pela regra dos 70%, quando o pre�o do �lcool for superior a 70% do valor da gasolina, financeiramente compensa mais abastecer com este �ltimo.
Um cen�rio deste tipo ajudaria a elevar a demanda por gasolina, que j� tem os pre�os pressionados por conta da alta do d�lar e da cota��o do petr�leo.
Todos esses efeitos v�o aparecer nos �ndices de infla��o nos pr�ximos meses, concentrados nos grupos habita��o e alimenta��o no domic�lio. Este �ltimo responde por quase 20% do �ndice de Pre�os ao Consumidor Amplo (IPCA), o �ndice de infla��o oficial do pa�s.
Carla Argenta observa que, sazonalmente, este � um per�odo em que os pre�os de alimentos geralmente d�o al�vio aos indicadores, o que n�o deve acontecer neste ano. Por ora, sua estimativa para o IPCA do ano, de 4,8%, est� sob revis�o, com vi�s de alta.
Caso a situa��o n�o melhore, a infla��o corre o risco de encostar no teto da meta admitida pelo Banco Central, 5,25%.
Dado que o aumento de pre�os � causado por uma restri��o de oferta, a autoridade monet�ria "tem pouqu�ssima margem para intervir", observa a economista, j� que um eventual aumento das taxas de juros afetaria essencialmente a demanda.

"Se o BC quiser trazer o IPCA como um todo para baixo vai ter que afetar os servi�os, que j� est�o extremamente pressionados", avalia.
Por que n�o choveu?
Uma das causas para a falta de chuvas foi um intenso La Ni�a neste ano, explica o climatologista Jos� Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
Esse fen�meno natural que reduz as temperaturas da superf�cie do oceano Pac�fico Tropical Central e Oriental com frequ�ncia tem como efeito a redu��o dos �ndices pluviom�tricos na regi�o Sul e, em alguma medida, tamb�m no Sudeste e Centro-Oeste.
"A ag�ncia NOAA [sigla para National Oceanic and Atmospheric Administration, ligada ao Departamento de Com�rcio dos EUA] havia informado que o La Ni�a tinha terminado [em abril], mas proje��es mostram que poder�amos estar apenas em um per�odo de transi��o, que o fen�meno freou, mas que poderia voltar a ganhar intensidade", explica.
"Isso por enquanto � uma previs�o, n�o � uma verdade absoluta. Mas � uma possibilidade preocupante."
O meteorologista destaca que a situa��o hoje est� concentrada no Sudeste, Sul e Centro-Oeste do pa�s. O quadro � est�vel no Nordeste e o Norte do pa�s vem enfrentando um volume de chuvas intenso, com eleva��o no n�vel de rios.
Como o Centro-Sul do pa�s est� pr�ximo de entrar no inverno, uma esta��o sazonalmente marcada pela estiagem, � improv�vel que haja revers�o do quadro nos pr�ximos meses.
"Ter�amos que esperar at� outubro mais ou menos e torcer para que comece a chover."
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!