
Era o auge da ditadura militar, que desmantelara a oposi��o, interviera em sindicatos e proibira greves. O escolhido para a miss�o foi o economista Carlos Langoni, que trabalharia no governo na virada das d�cadas de 1970 e 1980, quando foi presidente do Banco Central (BC), e voltaria a colaborar com a equipe econ�mica do ministro Paulo Guedes, quase 40 anos depois. Aos 76 anos, Langoni morreu neste domingo (13/6), v�tima da COVID-19, no hospital Copa Star, no Rio, onde estava internado.
Para fazer a cr�tica � desigualdade no Brasil, McNamara se baseara em artigo do brasilianista norte-americano Albert Fishlow, "Brazilian size distribution of income". O trabalho apontou na pol�tica econ�mica dos governos desde Castello Branco o motivo do crescente abismo social. De 1964 a 1967, descontada a infla��o, o sal�rio m�nimo recuara 20%. O ent�o ministro da Fazenda, Delfim Netto, encarregou a Funda��o Instituto de Pesquisas Econ�micas (Fipe) da Universidade de S�o Paulo (USP), da r�plica. Langoni trabalhava na institui��o e assumiu a tarefa aos 28 anos.
Sob a �tica do regime, a escolha de Langoni, considerado um profissional brilhante, foi perfeita. Dois anos antes, ele obtivera seu doutorado na Universidade de Chicago, centro de economistas ultraliberais, com a tese "The Sources of Brazilian Economic Growth". No trabalho, investigou a rela��o entre educa��o e economia. Calculou o retorno do investimento em escolas fundamentais, m�dias e superiores.
Estava a� a "base" da resposta que Langoni elaboraria para contestar o Banco Mundial. A desigualdade brasileira, argumentou, era estrutural, ligada � educa��o. Com o crescimento econ�mico, a demanda por trabalhadores qualificados tinha crescido muito mais do que pelos mal instru�dos. O aumento na participa��o de trabalhadores com mais anos de estudo na for�a de trabalho gerara a desigualdade. Essas conclus�es seriam contestadas por economistas de oposi��o. N�o aceitaram que toda a desigualdade brasileira se devesse apenas � falta de boa escola.
Langoni, por�m, abria seu caminho. Economista jovem e estrelado, com t�tulo em universidade americana, alinhado �s teses ortodoxas, tinha o perfil de "tecnocrata". Na �poca, a associa��o de t�cnicos com bom preparo a grandes empresas multinacionais, empres�rios locais e militares ajudava o Pa�s a crescer a taxas de at� dois d�gitos e infla��o sob controle e relativamente baixa (para padr�es brasileiros da �poca), de 1967 a 1973. Empr�stimos estrangeiros a juros baixos garantiam o fluxo de capital para sustentar o "Milagre Brasileiro", como orgulhosamente os apoiadores do governo militar chamaram o per�odo.
A festan�a desandaria em 1973, no primeiro choque do petr�leo, e acabaria de vez no segundo, em 1979. Depois, veio a crise da d�vida externa e a d�cada perdida - a primeira.
O economista, contudo, passou aqueles anos longe do poder - na academia. Depois de tr�s anos na Fipe, foi dar aulas na Escola de P�s-Gradua��o em Economia da Funda��o Getulio Vargas (FGV), no Rio. Foi subdiretor t�cnico da EPGE em 1972 e 1973. A partir de ent�o - tinha apenas 29 anos quando assumiu o cargo - foi diretor da institui��o. Ficou no posto at� 1979.
Origens
Carlos Geraldo Langoni era fluminense de Nova Friburgo, na Regi�o Serrana, onde nasceu em 24 de julho de 1944. Estudou com bolsa no Col�gio Nova Friburgo, projeto da FGV. Nos anos 60 do s�culo passado, ingressou na Faculdade Nacional de Economia, no c�mpus da Praia Vermelha, do que hoje � a Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ali se formou em 1966.
No ano seguinte, Langoni cursou programa��o e planejamento econ�mico no Centro de Treinamento para o Desenvolvimento Econ�mico Social (Cendec) do Minist�rio do Planejamento. A orienta��o do curso era liberal. Um acordo com Funda��o Ford para que alguns alunos do Cedec pudessem estudar na Universidade de Chicago ajudou. Foi assim que Langoni conseguiu uma bolsa para se doutorar em economia nos EUA. Teria sido o primeiro brasileiro a obter o t�tulo institui��o americana, � qual foi ligado Milton Friedman (1912-2006).
De volta ao Brasil, Langoni foi convidado para trabalhar no Fipe/USP, onde estava quando respondeu �s cr�ticas de McNamarra. L� estruturou o programa de p�s-gradua��o e a Revista de Estudos Econ�micos.
Em 1979, Langoni foi chamado pelo ent�o presidente do BC, Ernane Galv�as, para assumir a Diretoria da �rea Banc�ria da institui��o. Criou o Sistema Especial de Liquida��o e Cust�dia (Selic), que assegurava a liquida��o virtual de transa��es com t�tulos p�blicos. Eram pap�is virtuais, pela primeira vez no Brasil. Assim surgiu a taxa Selic.
Quando Galv�as foi nomeado ministro da Fazenda, em janeiro de 1980, Langoni o substituiu na presid�ncia do BC. Aos 35 anos, foi o mais jovem ocupante do cargo da hist�ria. Como presidente do Banco Central, tornou-se membro do Conselho Monet�rio Nacional e do Conselho Nacional de Com�rcio Exterior (Concex). Tamb�m foi representante do Brasil, como governador suplente, no Fundo Monet�rio Internacional (FMI). Deixou o cargo, por diverg�ncias, em 5 de setembro de 1983.
Fora do BC, voltou � FGV do Rio, onde criou o Centro de Economia Mundial (CEM/FGV), para debater a abertura da economia brasileira e a globaliza��o. Tamb�m foi CEO do NM Rothschild no Brasil entre 1989 e 1997. Manteve o cargo como diretor do CEM at� voltar a flertar com o governo, ainda na transi��o entre os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Langoni foi professor de Paulo Guedes e fazia parte do grupo apelidado pelo pr�prio ministro de "Chicago oldies". � num jogo de palavras com os "Chicago boys", como ficou conhecido o time de jovens economistas liberais egressos da Universidade de Chicago que trabalhou nas reformas da pol�tica econ�mica do Chile durante a ditadura de Augusto Pinochet, ber�o das pol�ticas neoliberais. Mais de uma vez, em eventos p�blicos no Rio, Langoni disse que preferia a alcunha de "Chicago grandfather".
Menos envolvido na elabora��o do programa coordenado por Guedes desde a virada de 2017 para 2018, Langoni resistiu a aceitar um cargo no governo. Em 2019, ganhou status de assessor informal. Marcava presen�a constante em reuni�es na sede do MInist�rio da Economia no Rio, onde, antes da pandemia, o ministro despachava toda sexta-feira. Deu as primeiras ideias para reformar o setor de g�s. No fim de 2019, foi indicado por Guedes como assessor para o ingresso do Brasil na Organiza��o para a Coopera��o e o Desenvolvimento Econ�mico (OCDE), que re�ne as economias mais desenvolvidas. At� adoecer, acumulava a fun��o com o cargo de diretor do CEM da FGV.
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.