
H� um ano, a cuidadora de idosos Maria Lucia Silva, de 58 anos, usa o medicamento Arava para tratamento de sua artrite reumatoide. Sem o rem�dio, ela sente dores fort�ssimas nas articula��es, incluindo as das m�os e dos p�s.
"As juntas das m�os ficam muito inchadas, eu n�o consigo fazer nada", conta ela � BBC News Brasil.
Embora a artrite reumatoide n�o tenha cura, o tratamento feito por Maria Lucia com o Arava retarda a evolu��o da doen�a, que pode levar � eros�o dos ossos.
O problema � que o rem�dio est� custando R$ 582 e est� em falta na farm�cia de alto custo do SUS (Sistema �nico de Sa�de), onde ela costumava retirar o medicamento.
"Faz dois meses que eu tento agendar para ir buscar o rem�dio e n�o consigo, o aplicativo diz que est� em falta", conta ela, que j� est� sentindo os efeitos da falta de tratamento.
"Minhas juntas est�o doendo e minha m�o est� come�ando a inchar. N�o sei o que vou fazer se continuar sem o rem�dio. Estou pensando em fazer uma vaquinha para ver se consigo comprar."Consultada pela BBC News Brasil, a Secretaria de Estado da Sa�de de S�o Paulo disse que o medicamento Leflunomida � de responsabilidade de aquisi��o e distribui��o pelo Minist�rio da Sa�de.
"A entrega ocorreu com atraso e a distribui��o para as farm�cias deve ser conclu�da na primeira semana de janeiro. A paciente ser� comunicada sobre a disponibilidade", disse a entidade em nota.
Maria Lucia mora com marido e dois filhos no bairro de Santa Cec�lia, em S�o Paulo, e atualmente n�o est� trabalhando.
"A gente tem s� a renda do meu marido, e com o aumento do pre�o de tudo, n�o temos condi��es de gastar 500 reais em rem�dio", diz ela.
Sua fam�lia tamb�m tem tido que comprar medicamentos que seu marido normalmente retirava no SUS por causa de instabilidade no sistema da farm�cia popular.
"Ele n�o estava conseguindo pegar e tivemos que comprar. Deu porque os dele s�o mais baratos, mas � dif�cil, porque tamb�m aumentou o pre�o", diz Maria Lucia.

Insumos importados
O aumento no pre�o de medicamentos e a falta de muitos deles no mercado t�m afetado fam�lias como a de Maria Lucia desde o in�cio da pandemia, mas a Covid-19 n�o � o �nico motivo.
"Os pre�os dos medicamentos v�o acompanhando a varia��o da infla��o e, principalmente, seguem a tend�ncia de alta do d�lar", explica Silvia Okabayashi, coordenadora de economia da Universidade Metodista de S�o Paulo.
"Os rem�dios que n�o s�o importados usam insumos importados. Temos uma depend�ncia internacional de 90% de insumos, ou seja, 90% da mat�ria-prima usada para produ��o de medicamentos no Brasil � importada."
Nos �ltimos doze meses (entre novembro de 2020 e novembro de 2021), o IPCA (�ndice oficial de infla��o de produtos e servi�os) teve um aumento acumulado de 10,74%, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica).
Embora o reajuste anual de medicamentos seja regulado pela Anvisa com base em uma tabela de pre�os m�ximos ao consumidor, a Tabela CMED, essas press�es inflacion�rias podem levar o aumento do pre�o dos rem�dios a ultrapassar esse teto de varia��o, explica Okabayashi.
Al�m disso, � comum as farm�cias oferecerem descontos em rela��o a esse valor m�ximo permitido - descontos que tendem a diminuir com o aumento da infla��o.
O aumento de pre�os dos rem�dios para hospitais e cl�nicas tamb�m foi consider�vel, embora n�o t�o alto quanto os pre�os para o consumidor final.
O �ndice de Pre�os de Medicamentos para Hospitais (IPM-H), produzido pela Fipe (Funda��o Instituto de Pesquisas Econ�micas) e pela Bionexo, teve aumento de 7,21% no acumulado de 12 meses (at� novembro de 2021).

Nesse cen�rio de aumentos, explica Okabayashi, s�o sempre as fam�lias de baixa renda que mais sofrem.
"Proporcionalmente elas s�o mais afetadas por esse processo inflacion�rio, porque os valores impactam mais no seu or�amento, e elas j� t�m um poder de compra reduzido", afirma.
Mesmo quem n�o sofre com doen�as cr�nicas t�m sentido esse impacto.
Gr�vida e acometida por uma infec��o urin�ria, a jovem carioca Ane Caroline Correia da Silva, de 24 anos, procurou a maternidade Maria Am�lia, no Rio de Janeiro, e recebeu a recomenda��o de usar um antibi�tico caro que n�o � fornecido pelo SUS.
Desempregada e sem condi��o de comprar o rem�dio, a jovem voltou para casa no Riachuelo, na zona norte do Rio, e n�o conseguiu fazer o tratamento.
Sua infec��o acabou se agravando. Ela voltou uma segunda vez para a maternidade, e agora sua fam�lia est� tentando que ela seja internada para receber o antibi�tico no pr�prio hospital.

Infla��o sem aumento de renda
Em junho de 2020, quando percebeu que o isolamento social estava afetando sua sa�de mental, a paulista Gabriela Calixto, de 31 anos, procurou um psiquiatra e come�ou a tomar dois rem�dios antidepressivos.
Isso adicionou mais R$ 300 reais aos seus gastos com medicamentos - ela j� tomava um rem�dio para controle de glicemia e perda de peso que custava mais de R$ 900.
Em 2021, todos os rem�dios que ela tomava tiveram um grande aumento no pre�o. "Com desconto, o Ozempic (para controle de glicemia) sa�a mais barato para mim. Mas agora o pre�o dele subiu para mais de R$ 1.000 e mesmo com desconto n�o sai por menos de R$ 870", conta ela.
Com seus gastos com contas, mercado e aluguel tamb�m subindo consideravelmente, Gabriela teve que parar de tomar o rem�dio para diabetes.
"Minha m�dica substituiu por outros dois que at� tratam o mesmo problema, mas t�m outros efeitos colaterais e n�o s�o o ideal para o meu caso", diz ela. "Tive que escolher entre (os rem�dios para) minha sa�de mental e cuidar da diabetes."
"Enquanto isso minha renda continua a mesma", diz a jovem, que trabalha como Pessoa Jur�dica e n�o recebeu aumento nem para repor a infla��o.
Okabayashi diz que � dif�cil calcular quanto tempo essa situa��o vai durar.
"Se a cota��o do d�lar diminuir, at� existe a possibilidade dos pre�os dos rem�dios n�o aumentarem tanto, mesmo que ainda haja um processo inflacion�rio. Mas � dif�cil", diz ela.
"Al�m disso, a instabilidade pol�tica e econ�mica v�m favorecendo essa deprecia��o do real", afirma.
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