
Mas n�o para por aqui: outras faturas ser�o repassadas aos clientes em breve.
Sob o fantasma dos apag�es devido ao baixo n�vel dos reservat�rios nas hidrel�tricas, o governo contratou emergencialmente no segundo semestre de 2021 o equivalente a R$ 39 bilh�es em energia de usinas termel�tricas a g�s natural - um combust�vel f�ssil, embora n�o t�o poluente quanto o petr�leo e o carv�o, e considerado caro.
A crise h�drica tamb�m resultou em um empr�stimo de R$ 10,5 bilh�es para cobrir os preju�zos de empresas do setor, um dinheiro que ser� levantado em bancos p�blicos e privados e que ser� pago - pelos consumidores - por meio de um encargo a ser embutido nas contas a partir de 2023.
Existem ainda outros fatores para pesar na fatura: nesta semana a Ag�ncia Nacional de Energia El�trica (Aneel) prop�s o aumento em at� 57% das bandeiras tarif�rias que vigoraram na �poca de falta de chuvas e h� os reajustes previstos das distribuidoras locais de energia nos pr�ximos meses.
Luz mais cara impacta os pre�os dos produtos. Segundo a Abrace (Associa��o dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres), gastos com energia representam 32% do custo do frango e 25% do cimento.
E a entidade, com base em dados da Ag�ncia Internacional de Energia (AIE), aponta que o custo da luz para o or�amento das fam�lias � o segundo maior do mundo, apenas atr�s da Col�mbia e na frente de pa�ses como Estados Unidos e Canad�.
"A crise maior n�o � do abastecimento, � a crise do custo. N�o adianta voc� ter o produto se ele tem um custo que as pessoas n�o podem adquirir. N�o adianta o supermercado estar cheio de fil� mignon se as pessoas n�o podem comprar", diz Luiz Eduardo Barata.
O ex-presidente do Operador Nacional do Sistema El�trico (ONS) e do Conselho de Administra��o da C�mara de Comercializa��o de Energia El�trica (CCEE) cita preocupa��es com o aumento da inadimpl�ncia. "A energia � cara, as pessoas ficam inadimplentes e acabam fazendo 'gato' [liga��o clandestina na rede el�trica]."
Veja abaixo alguns fatores que pesam na conta de luz:
Depend�ncia das chuvas e socorro pelas t�rmicas
O Brasil reduziu historicamente sua depend�ncia da energia hidrel�trica, mas ela ainda representa 65% de sua matriz el�trica.
E o regime de chuvas, do qual as usinas dependem, tem se tornado mais incerto em tempos de mudan�a clim�tica.

Havia pessimismo no final do ano passado sobre a recupera��o dos n�veis dos reservat�rios. Mas vieram as fortes chuvas do �ltimo ver�o, que praticamente eliminaram as chances de uma crise energ�tica em 2022, ao mesmo tempo que provocaram trag�dias na Bahia, em Minas Gerais e no Estado do Rio.
"A crise que vivemos no ano passado j� estava sinalizada desde 2020", diz Barata. "Ent�o era previs�vel que ao longo de 2021 n�s tiv�ssemos um cen�rio muito adverso."
O socorro em �pocas assim tem vindo principalmente das termel�tricas (tamb�m chamadas de t�rmicas), como visto na �ltima amea�a de apag�o. Mas o peso financeiro delas � consider�vel e vem aumentando pela conjuntura atual.
O pre�o do g�s natural que move as t�rmicas foi impactado pela guerra na Ucr�nia - a R�ssia � um dos grandes produtores do setor e o conflito mexeu com o mercado mundial.
Em outubro do ano passado, em raz�o dessa flututa��o, a Aneel autorizou reajustes que tornaram uma usina no Paran� a mais cara do pa�s, com a cobran�a de R$ 2.553,20 por MWh (megawatt-hora).
Em compara��o, a tarifa m�dia da hidrel�trica de Itaipu � de R$ 196,19/MWh, segundo Edvaldo Santana, ex-diretor da Aneel, em entrevista ao jornal Valor Econ�mico.
H� outro ponto importante em tempos de aquecimento global: o g�s natural das t�rmicas n�o � renov�vel e n�o cumpre a meta de aproximar a emiss�o de carbono a zero - uma quest�o de urg�ncia, alertaram cientistas da ONU recentemente.
H� pouco mais de um ano, o governo apresentou o Plano Nacional de Energia 2050, um planejamento de longo prazo que objetiva desenvolver solu��es de baixo carbono e estima uma maior participa��o de fonte solar, e�lica e de biomassa na matriz energ�tica no pa�s - o ministro Bento Albuquerque tamb�m citou as usinas nucleares como necessidade para essa composi��o.
Renov�veis: n�o aproveitamos todo o potencial
A necessidade de garantir seguran�a energ�tica junto � preocupa��o com a mudan�a clim�tica fazem com que o pa�s precise intensificar o aproveitamento do grande tempo de exposi��o solar e do excelente potencial para fontes e�licas em territ�rio brasileiro, diz Amanda Schutze, coordenadora de energia no Climate Policy Initiative (CPI) e professora da PUC-RJ.

"A gente, diferente de outros pa�ses, poderia partir para uma matriz el�trica 100% renov�vel. Al�m disso, podemos atrav�s da eletrifica��o, colaborar para a descarbonizac�o de outros setores e com o hidrog�nio verde transformar o pa�s em exportador de energia renov�vel para o mundo."
"O Brasil pode ser l�der na transi��o energ�tica e aproveitar a oportunidade para um crescimento econ�mico verde", afirma Schutze.
O ataque russo � Ucr�nia acelerou uma transi��o energ�tica na Europa Ocidental, que tenta diminuir a depend�ncia do fornecimento russo, e tem no hidrog�nio uma das principais apostas para um substituto vi�vel de combust�vel.
"N�o podemos ficar sem alternativas nessa crise do clima", diz Barata, ex-diretor do ONS. "Eu diria que tem sido feito esfor�os no sentido de amplia��o do uso de renov�veis, mas n�o com a intensidade necess�ria."
Ele afirma que h� "uma insist�ncia grande pela instala��o de t�rmicas a g�s".
A medida provis�ria que abre caminho para a privatiza��o da Eletrobras incluiu jabutis (pedidos pol�ticos sem rela��o com o tema inicial da proposta) durante tramita��o no Congresso como a instala��o de uma usina t�rmica no Tri�ngulo Mineiro e a prorroga��o de subs�dios � gera��o a carv�o.
O Minist�rio de Minas e Energia disse � BBC News Brasil que "atualmente, a matrizes energ�tica e el�trica brasileiras est�o entre as mais limpas e renov�veis do mundo. Matriz energ�tica: Brasil 46% e mundo 14%; matriz el�trica Brasil 83% e mundo 27%. Al�m de diversificar a matriz, o objetivo do governo brasileiro � elevar esse percentual nos pr�ximos dez anos. Destacam-se a biomassa da cana-de-a��car, hidroeletricidade, e�lica e solar".

"Para os pr�ximos 30 anos, as an�lises apontam que a capacidade solar instalada deve atingir entre 30 e 90 GW [gigawatts] em 2050, considerando apenas a gera��o centralizada. Isso representar� entre 5% e 16% do total. Em alguns cen�rios, chega a mais de 100 GW."
"A energia e�lica � hoje a segunda fonte de energia el�trica no Brasil, com mais de 8.500 aerogeradores e mais de 720 parques e�licos", complementa a nota.
Encargos da conta
Na quarta-feira (13/4), a Associa��o dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres divulgou um levantamento que coloca a conta de luz brasileira como a segunda mais cara entre 33 pa�ses pesquisados.
Segundo a entidade, s� a metade (53,5%) do valor da conta diz respeito � gera��o, transmiss�o e distribui��o da energia el�trica. Subs�dios, impostos, inefici�ncias do setor e pol�ticas p�blicas formam a outra parte.
O peso maior � representado pela Conta de Desenvolvimento Energ�tico (CDE), encargo setorial para promover o desenvolvimento energ�tico do pa�s e que representar� um montante de R$ 28,8 bilh�es neste ano.
O CDE inclui, por exemplo, um benef�cio concedido � compra de carv�o mineral nacional pelas termel�tricas para aumentar a competitividade desse tipo de energia - que � altamente poluente.
Est� inclu�do tamb�m o que se gasta para levar luz a popula��es em locais isolados, que n�o est�o interligados � rede nacional de energia. Barata concorda com esse mecanismo de solidariedade com popula��es vulner�veis, mas diz que � poss�vel otimizar esses custos.
"Com advento da energia e�lica, da solar, voc� pode substituir essas fontes a �leo combust�vel [que atualmente atendem essas popula��es] por um sistema h�brido, que, por exemplo, junta vento e bateria. Algo muito mais barato do que o �leo combust�vel", diz.
"Essas mudan�as est�o ocorrendo, mas em velocidade lenta."
O consumidor como fornecedor
Amanda Schutze, da PUC-RJ, defende um foco maior em mecanismos que atuam do lado da demanda como alternativa ao foco apenas na expans�o da capacidade.
Uma solu��o, diz ela, � refor�ar a inclus�o de consumidores como fornecedores - por meio dos pain�is solares.

"O consumidor ele � muito mais empoderado hoje no sentido de que ele n�o s� pode gerar a pr�pria energia como pode contribuir com a rede injetando o seu excedente".
Atualmente uma resolu��o da Aneel permite que clientes obtenham cr�ditos com uma esp�cie de troca com a energia n�o utilizada. Uma proposta de moderniza��o do setor pelo Minist�rio de Minas e Energia, que expande essas possibilidades, est� em tramita��o no Congresso.
Segundo o Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel), as unidades de pain�is solares em resid�ncias quanto e no com�rcio e ind�stria cresceu 50% em 1 ano. A energia gerada foi de 5 GW para 7 GW. A entidade prev� 35 GW de pot�ncia na gera��o distribu�da at� 2030.
Schutze tamb�m diz que h� mecanismos de resposta da demanda que fariam a diferen�a para a seguran�a energ�tica, ou seja, mecanismos para gerenciar o consumo em resposta �s condi��es de oferta.
"Se voc� oferece compensa��es para uma ind�stria transferir a sua produ��o para um outro hor�rio, para tirar do pico, voc� precifica o hor�rio de produ��o. Voc� pode desenhar diferentes incentivos para estimular a redu��o da demanda em momentos cr�ticos do sistema."
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