
Um colchonete, cobertores, peda�os de papel�o e um travesseiro.
Esse foi o kit levado pela maior parte das 50 pessoas que passaram at� 24 horas na fila � espera de atendimento para atualizar o Cad�nico no Centro de Refer�ncia da Assist�ncia Social (Cras), na Brasil�ndia, no extremo norte de S�o Paulo.
Isso ocorreu porque a unidade m�vel que estava fazendo atendimento no Centro Educacional Unificado (CEU) era a �nica da regi�o a distribuir 50 senhas para atendimento presencial. As demais funcionam apenas por agendamento online ou telef�nico.
Para algumas fam�lias, sexta-feira (14/10) seria o �ltimo dia poss�vel para fazer a atualiza��o do Cad�nico. Caso contr�rio, poderiam perder o direito de receber benef�cios sociais, como o Aux�lio Brasil.
No entanto, o governo federal estendeu esse prazo por mais um m�s.
A BBC News Brasil conversou com quatro m�es que cuidam sozinhas de seus filhos na Brasil�ndia e dependem majoritariamente de benef�cios sociais para comprar alimentos e pagar contas b�sicas de casa.
Quatro meses tentando
A bab� Ingrid Souza disse que tenta h� quatro meses fazer o agendamento para atualizar o cadastro no Cras.Ela conta que o cart�o dela foi bloqueado em agosto e, desde ent�o, s� consegue receber os benef�cios sociais numa ag�ncia da Caixa.
Na sexta, ela foi at� o Cras 3, na Brasil�ndia, em mais uma tentativa de atualizar o cadastro. Mas sem sucesso.
"Eles dizem que n�o podem fazer nada. Dizem que tenho que atualizar pelo site, mas eu j� tentei. Tamb�m liguei no 156 (atendimento da prefeitura) e aplicativo. Tenho dois filhos e n�o pude dormir na fila para garantir a atualiza��o", afirmou.
Ingrid contou � BBC News Brasil que o dinheiro do aux�lio � essencial para a fam�lia pagar as contas b�sicas e se alimentar. Ela mora sozinha e sustenta os dois filhos, de 7 e 3 anos.
"A primeira coisa que eu fa�o quando eu pego o dinheiro � comprar o leite das crian�as e a fralda usada pelo meu filho de 3 anos para dormir em cima porque faz xixi na cama. De resto, eu complemento a renda com bicos como bab�, que rendem R$ 200 por m�s", contou enquanto segurava uma crian�a que ela cuida.
Ingrid disse ainda que uma das principais ajudas que ela conta para gastar menos � com as refei��es que os filhos dela fazem na escola.
Procurada, a Secretaria Municipal de Assist�ncia e Desenvolvimento Social (Smads) de S�o Paulo informou que "o atendimento no Cad�nico na cidade de S�o Paulo � feito prioritariamente por agendamento pr�vio desde 2018, com a finalidade de evitar a forma��o de filas".
Por m�s, segundo a pasta, "s�o feitos cerca de 62 mil agendamentos na capital. De acordo com a Coordena��o de Gest�o de Benef�cios da Smads, h� aus�ncia em cerca de 25% dos agendamentos. Estas vagas geradas por aus�ncia ficam novamente dispon�veis � popula��o".
Renda principal
Joana d'Arc Ferreira da Cruz cuida sozinha dos tr�s filhos. E diz que tamb�m est� h� meses tentando agendar um atendimento no Cras para continuar recebendo o Aux�lio Brasil, principal renda da fam�lia.
"J� tentei pelo site, associa��o de bairro, no 156. Eu n�o posso perder o benef�cio. S� meu aluguel custa R$ 300, que � metade do aux�lio. Fora isso, tenho que pagar wi-fi para os meus filhos estudarem", afirmou.

Joana disse que os filhos fazem carretos de maneira espor�dica, mas que ela n�o conta com esse dinheiro para a casa.
Ela complementa a renda da fam�lia com o trabalho que faz coletando material recicl�vel.
"Esse trabalho me garante uma renda de at� R$ 150 por semana. Como somos quatro pessoas na casa, eu fa�o o que posso."
24 horas na fila
�s 10h de quinta-feira (13/10), quando Fernanda Aparecida Benedito chegou ao local onde a van itinerante do Cras estava estacionada na Brasil�ndia, ela foi informada que, caso n�o entrasse na fila para ser atendida no dia seguinte, possivelmente teria o Aux�lio Brasil cancelado.
"Naquela hora, j� tinham 22 pessoas na minha frente. Eu tive que passar a noite aqui, com muita gente dormindo na cal�ada. Pessoas com crian�as e idosos sem banheiro ou tenda. Vi senhoras fazendo xixi atr�s dos carros nas ruas. Quem trouxe coberta se cobriu. Quem n�o trouxe, ficou passando frio", relatou.
Ela conta que algumas pessoas chegaram a brigar � noite com quem j� estava na fila, por entender que eles n�o queriam mais pessoas l�.
"A gente dizia para as pessoas que chegavam que eram s� distribuiriam 50 senhas, mas elas achavam que a gente n�o queria que elas fossem atendidas. Teve at� briga de pux�o de cabelo por causa disso", disse Fernanda.
Ela contou � reportagem que nos �ltimos tr�s meses ligou para o 156 para tentar agendar atendimento, mas sempre ouviu que n�o havia vagas. Para ir � fila, ela deixou os filhos na casa da m�e porque n�o tinha quem os levasse � escola.
"Ent�o, as crian�as perdem os estudos e a gente perde dinheiro porque n�s trabalhamos com eventos. E como vamos trabalhar hoje se a gente dormiu a noite inteira na rua?", questionou.
Ela disse que usa o Aux�lio Brasil para pagar o aluguel de R$ 600 da casa onde vive com os filhos, de 14 e 9 anos. O pai deles, segundo ela, d� uma ajuda financeira informal para as crian�as.
"Se eles n�o d�o o benef�cio, eu n�o consigo pagar o aluguel. O trabalho que eu fa�o � para nos alimentar, pagar uma perua para levar meu filho, comprar roupas", disse.
Com queixas de artrose e dores no nervo ci�tico, Sandra Lia do Nascimento disse que "foi muito sofrido" passar a noite ao relento para atualizar o cadastro.
"Mas a gente precisa", se consola momentos antes de ter o nome dela chamado pela atendente.
Ao ser perguntada pela BBC News Brasil, ela disse que agora tem esperan�a de que ter� seu problema resolvido.
"Eu espero em Deus que eu consiga. Afinal, depois da tempestade, vem a bonan�a", disse, sorrindo.
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