
O texto tamb�m ir� sustar as mudan�as no Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem) previstas para 2024, que adequariam o exame ao previsto nas novas regras da etapa. O Enem �, atualmente, a principal porta de entrada para o ensino superior p�blico no Brasil. Essa suspens�o ocorrer�, inicialmente, enquanto durar o prazo da consulta p�blica sobre o tema.
Iniciada em mar�o, a consulta tem 90 dias de dura��o, com possibilidade de prorroga��o, e mais 30 dias para o Minist�rio da Educa��o (MEC) elaborar um relat�rio. Na pr�tica, a suspens�o deve ter, em 2024, um novo formato do Enem como a principal consequ�ncia.
A portaria com a suspens�o — que altera, por sua vez, a portaria 521, de julho de 2021— tem anu�ncia da equipe pr�xima ao presidente Lula. A avalia��o do Pal�cio do Planalto � de que o governo tem sofrido desgastes exagerados ao manter a reforma, sobretudo entre os estudantes — os jovens n�o representam uma base consolidada de apoio ao presidente porque n�o viveram os anos dos dois mandatos de Lula.
Uma revoga��o total da reforma dependeria da atua��o do Congresso, por ter ocorrido por lei. A suspens�o dos prazos foi a sa�da vista para acalmar os �nimos dos cr�ticos e evitar maiores impactos � imagem do governo e do presidente Lula.
O Novo Ensino M�dio foi aprovado em 2017, a partir de medida provis�ria (que acelera a tramita��o), e prev� a organiza��o da grade hor�ria em duas partes.
No modelo, 60% da carga hor�ria dos tr�s anos letivos � comum a todos os estudantes com as disciplinas regulares. Os outros 40% s�o destinados �s disciplinas optativas dentro de grandes �reas do conhecimento, os chamados itiner�rios formativos. O n�mero de horas anuais obrigat�rias passa de 800 para ao menos 1.000, ou de quatro para cinco horas di�rias.
A implementa��o do novo formato tornou-se obrigat�ria em 2022 e tem registrado uma s�rie de problemas. Os estudantes reclamam, principalmente, de terem perdido tempo de aula de disciplinas tradicionais. H� casos de disciplinas desconectadas ao curr�culo e defici�ncias de oferta dos itiner�rios a todas as escolas.
A revoga��o total n�o agrada os secret�rios estaduais de Educa��o. Eles argumentam terem realizado um trabalho importante para estruturar o novo modelo. Mais de 80% das matr�culas do Ensino M�dio est�o nas redes estaduais. Em entrevista ao jornal Di�rio do Nordeste, o ministro Camilo Santana disse que ser� suspensa "qualquer mudan�a no Enem em rela��o a 2024 por conta dessa quest�o do Novo Ensino M�dio". Questionado, o MEC n�o respondeu.
Um grupo de trabalho que trata do assunto esteve na tarde desta segunda-feira (3), e a portaria foi o principal tema da conversa.
Desde o in�cio deste ano, estudantes, professores e especialistas da �rea cobram o governo Lula para que o modelo seja revogado. No dia 15 de mar�o, estudantes fizeram um protesto pressionando pela revoga��o, em uma primeira rusga de entidades estudantis com a gest�o petista.
O prazo atual de implementa��o da reforma culmina com um novo formato do Enem em 2024, quando a primeira turma completa os tr�s anos da etapa no novo modelo. Por isso, a portaria que deve ser publicada nos pr�ximos dias e revoga esse prazo de implementa��o tamb�m.
Criados com o objetivo de dar aos jovens a op��o de escolher uma �rea para aprofundar os estudos, os itiner�rios do Novo Ensino M�dio est�o, na pr�tica, sendo impostos e at� mesmo sorteados entre os estudantes nas escolas estaduais do pa�s.
Por falta de professores, espa�o f�sico, laborat�rios e turmas lotadas, as escolas n�o conseguem atender a op��o feita por todos os alunos e acabam por coloc�-los para cursar os itiner�rios dispon�veis. Sem ter a escolha respeitada, os estudantes t�m 40% das aulas do ensino m�dio em �reas que n�o s�o as de seu interesse, como mostrou reportagem da Folha.
A consulta p�blica institu�da pelo MEC prev� audi�ncias p�blicas, oficinas de trabalho, semin�rios e pesquisas nacionais com estudantes, professores e gestores escolares sobre a experi�ncia de implementa��o do Novo Ensino M�dio em todos os estados.
Impacto e frustra��o
A especialista e consultora em educa��o, Priscila Boy, diz que o impacto da decis�o � enorme, principalmente do ponto de vista operacional. “As escolas, por for�a de lei, foram obrigadas a se reestruturar com prazo definido pelo governo. N�o foi dada a elas a op��o de aderir ou n�o ao novo modelo. Elas tiveram que se organizar, fazer investimentos, reorganizar estruturas curriculares e contratar consultorias.”
Priscila ressalta que ela mesma foi contratada por v�rias redes de ensino para ajudar a desenhar uma nova proposta de carga hor�ria, distribui��o de grade curricular e forma��o dos professores.
Segundo a especialista, a impress�o que passa � de um investimento jogado fora. “Foi feito um investimento econ�mico, emocional, formativo, al�m da expectativa dos alunos. Os professores se desdobrando, comprando cursos, fazendo leituras, desenhando eletivas e agora vem a suspens�o. Soa para a escola como um des�nimo.”
Ela refor�a que a decis�o deixa um clima de inseguran�a, frustra��o, descren�a e de falta de credibilidade. “Ficamos sem entender os reais motivos porque sabemos que por tr�s h� uma grande disputa pol�tica de ver quem assina essa reforma. H� um grupo pressionando o governo para revogar, sem uma proposta na m�o.” Outra consequ�ncia levantada por ela � a possibilidade de uma evas�o em massa no novo ensino m�dio.
A especialista acredita que � necess�rio mudar o modelo de ensino. “Ele est� falido, o mundo mudou. Temos novas tecnologias, perspectivas, postos de trabalho, profiss�es. � necess�rio mudar, mas n�o faz sentido suspender e ficar na expectativa.”
Para ela, o discurso do governo deveria ser de um projeto de reimplanta��o. “Ouvir o que j� foi feito, pegar as experi�ncias exitosas, aperfei�oar o modelo e reimplantar. Soaria melhor que esse discurso de desconstru��o.”
O professor e especialista em educa��o, Jamil Cury, concorda que a decis�o cria, nos estudantes e professores, uma situa��o de desconforto. ‘� preocupante. Estamos no meio de um processo. H� um grupo razo�vel que pede a revoga��o. Trata-se de uma lei que para ser revogada precisa de outra.”
Ele acredita que a decis�o n�o foi a melhor sa�da para solucionar o problema. “Como de h�bito na hist�ria do ensino m�dio no Brasil, a decis�o veio carregada de um elemento de improvisa��o. Acho que ela tem mais uma face pol�tica.”
“Deveria ter havido um evento amplo em que se pudesse discutir alternativas poss�veis para a realiza��o do Enem, talvez de uma forma mais tradicional e, ao mesmo tempo, uma programa��o que levasse em conta as lacunas verificadas na oferta do novo ensino m�dio.”