
Os mecanismos da universidade permitem barrar as fraudes em rela��o aos estudantes terem cursado escolas p�blicas e declarado baixa renda, mas n�o h� como fiscalizar as cotas raciais. Das 6.279 vagas da UFMG, 1.766 (28,2%) foram destinadas � reserva para pretos, pardos e ind�genas que estudaram em escolas p�blicas. “Caso algu�m proceda de acordo com essa conduta reprov�vel, as universidades n�o t�m instrumentos legais para coibir a pr�tica. N�o existe lei que possa amparar a desclassifica��o de algu�m por esse motivo”, afirma o pr�-reitor de gradua��o, Ricardo Takahashi.
Den�ncias de todo o Brasil foram levadas ao Minist�rio P�blico Federal (MPF). A brecha na lei tamb�m foi debatida em audi�ncia p�blica na Comiss�o de Direitos Humanos e Legisla��o Participativa do Senado, em setembro, com a presen�a de representantes do movimento negro que querem tipificar a fraude como crime no C�digo Penal.
Diante da inexist�ncia de fiscaliza��o, o coletivo e outras entidades do movimento negro questionam a autodeclara��o como crit�rio �nico para determinar se algu�m � negro. Os estudantes cunharam o termo “afroconveni�ncia” para designar o uso indevido da autodeclara��o para conseguir vaga em concursos concorridos, como os cursos de medicina das universidades federais. “Queremos destacar que o discurso da afrodescend�ncia e da autodeclara��o tem sido usado de forma conveniente por indiv�duos que nunca se entenderam como negros e que nunca ser�o lidos como tal para burlar um sistema de cotas, que deveria beneficiar um grupo socialmente oprimido e historicamente exclu�do do espa�o universit�rio”, denuncia Laura.
A percep��o � compartilhada pelo estudante da Universidade Federal Fluminense (UFF) Pedro Gomes, que integra o coletivo. Os estudantes iniciaram articula��o nacional para que sejam criados mecanismos para fiscalizar a Lei das Cotas. “Se s� tem 3% de negras e negros e nenhuma pessoa ind�gena na minha turma � porque existem pessoas brancas nestas vagas. Acreditamos que muito se deva �s fraudes nas cotas, j� que as vagas n�o ficam ociosas ou passam a ser disputadas por outras modalidades, como a ampla concorr�ncia”, afirma.
Pedro refor�a a import�ncia das cotas como medidas reparadoras de um processo hist�rico, que impede negras e negros de terem acesso � educa��o, de entrarem no mundo acad�mico e cient�fico. “A lei de cotas operou alguma mudan�a no sentido de que aumentou o percentual de pretos de 5% para 6% e o de pardos de 22% para 25%. Embora tenha essa altera��o, estudos indicam que o c�mpus universit�rio ainda � quase 20% mais branco que a pr�pria sociedade”, afirma Pedro, em refer�ncia ao trabalho “Perfil socioecon�mico do estudante de gradua��o: uma an�lise de dois ciclos completos do Enade (2004 e 2009)”, elaborado por Dilvo Ristoff.
Ele lembra que altera��es foram sentidas nos cursos menos concorridos do vestibular, o que ainda n�o foi percebido nos altamente concorridos, como medicina. “Na medicina, em m�dia, 2% s�o pretos, 18% pardos e 80% brancos, enquanto na sociedade apenas 48% s�o brancos, e isso, mesmo ap�s as cotas.” Para ele, parte dos cursos de medicina viu decr�scimo de pessoas negras.
Com cartazes com as hashtags #AfroConveni�ncia, #FraudenasCotas e #Avaga�Nossa, o NegreX iniciou campanha de den�ncia e combate �s fraudes nas cotas, cobrando que as faculdades abram processos de investiga��o. “Conseguimos um primeiro passo na UFRB e esperamos conseguir mais sucesso por todo o Brasil. Gostar�amos que essas vagas, que foram perdidas, fossem preenchidas por pessoas negras, como seria o justo, embora isso n�o esteja acontecendo. Mas, de qualquer forma, ficamos satisfeitos com o ocorrido, j� que mostra que a lei existe e deve ser cumprida.” A den�ncia da Universidade Federal do Rec�ncavo Baiano (UFRB) foi apresentada no MPF. O coletivo tamb�m publicou carta p�blica, pedindo mais fiscaliza��o para as fraudes. “� preciso mais comprometimento do estado em tipificar os casos de fraude,. Atualmente a vaga � destinada a quem se declara negro, sem nenhum crit�rio avaliativo. Isso possibilita a fraude”, diz Elis�ngela Lima, uma das idealizadoras da campanha nacional.
Fundado durante o 27º Congresso Brasileiro dos Estudantes de Medicina em Belo Horizonte, al�m de questionar a aplica��o da lei, o grupo d� suporte aos estudantes negros nos cursos de medicina, que ainda s�o poucos. “Somos uma coletividade com hist�ria de vida comum mesmo tendo suas especificidades. Decidimos que, mesmo que estiv�ssemos sozinhos em nossas turmas ou at� universidade, n�o estar�amos sozinhos mais. Estar�amos juntos para apoiar uns aos outros, para chorar, alegrar-se e lutar juntos”, afirma Pedro.