
ilagre para salvar a menina.
Natal de 2011. Num canto da sala de dois ambientes na casa de n�mero seis, no Bairro Dona Clara, na Regi�o da Pampulha, sob a mesma �rvore da estrela dourada, Laura � o presente da vida no colo da m�e, Priscila Gibosky, de 34. O pai, Ricardo de Carvalho, de 45, n�o esconde a alegria de ter a filha em casa depois da trag�dia no Anel. No primeiro semestre, em cinco meses de interna��o, foram v�rias as interven��es cir�rgicas. Yuri, o mocinho mais velho da casa, com 10 anos, pausa as estripulias com os amigos para se juntar � fam�lia. Lolla, a mascote malt�s, faz festa para o registro. Retrato de f�, amor e uni�o, que se renova no mais leg�timo esp�rito do renascimento. H� uma luz a mais a cobrir a fam�lia. Laura, de olhos vivos, arrebatadora, parece buscar a lente da c�mera. Linda, de batom, vestida na moda, de cal�a legging fus� preta e camisa vermelha com estampa da Sininho – a Tinkerbell dos dias atuais –, chama a aten��o pela for�a da presen�a, que afasta o clima do nunca. Imposs�vel ficar indiferente aos olhares da menina, que (ainda) n�o anda, n�o fala e pouco se movimenta.
Sentimentos Antes de Laura ganhar a sala, a atmosfera da entrevista de Ricardo e Priscila ao Estado de Minas � uma miscel�nea de sentimentos: dor pela morte de Ana Fl�via, de 2, prima de Laura, que n�o sobreviveu ao acidente; revolta por conta da impunidade nas trag�dias do tr�nsito e o descaso com o Anel Rodovi�rio; tristeza por saber de mocinha t�o ativa ter a vida ao avesso; alegria pelo milagre da sobreviv�ncia; esperan�a pela recupera��o, ainda que lenta; e receio por mais uma cirurgia que se aproxima. A fam�lia acaba de receber a not�cia da necessidade de mais uma interven��o no c�rebro da garota. Uma v�lvula no sistema ventricular. Batalha longa e desgastante pela vida, que n�o afeta o otimismo de Ricardo e Priscila. Advogados de sucesso, ambos foram obrigados a rever a carreira para dar conta de dar aten��o especial �s circunst�ncias. Apesar de a infraestrutura hospitalar 24 horas em casa ser mantida por conv�nio m�dico, os custos descobertos chegam a R$ 6 mil mensais, com alimenta��o, medicamentos e assist�ncia particular.
De todos os sentimentos percebidos em duas horas de conversa, sobressaem o amor e a esperan�a. Priscila � mais for�a. Ricardo � mais sorriso. A m�e respira fundo repetidas vezes e tenta segurar as inquieta��es de quem demonstra amar al�m de todas as contas. N�o se cont�m e desaba uma, duas vezes. O pai, desenvolto, chora por vezes. Sorrindo, derrama l�grimas enxutas pelas costas da m�o. Explica o sentimento de “quebra no tempo e no espa�o”, vivido desde o fat�dico 28 de janeiro. “Primeiro, o choque com a quase morte, o vazio. Depois, o porqu�. A gente tentava entender… por que com a nossa fam�lia? Em seguida, veio a realidade de UTI, com v�rias trag�dias reunidas no mesmo lugar. E a gente unido, lutando contra todas as previs�es. Todo dia sabendo que ela podia morrer e, ao mesmo tempo, comemorando um novo dia”, relata.
Conquistas Ao falar de julho, m�s em que Laura deixou o hospital, voltou para casa e comemorou 5 anos, o advogado abre ainda mais a envergadura do sorriso e fala de dias melhores: “Depois de tudo, uma fase muito boa de motivos de festa por cada conquista”. Comenta as dificuldades encaradas com determina��o por todos os amigos e familiares e considera as incertezas com o futuro trazidas pelo quadro de paralisia cerebral. Priscila reconhece: “N�o � f�cil. Tem dias que falta for�a para sair da cama”. No entanto, fortalecida por nova dose de esperan�a a cada instante, apega-se � f� na recupera��o da filha. “A verdade � que ningu�m sabe nada do c�rebro. As melhoras v�m do pr�prio c�rebro. Os m�dicos acreditam que, como a Laura j� tinha registros quando ocorreu o acidente, a recupera��o seja poss�vel.” Longe dos casados comuns, pai e m�e exibem cumplicidade admir�vel durante toda a conversa. Fazem-se soma e equil�brio: ele f�, ela comunh�o.
H� 17 anos juntos, Ricardo e Priscila fazem dos momentos mais dif�ceis raz�o para crescer. M�o e luva, se amparam para superar a dureza da s�ndrome p�s-traum�tica. Demonstram olhar diferenciado sobre os dramas dos outros e se apegam �s pequenas conquistas di�rias de Laura. “Em todas as fam�lias, voc� vai vendo que cada um tem l� as suas trag�dias”, diz Ricardo, que, daqui para a frente, s� pensa na melhor maneira de trazer Laura para a pr�pria vida como ela �, sem pensar apenas no futuro, vivendo o presente com a maior integridade poss�vel. “Quero ter alegria. Parece que a sociedade, no fundo, quer ver voc� triste. Algumas pessoas se espantam com o m�nimo de alegria preservada em voc�”, lamenta o professor. Muito emocionado, desabafa: “Quero viver o hoje da minha filha. N�o quero mais viver de passado e com medo de n�o t�-la mais”.
Priscila vai at� o andar de cima buscar Laura. No quintal, Yuri � pura energia com os amigos. “Filho, vamos fazer uma foto!”, convoca o pai. O garoto reclama. Natural. N�o quer deixar a farra com os vizinhos. Ali, � tarde de �gua boa sob a chuva fina. Com a chegada de Laura na sala, a cadela malt�s faz festa. A imagem da mocinha na escadaria, no colo de Priscila, parece pintura. M�e e filha num cuidado de dar gosto. A advogada, funcion�ria p�blica licenciada, tem mais vida e luz na express�o de encanto. Deixa de lado qualquer resqu�cio do que � l�gubre para dar espa�o ao que � somente beleza. � preciso repetir: Laura � linda. Olhos profundos cheios de vida por viver. Pele bem cuidada que faz m�nimas as cicatrizes do corpo. Boca vermelha, entreaberta, de quem sabe agradecer em sil�ncio. “No final, pe�a para que todo mundo continue orando por ela”, apela o cora��o da m�e. Do lado de fora, a bicicletinha sem rodinhas ainda espera por Laura, milagre da vida.
A 115km/h, carreta arrastou 14 ve�culos
Era por volta das 18h40 de 28 de janeiro deste ano quando Leonardo Faria Hil�rio (foto), de 24 anos, motorista de uma carreta bitrem Volvo, de Mundo Novo (MS), perdeu o controle da dire��o do ve�culo, carregado com 37 toneladas de trigo, bateu em um caminh�o-ba� e arrastou 14 ve�culos parados no tr�nsito no km 6 do Anel Rodovi�rio, no Bairro Bet�nia, Regi�o Oeste de Belo Horizonte.
Cinco pessoas morreram e 12 ficaram feridas, entre elas Laura Gibosky. A per�cia da Pol�cia Civil apontou que o condutor trafegava a 115 km/h. Depois de passar sob o Viaduto da Via do Min�rio, em alta velocidade, ele se deparou com v�rios carros � sua frente retidos em um congestionamento provocado pelo afunilamento de pista debaixo de um viaduto da linha f�rrea.
O motorista foi preso e na noite de 15 de fevereiro foi solto, depois que o juiz do 1º Tribunal do J�ri do F�rum Lafayette, de Belo Horizonte, Guilherme Queiroz Lacerda, concedeu liberdade provis�ria ao acusado. Leonardo havia sido autuado em flagrante um dia depois do acidente e ficou detido no Centro de Remanejamento do Sistema Prisional, no Bairro Gameleira. Ele aguarda julgamento em liberdade.