

No alto da Rua do Cart�rio, entre a mata de eucaliptos, uma pequena pra�a que serve de retorno e um descampado ermo, a Igreja do Sagrado Cora��o de Jesus passa noites solit�rias na comunidade do Marzag�o, em Sabar�, na Grande BH. Ali perto ficam os sobrados da antiga vila oper�ria erguida para abrigar funcion�rios da primeira tecelagem implantada no local, nos anos 1920. A fragilidade do patrim�nio estadual tombado em museus, igrejas e s�tios hist�ricos de Minas vai muito al�m das 40 edifica��es em 25 cidades onde os sistemas de alarmes deixaram de funcionar por falta de pagamento do programa Minas para Sempre, do Iepha, conforme o Estado de Minas denunciou. Pelo menos outras 84 constru��es hist�ricas em 43 cidades, que deveriam ser protegidos pelo instituto, nunca receberam equipamentos de seguran�a, como ocorre no Marzag�o.
Os 124 pr�dios hist�ricos foram listados no memorando enviado � Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) pedindo refor�o no policiamento, como parte das medidas emergenciais tomadas no �ltimo dia 17 pelo Iepha para refor�ar a vigil�ncia, seja onde o alarme foi desligado ou onde o equipamento nunca foi instalado. Em muitos casos, para preservar os bens, a solu��o foi o bloqueio com tijolos das entradas de algumas edifica��es para impedir saques. Na igreja de Marzag�o, por exemplo, apenas a grade do entorno e os vitrais das portas impedem que imagens como a do Sagrado Cora��o de Jesus sejam levadas. Ainda em Sabar�, a Igreja de Nossa Senhora da Concei��o, na Pra�a Get�lio Vargas, est� desprotegida, porque o alarme foi desligado por falta de pagamento.
Os 84 locais hist�ricos podem ser considerados privilegiados, pelo menos por terem sido alvo de um pedido de refor�o do policiamento. Situa��o pior � a de locais que abrigam pe�as hist�ricas e sacras importantes para comunidades religiosas e que nem sequer t�m expectativa de receber investimentos em seguran�a. Como no Marzag�o, o distrito de Pinh�es, em Santa Luzia, tamb�m na Grande BH, tem um templo importante isolado na pequena comunidade. Ao redor da capelinha em estilo g�tico de Nossa Senhora do Ros�rio, constru�da em 1906, h� apenas um curral, um cemit�rio, a casa paroquial e uma pra�a desolada. N�o h� alarmes nas paredes, sensores de movimento em corredores, trancas sofisticadas nos acessos ou sequer vigilantes. “Estamos completamente vulner�veis aqui. Somos v�timas de assaltos sempre. J� levaram quatro vezes os alto-falantes, roubaram uma bateria e o sistema de som”, lembra a tesoureira da igreja, Aparecida de Jesus Lima, de 55 anos.
As marcas das invas�es podem ser vistas nos acessos do templo isolado. A madeira original da porta lateral ficou lascada de tantos arrombamentos e precisou ser refor�ada com t�buas novas e parafusos. Nas janelas, os p�s de cabra dos arrombadores tamb�m deixaram rombos. “Temos obras importantes para a comunidade, como imagens do in�cio do s�culo 20 e crucifixos usados desde que a capelinha foi constru�da”, afirma.

Contraste na vigil�ncia
As finas portas azuis de madeira talhada em 1818 e as janelas sem vidros foram as barreiras f�sicas deixadas pelo Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha) para servir de seguran�a �s rel�quias da hist�ria colonial mineira abrigadas no Museu Aur�lio Dolabella/Casa da Cultura. Os alarmes e sensores de movimento do pr�dio que fica em Santa Luzia, na Grande BH, ainda n�o foram religados, mesmo com o an�ncio de renova��o de contrato do instituto com as empresas de vigil�ncia que administram os aparelhos, anunciado no dia 17. A situa��o de fragilidade s� n�o � pior porque o munic�pio, a t�tulo emergencial, deslocou quatro seguran�as para o pr�dio. A vulnerabilidade contrasta com a abund�ncia em equipamentos que garantem a paz de imagens e obras tombadas da Igreja Matriz de Santa Luzia, edificada entre 1744 e 1778, a 10 metros do Museu, do outro lado da Rua Direita.
Al�m das trancas, cadeados e barras transversais que fortificam os portais do templo do s�culo 18, no Centro Hist�rico da cidade, foram distribu�dos aparatos de vigil�ncia por todos os acessos e passagens da igreja barroca. S�o seis c�meras internas, nove externas e sete sensores de movimento pelos corredores e escadarias de madeira. Nem as escadarias dos sinos, que se erguem em torres com mais de 10 metros de altura, escapam ao mapeamento a laser dos alarmes. A igreja, tombada pelo munic�pio, tem uma central de seguran�a onde ocorrem os ajustes dos instrumentos e a grava��o das imagens dos circuitos fechados. “A manuten��o e a checagem dos sistemas s�o feitas diariamente. Desde que roubaram todas as imagens do interior da igreja, h� 40 anos, a preocupa��o com seguran�a aumentou muito”, afirma o representante da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Santa Luzia, F�bio J�nio da Silva.
O epis�dio causou muita como��o na comunidade. O templo sem prote��o teve 15 obras tombadas levadas por ladr�es. Foram tr�s anjos barrocos que compunham as decora��es entalhadas nas paredes internas da igreja e 12 imagens de santos, inclusive a pequena Santa Luzia que � alvo de devo��o em v�rias partes do Brasil. Declara��es emocionadas pediram o retorno das pe�as pelos meios de comunica��o da �poca e at� pragas foram lan�adas na tentativa de reaver o material, rogando que “ficassem cegos” os ladr�es da Santa Luzia.

As c�meras e os sensores v�m sendo instalados h� 10 anos e inibiram arrombamentos desde ent�o. Os ataques que o templo sofreu nos �ltimos anos s�o a��es de v�ndalos, como os que atearam fogo a um dos portais, no fim do ano passado, e os rabiscos deixados por pichadores ainda vis�veis em algumas paredes externas.
Seja por f� ou para admirar a arquitetura e a exuber�ncia das constru��es tombadas, turistas e frequentadores apoiam a decis�o de ampliar a seguran�a dos edif�cios e criticam a n�o renova��o dos servi�os. “Infelizmente, hoje, os equipamentos (de vigil�ncia) s�o essenciais. N�o fosse por isso, n�o ter�amos como ver essas belezas da nossa terra, como eram na �poca de sua constru��o”, disse a aposentada belo-horizontina Leda Viegas, de 68 anos, que n�o vinha � Igreja Matriz de Santa Luzia h� 63 anos. “Vim com minha falecida m�e e est� tudo como era antes. Isso � emocionante.” (MP)
Preservar � preciso
Paulo Nogueira
O patrim�nio hist�rico � uma das maiores atra��es tur�sticas de Minas, se n�o for a maior. � essencial que ele esteja devidamente protegido contra ataques de ladr�es e v�ndalos. A melhor solu��o parece mesmo ser a tecnologia, por mais onerosa que seja, porque dificilmente haver� policiais dispon�veis para garantir definitivamente a seguran�a de tantos bens espalhados por todo o estado. Uma boa ideia seria estender um programa que j� funciona em BH para o todo o estado, que � a ado��o de bens culturais por empresas ou institui��es, como j� ocorre com canteiros e pra�as.