Mateus Parreiras

Perder o �nibus na LMG-808, entre Contagem e Esmeraldas, na Grande BH, pode significar mais do que uma espera razo�vel pela viagem seguinte. Ali, �nibus n�o respeitam hor�rios e o intervalo entre as viagens chegam a duas horas. Nos pontos de embarque e desembarque, a passagem de ve�culos de grande porte levanta nuvens de poeira, o que faz moradores levarem panos para limpar o banco do �nibus antes de se sentar. O abrigo n�o � suficiente para proteger do sol ou da chuva. A situa��o ilustra problemas de transporte enfrentados por moradores de localidades mais pobres da Regi�o Metropolitana de BH e que levaram uma parcela da popula��o a organizar protestos por melhorias.
No Bairro Monte Sinai, em Esmeraldas, moradores relatam dificuldades. Eram 13h da �ltima quarta-feira quando o operador de processos Wellington de Souza Dourado, de 35 anos, chegou ao ponto de �nibus do bairro. Queria aproveitar a folga do trabalho para pagar contas em Contagem. Chegou mais cedo que o previsto pelo quadro de hor�rios dos �nibus para n�o ser surpreendido, mas teve de esperar por mais de uma hora para embarcar. “Aqui os �nibus fazem o hor�rio que querem. Se voc� perde uma viagem fica mofando no ponto depois para conseguir outra”, disse.
Antes de descobrir que esperaria por mais de uma hora, o dia parecia de sorte para Wellington. Pouco depois de ele chegar ao ponto, um �nibus da linha 6670 (Novo Retiro/Esta��o Eldorado) apontou na curva ainda distante. O trabalhador fez uma express�o de al�vio, sacudiu o bra�o para o motorista, mas o �nibus n�o reduziu para ele embarcar. Pelo contr�rio: o condutor acelerou para embalar na subida e ignorou o passageiro. “Me janelou!”, reclamou Wellingtou. A g�ria � usada por passageiros quando o �nibus passa direto quando deveria ter parado. “Acontece sempre. A gente pergunta para os motoristas por que fazem isso, mas nenhum deles responde. N�o t�m qualquer considera��o”, diz o passageiro.
Perigo
O tempo passa e quem fica sentado no abrigo tem pouco a fazer. “A gente fica aqui (no ponto) aflito, pensando se vai dar tempo de chegar no banco e pegar a ag�ncia aberta. Se vai voltar antes do jantar para fazer uns trabalhos em casa”, conta Wellington. Apesar de ser uma estrada secund�ria, que leva de Esmeraldas a Nova Contagem, o movimento � intenso. Em uma hora, a reportagem do EM contou 346 ve�culos nos dois sentidos. � como se um carro passasse por l� a cada 10 segundos. A falta de radares e quebra-molas � um dos motivos que levaram moradores de comunidades pr�ximas a interromper a via nos �ltimos dias. “Passa mulher de m�o dada com crian�a, av� carregando netinho no colo e at� boiada. � muito perigoso”, conta o comerciante Alberto Danta Santana, de 66. “Outro dia atropelaram uma crian�a. Ela ficou internada muito tempo e depois morreu”, lembra.
Secretaria prepara projetos
O problema mais grave da Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte � a ocupa��o desordenada dos territ�rios, na opini�o do secret�rio de Gest�o Metropolitana, Alexandre Silveira. “Isso de certa forma � o componente que torna todas as demais demandas mais dif�ceis de ser sanadas. Como levar transportes a �reas distantes e asfaltar ruas que n�o t�m saneamento b�sico? Por isso � a quest�o primordial”, afirma. Uma das formas de resolver isso, de acordo com ele, � fortalecer outras cidades, dando op��es para resolu��o de problemas e servi�os fora da capital mineira. “No vetor Norte isso vem ocorrendo gra�as � Cidade Administrativa, � Linha Verde e ao aeroporto internacional de Confins. Estamos com planejamentos para fazer o mesmo no Vetor Oeste, (Ribeir�o das Neves, Esmeraldas, Contagem e Betim), Leste (Ravena, Caet�) e Sul (Nova Lima).”
A secretaria prop�e ainda outros dois projetos. Um deles � o Trem, que pretende aproveitar ramais ferrovi�rios entre Divin�polis e Sete Lagoas, BH e Brumadinho, al�m de Betim e Contagem. Este �ltimo pode sair no ano que vem, dependendo de acordo com o governo federal em reuni�o marcada para amanh�. A transfer�ncia ao estado dos servi�os de recebimento de lixo tamb�m est� acertada entre as 13 maiores cidades da Grande BH e deve ter as primeiras licita��es at� o fim deste ano.
Procuradas, as prefeituras de Ribeir�o das Neves, Esmeraldas e Contagem culpam administra��es anteriores por boa parte dos problemas. No caso do Bairro Tup�, a Prefeitura de Contagem informa que acelerou o projeto de constru��o de posto de sa�de previsto no or�amento participativo de 2009. Sem saneamento pela Copasa, n�o h� como o munic�pio asfaltar as ruas. A Copasa, por sua vez, informa estudar interven��es para o local. No caso do Bairro Santana 2, em Ribeir�o das Neves, a companhia afirma que os reparos necess�rios foram feitos no esgoto da Rua 1 e que haver� vistorias. A prefeitura informa que a coleta � regular, mas que os moradores n�o colaboram e espalham o lixo de forma desordenada. O munic�pio informa estar pleiteando verbas federais para asfaltamento na comunidade.
A Prefeitura de Esmeraldas afirmou que aguarda os planos de saneamento da Copasa para asfaltar o Bairro Palmital. De acordo com a Secretaria de Estado de Transportes e Obras P�blicas, os intervalos a que os passageiros t�m sido submetidos na LMG-808, que chegam a quase duas horas, s�o justific�veis pela demanda, considerada pequena. As condi��es dos abrigos e pontos de embarque e desembarque ser�o analisadas. A secretaria espera que com a implanta��o do sistema BRT e das esta��es metropolitanas haja maior comodidade e efici�ncia no transporte metropolitano.

H� dois anos, a dom�stica Alzerina Maria Gomes, de 70 anos, perdeu o marido, Orlando. Moradora do Bairro Tup�, em Contagem, ela conta que a sa�de dele piorava ao longo dos anos at� que, sem acompanhamento m�dico, sentiu uma pontada no peito e come�ou a passar mal. “Foi uma correria danada e ningu�m para acudir meu marido. N�o tem posto de sa�de aqui e na unidade (de sa�de da fam�lia) n�o tinha m�dicos nem enfermeiras”, lembra. “Meu marido morreu dentro de casa. Mas o nosso choro n�o serviu para mudar nada. Para conseguir atendimento, s� com �nibus ou carona at� o Centro de Contagem ou bairros por perto”, reclama Alzerina, que � hipertensa e asm�tica.
Desde 2009, os habitantes do Bairro Tup� esperam pela constru��o de um posto de sa�de, que foi proposta vencedora do or�amento participativo de 2009. O terreno est� pronto, dentro da �rea da escola municipal. Como o projeto ainda n�o saiu do papel, a popula��o recorre ao atendimento de uma unidade de sa�de da fam�lia, onde ficou combinado que o m�dico iria duas vezes por semana. Na �ltima quarta-feira, quando a reportagem esteve no bairro, ningu�m prestava atendimento. Segundo os pacientes, nenhum profissional apareceu durante a semana.
Debilitada por conta de insufici�ncia renal cr�nica, a dona de casa Maria das Gra�as Gon�alves, de 61, n�o consegue mais subir a ladeira entre sua casa e o ponto de �nibus que a levaria para fazer hemodi�lise no Bairro Eldorado, tamb�m em Contagem. Como as condi��es dela s�o delicadas e n�o h� m�dicos no posto de sa�de, a solu��o foi a Secretaria Municipal de Sa�de de Contagem treinar o marido dela para fazer a hemodi�lise em casa. Jos� Fernandes Gon�alves, de 68, trata da mulher com cuidado, mas Maria das Gra�as, que faz o tratamento deitada na cama do casal, acredita que seria importante ter atendimento especializado. “Aqui tinha de ter m�dicos para acompanhar a gente de perto”, cobra.
Palavra de especialista
Conurba��es s�o problema
Paulo Eduardo Borges
Professor do Cefet e doutorando em an�lise ambiental pela UFMG
“Temos uma evolu��o sanit�ria consider�vel na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, mas h� locais onde a situa��o � de calamidade, principalmente em Ribeir�o das Neves e em Esmeraldas. Como n�o houve planejamento para a ocupa��o dos terrenos, n�o h� tamb�m estruturas como saneamento b�sico e servi�os como transporte e sa�de. Apesar da evolu��o no saneamento b�sico, estamos distantes de uma posi��o razo�vel no que diz respeito ao tratamento do esgoto lan�ado. As conurba��es s�o outro grave problema na RMBH: uma cidade emenda na outra e ningu�m sabe a qual prefeitura deve recorrer para fazer reivindica��es.”