
Arinos, Bonfin�polis de Minas, Buritis, Dom Bosco, Formoso e Urucuia – Do ch�o alaranjado e duro n�o brota mais nem mato. O que desponta do solo – restos de troncos retorcidos e podres, que lembram l�pides em um cemit�rio �rido – s�o os �ltimos vest�gios da mata de cerrado. As chuvas, que irrigavam a terra durante um per�odo de seis meses no passado, j� n�o gotejam por mais do que quatro meses. Nascentes morreram, c�rregos se tornaram intermitentes e a escassez de �gua seguiu seu curso atingindo os meios rural e urbano. Mas o cen�rio n�o fica no semi�rido Norte de Minas, onde a seca j� � parte da vida do sertanejo. Por incr�vel que pare�a, o terreno est�ril pertence ao Noroeste, regi�o ainda considerada um dos celeiros do estado, por ser a maior produtora de gr�os de Minas. A �rea desolada descrita acima, em Buritis, a 750 quil�metros da capital mineira, � apenas uma amostra dos 180 mil hectares de terras que j� foram f�rteis, mas que, de acordo com especialistas, por causa de mudan�as clim�ticas e do manejo n�o sustent�vel, entraram em processo de desertifica��o, espalhando a mancha da sede pelo mapa mineiro. � como se uma �rea equivalente a cinco vezes e meia a extens�o de Belo Horizonte se tornasse incapaz de sustentar a vida.
Pelo mapeamento por imagens de sat�lite no computador, o coordenador do Comit� de Bacias Hidrogr�ficas (CBH) do Rio Urucuia, Julio Ayala, aponta a expans�o de terrenos arenosos, pedregosos e est�reis em �reas onde h� d�cadas se destacavam grandes pol�gonos verdes de monoculturas como soja, milho e feij�o. “Dentro da Bacia do Rio Urucuia temos 600 mil hectares nos quais a produ��o n�o � sustent�vel e degrada o solo com o tempo. Desses, pelo menos 30% (180 mil hectares) j� sofrem algum est�gio de desertifica��o”, atesta Ayala, engenheiro-agr�nomo e consultor do comit� que prop�e e fiscaliza as pol�ticas h�dricas em um dos dois rios mais importantes da regi�o – o outro � o Rio Paracatu.
Segundo o professor de geografia f�sica da USP Jos� Bueno Conti, que tem livre-doc�ncia em desertifica��o em �reas tropicais, o Noroeste de Minas est� na periferia do semi�rido e � uma regi�o classificada como sub�mida. Esses dois tipos de clima s�o os mais propensos � desertifica��o. “Verificamos naquela regi�o um per�odo de estiagem estendido e severo. Quando h� prolongamento da seca por dois ou tr�s anos, como vem ocorrendo, os sistemas hidrol�gicos e geol�gicos (solos) e todo o ecossistema podem entrar em colapso e desencadear o processo de desertifica��o”, explica.
Mais grave do que na �rea da sudene
Entre 2003 e 2011, a m�dia de decretos de estado de emerg�ncia devido � estiagem no Noroeste de Minas era de tr�s por ano. No ano passado a quantidade mais que dobrou, chegando a sete. De acordo com a Ag�ncia Nacional das �guas (ANA), 68,4% das cidades do Noroeste precisar�o ampliar seus sistemas de capta��o de �gua at� 2015 ou enfrentar�o desabastecimento. O �ndice � pior do que o registrado pelos munic�pios da �rea mineira da Superintend�ncia do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), 64,8% dos quais ser�o obrigados a aumentar a capacidade de produ��o h�drica nos pr�ximos dois anos.
Apesar disso, como o Noroeste de Minas n�o se encontra na �rea formal do semi�rido brasileiro, os munic�pios n�o t�m acesso a incentivos garantidos �s prefeituras integrantes da �rea da Sudene, nem aos projetos do Programa de A��o Nacional de Combate � Desertifica��o e Mitiga��o dos Efeitos da Seca (PAN) ou � sua vers�o estadual, o PAE/MG.
Mas engana-se quem pensa que o avan�o da desertifica��o tem impactos apenas sobre esses munic�pios. As consequ�ncias v�o muito al�m. “Esse processo tem impactos em sistemas mais abrangentes e complexos, como no assoreamento do Rio S�o Francisco”, alerta o coordenador do CBH do Rio Urucuia, Julio Ayala.
O Urucuia, junto com o Paracatu e o Rio das Velhas, comp�e a lista dos principais afluentes do Velho Chico. Quando chove na �rea da bacia em processo de desertifica��o, a �gua corre diretamente para os cursos d’�gua, carreando detritos e assoreando os leitos. Se tivesse sido retida pela vegeta��o, a chuva penetraria lentamente no solo e recarregaria os len��is fre�ticos ou aqu�feros. Esses reservat�rios subterr�neos, quando cheios, liberam o conte�do aos poucos, permitindo que c�rregos e ribeir�es corram durante a seca e mantendo a regi�o �mida e com evapora��o di�ria. “A �gua que n�o penetra no solo sai do sistema. N�o forma mais chuvas naquela regi�o. Por isso ocorre a seca, a diminui��o dos meses de chuvas e da intensidade das precipita��es”, aponta Ayala.