Valquiria Lopes

Eles passam o dia perambulando de um canto para o outro. Deitam, se levantam, fumam guimbas de cigarro, brigam entre si, cheiram solvente de tinta e usam drogas em via p�blica. As m�os que carregam garrafas com o t�ner s�o as mesmas que recebem moedas de pessoas que passam pela rua, ainda que sob a press�o de uma amea�a, nem sempre velada. Apesar da pouca idade, crian�as e adolescentes que frequentam diariamente a Pra�a Tiradentes, no cruzamento das avenidas Afonso Pena e Brasil – duas das mais importantes da Regi�o Centro-Sul – j� s�o alvo de a��es policiais e interven��es do servi�o social. Quem mora ou trabalha no entorno reclama dos constantes inc�modos que eles causam. Os problemas v�o desde a sujeira deixada no espa�o que ocupam at� ocorr�ncias de furtos e roubos, e parecem longe de solu��o, j� que os menores, mesmo depois de v�rias abordagens, permanecem na rua. Fazem parte do mesmo grupo que migrou da Savassi e da Pra�a Hugo Werneck, na regi�o hospitalar, locais que tamb�m costumam frequentar esporadicamente.
De acordo com a Pol�cia Militar e a Prefeitura de Belo Horizonte esses meninos e meninas t�m hist�rico de perambular pela Regi�o Centro-Sul, geralmente se aglomerando em pra�as, onde passam boa parte do dia. Alguns somem durante a noite, enquanto outros dormem ao relento. Somente em setembro, 56 adolescentes em situa��o de rua foram abordados na regional por equipes da Secretaria Municipal Adjunta de Assist�ncia Social. “Eles s�o atrevidos, entram nos com�rcios e dizem que, se o dono n�o der o que pedem, v�o roubar. Eu j� vi pessoas sendo assaltadas por alguns. Al�m disso, fazem bagun�a, deixam sujeira por todo lado e intimidam quem passa. Ligo para a pol�cia todos os dias, v�rias vezes, para reclamar”, diz o designer Rodrigo Canedo, morador da Rua Aimor�s, no quarteir�o da Pra�a Tiradentes.
Intimidados, comerciantes dizem preferir “n�o comprar briga” para n�o serem amea�ados. “Eles ficam na porta da minha banca todos os dias e, pela forma como agem com as pessoas que passam aqui, acabam por espantar os clientes”, diz Saulo Ribeiro Dantas, de 51, dono da Banca Tiradentes, na pra�a. Cansada de sofrer com as amea�as dos menores, a empres�ria Cl�udia Vergolino, dona de uma loja de chocolates na Avenida Brasil, contratou um seguran�a para vigiar o estabelecimento. “Os meninos simplesmente entravam e perguntavam aos outros, do lado de fora, qual chocolate iam querer. E pegavam, porque parece que o doce acalma, j� que cheiram muito t�ner. Eu e as funcion�rias fic�vamos olhando, sem saber o que fazer”, afirma. Ela conta que a situa��o melhorou depois da contrata��o do servi�o particular, mas reclama de ter que pagar pela seguran�a, al�m de afirmar que os meninos continuam intimidando quem passa na rua. “� uma situa��o que s� atrapalha o com�rcio”, diz.
REIVINDICA��O Mesmo antes de abrir as portas do novo ponto na Pra�a Tiradentes – um restaurante com almo�o e happy hour – os empres�rios Victor Costa, de 29, e Mariana Bouchardet, de 30, j� reclamam da conduta dos menores. “A pra�a � um ambiente agrad�vel, onde as pessoas descansam na pausa do trabalho ou quando est�o passando. Mas s�o tantos menores de rua que afastam outras pessoas porque est�o sempre sujos e amea�ando os pedestres”, afirma Mariana. Segundo Victor, mais de mil assinaturas foram recolhidas em uma abaixo-assinado para que um posto policial seja instalado na pra�a. O documento foi encaminhado � PM e a resposta est� sendo aguardada. Victor diz ainda que os policiais refor�aram o patrulhamento e sempre aparecem quando chamados, mas ele defende que a presen�a precisa ser constante.
No lugar, nem mesmo o carrinho de balas passa despercebido. “Se eu der bobeira, eles levam, porque j� chegam metendo a m�o”, diz o ambulante Jacir Ferreira, de 48, que vende doces na Pra�a Tiradentes. Funcion�rios de empresas do entorno tamb�m reclamam. “N�o d� mais para passar a hora de almo�o na pra�a, porque eles pedem dinheiro ou at� um picol� que estamos chupando. N�o quero ser preconceituoso. S� acredito que esses meninos precisam de atendimento social.”
Pol�cia vai cadastrar grupos
Meninos e meninas de rua que circulam pela Regi�o Centro-Sul v�o fazer parte de um cadastro da Pol�cia Militar. A iniciativa de recolher dados, fotografar e conhecer o hist�rico de cada um foi motivada pelas constantes reclama��es de comerciantes e vizinhos das �reas onde eles costumam ficar. De acordo com comandante da 4ª Companhia da PM, major Marcelo de Castro Machado, o mapeamento dos menores e dos adultos que vivem nas ruas ser� apresentado aos comerciantes dos bairros da �rea de abrang�ncia da companhia. Na ocasi�o, a PM vai mostrar ainda aos empres�rios um projeto especial para melhorar a sensa��o de seguran�a na regi�o que compreende a Savassi, os bairros de Lourdes e Funcion�rios e parte da Regi�o Central. “� um programa inovador. Uma rede de prote��o aos comerciantes. Isso se reflete em toda a popula��o”, afirma o major.
Ele diz que as primeiras informa��es sobre adolescentes de rua mostram que muitos t�m fam�lias na capital. Entre os maiores de idade abordados, segundo o comandante, muitos n�o s�o de BH. “Eles sempre preferem locais de grande movimenta��o de pessoas e est�o sempre se deslocando de um lugar para outro, o que faz com que a PM tamb�m se desloque para refor�ar a seguran�a”, diz o policial. Segundo ele, o n�mero de menores diminuiu na Savassi ap�s uma a��o para desocupar uma casa invadida, mas eles ainda retornam eventualmente � regi�o.
A dificuldade de restabelecimento dos v�nculos familiares ou de ades�o aos servi�os sociais oferecidos pela equipe Especializada de Abordagem Social nas Ruas da Prefeitura de Belo Horizonte ainda � entrave para a sa�da dos meninos e meninas das ruas da Centro-Sul. Dos 56 adolescentes abordados em setembro na regi�o, apenas 24 t�m rela��o mais pr�xima com o servi�o. Quando o v�nculo � estabelecido, eles recebem orienta��es que come�am pela an�lise da possibilidade de retorno ou aproxima��o com a fam�lia, participa��o em projetos sociais, acolhimento nos centros de passagem e a��es em busca de alternativas para outros projetos de vida. Todos os casos s�o notificados aos conselhos tutelares e informados ao servi�o social das regionais de origem ou aos conselhos tutelares das cidades de origem.
Os caminhos dos menores de rua na Centro-Sul
Pra�a da Savassi – A regi�o passou a conviver com onda de medo, depois que moradores de rua passaram a frequentar um casar�o abandonado na Rua Rio Grande do Norte, ao lado de um pr�dio tamb�m vazio, no n�mero 1.008. O im�vel foi invadido por cerca de 20 moradores de rua e viciados em crack, entre maiores e menores de idade, que estariam arrombando lojas de madrugada. Em maio de 2102 a PM montou opera��o para desocupar a casa.
Pra�a Hugo Werneck – Com a expuls�o da Savassi, a pra�a da regi�o hospitalar, �rea de intensa movimenta��o de pessoas, passou a ser ponto de menores de rua, que abordavam pedestres, cheiravam t�ner e se envolviam em furtos e roubos. Depois de muitas reclama��es, uma base da PM passou a ficar durante todo o dia no local para controlar a onda de criminalidade.
Pra�a Tiradentes – Comerciantes relatam que a popula��o de rua, historicamente presente no local, aumentou com a aglomera��o maior de crian�as e adolescentes. Segundo queixas de lojistas e pedestres, eles passam o dia cheirando t�ner, pedindo dinheiro e intimidando quem passa pela regi�o. De acordo com moradores e com a Pol�cia Militar, h� envolvimento de alguns em crimes.