
Oito anos e seis meses � o tempo m�dio que processos de homic�dios demoram para ser julgados no Brasil, de acordo com um levantamento feito pela Secretaria da Reforma do Judici�rio do Minist�rio da Justi�a (SRJ/MJ). Para quem espera por uma resposta, oito anos e seis meses s�o uma eternidade. A argentina Silvia Vergara ainda n�o alcan�ou essa m�dia. A espera dela por justi�a dura “apenas” dois anos, um m�s e 22 dias, desde que, no dia 10 de fevereiro de 2013, sua filha, Maria Silvina Val�ria Perotti, foi assassinada em Belo Horizonte. Val�ria, como � chamada pela m�e, estava gr�vida de seis meses quando o crime ocorreu. Nesta ter�a-feira, o Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (TJMG) anunciou que parte da espera de Silvia acabou. O ex-marido da v�tima, Jos� Ant�nio Mendes de Jesus, foi oficialmente acusado pelo crime e ir� a j�ri popular. A not�cia foi recebida com l�grimas, mas ainda acompanhada por um forte sentimento de impunidade, uma vez que o acusado ir� responder ao processo em liberdade. “Me sinto muito, muito mal com isso. � como se ele se livrasse de tudo. Est� solto e vive sua vida como se nada tivesse acontecido. S� vou ter paz quando ele for condenado”, lamenta.
Jos� chegou a ficar preso no Ceresp S�o Cristov�o por dois dias e foi liberado. O juiz Carlos Roberto Loyola entendeu que a pris�o dele n�o teve fundamento em provas da autoria na morte da empres�ria. No inqu�rito, o delegado Frederico Abelha tamb�m n�o pediu a pris�o, mesmo tendo plena convic��o da autoria.
“Eu j� n�o estava acreditando mais na Justi�a”, desabafa Silvia ao descobrir a decis�o da ju�za sumariante do 2º Tribunal do J�ri do F�rum Lafayette, �malin Aziz Sant’Ana. Apesar de estar em liberdade, Jos� Ant�nio responde pelo homic�dio duplamente qualificado e por tentativa de aborto. A ju�za considerou os depoimentos de duas testemunhas que estavam presentes na cena do crime e, al�m de reconhecerem o acusado, alegaram ter visto apenas duas pessoas no carro em que ocorreu o disparo. No relato do crime � Pol�cia Militar, o acusado disse ter sido abordado por dois assaltantes quando ia ao supermercado com a esposa e que eles teriam sido respons�veis pelo crime.
A diverg�ncia entre os relatos de Jos� e das testemunhas trouxe � argentina esperan�a de que o suspeito seria preso e responderia rapidamente pelo crime. “Eu me decepcionei com o fato de a Justi�a ter demorado tanto e deix�-lo em liberdade com todas as provas que tem contra ele. Achava que ela era melhor no Brasil do que na Argentina, mas agora? Tenho minhas d�vidas. As evid�ncias s�o claras”, afirma.
A falta de data para o julgamento tamb�m decepciona. Por ser de primeira inst�ncia, a decis�o de levar o acusado a j�ri ainda cabe recurso. Segundo o levantamento feito pela SRJ/MJ, a fase mais problem�tica dos processos � exatamente agora, entre a decis�o do juiz de primeiro grau, de levar o julgamento ao j�ri, e a realiza��o do j�ri propriamente.

O desejo por justi�a � n�o s� por ela, mas tamb�m pelo pequeno Mateus Santiago, de dois anos, um m�s e 22 dias, segunda v�tima do atentado contra a vida de Val�ria Perotti. O beb�, que � criado pela av� na capital argentina, foi salvo por uma equipe de resgate por meio de uma ces�rea de emerg�ncia. Ele sobreviveu ao trauma e aos tr�s meses de interna��o na UTI Neonatal do Hospital J�lia Kubitschek, em Belo Horizonte, e � considerado um milagre pela av�/m�e.
“Tudo na minha vida mudou para o Mateus. Tudo � para ele e com ele. Hoje, tenho que me adaptar �s necessidades dele”, conta. Divorciada, ela vivia sozinha e levava uma vida independente. Ser a �nica respons�vel por um beb� prematuro foi uma grande reviravolta. Mudan�as na rotina como acordar de madrugada, alimentar e trocar fraldas foram as menores na vida dela. “Esse tempo foi dif�cil, sempre pensando que a Val�ria tinha que estar no meu lugar. Mas � ela quem me d� for�as para seguir. Acredito que ela est� com sua luz, nos iluminando para tudo dar certo”, confessa.
Morosidade
A demora para a conclus�o do processo levou Silvia a criar um grupo no Facebook pedindo apoio para a resolu��o r�pida do caso. “Quem comete tal crime n�o pode estar em liberdade convivendo em sociedade, sob nenhum pretexto. � incompreens�vel como uma pessoa que cometeu uma aberra��o como essa n�o esteja sob cust�dia”, diz o perfil.
O inqu�rito sobre o homic�dio foi encerrado um ano e dois meses depois do caso. O delegado Frederico Abelha aponta as burocracias como os fatores que postergaram as apura��es. “O juiz que fez o alvar� de soltura e deu a liberdade provis�ria a ele requisitou que o pai biol�gico do filho mais velho dela (Maria Perotti), e o filho mais velho fossem ouvidos. Eles moram no interior do estado de S�o Paulo e para ouvi-los dependemos de libera��o de verba, e isso demora. Tamb�m houve quebra de sigilo e algumas medidas cautelares que �s vezes demoram”, concluiu.
Relembre o caso
O crime aconteceu em fevereiro de 2013, no Bairro Calafate, Regi�o Oeste de Belo Horizonte. Maria Silvina estava no sexto m�s de gesta��o quando foi baleada na cabe�a e jogada em um lote vago. Duas testemunhas disseram � Pol�cia Militar que havia duas pessoas no carro quando ela foi baleada e jogada na rua. Uma delas garantiu ter visto Jos� Ant�nio pegar a arma na parte traseira do carro. Outra testemunha disse que o suspeito pegou a mulher pelo pesco�o, encostou a arma no queixo dela, disparou dois tiros e fugiu.
� pol�cia, Jos� Ant�nio disse que ele e a mulher estavam a caminho do supermercado e o Gol que ele dirigia foi fechado por dois homens numa moto. Segundo ele, Maria Silvina foi baleada e jogada para fora do carro e um dos ladr�es teria seguido com ele no carro, acompanhado de um segundo assaltante de moto. Val�ria, como era mais conhecida, chegou a ser atendida pelo Samu, que por meio de uma cesariana de emerg�ncia conseguiu salvar o beb�. O garoto Mateus Santiago, filho da empres�ria argentina, deixou o Hospital J�lia Kubitschek depois de ficar internado por tr�s meses e sete dias na UTI neonatal da unidade de sa�de.