
O parecer favor�vel do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), � descriminaliza��o da posse de drogas para uso pessoal divide a opini�o dos �rg�os ligados � seguran�a p�blica e ao Judici�rio em Minas Gerais e pode ter efeito sobre mais de 4 mil processos relacionados ao artigo 28 da Lei de Drogas. As a��es s�o referentes ao consumo de entorpecentes e est�o ativas no Juizado Especial de Belo Horizonte, segundo dados do Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (TJMG). Se a descriminaliza��o for aprovada pela maioria dos magistrados, especialistas acreditam que esses autos seriam extintos. Entretanto, alguns ju�zes acreditam que sejam necess�rias maiores explica��es do STF para definir o futuro dos processos. Outro par�metro do TJMG que permite medir o tamanho do consumo de drogas na capital mineira � a apreens�o de mais de 8 mil jovens de at� 17 anos nos �ltimos seis anos em BH por esse crime, o que significa uma m�dia de tr�s adolescentes conduzidos todos os dias para a delegacia, flagrados usando ou portando entorpecentes para uso pessoal.
A aprecia��o do STF sobre a descriminaliza��o do uso de drogas foi motivada por um recurso da Defensoria P�blica de S�o Paulo, que chegou � Suprema Corte em 2011. O �rg�o representa um presidi�rio flagrado em 2009 com 3 gramas de maconha dentro da cela, condenado pelo uso de drogas a prestar servi�os comunit�rios enquanto j� cumpria pena por assalto � m�o armada, recepta��o e contrabando. O advogado de Francisco de Souza alegou que ningu�m pode ser punido por ser usu�rio de subst�ncias il�citas, j� que esta seria uma quest�o de foro �ntimo. O ministro Gilmar Mendes, que � o relator do caso no Supremo, foi o �nico a votar at� agora e deu provimento ao recurso da Defensoria, entendendo que a criminaliza��o estigmatiza o usu�rio e compromete medidas de preven��o e redu��o de danos.
“Tenho que a criminaliza��o da posse de drogas para uso pessoal � inconstitucional, por atingir, em grau m�ximo e desnecessariamente, o direito ao desenvolvimento da personalidade em suas v�rias manifesta��es, de forma, portanto, claramente desproporcional”, argumentou o magistrado, em apenas uma das passagens de seu voto, que tem 56 p�ginas. O julgamento foi interrompido com o pedido de vistas do processo pelo ministro Edson Fachin e ainda n�o tem previs�o de ser retomado. Restam 10 membros da corte para emitirem seus pareceres sobre o tema.
O major Gilmar Luciano, chefe da Sala de Imprensa da Pol�cia Militar, diz que, se acompanhado pela maioria dos ministros, o entendimento de Gilmar Mendes seria negativo para a sociedade. “Se isso acontecer, a PM n�o faria mais a repress�o, preven��o e condu��o dos usu�rios de drogas. O problema de outros crimes praticados por conta do uso, como pegar um carro depois de fumar maconha, atropelar e matar uma pessoa, n�o seria resolvido”, afirma o militar.
O pensamento � o mesmo do promotor de Justi�a Jorge Tobias de Souza, coordenador da Coordenadoria de Combate e Repress�o ao Tr�fico Il�cito de Subst�ncias Entorpecentes do Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG). “Nossas leis antidrogas se preocuparam com o problema da sa�de p�blica. O que a lei quer coibir � justamente a facilidade de acesso, que pode aumentar a depend�ncia. Se o artigo 28 for considerado inconstitucional, a Pol�cia Militar n�o ter� mais o que fazer no momento em que uma pessoa estiver usando drogas, por exemplo, na frente de uma crian�a. Al�m disso, muitas vezes a porta de entrada para um tratamento � essa abordagem, que acaba revelando o problema para a fam�lia”, afirma o promotor.
DETERMINA��ES J� o presidente da Comiss�o de Assuntos Penitenci�rios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Adilson Rocha, prev� a extin��o de processos no Juizado Especial e considera como positiva uma poss�vel descriminaliza��o, pois serviria para acabar com o estigma de que um usu�rio de drogas � um criminoso. “Quem usa drogas pode ser considerado um dependente ou uma pessoa que carece de cuidados e de tratamento, mas ele n�o �, definitivamente, um criminoso”, afirma.
A ju�za Anna Carolina Goulart, do Juizado Especial de Belo Horizonte, avalia que s�o necess�rios mais esclarecimentos do STF. “Apesar de propor a retirada da ‘natureza penal’ das medidas aplicadas, que passariam a ter apenas ‘natureza civil’ e administrativa, (o ministro) prev� a notifica��o do usu�rio para comparecer diante de um juiz para ser determinada qual medida mais adequada a se cumprir”, diz a magistrada. Ela considera cedo para antecipar a solu��o a ser dada aos processos em tramita��o junto aos Juizados Especiais.
Tr�s adolescentes s�o apreendidos por dia
Todos os dias, tr�s adolescentes s�o levados ao Centro de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional de Belo Horizonte (Cia-BH) pelo porte de drogas para uso pessoal. Os dados s�o disponibilizados pelo Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (TJMG) e levam em considera��o o per�odo fechado entre 2009 e 2014, somando mais de 8 mil condu��es nesse intervalo. No primeiro dos seis anos analisados, esse tipo de ato infracional ocupou o primeiro lugar no ranking das raz�es que levam os jovens da capital � delegacia. Entre 2010 e 2012, o uso de drogas ficou em segundo, perdendo para o tr�fico. J� nos dois �ltimos anos, esse crime figurou na terceira posi��o, perdendo tamb�m para o roubo.
A ju�za Val�ria Rodrigues, titular da Vara Infracional da Inf�ncia e da Juventude de Belo Horizonte, diz que esse n�mero � bem maior, j� que ela considera que 99% dos adolescentes apreendidos por tr�fico tamb�m s�o usu�rios. A magistrada avalia que uma descriminaliza��o do uso seria um caos para a sociedade, pois os efeitos seriam muito ruins para a sa�de p�blica. “Entendo que essa situa��o fecharia oportunidades de tratamento. A maconha, por exemplo, � uma porta de entrada para drogas mais pesadas. Descriminalizar � negar oportunidades de tratamento que entre 80% e 90% dos casos s�o dadas pela primeira vez quando os adolescentes chegam Do Cia-BH”, afirma a ju�za.
Para o psiquiatra Frederico Garcia, que coordena o Centro de Refer�ncia em Drogas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), esse processo possui dois lados. “De um lado, n�s vamos ajudar a Justi�a a ficar mais justa. Por outro, com o aumento da percep��o de seguran�a em rela��o ao consumo da droga, mais pessoas v�o experimentar por achar que n�o tem repress�o, e com isso teremos mais dependentes no futuro”, diz o m�dico. (GP)
EFEITO DAS DROGAS
4.177
Processos ativos no Juizado Especial de Belo Horizonte referentes ao uso de entorpecentes
A descriminaliza��o do uso das drogas � positiva?
Adilson Rocha
Presidente da Comiss�o de Assuntos Penitenci�rios da OAB nacional
SIM
Acho que a descriminaliza��o � positiva, porque a posse de uma pequena quantidade de subst�ncia para o consumo pessoal, definitivamente, n�o pode ser considerada uma conduta criminosa. Tanto que j� h� o entendimento de que a pena n�o � privativa de liberdade. Por�m, � necess�rio que o pr�prio STF ou o Congresso Nacional determinem par�metros para diferenciar o uso do tr�fico em caso de aprova��o da descriminaliza��o, para n�o criar problemas para os policiais de todo o pa�s na hora da abordagem de pessoas suspeitas.
Major Gilmar Luciano
chefe da sala de imprensa da Pol�cia Militar
N�O
A Pol�cia Militar n�o � a favor da descriminaliza��o por conta dos efeitos sociais causados pelo uso das subst�ncias psicotr�picas. O uso das drogas leva � pr�tica de outros crimes, e essa decis�o serviria apenas para redu��o das estat�sticas do consumo, o que n�o significa que os demais crimes relacionados diminuiriam. Toda subst�ncia que tire a capacidade cognitiva da pessoa � nociva � vida saud�vel em sociedade.