“Defender quem faz isso com uma adolescente desacordada � ser estuprador tamb�m. As pessoas n�o t�m o direito de culpar algu�m que n�o deu consentimento”, revolta-se a jovem J.A., de 21 anos, referindo-se � menina do Rio, de 16, que apareceu desmaiada, seminua, em v�deos divulgados na internet por alguns de seus 33 estupradores, que se vangloriavam do ato nos filmes. Ela sabe bem o que est� dizendo. Durante a vida inteira, a estudante escondeu de si mesma e da fam�lia de que foi seguidamente violentada por um tio, desde os 4 anos at� por volta de 14. “Vivi no sil�ncio, carregando uma culpa que n�o era minha”, conta a mo�a, at� que, ano passado, entrou em depress�o grave, com tend�ncia suicida.
No mundo inteiro, meninas e adolescentes sofrem as consequ�ncias da viol�ncia sexual contra mulheres, que precisa ser denunciada e combatida, defende a m�dica psiquiatra Gislene Valadares. Entre as consequ�ncias para as v�timas, est�o doen�as org�nicas e psicol�gicas, como depress�o, ansiedade, ins�nia, nervosismo e s�ndrome do p�nico. “� um evento dif�cil, traum�tico e humilhante na vida de uma mulher, mas na medida em que ela percebe que o problema n�o � s� com ela, ela poder� ressignificar outros aspectos de maior import�ncia na sua vida”, completa, lembrando que a viol�ncia sexual � infinitamente mais praticada contra a mulher, em cerca de 90% dos casos.
“Ser mulher n�o � f�cil. Minha impress�o � de que a gente n�o � dona do pr�prio corpo, de que nossa cultura foi constitu�da da maneira em que a mulher foi criada para servir”, compara a integrante do coletivo feminino, que j� re�ne mais de 50 mulheres presencialmente e mais de 1,5 mil em um clube aberto no Facebook. “Somos chamadas de radicais, mas aos poucos vamos conseguindo uma abertura maior, at� entre professores. A pr�pria exist�ncia do coletivo inibe muita coisa no c�mpus”, diz J.A., lembrando o estupro coletivo registrado na UFMG.
A doutoranda em ci�ncia pol�tica Clarisse Goulard Paradis defende que a cultura do estupro � disseminada na sociedade. “� a estrat�gia patriarcal de controle do corpo da mulher. Existe uma classifica��o da mulher santa e da puta. A mulher � vista como coisa, objeto e n�o como sujeito”, diz. Para a doutoranda, que empreende pesquisa sobre o feminismo, h� uma ideia de que o corpo da mulher � de propriedade p�blica. Muitas vezes, os homens que cometem viol�ncia sexual s�o vistos como loucos, mas Clarisse alerta que o estupro � uma pr�tica recorrente, � algo estrutural.