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Estado de Minas

Trag�dia da Samarco atingiu at� o pr�prio ramo de minera��o no Rio Doce

Dragas afundaram e trabalhadores t�m medo do contato com a �gua. Pescadores tamb�m perderam seu trabalho


postado em 02/11/2017 11:00 / atualizado em 02/11/2017 11:15

João Batista Oliveira e as marcas da ferrugem que afundou suas dragas: 'Não me reconhecem como atingido'(foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)
Jo�o Batista Oliveira e as marcas da ferrugem que afundou suas dragas: 'N�o me reconhecem como atingido' (foto: Ramon Lisboa/EM/D.A Press)

Conselheiro Pena e Governador Valadares
– �s v�speras de completar dois anos, a trag�dia de Mariana, considerada o maior desastre socioambiental da hist�ria do pa�s, n�o prejudicou apenas o meio ambiente e popula��es inteiras no caminho da lama. At� mesmo pessoas do mesmo ramo da empresa respons�vel pelos danos, a mineradora Samarco, foram afetadas. Dono dos direitos para a extra��o de ouro em boa parte do Rio Doce, o minerador Jo�o Batista de Oliveira, de 46 anos, n�o consegue retirar mais um grama do metal precioso do manancial desde o rompimento da Barragem do Fund�o, em 5 de novembro de 2015. “Seis das minhas dragas afundaram com o rejeito que veio pelo rio e a Samarco n�o me reconhece como atingido. At� hoje n�o recebi nem uma garrafa de �gua. Como ningu�m sabe se o rio est� contaminado, n�o consigo gente para operar as dragas, nem investidores para tocar a minera��o. Estou devendo R$ 300 mil e com o nome sujo na pra�a”, lamenta o valadarense.

No munic�pio vizinho, Conselheiro Pena, quem tirava alguma renda com a venda dos peixes que fisgava no Rio Doce n�o consegue mais vender nada, apesar de a atividade estar liberada para esp�cies ex�ticas. “Ningu�m compra peixes do Rio Doce, nem da regi�o, com medo de estarem contaminados. Voc� n�o consegue vender nem se pescar em outros rios, porque est� todo mundo desconfiado”, reclama o agricultor e pescador Jonas Ferreira de Souza, de 66. Enquanto isso, esp�cimes que foram salvos no dia que a lama passou pela regi�o ainda est�o em tanques, sem qualquer aux�lio dos respons�veis pela maior trag�dia socioambiental do Brasil.

O caso dos peixes e da contamina��o do rio s�o reflexos de falta de informa��o e de a��es consideradas ainda muito t�midas no que diz respeito � repara��o ambiental das �reas destru�das ou contaminadas. O pr�prio plano de recupera��o de �reas devastadas pelo rompimento da Barragem do Fund�o, que deve ser intensificado em 2018, prev� a��es nos pr�ximos 20 anos, mas especialistas estimam que o meio ambiente n�o se recuperar� em menos de cinco d�cadas. “H� impactos grav�ssimos que dever�o persistir nos pr�ximos 50 anos. A recupera��o da microfauna, que � fundamental para o ecossistema, e tamb�m aquele material depositado entre as baixadas e os rios, que recircula com as chuvas, s�o impactos importantes, que precisam ser estudados e s�o de dif�cil solu��o”, afirmou o bi�logo Carlos Joly, do Instituto de Biologia IB/Biota-Fapesp, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em evento sobre os dois anos do desastre.

O medo de mergulhar em um rio polu�do e afetar, com isso, a sua sa�de afugentou os �ltimos operadores de dragas que o minerador Jo�o Batista tinha trazido de Porto Velho (RO) para a regi�o do Rio Doce. “Os trabalhadores t�m de mergulhar e ficam at� duas horas sondando o fundo do rio com a draga. Mas ningu�m mais quer descer l�, com medo de pegar alguma doen�a, de morrer contaminado por causa do tanto de rejeito que ainda est� no fundo. Minha atividade acabou”, afirma. De acordo com ele, a mar� de rejeitos que desceu pelo rio afundou suas dragas. “Parece que aquela lama enferruja os flutuadores das dragas mais r�pido, e com isso eles se romperam, encheram de �gua e afundaram”, lamenta.

O medo de quem n�o compra peixes pescados na Bacia do Rio Doce acaba sendo corroborado por estudos que atestam o alto grau de contamina��o dos animais. De acordo com exames feitos pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), 60% dos esp�cimes coletados no Rio Doce, na regi�o da Barragem de Baguari, em Governador Valadares, apresentavam contamina��o por metais pesados como merc�rio, c�dmio, chumbo e ars�nio. “S�o contaminantes extremamente nocivos para a vida aqu�tica e para a sa�de humana tamb�m. N�o devem ter sido desprendidos dos rejeitos em si, mas acumulados ao longo dos anos, principalmente das atividades miner�rias nos rios do Carmo e Gualaxo do Norte. Isso tudo acabou sendo revolvido do fundo pela lama quando desceu da barragem”, afirma o professor de recursos h�dricos da institui��o, Alexandre S�lvio Vieira da Costa. Relat�rios do Igam tamb�m detectaram a presen�a de merc�rio na regi�o em 2016.

Em Baguari, distrito de Valadares, o aposentado Elber Geraldo da Silva, de 54, diz manter pelo menos 20 mil peixes resgatados do Rio Doce em dois tanques que ficam em uma propriedade � margem do manancial. “Nem a Samarco nem a Renova nunca apareceram para dar nem um grama de ra��o para esses bichos. S�o os peixes que a comunidade salvou do Rio Doce e que est�o dentro desse tanque h� quase dois anos. Era para ser a chance de renova��o do rio, mas ningu�m liga para isso”, lamenta.


Renova faz defesa de a��es de recupera��o

A Funda��o Renova informa que foram instalados 92 pontos de monitoramento da qualidade da �gua ao longo do Rio Doce e que a presen�a de peixes foi identificada, inclusive em locais onde os rios foram severamente impactados, mas ainda n�o h� informa��es sobre a contamina��o desses esp�cimes. A funda��o tamb�m rebate a ideia de que pouco foi feito at� o momento. De acordo com o diretor de programas da Renova, Marcelo Eduardo Figueiredo, uma �rea de 800 hectares j� foi recuperada. “Nessa primeira etapa fizemos a reconforma��o geom�trica (das calhas e das margens do rio), implantamos sistemas de drenagem nos 117 primeiros quil�metros, tudo isso com processos de bioengenharia”, afirma. O plano de manejo dividiu os trechos de rios impactados em 17 �reas onde ocorrer�o diferentes a��es de recupera��o. “As a��es v�o desde a retirada do rejeito at� a bioengenharia nas margens, drenagens nas �reas de recarga h�drica, revegeta��o de tudo nas plan�cies, cercamento, s�o diversos tipos de a��es”, afirma.

Das 10 mil nascentes identificadas ao longo do rio, mil foram cercadas, afirma. Uma �rea de 40 mil hectares ser� reflorestada a partir de 2018 em trechos ainda n�o divulgados. Sobre os peixes de Baguari, a Renova informou n�o ter informa��es sobre esses reservat�rios, mas afirma que 1.100 animais dom�sticos e de cria��o impactados est�o ainda sob a cust�dia da funda��o em tr�s fazendas. “Neste primeiro momento, as a��es para a fauna silvestre s�o ainda as emergenciais, mas temos projetos prontos para serem executados com diversas entidades e que v�o ser realizados levando em conta �reas de conserva��o e a continuidade dessas �reas”, disse o presidente da Funda��o Renova, Roberto Waack.


DEPOIMENTO
Mateus parreira
Rep�rter

A ilus�o das �guas claras

“A bordo do pequeno barco de madeira pilotado pelo pescador Jonas Ferreira de Souza, de 66 anos, atravessei o Rio Doce, em Conselheiro Pena, at� a chamada Ilha do Jonas. Minha �ltima recorda��o do rio em um trecho pr�ximo era de uma �gua vermelha, exalando cheiro de ferrugem por causa dos rejeitos. Desta vez, me impressionou o fato de as �guas superficiais estarem l�mpidas a ponto de se enxergar o fundo. E era nesse fundo – um raso, na verdade, com menos de um metro de profundidade –, que estava o rejeito que veio de Mariana. Enquanto naveg�vamos, o minerador lamentava ter perdido tudo, porque n�o conseguia mais gente para mergulhar e operar as mangueiras das dragas. Era paradoxal imaginar que o medo da contamina��o intimidava homens forjados na dureza dos garimpos de ouro, onde se usa clandestinamente at� o perigoso merc�rio, a ponto de impedi-los de entrar num rio de �guas claras que mal bate nos joelhos.”


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