
Quando a Sele��o entra em campo, com ela vem o peso e as responsabilidades de quem � a segunda melhor do mundo no ranking da Federa��o Internacional de Futebol (Fifa). A torcida, brasileira ou n�o, espera de antem�o dribles, passes certeiros e gols na rede do advers�rio. Fora dos est�dios, no entanto, a realidade massacra o Brasil e o faz perder posi��es importantes no jogo da vida. Se em vez de um Mundial de futebol houvesse uma Copa da educa��o e da sa�de, servi�os essenciais para o desenvolvimento e a sobreviv�ncia de uma na��o, o pa�s, certamente, n�o passaria de um mero figurante e seria eliminado logo na fase de grupos, estando nas �ltimas posi��es entre as 32 equipes participantes do evento esportivo mais importante do planeta. Sem medidas urgentes e pr�ticas, defendem especialistas, neste s�culo, o Brasil n�o ser� campe�o.
Relat�rio de Desenvolvimento Humano do Programa das Na��es Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), elaborado em 2016 com informa��es de 2015, mostra que o Brasil figura na 22ª coloca��o em m�dia de anos de escolaridade da popula��o adulta com 25 anos ou mais. Ocupa a 24ª posi��o quando � avaliado o percentual de alunos matriculados no ensino superior em rela��o ao grupo populacional entre 18 e 24 anos. J� em rela��o � expectativa de anos de estudo a partir do momento em que se entra na escola, o pa�s est� um pouco melhor: 14º lugar.
Diretor de rela��es institucionais do Quero Bolsa, plataforma de distribui��o de bolsas para alunos de estabelecimentos privados de ensino superior, Marcelo Lima atribui os resultados p�fios apresentados nos rankings � falta de investimento adequado no desenvolvimento da educa��o b�sica. O pa�s gasta, anualmente, US$ 3,8 mil (R$ 11,7 mil) por aluno no primeiro ciclo do ensino fundamental (at� o 5º ano). Esse � um dos piores �ndices mundiais, segundo a Organiza��o para a Coopera��o e Desenvolvimento Econ�mico (OCDE). O cen�rio � um pouco melhor em rela��o aos gastos com estudantes universit�rios. Nesse caso, o Brasil investe US$ 11,7 mil (R$ 36 mil), se aproximando de alguns pa�ses europeus, como Portugal e Espanha, com despesas, respectivamente, por aluno, de US$ 11,8 mil e US$ 12,5 mil, e at� ultrapassa pa�ses como a Pol�nia (US$ 9,7 mil).
Segundo Marcelo Lima, a disparidade dos recursos acaba afetando de maneira geral os �ndices educacionais brasileiros, porque se n�o h� uma educa��o b�sica de qualidade, a quantidade de estudantes com possibilidade de acesso ao ensino superior continuar� sendo limitada, sem espa�o para avan�os significativos. Na avalia��o dos gastos com educa��o em rela��o ao Produto Interno Bruto (PIB), o Brasil tem posi��o de destaque, no 7º lugar, � frente de muitos pa�ses desenvolvidos, como Alemanha, que investe 4,9% de seu PIB e Jap�o (3,8%). “� preciso gest�o p�blica para a bola rolar com destreza. O dinheiro que o Brasil investe hoje em educa��o, 6% do PIB, n�o � pouco, mas � mal distribu�do e mal gerido”, ressalta. “Investir na educa��o b�sica significa dar condi��es de o aluno entrar na universidade. Mesmo n�o tendo vagas suficientes no ensino superior p�blico, tendo um bom n�vel b�sico, o estudante pode chegar ao privado com boa bagagem e interesse. O que vemos hoje � uma falta de interesse de quem cursa o ensino m�dio em escola p�blica, porque n�o � estimulado pela escola, pelo professor, por familiares.”
O percentual de investimento, no entanto, � relativizado pelo coordenador de projetos do Movimento Todos pela Educa��o, Caio Callegari. Segundo ele, a situa��o deve a ser analisada e corrigida a partir da base. Ele lembra que, durante d�cadas, os recursos da educa��o ficaram em cerca de 2% do PIB, gerando um passivo de desafios hist�ricos e pend�ncias. “O tamanho do PIB brasileiro � pequeno, ent�o, no fundo, 5,9% � pouco dinheiro, principalmente quando se considera que a nossa popula��o jovem � maior que a de outros pa�ses, fazendo com que tenhamos muito mais estudantes que o Jap�o ou a Alemanha, por exemplo”, diz. “Os pa�ses desenvolvidos investem em educa��o b�sica 2,5 vezes mais que o Brasil. Isso � o que nos leva a defender com tanta �nfase que precisamos investir mais. Isso significa ter infraestrutura adequada em escola, ampliar a oferta em tempo integral e valorizar o professor. O pa�s est� correndo contra o tempo para driblar desafios e obst�culos do s�culo 20 para conseguir entrar na educa��o do s�culo 21”, acrescenta.
Callegari destaca que o financiamento da educa��o deve ser olhado num trip�. Al�m do investimento, entram nessa conta a distribui��o e a gest�o dos recursos. Trocando em mi�dos: fazer melhor com o dinheiro dispon�vel. “De 2005 a 2014, dobrou-se o investimento por aluno da educa��o b�sica, mas n�o se avan�ou quase nada na qualidade, exceto nos anos iniciais do ensino fundamental. Os anos finais deste n�vel est�o estagnados e o n�vel m�dio, em queda”, afirma. Por isso, o especialista defende romper essa polariza��o de investimento para cada real investido chegar concretamente aos estudantes em sala de aula para melhorar a aprendizagem.
ORGULHO A estudante Andreza Barbosa Maia, de 23 anos, do 3º per�odo de gest�o em recursos humanos, driblou as adversidades para integrar o seleto grupo de universit�rios brasileiros e jogar no time oposto ao de quem n�o tem acesso ao ensino superior. Andreza mora no Bairro Jardim Laguna, em Contagem, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, com os pais, a av� e a irm�. � a primeira da fam�lia a ter curso superior: o pai, motorista, estudou at� a antiga 5ª s�rie (atual 4º ano do fundamental) e a m�e, cozinheira, at� a 4ª s�rie (3º ano do fundamental). Entre os outros familiares, apenas uma prima se graduou. “Estar na faculdade � a realiza��o da fam�lia e de um sonho meu. � muito bom ver as pessoas ao seu redor terem orgulho por voc� estar conseguindo chegar t�o longe. Nem sempre � f�cil a vida acad�mica e, �s vezes, acho que n�o vou conseguir, mas isso d� for�a”, relata.
A jovem � um exemplo de quem aproveitou as oportunidades para fazer a roda girar em movimento de progresso. Quando come�ou o processo do vestibular, navegando numa rede social, viu um an�ncio do Quero Bolsa e se inscreveu, temerosa de que fosse um golpe. No momento de pagar o primeiro boleto, o fez com o cora��o na m�o e o al�vio s� veio quando o documento foi confirmado pela institui��o de ensino. No in�cio da gradua��o, Andreza trabalhava numa oficina mec�nica e recebia pouco mais de um sal�rio-m�nimo. “N�o fosse a bolsa, eu n�o conseguiria estudar, pois n�o podia pagar R$ 1 mil da mensalidade de forma alguma”, diz a estudante do Centro Universit�rio UNA. Hoje, ela trabalha numa empresa de engenharia, em sua �rea – recursos humanos. A expectativa � de melhorar ainda mais depois de formada e crescer na profiss�o: “Como eu n�o preciso pagar o curso depois que terminar, vou poder comprar a moto que tanto quero e ajudar mais em casa, porque n�o vai mais ter o dinheiro da faculdade. O investimento � muito grande, mas vai valer a pena.”