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Estado de Minas

Historiadora resgata vida de mestre de obras que embelezou igrejas mineiras

Portugu�s Francisco de Lima Cerqueira, respons�vel por selecionar e comandar profissionais para criar as artes de diversos templos. Pesquisas resultaram em mais de 400 p�ginas que devem ser lan�adas em livro


postado em 03/09/2018 07:00 / atualizado em 03/09/2018 08:57

Igreja em São João del-Rei:obra foi contratada por Lima Cerqueira(foto: Marta Leandro/ Divulgação)
Igreja em S�o Jo�o del-Rei:obra foi contratada por Lima Cerqueira (foto: Marta Leandro/ Divulga��o)
A hist�ria colonial de Minas n�o para de surpreender, de se abrir a novas descobertas e permitir, aos estudiosos, mergulhos profundos em documentos que trazem � luz personagens de relev�ncia, embora muitas vezes apagados pelo tempo ou � sombra de seus contempor�neos. Com paix�o pela pesquisa, pelos estilos barroco e rococ�, a professora doutora Patr�cia Urias se dedicou durante quatro anos � vida, � obra e ao legado do portugu�s Francisco de Lima Cerqueira (1728-1808), mestre de obras, louvado (perito) e arquiteto, que trabalhou em igrejas de Ouro Preto e Congonhas, na Regi�o Central, S�o Jo�o del-Rei, no Campo das Vertentes, e Campanha, no Sul do estado. Diferentemente dos c�lebres artistas da �poca, a exemplo de Ant�nio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), Lima Cerqueira era um empreiteiro, respons�vel por arrematar os servi�os e empregar escultores, entalhadores, pintores e outros profissionais que fizeram a grandeza das Gerais do s�culo 18.

Em 2018, quando os brasileiros lembram os 280 anos de nascimento de Aleijadinho, � importante destacar os 290 anos de Lima Cerqueira, de amplo curr�culo como gerente do canteiro de obras da Igreja de S�o Francisco de Assis, da Ordem Terceira de S�o Francisco, em S�o Jo�o del-Rei, e mestre canteiro. “Chama a aten��o na trajet�ria dele a conquista de espa�o no meio profissional de forma paciente, usando estrat�gias que lhe proporcionaram as experi�ncias necess�rias para acessar os grandes centros. Foi um empreendedor, vers�til, que deu rica contribui��o a nossa arquitetura. Sem ele, muitos artistas n�o teriam trabalho”, diz a professora, natural de Caet�, na Grande BH, com a certeza de que ter nascido numa cidade de passado colonial, a antiga Vila Nova da Rainha, foi decisivo para escolher a carreira e se interessar pela arte setecentista.

As pesquisas resultaram num calhama�o de mais de 400 p�ginas que Patr�cia pretende lan�ar como livro, ap�s defender, na Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a tese de doutorado Francisco de Lima Cerqueira: A atua��o do mestre portugu�s em Minas Gerais entre os anos de 1754 e 1808 – antes, Lima Cerqueira foi um dos mestres pesquisados na disserta��o de mestrado na mesma universidade. Al�m da investiga��o em documentos do Arquivo P�blico Mineiro (APM), em Belo Horizonte, em livros de ordens terceiras, ent�o as grandes contratantes de servi�os (igrejas, capelas etc.), bibliotecas e outras institui��es, Patr�cia visitou a terra natal de Lima Cerqueira, a Aldeia Grande, no Norte de Portugal. “Ele veio para Minas devido � oferta de trabalho aqui e tamb�m porque a fome assolava a regi�o dele, o Minho, com escassez principalmente de milho”, explica Patr�cia, que teve como orientador o professor doutor Andr� Guilherme Dornelles Dangelo.

PONTES DO TEMPO No in�cio, em Minas, o portugu�s atuou como pedreiro, depois mestre canteiro (especialista em pedra de cantaria) at� se tornar empreendedor ou empreiteiro. “Onde tinha obra, ele ia atr�s”, enfatiza a professora. Dono de uma oficina itinerante e procurador-geral da Ordem Terceira de S�o Francisco de Assis, Lima Cerqueira arregimentava m�o de obra qualificada. Para a Igreja de S�o Francisco, em S�o Jo�o del-Rei, expoente do rococ�, levou profissionais competentes e pouco conhecidos hoje, com os entalhadores em madeira Manoel Jo�o Pereira, Luis Pinheiro e Ant�nio Martins e o pedreiro canteiro Aniceto de Souza Lopes, que deu continuidade aos projetos do empreendedor.

“Tinha uma enorme capacidade de formar parcerias, algo imprescind�vel naquele universo. Era um homem � frente do tempo, de vis�o. Naquela �poca, quem n�o agia assim, n�o sobrevivia. E o artista era obrigado a ter o que se chamava ‘f�brica’, nada menos do que estrutura f�sica para levar o empreendimento adiante. Isso inclu�a os fiadores e gente com experi�ncia para trabalhar”, relata a professora. Na Igreja de S�o Francisco de Assis, em S�o Jo�o del-Rei, o empreiteiro foi o respons�vel pelo risco das torres e tamb�m pelo adro que circunda o templo, um ponto importante defendido na tese.

A rela��o de Lima Cerqueira com Aleijadinho, 10 anos mais novo, merece um destaque. Os dois trabalharam juntos na Igreja do Carmo, em Ouro Preto, a na S�o Francisco de S�o Jo�o del-Rei, atuando o portugu�s sempre como o empreiteiro e louvado. Mas foi nessa �ltima que teria ocorrido “uma certa diverg�ncia”, registrada no fim da d�cada de 1920, pelo grupo de modernistas – o escritor paulista M�rio de Andrade (1893-1945) � frente –, em visita a Ouro Preto. Eles apuraram que Lima Cerqueira modificara o projeto original do templo, “o que, � luz de documentos da �poca e da literatura sobre o per�odo, era considerado algo perfeitamente normal”, explica Patr�cia.

 Patrícia Urias, professora doutora, que defendeu tese de doutorado na UFMG sobre Francisco de Lima Cirqueira (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Patr�cia Urias, professora doutora, que defendeu tese de doutorado na UFMG sobre Francisco de Lima Cirqueira (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
“A visita dos modernistas a Minas, a partir da qual o nome de Aleijadinho foi enaltecido como a express�o maior da arte colonial brasileira, apagou a hist�ria e import�ncia de outros artistas e empreendedores”, afirma a professora. Ela lembra que, por ser mulato, Aleijadinho podia apenas subempreitar obras, da� Lima Cerqueira arrematar os servi�os e contratar o mineiro de Ouro Preto para execut�-los. Mestre em fazer parcerias, Lima Cerqueira atuou, em Ouro Preto, antiga Vila Rica, com o mestre de obras Jos� Pereira dos Santos, na Nossa Senhora do Ros�rio, Domingos Moreira de Oliveira, na Igreja S�o Francisco de Assis, e Jo�o Alves Viana, na Igreja Nossa Senhora do Carmo.

DESTAQUES Na Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Ouro Preto, Lima Cerqueira arrematou, em 1771, servi�os como o p�rtico principal e lavabo da sacristia, ambos em pedra-sab�o, e os arcos do coro. Ainda em Vila Rica, ele mostrou sua arte num chafariz no Bairro Cabe�as, datado de 1763. J� em Campanha, antiga Vila de Campanha da Princesa da Beira, contratou as obras da Igreja de Santo Ant�nio.

Quem visita S�o Jo�o del-Rei e se encanta com as pontes sobre o C�rrego do Lenheiro, cortando a cidade, pode ficar sabendo que tais estruturas foram objeto de empreitada de Lima Cerqueira. Para Patr�cia Urias, � fundamental o estudo dos profissionais que trabalharam em Minas no s�culo 18. “Eram pessoas de muito talento, mostrando que a regi�o das minas consistia num ambiente composto por profissionais e artistas competentes e havia gente interessada em valoriz�-los e assegurar o trabalho.”


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