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Estado de Minas

Sem in�cio de obras de distritos, moradores de Mariana mostram apreens�o

Rompimento de barragem que matou 19 pessoas completa tr�s anos nesta segunda-feira. Fam�lias que perderam casas ainda aguardam novas comunidades


postado em 05/11/2018 08:07 / atualizado em 05/11/2018 08:26

Distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, atingido pelo rompimento de barragem de rejeitos da mineradora Samarco(foto: Antonio Cruz/ Arquivo Agência Brasil)
Distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, atingido pelo rompimento de barragem de rejeitos da mineradora Samarco (foto: Antonio Cruz/ Arquivo Ag�ncia Brasil)


H� tr�s anos, cerca de 400 fam�lias viram suas casas serem engolidas pela lama na maior trag�dia ambiental do pa�s. Desde ent�o, moradores dos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu, vinculados a Mariana (MG), e de Gesteira, vinculado a Barra Longa (MG), sonham com o dia em que poder�o viver novamente em suas comunidades. O cronograma de reconstru��o, divulgado h� dois anos, n�o se converteu em realidade e a esperada entrega dos novos distritos em 2019 n�o vai ocorrer.

A reconstru��o � uma obriga��o da Funda��o Renova, que foi criada conforme previsto em acordo firmado no in�cio de 2016 entre a Uni�o, os governos de Minas Gerais e Esp�rito Santo e as mineradoras respons�veis pela trag�dia: a Samarco, dona da barragem que se rompeu, e suas acionistas Vale e BHP Billiton. Cabe � Funda��o Renova, com recursos das empresas, reassentar as fam�lias e reparar todos os danos ambientais e sociecon�micos decorrentes do epis�dio.

Apesar dos atrasos, os moradores de Bento Rodrigues comemoraram uma vit�ria recente: o canteiro de obras foi implantado em maio desse ano, as licen�as necess�rias obtidas em julho e o trabalho de supress�o de vegeta��o e abertura das vias j� est� em curso. A pr�xima etapa deve ser a instala��o de rede de esgoto e em seguida a pavimenta��o. As obras devem ser conclu�das em aproximadamente 22 meses e a entrega est� prevista para agosto de 2020.

"As coisas n�o evolu�ram como n�s quer�amos. Dois anos e meio s� para sair o licenciamento. As crian�as v�o crescendo num ambiente diferente. Eu nunca gostei de cidade. Gostava da minha ro�a. Colher a couve, colher a cebolinha, tirar leite, fazer queijo. Tudo isso eu quero de novo aqui", diz Jos� do Nascimento de Jesus, conhecido como Zezinho do Bento, presidente da Associa��o Comunit�ria de Bento Rodrigues e integrante da comiss�o de atingidos.

Aos 73 anos, ele visita a obra quase todos os dias e � conhecido, pela equipe da Funda��o Renova, como “o maior e mais rigoroso fiscal”. "Estou aqui defendendo a minha comunidade. Tem que ser entregue do jeito que a gente quiser", acrescenta. Ele avalia que agora a obra est� atingindo o ritmo desejado.

No novo Bento Rodrigues ser�o reassentadas cerca de 240 fam�lias e a reconstru��o segue o projeto urban�stico aprovado pelos pr�prios atingidos em fevereiro, que levou em conta as atingas rela��es de vizinhan�a. Elas tamb�m escolheram o terreno, que antes pertencia � sider�rgica Arcelor Mittal e foi comprado pela Funda��o Renova. No local, havia uma produ��o de eucalipto. A pedido dos atingidos, a madeira suprimida est� sendo armazenada. Segundo o presidente da associa��o comunit�ria, a ideia � guard�-la para abastecer os fog�es a lenha das futuras casas.

"Na pr�xima semana, come�am as visitas das fam�lias aos lotes para que elas autorizem a constru��o e a entrada no projeto individual das resid�ncias na prefeitura", diz Patr�cia Lois, engenheira civil e gerente dos reassentamentos da Funda��o Renova, explicando que o alvar� de cada casa � individual.

O desenho das casas j� est� sendo desenvolvido. S�o 28 arquitetos designados apenas para fazer os projetos. "Muitos atingidos est�o optando por n�o repetir o desenho das casas antigas. As fam�lias est�o muito ligadas ao futuro. Novas atividades econ�micas, novos h�bitos que elas adquiriram nesses tr�s anos que se passaram. Isto tudo est� sendo considerado por elas", diz o arquiteto Alfredo Zanon.

Mesmo quem mant�m suas atividades pode querer um espa�o mais adequado do que o anterior. "Tem o exemplo da fam�lia que produz geleia de pimenta biquinho. Como vai ser essa nova ind�stria deles? Na comunidade de Paracatu, tem gente pensando em agroecologia e em agroturismo. Estamos incorporando tudo isso no projeto", acrescenta Zanon.

Uma das promessas da Funda��o Renova � empregar nas obras cerca de 80% de m�o de obra local. Um acordo com o Minist�rio P�blico de Minas Gerais foi firmado dando aos atingidos o direito de serem contratados, caso queiram. Estima-se que, em meados do pr�ximo ano, quando as obras estiverem mais avan�adas, 2 mil pessoas possam ser empregadas.

(foto: EBC)
(foto: EBC)


Distrito de Paracatu


Romeu Geraldo de Oliveira, de 43 anos, morava em Paracatu e decidiu colocar a m�o na massa. "Estou bem satisfeito pela comunidade de Bento Rodrigues. Mas a felicidade s� estaria completa se eu estivesse trabalhando na reconstru��o de Paracatu. Enquanto n�o come�ar a terraplanagem, a gente ainda fica com receio. A gente ainda tem essa sensa��o de que pode n�o sair a comunidade como a gente quer", diz.

Em sua vis�o, a cobertura da imprensa contribuiu para que as solu��es para Bento Rodrigues tivessem prioridade. "� a menina dos olhos da m�dia. Paracatu fica esquecido e a lama atingiu nossas casas do mesmo jeito. Foi quest�o de horas para tudo ser arrasado. Mas estou satisfeito pelos moradores de Bento Rodrigues. Eles n�o t�m culpa de ter come�ado a constru��o da sua comunidade, enquanto a nossa est� atrasada", acrescenta Romeu, que tamb�m � integrante da comiss�o de atingidos de Mariana.

As caracter�sticas do distrito de Paracatu geraram um contratempo, pois foi necess�rio que a C�mara dos Vereadores de Mariana aprovasse uma lei alterando o plano diretor do munic�pio. Na comunidade, os s�tios ficavam no meio do n�cleo urbano, o que n�o era previsto na legisla��o da cidade. Dessa forma, foi inclu�do no plano diretor uma nova zona especial de reassentamento. Os atingidos de Paracatu aprovaram o projeto urban�stico da nova comunidade em setembro. Cerca de 140 fam�lias ser�o reassentadas. Segundo Patr�cia Lois, t�o logo o licenciamento seja obtido, as obras tamb�m ter�o in�cio.

Gesteira ainda sem terreno


A apreens�o que toma conta dos moradores de Paracatu tamb�m � a mesma que atinge os que ficaram desabrigados em Gesteira. L�, a situa��o se agrava porque nem mesmo a compra o terreno para a reconstru��o foi conclu�da. "A gente fica sem not�cias e parece que tudo caminha bem devagar", lamenta Ant�nio Marcos da Costa. Ele perdeu a casa onde morava, que pertenceu aos av�s, e tamb�m viu a mercearia que gerenciava ser devastada pela lama.

"Tivemos uma dificuldade grande na compra do terreno. O propriet�rio pedindo um valor muito maior do que o valor de mercado. Agora estamos conseguindo evoluir na negocia��o", diz Andrea Aguiar Azevedo, diretora-executiva de engajamento, participa��o e desenvolvimento institucional da Funda��o Renova.

A gerente dos reassentamentos Patr�cia Lois diz que a Aedas, assessoria que atende os atingidos de Gesteira, come�ou a atuar apenas no in�cio em novembro de 2017 e realizou um processo de escuta at� fevereiro de 2018 com as 37 fam�lias que ser�o atendidas.

"Diferente de Bento Rodrigues e Paracatu, a comunidade de Gesteira n�o quer a constru��o do novo reassentamento baseada nas rela��es de vizinhan�a. L� teremos o que chamamos de reassentamento de futuro". Ela diz que, por ter menos atingidos, as obras de Gesteira ser�o mais r�pidas.

Gesteira n�o foi totalmente devastada, pois a maior parte das edifica��es ficava em uma �rea mais elevada. Ant�nio Marcos da Costa vive hoje neste local, em uma resid�ncia alugada pela Funda��o Renova.

Mesmo tendo se mantido na comunidade, ele diz que a vida mudou completamente pois a renda atual � muito aqu�m da que ele tinha gerenciando a mercearia, cujo dono mora no centro de Mariana. Al�m disso, precisa lidar com a depress�o que tomou conta de sua m�e, problema recorrente entre os atingidos, e comprar os medicamentos. "Fa�o o que posso. Peguei minhas economias e abri um barzinho. Mas n�o ganho igual, mesmo somando com o aux�lio mensal da Funda��o Renova".

O aux�lio mensal, acordado com o Minist�rio P�blico meses ap�s o rompimento da barragem, � destinado a todos os que perderam renda em decorr�ncia da trag�dia. Os valores s�o pagos por meio de um cart�o e cada benefici�rio recebe um sal�rio m�nimo, acrescido de 20% para cada dependente, al�m do valor de uma cesta b�sica. O aux�lio n�o configura verba indenizat�ria e, no caso dos desabrigados dos tr�s distritos, dever� ser pago por pelo menos um ano ap�s o reassentamento.

A exemplo de Ant�nio, Romeu tamb�m conta que sua renda atual � insuficiente. O sal�rio que recebe na obra de Bento Rodrigues chega a ser quatro vezes inferior ao que ele conseguia com a sorveteria em Paracatu. Al�m disso, morando em uma casa oferecida pela Funda��o Renova na �rea urbana de Mariana, ele diz ter gastos superiores aos que tinha antes.

"Essa casa aqui � at� muito boa, mas n�o � minha. L� eu tinha um amor por cada tijolo, que fui eu que coloquei. Foram d�cadas de constru��o, fazendo tudo aos poucos, e perdi em 10 minutos. Minha casa era menor do que essa, mas l� � outro ambiente. Tinha horta, tinha galinha, tinha tudo e n�o precisava comprar. E tinha a sorveteria que era a �nica da regi�o. N�o estou nem mais ligando para indeniza��o. Se derem minha casa de volta eu j� estou feliz".

Atrasos ser�o cobrados


De acordo com a Funda��o Renova, os atrasos ocorreram pelo tempo levado para compreender a legisla��o e para atender os anseios da comunidade, atrav�s de um processo de escuta. Em meio a esse processo, foi fechado um acordo com o Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG) que estabeleceu a contrata��o de assessorias t�cnicas para os atingidos. A C�ritas vem atendendo os atingidos de Bento Rodrigues e Paracatu, e a Aedas � a institui��o que atende os moradores de Gesteira.

"Precisamos respeitar tamb�m o tempo de discuss�o dos atingidos porque n�o adianta apenas fazer uma casa e coloc�-los l� dentro. Eles precisam ser ouvidos para que a nova comunidade lhes permita resgatar seus modos de vida e suas tradi��es. E precisam estar amparados pelas suas assessorias", diz Patr�cia Lois.

Para o promotor do MPMG, Guilherme Meneghin, a Funda��o Renova cometeu falhas ao regular o espa�o de participa��o das v�timas. "N�s tivemos que atuar, cancelar uma assembleia que havia sido convocada onde as v�timas poderiam ser manipuladas a aprovar um projeto que n�o lhes atendia. Uma coisa � destruir a casa da pessoa, comprar outra e colocar ela l� dentro. Isso � muito f�cil. Outra coisa � fazer com que as pessoas retomem os seus modos de vida e, assim, realmente reparar os danos".

O promotor conta que o processo come�ou a deslanchar apenas este ano. Em audi�ncias realizadas em fevereiro e em mar�o, o MPMG e a Funda��o Renova chegaram a um acordo que estabelece 78 diretrizes de reassentamento. Ficou pactuado, por exemplo, que as casas dever�o ter, pelo menos, 20 metros quadrados a mais do que a que foi devastada. Uma vez reassentados, os atingidos tamb�m ter�o direito � assist�ncia t�cnica para desenvolvimento de atividades agro-silvo-pastoris e dever�o receber ra��o, adubo e demais insumos necess�rios.

"Se eles tivessem adotado essas cautelas um ano antes, n�o haveria esse atraso", lamenta Meneghin. Ele diz que o tempo perdido ser� cobrado. "J� temos um processo na Justi�a onde pedimos a aplica��o de uma multa em benef�cio das v�timas por conta dos atrasos".


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