
Perto de completar cinco anos sem uma resposta definitiva para a indeniza��o dos atingidos e a repara��o ambiental do desastre do rompimento da Barragem do Fund�o, operada pela Samarco, em Mariana, os avan�os conquistados at� agora podem ser prejudicados por um v�cio. Segundo den�ncias de atingidos em Linhares, da imprensa local e que chegaram ao Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e � reportagem do Estado de Minas, a promotora de Justi�a do Minist�rio P�blico do Esp�rito Santo (MPES) e coordenadora do Grupo de Trabalho de Recupera��o do Rio Doce (GTRD), M�nica Bermudes Medina Pretti, n�o poderia atuar em a��es contra a Vale, por ser a mineradora defendida pelo escrit�rio S�rgio Bermudes, de propriedade do tio dela, nem contra a Samarco, por ter o irm�o dela advogado para a empresa.
Em rela��o � Vale, a assessoria afirmou que a empresa “tomou conhecimento e vai estudar o caso”.
Segundo avalia��o de Tchenna Maso, advogada da coordena��o nacional do MAB, “o correto teria sido a promotora declinar sobre essas causas e se declarar sob suspei��o devido ao conflito de interesses por serem os dois lados da mesma fam�lia. Isso pode levar � anula��o de v�rias decis�es e atrasar todo o processo”.
V�rias decis�es assinadas pela promotora s�o consideradas controversas pelas v�timas. O mais pol�mico � o que diz respeito ao fechamento do cadastro de atingidos da Funda��o Renova de Baixo Guandu (ES), o que as empresas queriam e foi considerado prejudicial a quem ainda n�o se cadastrou. A promotora e coordenadora expressamente reconheceu a legitimidade da comiss�o e chegou a assinar o mesmo documento que o seu tio, S�rgio Bermudes, no processo 1016742-66.2020.4.01.3800, de Baixo Guandu, sendo ela representante do MPES e ele defendendo a Mineradora Vale.
A trag�dia de Mariana resultou na morte de 19 pessoas, sendo quatro de Bento Rodrigues e as demais trabalhadores na Samarco, quando ocorreu o rompimento da Barragem do Fund�o. Foram liberados 40 milh�es de metros c�bicos de rejeitos que arrasaram a bacia hidrogr�fica do Rio Doce entre Minas Gerais e o litoral do Esp�rito Santo, deixando cerca de 300 mil pessoas atingidas.
De acordo com a advogada do MAB, h� diversas queixas quanto � atua��o da promotora por parte dos atingidos. “Temos conhecimento dessa rela��o familiar desde que a promotora come�ou a atuar no caso, principalmente sobre o barramento do Rio Pequeno, uma barragem foi constru�da pela Samarco em Linhares (ES) para conter a propaga��o da lama, para que n�o atingisse a lagoa de abastecimento da cidade”, conta a representante legal do movimento.
Para a advogada, a atua��o da promotora M�nica Bermudes foi contest�vel. "Para n�s, foi uma atua��o jur�dica bastante equivocada. Ela pediu per�cias. Apareceu a empresa Aecom, que � a mesma que hoje faz a maior parte das per�cias do Rio Doce. Na a��o que tramita na 12ª Vara Federal, foi a primeira vez que essa empresa surgiu. Logo depois, essa mesma empresa, que j� fez auditoria para a Funda��o Renova na parte da sa�de, fez v�rios laudos e at� o juiz federal queria usar essa mesma empresa para fazer outros laudos, mas o Minist�rio P�blico Federal interferiu. N�o pode uma empresa fazer laudos e auditoria para duas partes litigantes. Pode ser mais um prov�vel conflito de interesses", considera.
A advogada disse saber que a promotora tinha uma rela��o com S�rgio Bermudes, seu tio, mas n�o sabia ainda do irm�o. “Ficamos ainda mais surpresos ao saber que o irm�o atuou pela Samarco. Isso gera um grande conflito de interesse, pois existe uma rela��o familiar entre os advogados. N�o pela defesa da fam�lia, diretamente.”
Um dos medos � que, como a promotora assinou documentos importantes, como o termo de Ajustamento de Conduta da Governan�a (GTAC), que definiu as linhas de repara��o e indeniza��o da Funda��o Renova, tais medidas venham a ser questionadas e at� anuladas. No caso do GTAC, ela assinou como uma opini�o t�cnica que deveria dar embasamento a toda a sustenta��o, mas que agora precisa ser discutido se ter� validade devido aos la�os familiares. No termo que antecedeu o GTAC, o Termo Transnacional de Ajustamento de Conduta (TTAC), respons�vel por criar a Renova, em 2016, mais uma vez a assinatura da promotora e do seu tio se fazem presente no mesmo documento, cada um representando um lado.
O outro lado
Procurada pela reportagem, a promotora M�nica Bermudes enviou uma nota de desagravo do Minist�rio P�blico do Esp�rito Santo e da Associa��o Espirito-Santense do MP (AESMP) para se defender. O documento diz que “n�o houve qualquer rastilho de ilegalidade. N�o houve atua��o direta dos citados em procedimentos e processos extra e judiciais da promotora de Justi�a em rela��o ao desastre ocasionado pelo rompimento da barragem da Samarco em Mariana. � bom que se ratifique que a promotora de Justi�a j� atuava como titular da �rea de meio ambiente em Linhares dois anos antes do desastre que devastou o rio Doce. Em todo esse tempo, at� hoje, a promotora de Justi�a n�o tratou desse assunto com os referidos advogados”. O MPES e sua associa��o ressaltaram que a atua��o ministerial da promotora de Justi�a se deu com outros membros do Minist�rio P�blico dos Estados do Esp�rito Santo (MPES) e de Minas Gerais (MPMG), do Minist�rio P�blico Federal (MPF-ES e MPF-MG), al�m de membros da Defensoria P�blica. Quando se refere ao Esp�rito Santo, “a promotora de Justi�a tem plena legitimidade social, � reconhecida pela comunidade por ser atuante, justa e equilibrada no trato com a mat�ria”, afirma a nota.
J� a promotora Carla Viana, que � da corregedoria do MPES, informou que j� est� de posse das den�ncias sobre o caso da coordenadora M�nica Bermudes e que come�a hoje a apura��o para identificar poss�veis faltas. “Nosso c�digo de conduta e �tica (do Minist�rio P�blico) � muito claro. A primeira coisa que farei ser� ouvir a promotora e em caso de alguma conduta indevida isso poder� gerar, inicialmente, uma puni��o disciplinar”, disse.