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Estado de Minas JULGAMENTO NA INGLATERRA

Trag�dia de Mariana: 200 mil em ritmo de espera por a��o internacional

Corte do Reino Unido deve decidir at� setembro se aceita julgar pedido de indeniza��es � multinacional BHP. "A gente tem esperan�a que seja feita justi�a", diz vi�va de v�tima


02/08/2020 04:00 - atualizado 02/08/2020 08:46

Bombeiros fazem buscas na área do rompimento da Barragem do Fundão, em 2015: uma das 19 vítimas nunca foi localizada
Bombeiros fazem buscas na �rea do rompimento da Barragem do Fund�o, em 2015: uma das 19 v�timas nunca foi localizada (foto: Euler J�nior/EM/D.A Press - 9/11/15)

Manchester – Drama que se prolonga desde 2015 e um m�s de espera esperan�osa. No maior desastre ambiental do Brasil, o rompimento da Barragem do Fund�o , em Mariana , a t�cnica em enfermagem Jaqueline Aparecida Dutra, de 43 anos, perdeu o marido. Vando Maur�lio dos Santos, de 37, era terceirizado da Samarco, operadora da represa de rejeitos. “Depois disso, lutei sozinha pela vida do meu filho, que tem paralisia cerebral, por quatro anos, at� perder a batalha em 2019. A Funda��o Renova se importa mais com objetos do que conosco”, desabafa. O corpo do marido foi o 17º a ser encontrado – uma das 19 v�timas ainda est� desaparecida. “A gentetem esperan�a que seja feita justi�a. Se n�o aqui no Brasil, que seja no exterior. � preciso que se aprenda com isso para n�o repetir esses desastres”, afirma a vi�va.

Em Conselheiro Pena, sem reconhecimento, Jo�o Vallezany, de 87, pai do pescador atingido Jos� Vallezany, que morreu h� dois anos, definha sem receber qualquer pens�o, aux�lio ou indeniza��o, para desespero da fam�lia humilde. “S� queria entender por que cortaram o benef�cio do meu irm�o. Meu pai era completamente dependente dele. Tinha de ser indenizado e n�o foi, estamos contando com Deus para que ele n�o morra tamb�m”, diz Kelly Vallezany, de 46, filha do senhor doente.

Ligadas pelos efeitos do desastre de 2015, as duas fam�lias est�o entre os cerca de 200 atingidos que depositam suas esperan�as em um ponto em comum: a resposta sobre a aceita��o ou n�o pelas cortes do Reino Unido de a��o proposta contra a BHP Billiton, que deve ser conhecida at� setembro. Ao lado da Vale, a multinacional inglesa e australiana controla a Samarco, que operava o barramento que se rompeu em 5 de novembro de 2015, matando 19 pessoas e deixando um rastro de destrui��o ao longo da Bacia do Rio Doce, onde foram despejados 40 milh�es de metros c�bicos de rejeitos de min�rio de ferro. Junto com estados e a Uni�o, as empresas formaram a Funda��o Renova, para executar as a��es de repara��o, indeniza��o e compensa��o de danos provocados pelo rompimento.

Os atingidos s�o representados pelo escrit�rio PGMBM, que � formado por ingleses, americanos e brasileiros. De acordo com o s�cio administrador do escrit�rio, o advogado Tom Goodead, ap�s os argumentos dos dois lados terem sido ouvidos, em audi�ncias iniciadas em 22 de julho e finalizadas na sexta-feira, resta agora esperar pela decis�o do juiz, sir Mark Turner. “Estamos muito otimistas. Vamos conhecer a decis�o antes que ela seja formalmente transmitida na Corte. Haver� mais uma audi�ncia para isso. Diferentemente do que ocorre no Brasil, onde as senten�as s�o bastante resumidas, no Reino Unido ser� um longo julgamento. Ouviremos em setembro, acredito, a decis�o do juiz (sobre a admissibilidade do processo), seguida dos argumentos de cada lado, que precedem uma eventual senten�a. Os dois lados podem e devem recorrer de qualquer que seja a decis�o. Mas estamos muito otimistas”, afirma.

Desde 2018, ao longo dos 600 quil�metros da Bacia do Rio Doce, entre Minas Gerais e o Esp�rito Santo, os advogados reuniram representantes legais de atingidos, depoimentos, avalia��es de especialistas, pareceres legais, documentos e relatos para demonstrar que a Justi�a no Brasil se arrasta e n�o garante a total repara��o aos atingidos.

Entre 22 e 31 de julho, o escrit�rio desafiou o corpo legal da maior mineradora do mundo, a BHP Billiton, no Centro de Justi�a C�vel de Manchester, no Noroeste da Inglaterra, defendendo que a companhia pode ser processada pelos danos aos atingidos. A concep��o do PGMBM � de que os atingidos que movem a��es no Brasil e na Inglaterra s�o diferentes ou requerem repara��es diversas ou suficientes ante ao que obtiveram ou poder�o obter por meio da Justi�a brasileira. Segundo os advogados, � direito de seus clientes processa a BHP Billiton na sede da corpora��o, na Inglaterra, sendo que a empresa n�o e r� no Brasil.

ABUSO JUR�DICO

Do outro lado, a multinacional exp�s os motivos pelos quais considera que um processo na Inglaterra seria um abuso jur�dico e sobreporia os j� em curso no Brasil, esvaziando a Funda��o Renova e suas 42 a��es em pr�tica, al�m de dois acordos. O primeiro dos acordos foi o Termo Transacional de Ajuste de Condutas (TTAC), assinado com a Uni�o e os estados, prevendo R$ 20 bilh�es de repara��o. O segundo, o TAC da Governan�a (GTAC), abarcou uma a��o do Minist�rio P�blico Federal (MPF), no valor de R$ 155 bilh�es, processos civis p�blicos e individuais na Justi�a brasileira.

A BHP tentou a todo momento desqualificar a a��o. Afirmou tratar-se de “perda de tempo”, que que teria um “custo irrecuper�vel” para a empresa e para a corte. “Para a BHP, a Justi�a brasileira e a Funda��o Renova est�o em melhor posi��o para atender aos pedidos que surgem sobre os eventos que ocorreram no Brasil e est�o sujeitos � lei brasileira, al�m de j� possu�rem consider�vel experi�ncia em lidar com esses pedidos”, defenderam.

Vidas marcadas pelo desastre

Antes do rompimento da Barragem do Fund�o, Jaqueline Aparecida Dutra, de 43 anos, e Vando Maur�lio dos Santos, de 37, moravam em Itabirito e tinham uma rotina j� apertada, com ele trabalhando na Samarco, em Mariana, e os dois tendo de levar o filho Leonardo, de pouco mais de 5 meses, para atendimentos em Belo Horizonte, uma vez que o menino nasceu com paralisia cerebral e precisava de muitos tratamentos para viver. Depois do rompimento, a luta de Jaqueline ficou ainda mais intensa, com a procura pelo marido desaparecido entre os rejeitos e a necessidade de se dedicar sozinha ao filho.

Mesmo depois de o corpo do marido ser localizado, o 17º dos 18 encontrados – um ainda est� desaparecido – ela mal p�de viver o luto. “Meu filho piorou e teve de ficar internado por um ano num Centro de Tratamento Intensivo (CTI). Fui morar com ele. O Leonardo s� teve alta quando praticamente montei um CTI dentro de casa. Foi mais um ano de batalha, at� que em 2019 n�s perdemos essa luta e o Leonardo morreu”, lamenta a m�e.

“O que outras vi�vas e eu temos visto � a Renova e a Samarco tendo mais considera��o por objetos, como fog�es e geladeiras, do que pelas vidas que eles levaram. A gente espera que seja feita justi�a. Se n�o aqui no Brasil, que seja no exterior. � preciso que se aprenda com isso para n�o repetir Fund�o e C�rrego do Feij�o”, afirma a vi�va, numa refer�ncia ao desastre de Brumadinho, em 2019.

Esse mesmo sentimento de abandono atormenta Kelly Vallezany, de 46, que tira recursos de onde n�o tem para manter o pai vivo, depois que Jo�o Vallezany, de 87, acamado e que precisa de oxig�nio, perdeu o filho pescador, de quem era totalmente dependente. “N�o temos apoio de ningu�m. Quando cortaram o benef�cio do meu irm�o ap�s sua morte tiraram a �nica renda do meu pai, al�m de terem destru�do toda a comunidade pescadora que existia por aqui. S�o muitos rem�dios, muitas condi��es de pagamento que v�o al�m do que eu consigo. S� o refil de oxig�nio dele custa R$ 140”, reclama.

Otimismo entre prefeitos

Depois de encarar 14 dias de quarentena, uma vez que brasileiros precisam ser isolados ao ingressar no Reino Unido devido � situa��o da pandemia da COVID-19 no Brasil, os prefeitos de Mariana, a cidade mais arrasada pelo rompimento da Barragem do Fund�o, Duarte Junior (Cidadania), e do munic�pio de Rio Doce, Silv�rio da Luz (PT), dizem regressar confiantes para o Brasil ap�s as audi�ncias para tentar emplacar processo contra a BHP Billiton, em Manchester. “O sentimento � o de dever cumprido. Fizemos uma quarentena, num quarto de hotel muito desconfort�vel, mas estritamente como foi determinado pela legisla��o. Participamos todos os dias das audi�ncias em Manchester. E voltamos com muita confian�a”, disse Duarte Junior.

Os dois enfrentaram momentos de tens�o, como quando os advogados da BHP questionaram o tempo de quarentena cumprido por eles. Ambos estavam cobertos pela legisla��o que permite atender a quest�es jur�dicas e ainda realizaram testes de COVID-19, com resultados negativos para participar das audi�ncias. “Foram dias dif�ceis. Principalmente no in�cio, quando praticamente s� a parte contr�ria (BHP) se posicionava. T�nhamos a impress�o de que o juiz n�o estava entendendo bem o que estava sendo proposto e por qu�. Pudemos ajudar os nossos advogados trazendo mais informa��es. Mas, no final, sa�mos com a confian�a e a certeza de que o juiz entendeu o motivo de estarmos aqui e agora � aguardar a sua decis�o com rela��o � jurisdi��o”, disse o prefeito de Mariana.

O mesmo al�vio sentiu Silv�rio da Luz, prefeito de Rio Doce. “O primeiro passo foi dado. Sa�mos com a certeza de que o juiz entendeu como as coisas estavam acontecendo ou n�o no Brasil. Fica a  ansiedade sobre  a decis�o, mas a esperan�a � grande de que consigamos trazer para o Brasil a repara��o que os atingidos merecem”.


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