
Impulsionadas pelo discurso negacionista do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), prefeituras de Minas Gerais adotaram - oficialmente ou n�o - o chamado ‘kit COVID-19’, composto por hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina, medicamentos sem efic�cia comprovada no combate ao coronav�rus. Algumas administra��es municipais chegaram a associar o uso desses protocolos � melhora nos indicadores epidemiol�gicos da pandemia. Por�m, um levantamento feito pelo EM mostra que n�o � poss�vel relacionar o suposto ‘tratamento precoce’ a eventuais quedas no n�mero de mortes decorrentes da doen�a.
A reportagem analisou dados divulgados nesta ter�a-feira (30) pela Secretaria de Estado de Sa�de de Minas Gerais (SES-MG). Foram levados em considera��o dez munic�pios mineiros cujas administra��es municipais se posicionaram favoravelmente ao uso de medicamentos que comp�em o ‘kit COVID-19’ em algum momento da pandemia: Uberl�ndia, Governador Valadares, S�o Louren�o, Paracatu, Itajub�, Ipatinga, Caratinga, Montes Claros, Jana�ba e Nova Lima.
A letalidade da doen�a nessas cidades n�o � necessariamente menor que em outras que n�o adotaram o protocolo e nem mesmo que a m�dia de Minas Gerais. No estado, 2,15% das pessoas diagnosticadas com o v�rus n�o conseguem se recuperar e morrem. O n�mero, por exemplo, � inferior ao de munic�pios como Itajub� (4,05%), Governador Valadares (3,51%), Caratinga (2,85) e Uberl�ndia (2,16%).
Por outro lado, h� tamb�m cidades cuja letalidade � menor que a m�dia estadual: S�o Louren�o (1,98%), Ipatinga (1,90%), Paracatu (1,82%), Nova Lima (0,90%), Montes Claros (0,01%) e Jana�ba (0,01%). N�o existe um padr�o. Portanto, � incorreto relacionar o uso do suposto tratamento - comprovadamente ineficaz - com eventuais quedas nos n�meros de mortes.
“Tudo o que a gente queria era que existissem medica��es simples, de bom perfil de seguran�a, com grande tolerabilidade e baixo custo, que funcionassem para proteger, para um tratamento precoce ou para um tratamento em fase grave, que tivessem uma efic�cia comprovada e ampla. Infelizmente, nenhuma dessas medica��es que as pessoas t�m usado - nem ivermectina, nem azitromicina, nem hidroxicloroquina, nem vitamina D, nem nitazoxanida - tem esse perfil”, refor�ou a m�dica infectologista e mestra em sa�de p�blica, Luana Ara�jo.
A comunidade cient�fica internacional n�o recomenda o uso dessas medica��es e nem reconhece o chamado ‘tratamento precoce’ - disseminado tamb�m pelo governador Romeu Zema (Novo) - como eficaz contra o coronav�rus. Pelo contr�rio: algumas drogas que comp�em o ‘kit’ podem colocar o paciente em risco ainda maior, em fun��o dos efeitos colaterais.
“Se voc� usar cloroquina por muito tempo, pode ter problemas card�acos. Tem gente usando para prevenir COVID-19, o que � um absurdo e uma burrice. Existem casos de cegueira provocados pelo uso cr�nico. A ivermectina � muito boa para tratar parasitas, o paciente toma uma dose s�. A dose que � preconizada para ‘tratar’ - entre aspas, porque n�o trata - a COVID-19 � um grande n�mero de comprimidos. A possibilidade de efeitos colaterais � muito grande: hepatite medicamentosa, eventualmente levando at� � possibilidade de transplante de f�gado”, explicou o m�dico infectologista e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Geraldo Cury.
As explica��es para indicadores melhores se referem, em especial, �s medidas preventivas no combate � pandemia: isolamento social, higiene das m�os e uso de m�scaras. N�o h� tratamento espec�fico contra a COVID-19. Os medicamentos utilizados em pacientes com o v�rus servem para tratar consequ�ncias da doen�a, como trombose ou infec��es secund�rias, por exemplo.
“Como n�o temos vacina suficiente porque o Minist�rio da Sa�de n�o encomendou no ano passado, s�o necess�rias medidas duras (de isolamento social). Essas medidas a que estamos assistindo agora em muitas cidades v�m no sentido de serem a possibilidade de diminuir o n�mero de mortes. N�s estamos falando aqui em UTIs lotadas, em hospitais cheios, em pessoas morrendo, esperando vaga em hospital. � preciso muito cuidado, � preciso usar sempre m�scara, evitar sair de casa e seguir as orienta��es das autoridades sanit�rias dos munic�pios respons�veis”, concluiu Geraldo Cury.