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Estado de Minas ENTREVISTA

Carlos Starling: 'Aglomera��es t�picas da folia, se fizermos, volta tudo'

Infectologista prev� retorno das atividades de forma cada vez mais regular. Mas ressalta que, at� boa parte de 2022, viveremos sob liberdade vigiada


19/09/2021 04:00 - atualizado 19/09/2021 07:40

'Eu não recomendaria às pessoas qualquer aglomeração nos próximos três ou quatro meses. Tenho atendido famílias inteiras infectadas porque resolveram fazer um jantar de aniversário para 10, 12 pessoas'
'Eu n�o recomendaria �s pessoas qualquer aglomera��o nos pr�ximos tr�s ou quatro meses. Tenho atendido fam�lias inteiras infectadas porque resolveram fazer um jantar de anivers�rio para 10, 12 pessoas' (foto: T�lio Santos/EM/D.A Press - 9/6/21)
O carnaval de alma lavada, com multid�es correndo atr�s do trio el�trico e da boemia perdida ainda n�o ser� o de 2022. O Natal deste ano tamb�m n�o ser� como o dos retratos de fam�lia pr�-pand�micos, com tios, primos, pais, av�s, todo mundo aglomerado em torno da ceia, entre abra�os e rusgas, como gosta o brasileiro padr�o.

Sem rodeios, o infectologista Carlos Starling avisa: pelo resto deste ano e, provavelmente, durante boa parte do ano que vem, ainda viveremos sob liberdade vigiada.

Tamb�m n�o estamos livres de novos colapsos do sistema de sa�de, tampouco de novos picos da epidemia. A boa not�cia, pondera o m�dico, � que as curvas da montanha-russa ser�o cada vez mais brandas, gra�as ao avan�o da vacina��o e ao arsenal de recursos de combate � COVID-19 que a ci�ncia promete entregar muito em breve – de vacinas nasais a armas imunobiol�gicas.

Quando o assunto s�o os legados da pandemia, Starling assume um tom bem mais otimista. “Ela nos ensinou a andar no escuro e achar o caminho certo. A principal heran�a que teremos � a da pedagogia da civilidade. A consci�ncia de corpo planet�rio”, diz o infectologista.

Na entrevista a seguir, Starling, que � membro do Comit� Municipal de Enfrentamento � COVID-19, comentou ainda a pol�mica decis�o da prefeitura de manter as escolas fechadas por 18 meses, a despeito das cr�ticas de pais, educadores e especialistas: “O que foi feito foi correto.”

Por quanto tempo ainda viveremos nessa esp�cie de “montanha-russa” de picos e quedas da pandemia, com restri��es de conviv�ncia? Quais as perspectivas para os pr�ximos seis meses?  
A epidemia, apesar dos dados epidemiol�gicos favor�veis neste momento, ainda tem um curso longo e muito indefinido. Isso em fun��o das variantes mais transmiss�veis, das limita��es da vacina��o, que ainda n�o chegou �s crian�as e adolescentes. E, principalmente, por causa da fragilidade com que a epidemia tem sido conduzida no pa�s pelo governo federal que, a cada dia, nos prega uma pe�a diferente.

Na quinta-feira (15/9), foi a interrup��o da vacina��o de adolescentes (BH e Minas decidiram na sexta-feira retomar o plano de vacina��o). Ent�o, existem as incertezas relacionadas � pr�pria caracter�stica do v�rus e as incertezas pol�ticas, relativas �s medidas que v�o sendo tomadas pelo governo ao longo desse processo. Tudo isso torna o futuro epidemiol�gico um tanto imprevis�vel.

Outro aspecto importante � que as vacinas dispon�veis n�o s�o esterilizantes. Ou seja: elas n�o evitam a transmiss�o do v�rus. Elas evitam a forma grave da doen�a e reduzem de forma extremamente significativa a mortalidade, mas o v�rus continua sendo transmitido. E ele continua circulando sem freio nas crian�as e jovens at� 17 anos, que ainda n�o foram vacinados. Eles representam cerca de 25% da popula��o. Novas variantes podem surgir a partir da�.

Ent�o, infelizmente, n�s podemos ter, sim, novos colapsos do sistema de sa�de e novas ondas epid�micas. Nada impede que isso aconte�a, principalmente se considerarmos a presen�a das variantes mais transmiss�veis e, eventualmente, mais virulentas. Claro que n�s vamos passar por tudo isso com um pouco mais de conforto por causa da vacina��o.

Mas n�o podemos prescindir jamais das medidas de distanciamento social, do uso de m�scaras ou da higieniza��o das m�os. At� o fim deste ano e boa parte do ano que vem, os protocolos sanit�rios ser�o necess�rios. Ou melhor: at� que tenhamos 80% da popula��o completamente vacinada, com os grupos de maior risco revacinados.

Porque, agora, n�s j� sabemos que as vacinas dispon�veis no momento t�m uma efic�cia muito boa, mas a imunidade cai progressivamente. Logo, n�s vamos precisar de novos ciclos de vacina��o e de novas vacinas que contemplem as variantes e que, se poss�vel, sejam esterilizantes.

Isso significa que as pessoas n�o devem ficar muito animadas para o Natal e para o carnaval do ano que vem?
Eu n�o recomendaria �s pessoas qualquer aglomera��o nos pr�ximos tr�s ou quatro meses. Tenho atendido fam�lias inteiras infectadas porque resolveram fazer um jantar de anivers�rio para 10, 12 pessoas. A situa��o epidemiol�gica � um pouco mais confort�vel em rela��o ao que n�s vivemos em abril e mar�o, que foi um caos. Mas o cen�rio ainda � preocupante.

Sobre o carnaval, para fevereiro do ano que vem, temos uma perspectiva melhor do que a do ano passado. Mas as aglomera��es t�picas da folia, se fizermos, volta tudo de novo. N�s estamos muito atentos �s pr�ximas duas semanas em fun��o das aglomera��es do feriado de 7 de Setembro e que devem se refletir agora. J� est�o come�ando a se refletir.

A taxa de transmiss�o do v�rus em Belo Horizonte j� subiu, est� em 1,08. Ent�o n�s come�amos j� a perceber uma certa tend�ncia de aumento do n�mero de casos. Se isso n�o se refletir no sistema de sa�de, se n�o pressionar as interna��es em UTI, est� muito bom. Paulatinamente, chegaremos num n�vel mais confort�vel de vida e poderemos vislumbrar o retorno das nossas atividades de forma cada vez mais regular. Mas n�o por enquanto. Por enquanto, ainda estamos sob liberdade vigiada.

Como o senhor vislumbra que v�o funcionar os ciclos de vacina��o contra a COVID-19?
O futuro da vacina��o, na minha opini�o, vai passar por uma vacina intramuscular e uma vacina de uso nasal. � isso que a literatura est� nos mostrando para um futuro muito breve. As vacinas nasais, essas sim, t�m se mostrado com capacidade esterilizante, ou seja, evitam que as pessoas transmitam o v�rus.

Esses imunizantes j� devem estar dispon�veis no pr�ximo ano e poderemos, ent�o, fazer combina��es de estrat�gias. At� l�, teremos que manter os protocolos sanit�rios. Isso vai ajudar muito no processo de retomada da normalidade.

Mas � importante ressaltar que a epidemia n�o vai acabar se n�o houver uma distribui��o de vacinas para o mundo inteiro. Para todas as camadas sociais, todas as classes sociais. Todos os pa�ses t�m que estar mais ou menos na mesma p�gina. Sen�o, a epidemia termina num canto e come�a no outro. Da� o v�rus muta e teremos o ping-pong do v�rus do lugar que n�o vacinou para o que vacinou, estaremos sempre correndo atr�s da variante prevalente.

E o tratamento da COVID-19, como deve evoluir?
As perspectivas s�o muito boas. Podemos sim, esperar o desenvolvimento de tratamentos inovadores e realmente eficazes. Os anticorpos monoclonais s�o um exemplo. � um recurso direcionado a pessoas com alto risco de desenvolver formas graves da doen�a. Isso j� � uma realidade. Esse tratamento j� � disponibilizado e autorizado pela Anvisa para uso em grupos espec�ficos, em situa��es espec�ficas.

Existem tamb�m antivirais, ainda com efic�cia limitada, mas que, em determinados momentos cl�nicos, mudam o curso da doen�a. Temos as drogas imunobiol�gicas, que tamb�m melhoram o progn�stico dos pacientes. Mas o melhor de tudo � que n�s passamos a entender melhor a fisiopatologia da COVID-19. Logo, temos condi��o de tratar melhor os doentes porque, agora, conhecemos com mais profundidade a maneira como a infec��o se desenvolve nas pessoas.

A pandemia deixou uma esp�cie de legi�o de sequelados, que j� demandam todo tipo de suporte –  de fisioterapia a hemodi�lise. No Cear�, este p�blico j� pressiona o sistema de sa�de a ponto de hot�is terem sido transformados em centros de reabilita��o. Essa crise vai se espalhar pelo pa�s?
Os dados oficiais apontam 20 milh�es de pessoas infectadas, mas eles s�o subestimados. Logo, as consequ�ncias da infec��o tamb�m. Ent�o, teremos, sim, que lidar com um contingente muito grande de pessoas com as mais diversas sequelas que v�o precisar de suporte. A pandemia tem os seus reflexos no curto, m�dio e longo prazos.

Esse � possivelmente um reflexo de m�dio e longo prazos. Portanto, � razo�vel esperarmos um tensionamento do sistema de sa�de pelas sequelas da doen�a. O que a gente lamenta muito � que isso poderia ter sido bastante minimizado com a condu��o adequada da pandemia. Estudos mostram que quatro de cada cinco �bitos poderiam ter sido evitados no pa�s. Da mesma forma, esses quadros cl�nicos de sequelas.

O que aprendemos e o que ainda precisamos aprender com a pandemia?
Certamente, aprendemos demais nessa pandemia. Um dos aprendizados � que o nosso sistema de vigil�ncia epidemiol�gica precisa melhorar muito. Precisamos de um incremento dos sistemas de informa��es epidemiol�gicas, especialmente da sistematiza��o de dados. Isso tem que ser muito �gil. Epidemiologistas e infectologistas batem nessa tecla desde 2009, quando passamos pela gripe su�na. O investimento em sistemas de informa��o � para ontem.

Outra coisa important�ssima � o investimento em pesquisa. Um pa�s sem pesquisa � muito vulner�vel, � assim como um pa�s sem fronteiras. Sem ci�ncia e forma��o de especialistas, ficamos absolutamente vulner�veis e dependentes de outros pa�ses.
Mas o ponto que talvez seja mais importante � que precisamos aprender a ser mais respons�veis do ponto de vista coletivo.

O ego�smo � fatal, vimos que � incompat�vel com o que estamos enfrentando agora e vamos enfrentar no futuro porque, certamente, novas epidemias vir�o. O interesse coletivo tem que sobrepujar o interesse individual em nome da nossa sobreviv�ncia enquanto esp�cie.

Nesse sentido, o SUS tem que ser muito bem estruturado. Foi ele que segurou as pontas de uma popula��o brasileira N�s temos a� 50 milh�es de pessoas que t�m plano de sa�de e mais de 150 milh�es que n�o t�m e que precisam ser atendidas. Quando voc� compromete os 150 milh�es, os outros 50 milh�es ficam amea�ados tamb�m.

Ali�s, ficou muito claro nessa pandemia que o setor privado � t�o vulner�vel quanto o p�blico, colapsou junto com ele. Em alguns momentos, colapsou mais. O fato de voc� ter a carteirinha de um plano de sa�de nobre n�o garante sobrevida num contexto epid�mico. Eu espero que a popula��o tenha percebido isso.

N�s tamb�m vamos ter que repensar as escolas. N�o falo s� do ponto de f�sica tecnol�gico, das adapta��es para o novo normal, mas tamb�m do ponto de vista pedag�gico. O que elas ensinam do ponto de vista dos relacionamentos, do combate ao individualismo. N�s temos que enfatizar a pedagogia da civilidade.
A pandemia nos ensinou a andar no escuro e achar o caminho certo. A solu��o deixar� rastros na nossa nossa mem�ria presente e na nossa estrutura gen�tica. Mas a principal heran�a e legado que teremos � a da pedagogia da civilidade. A consci�ncia de corpo planet�rio.

Como o senhor avalia o desempenho de Belo Horizonte na pandemia?
N�s somos uma das capitais com menor mortalidade do pa�s por milh�o de habitantes. Isso � um sinal favor�vel. Acho que n�o foi f�cil para n�s, como n�o foi f�cil para ningu�m, lidar com a complexidade do problema. Mas, certamente, as medidas tomadas aqui se mostraram eficazes em compara��o com outros locais. Numa capital deste tamanho, n�o tivemos, em nenhum momento, doentes morrendo por falta de oxig�nio ou na fila das UTIs. Ou seja: as pessoas foram acolhidas pelo sistema de sa�de, o p�blico e o privado.

Mas n�s temos que melhorar a testagem. Ali�s, come�ou ontem um programa de testagem ampla. Ser�o mais de 800 testes por dia realizados na popula��o de forma aleat�ria. � uma medida que vem tarde, mas, por outro lado, faltaram insumos e testes no Brasil. A verdade � que a pandemia mudou o conceito de produtos de primeira necessidade. �lcool em gel tornou-se artigo de primeira necessidade. Tecnologia de testes, a mesma coisa.

Na compara��o com outras capitais e, sobretudo, com outras cidades do mundo, BH foi uma  das localidades que permaneceram mais tempo com as escolas fechadas. Essa postura recebeu muitas cr�ticas ao longo da pandemia. Hoje, o senhor acredita que manter as aulas presenciais suspensas por tanto tempo foi um erro?
N�o foi erro, n�o.  O que foi feito foi correto. Falar que tem que abrir escolas porque as crian�as n�o se infectam e n�o s�o atingidas pela forma grave da doen�a � um equ�voco. A grande maioria das crian�as, de fato, vai desenvolver formas mais brandas da COVID. Mas, nem por isso, o problema � menor. A quest�o � mais complexa.

Se tiv�ssemos reaberto as escolas antes, sem protocolo seguro e sem conhecimento sobre o desenvolvimento da doen�a neste p�blico, seria uma irresponsabilidade. Sim, outros pa�ses retomaram as atividades escolares presenciais mais cedo. Mas vamos lembrar que, aqui no Brasil, n�s temos uma mortalidade 15 vezes maior do que a americana ou a do Reino Unido. O acesso ao tratamento nesse pa�s tamb�m � completamente diferente na compara��o com os pa�ses desenvolvidos. A diferen�a social de um lugar para o outro, portanto, faz com que o manejo da epidemia tenha que ser diferente.

Essa quest�o foi muito politizada e muito pressionada pelas escolas privadas. Os interesses envolvidos v�o al�m do bem das crian�as. H� interesses comerciais e eles precisam ser colocados na balan�a. Ent�o, n�s tivemos que ter cautela para lidar com isso, pois o que estava em jogo era a vida das pessoas. As escolas s�o fundamentais, s�o prioridade. Mas elas t�m que estar preparadas para enfrentar um momento diferente.

Os surtos que ocorrem em qualquer ambiente fechado se espalham para dentro da casa das pessoas. E vice-versa, o que est� dentro da casa das pessoas vai para as escolas. Isso gera quadros cl�nicos graves e, eventualmente, a morte de pessoas mais vulner�veis. Uma infec��o banal para uma crian�a pode ser fatal para o av� dessa crian�a. Isso, eu acho que � uma coisa que a popula��o percebeu. A epidemia mostrou claramente que o fato de a infec��o ser mais branda, n�o significa que n�o seja importante para o pai, a m�e, o av�, o tio da crian�a. Ela n�o est� isolada na escola, mas inserida em um contexto social.

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