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Estado de Minas NA LINHA DE FRENTE

Bombeiros que combatem os inc�ndios florestais afirmam: 'Estamos cansados'

O desabafo indignado � a tradu��o de uma triste estat�stica: somente em setembro, foram 4.100 chamados; 2021 j� superou o n�mero de ocorr�ncias de 2020


26/09/2021 04:00 - atualizado 26/09/2021 08:21

Tenente Daniel Lipovetsky:
Tenente Daniel Lipovetsky: "No fim de cada opera��o, olhamos para a tropa e todos est�o desgastados. � um cansa�o que vai se acumulando" (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A. PRESS)

“Voltar pra casa � um al�vio. � voltar inteiro, vivo, e com a sensa��o de miss�o cumprida. Mas �s vezes a gente n�o volta. O Roberto, por exemplo, foi e n�o voltou”, desabafa o tenente Daniel Lipovetsky ao lembrar o colega que morreu durante combate a inc�ndio na �ltima quarta-feira, o  sargento Carlos Roberto da Silva .

Conhecidos como Soldados do Fogo, os bombeiros militares desafiam diariamente o limite entre a vida e a morte. E o combate tem sido mais intenso nesta �poca do ano em que o  clima seco castiga Minas Gerais : entre abril e setembro, o Corpo de Bombeiros registrou mais de 20 mil chamados para ocorr�ncias relacionadas a queimadas.

Muitas vezes, esses focos come�am como uma atitude irrespons�vel e se transformam em labaredas que matam a vegeta��o e animais, amea�am ou atingem pessoas e im�veis, poluem o ar e ainda p�em em risco os pr�prios combatentes.

Somente em setembro, os Bombeiros receberam 4.100 chamados at� o dia 24. Nos nove primeiros meses, � poss�vel afirmar que 2021 bateu recorde de atendimento contra o fogo em rela��o aos �ltimos tr�s anos. Foram mais de 21.700 ocorr�ncias. No ano passado, o acumulado de 12 meses ficou em 20.741. Em 2019, foram 18.567.



A estat�stica se traduz na pr�tica sob a forma do suor no trabalho dos bombeiros, no olhar de cansa�o e no desabafo indignado: “Estamos cansados”. A reportagem do Estado de Minas ouviu esses combatentes que est�o na linha de fogo, lidando com a dor de um trabalho exaustivo, enfrentando calor, sede e perigo na tentativa de apagar labaredas sob sol escaldante para cumprir o prop�sito da profiss�o: salvar vidas e bens alheios.


DEVER CUMPRIDO


Tenente Daniel Lipovetsky:
Tenente Daniel Lipovetsky: "O complicado da profiss�o � ser t�cnico e ter esse olhar de empatia para lidar com o sofrimento" (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A. PRESS)


Tenente Daniel Lipovetsky, 33 anos

Bombeiro h� 15 anos
Coordena equipe no 2º Batalh�o, em Contagem, Grande BH

 

“� muito triste ver pessoas perdendo seus bens, parentes ou animais de estima��o. O complicado da profiss�o � ser t�cnico e ter esse olhar de empatia para lidar com o sofrimento. Os inc�ndios florestais s�o bastante exaustivos.

Tem o calor do fogo e o do ambiente. A gente trabalha com fardamento completo, equipamentos de prote��o, tudo isso nos deixa exaustos. No fim de cada opera��o, olhamos para a tropa e todos est�o desgastados. � um cansa�o que vai se acumulando.

Este � sempre um per�odo cr�tico, em que a gente vem trabalhar j� sabendo exatamente o que vamos encontrar. Permanecemos horas combatendo o fogo, nos deslocando em dist�ncias grandes. Os inc�ndios florestais desgastam f�sica e psicologicamente. �s vezes, achamos que � s� mato queimando, mas o fogo na vegeta��o passa para um galp�o de empresa em que h� maquin�rio, subst�ncias inflam�veis. S�o riscos...

A pessoa pensa que o fogo � tranquilo e depois de queimar o amontoado de lixo ou folhas, aquilo se alastra e h� todo um desdobramento impens�vel. Toda uma log�stica: v�rios �rg�os, viaturas, brigadistas... Precisamos conscientizar a popula��o.

Com tudo isso, voltar para casa � um al�vio. Voltar inteiro, vivo e com a sensa��o de miss�o cumprida. � o que fazemos. A gente se entrega para a profiss�o que juramos desempenhar da melhor maneira poss�vel, que � salvar vidas e os bens das pessoas.”


FUTURO CINZENTO


Sargento Anderson Pereira Rodrigues:
Sargento Anderson Pereira Rodrigues: "Tem situa��es de combate de 12 ou 24 horas ininterruptas. A gente faz uma ora��o e segue cansado, mas sabemos que no dia seguinte conseguiremos descansar" (foto: ALEXANDRE GUZANSHE/EM/D.A. PRESS)


Sargento Anderson Pereira Rodrigues, 45 anos

Bombeiro h� 28 anos
Trabalha no 2º Batalh�o, em Contagem, Grande BH

 

“A gente trabalha com diversidade grande de temperatura, da topografia do terreno, de acesso ao local. �s vezes, vamos combater um inc�ndio dentro de uma mata e precisamos caminhar tr�s quil�metros carregando material e alimenta��o. � uma atividade em que sofremos um pouco, devido �s adversidades.

A atividade de bombeiro operacional requer condicionamento e preparo para lidar com essa rotina, mas o inc�ndio florestal � muito desgastante. Tem situa��es de combate de 12 ou 24 horas ininterruptas. A gente faz uma ora��o e segue cansado, mas sabemos que no dia seguinte conseguiremos descansar.

Quando atendemos a essas ocorr�ncias sabendo que s�o criminosas, eu me sinto pequeno e frustrado. Ficamos decepcionados, porque s�o inc�ndios que poderiam ser evitados. Acredito que na maioria das situa��es falta conscientiza��o.

Viemos daquela cultura de usar o fogo para limpeza e ele vai tomando propor��o diferente, em que se perde o controle. � uma a��o totalmente devastadora. Passamos por beiras de estradas e o fogo est� ardendo. Aquilo n�o tem utilidade para algu�m. � um dano para o meio ambiente, que interfere nas nossas �guas e nos nossos ares. Temos o compromisso de deixar um ambiente melhor para nossos filhos e nossa sociedade.”

 

 

DOR E FRUSTRA��O

Tenente Sérgio Lamêgo Magalhães:
Tenente S�rgio Lam�go Magalh�es: "O maior problema � o desgaste f�sico mesmo, relacionado ao calor, ao fato de o militar ter que carregar o pr�prio equipamento, na maioria das vezes fazendo caminhadas de pelo menos cinco quil�metros at� que chegue ao local do foco" (foto: ED�SIO FERREIRA/EM/D.A. PRESS)


Tenente S�rgio Lam�go Magalh�es, 38 anos
Bombeiro h� 11 anos
Coordena equipe no 1º Batalh�o, na Regi�o Centro-Sul de BH

 

“Agora no per�odo de estiagem temos essa demanda espec�fica de inc�ndio florestal, um per�odo que causa um desgaste, principalmente devido � quantidade de ocorr�ncias e tamb�m ao tempo que demora para resolver. O maior problema � o desgaste f�sico mesmo, relacionado ao calor, ao fato de o militar ter que carregar o pr�prio equipamento, na maioria das vezes fazendo caminhadas de pelo menos cinco quil�metros at� que chegue ao local do foco.

Em diversas situa��es, militares acabam se acidentando, mas n�o por quest�o de mau uso de EPI (equipamento de prote��o individual) – muito pelo contr�rio, acho que o Corpo de Bombeiros nunca esteve n�o bem protegido em rela��o aos equipamentos. Mas tem a quest�o do cansa�o f�sico, que acaba gerando certa desaten��o no deslocamento no meio da mata e essa desaten��o pode acabar em acidente. Pode haver tor��es, quedas e � grande o perigo da falta de visibilidade.

Acho que medo n�o � muito a principal palavra. Ele acompanha a gente em todas as ocorr�ncias, n�o s� de inc�ndio florestal, mas acho que a sensa��o quando a gente n�o consegue controlar o fogo no tempo que se previa � de frustra��o. � a palavra certa.”


C�RCULO DE FOGO

Sargento Roberto Carlos Babeto:
Sargento Roberto Carlos Babeto: "Em Arinos, queimou bastante, foi muito grande, muito dif�cil, n�o tem condi��o de combate" (foto: ED�SIO FERREIRA/EM/D.A. PRESS)


Sargento Roberto Carlos Babeto, 48 anos
Bombeiro h� 29 anos
Trabalha no Pelot�o de Combate a Inc�ndios Florestais, com sede em BH

 

"Certa vez, eu e meu primo, que foi para a reserva no ano passado, fomos cercados pelo fogo na Serra do Sabonetal, nas margens do Rio S�o Francisco (Itacarambi, Norte de Minas). A gente aguardava a aeronave para nos retirar e avistava o fogo vindo distante, com uma caracter�stica muito parecida  ao que vimos em Arinos esta semana .

Est�vamos em um lugar tranquilo para o pouso da aeronave, na estrada, mas o fogo pulou a estrada dos dois lados. N�o tinha mais como ningu�m acessar nem como a gente sair. O fogo foi fechando, at� que n�o teve mais como correr e a gente teve que se abrigar da melhor forma poss�vel.

Queimou tudo: nossa roupa, derreteu o capacete... As ferramentas com cabo de madeira queimaram, as bombas come�aram a retorcer por causa do calor. E n�s nos ‘sapecamos’ todo… Por nossa sorte, um dos brigadistas veio com a caminhonete, passou e n�s pulamos na ca�amba.

Foi como conseguimos sair daquela situa��o, a mais cr�tica que enfrentei, ao lado de Arinos, agora.
Em Arinos, queimou bastante, foi muito grande, muito dif�cil, n�o tem condi��o de combate. As equipes v�o trabalhar muito ainda. Arinos e Paracatu est�o em chamas. [O  inc�ndio em Arinos  foi debelado ontem, dias depois do depoimento]

 

Eu n�o tenho medo. Desde quando eu entrei aqui me vi com o perigo e n�o tive medo. Por isso eu me machuquei bastante (risada). Num primeiro momento a gente fica chateado porque a gente sabe que o inc�ndio � criminoso.

Na Serra do Rola-Mo�a, colocavam fogo, a equipe ia e conseguia apagar. S� que, antes de voltar ao pelot�o, j� tinham colocado mais. Isso � uma cultura que tem que ter uma puni��o mais severa. � muito dif�cil tamb�m pegar quem colocou fogo."


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