Devasta��o na Serra do Curral crescer� 20% com nova mina
Cavas da Tamisa adicionar�o 101 hectares � mancha de destrui��o de 511ha acumulada em d�cadas de minera��o, apontam c�lculos do EM com base em mapas do dossi�
Vista da Serra do Curral a partir do Pico Belo Horizonte: �rea que a Tamisa pretende minerar � 11,2 vezes maior que as dos dois empreendimentos em atividade somadas (foto: Mateus Parreiras/EM/D.A Press)
“Megaestrutura” ou empreendimento conservador? A classifica��o do porte do complexo da Taquaril Minera��o S.A (Tamisa), que prev� escava��o de 101 hectares da Serra do Curral – �rea equivalente a um ter�o da do Parque das Mangabeiras –, � mais um dos pontos de confronto entre ambientalistas, que temem impactos severos do projeto, e �rg�os do governo estadual e representantes do setor produtivo, que se apoiam no argumento de que o licenciamento dado � empresa foi baseado em decis�es “t�cnicas” para minimizar a poss�vel devasta��o. Utilizando como base os dados dos mapas do dossi� de tombamento da Serra do Curral produzido pelo Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha), a reportagem do Estado de Minas calcula que �rea que a Tamisa pretende minerar corresponde a cerca de 20% das manchas de destrui��o j� deixadas pela minera��o (veja quadro comparativo e mapa) na forma��o montanhosa, um dos s�mbolos mineiros.
Em outras palavras, vai representar um aumento de 20% na �rea devastada. Se levadas em conta apenas as duas minas em atividade atualmente, que somam 9,01 hectares (ha), a Tamisa reinar� como a maior minera��o no local , com �rea explorada 11,2 vezes maior.
De acordo com os dados baseados no mapeamento do Iepha e dos dat�lites usados pelo Google Earth e a ONG Global Forests Watch sobre concess�es de minera��o e outras informa��es, a �rea de tombamento da Serra do Curral na proposta do dossi� considerada “�rea Tombada” dentro da “�rea de Estudos” � de 6.320ha (pouco maior que o Parque Estadual do Itacolomi, entre Ouro Preto e Mariana). Atualmente, a mancha de devasta��o deixada por atividades miner�rias exercidas por d�cadas � de 511,07ha, o que corresponde a 8,08%. Essa mancha poder� aumentar em quase um quinto com a Tamisa. Atualmente, se descontada a mancha de ocupa��o urbana da serra (7,48%), restam 5.335,63 ha de �rea nativa ou em recupera��o sem atividades, equivalentes a 84,42% do total da Serra do Curral.
Com a libera��o completa do projeto da Tamisa, j� detentora de licen�as de Instala��o e Pr�via para a fase 1 (41ha) e a fase 2 (60ha) a mancha de atividades miner�rias cresce para 612,31ha – ou 9,68% do total da �rea que se pretende tombar – e para 1.085,61ha na soma das �reas urbana e mineradas, totalizando uma ocupa��o de 17,17% do espa�o potencialmente preserv�vel. A minera��o da Tamisa praticamente se debru�ar� sobre as encostas de Nova Lima, a uma dist�ncia de poucos metros da dobra do cume das montanhas, ou seja, do in�cio do territ�rio de Belo Horizonte. Ainda assim, os argumentos da capital mineira foram deixados de fora do processo legal de licenciamento do projeto.
“Esse projeto vai simplesmente fazer um rombo no corredor ecol�gico que permite a movimenta��o de v�rias esp�cies pela Serra do Curral. Com certeza, a movimenta��o de ve�culos e o barulho da extra��o de min�rio afugentar�o o fluxo normal dos animais. E a Serra do Curral � importante para ligar, principalmente, a avifauna da regi�o da Serra do Cip� com as serras do Rola-Mo�a e Moeda. Cortar esse fluxo compromete a variabilidade gen�tica e prejudica as popula��es”, observa o professor de qu�mica, pesquisador de espeleologia e ativista ambiental Luciano Faria.
Paulo Carvalho, diretor da ONG de conserva��o das aves EcoAvis, concorda que a minera��o proposta na Serra do Curral ter� um grande impacto no corredor ecol�gico, que considera j� altamente impactado. “As plantas dependem das aves e dos insetos para sua reprodu��o e dispers�o. De forma similar, insetos e aves dependem de plantas espec�ficas para alimenta��o, abrigo e reprodu��o. Pequenas perturba��es neste equil�brio podem ter efeitos catastr�ficos sobre as popula��es de um ecossistema. E mal conhecemos as din�micas que ser�o afetadas em um campo ferruginoso de altitude e suas depend�ncias em rela��o aos remanescentes de Mata Atl�ntica”, diz.
Poeira chegando aos bairros Serra e Santa Efig�nia, ru�dos nas comunidades e impactos preocupantes nos recursos h�dricos que abastecem a Grande BH teriam sido trocados por alinhamentos que se tornam permiss�es consideradas “absurdas” para a ambientalista Maria Tereza Viana de Freitas Corujo, a Teca, que integra v�rios movimentos para defender as cadeias montanhosas e �guas mineiras. “Al�m de graves altera��es na legisla��o ambiental (n�veis estadual e federal) feitas em especial nos �ltimos 10 anos, existe o descumprimento do que ainda temos e que protegeria esse patrim�nio �nico de biodiversidade. Tudo atrelado a um sistema de gest�o p�blica que tem como pol�tica priorit�ria atender aos interesses econ�micos de grandes grupos, como � o caso da minera��o em Minas Gerais”, observa.
O Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema) e o setor miner�rio t�m se posicionado a favor da minera��o da Tamisa na Serra do Curral com o discurso de que os impactos est�o tecnicamente dentro da toler�ncia da legisla��o. Na outra ponta, h� cr�ticas legais e den�ncias de deputados, Prefeitura de Belo Horizonte, minist�rios p�blicos Federal e Estadual, partidos e ambientalistas.
Em audi�ncia p�blica na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, na quinta-feira a secret�ria de estado de Meio Ambiente e desenvolvimento sustent�vel (Semad), Mar�lia Carvalho de Melo, encolheu retoricamente os impactos e as dimens�es da Tamisa. “O projeto foi readequado (em 2019), com diminui��o, inclusive, da �rea de explora��o. A �rea total da fazenda onde o empreendimento est� � de 1.250 hectares (ha). Mas o projeto, na sua primeira fase aprovada no Copam far� interven��o em 41 hectares. Isso equivale a 0,54% da �rea da Serra do Curral”, disse. “E a compensa��o � um ponto a se destacar. A compensa��o equivale a 83ha”, contemporiza Melo.
Ela minimizou os impactos sobre recursos h�dricos, desconsiderando alertas de ambientalistas para outros efeitos. “J� h� uma capta��o em um po�o tubular que ter� 10 litros por segundo (l/s) de vaz�o . Na segunda fase, ser�o outros tr�s, que somar�o 54 l/s. S� o abastecimento p�blico da Copasa na Grande BH � de 18.900 l/s”, comparou.
O superintendente de projetos priorit�rios da Semad, Rodrigo Ribas, compara a explora��o projetada pela Tamisa, que retirar� 1 milh�o de toneladas de min�rio de ferro por ano na primeira fase e 3 milh�es na segunda, � de outras mineradoras. “Falaram de megaempreendimento na Serra do Curral. Para se ter uma ideia, a Samarco, em Mariana, tem licenciada (a explora��o) de 29 milh�es de toneladas por ano e � muito maior. Itabira (Vale) tem uma licen�a de produ��o anual de 96 milh�es. N�o se compara. N�o d� para falar de megaempreendimento nesse caso”.
J� o consultor da Tamisa Leandro Amorim afirma que a empresa seguiu todas as regras. “ Se o que se est� propondo (suspender as licen�as) virar regra, n�o existir� mais licenciamento ambiental em Minas ”, afirma. (MP)
Pr�dio em Nova Lima onde a Tamisa informou estar sediada: empresa alegou "home office" para o fato de ningu�m ter sido encontrado no endere�o (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Com empresa fechada, juiz manda intimar diretor em casa
Ap�s uma oficial de Justi�a n�o encontrar representantes da Taquaril Minera��o S.A (Tamisa) na sede da empresa, em Nova Lima, na Regi�o Metropolitana, a companhia emitiu nota para informar que adotou o trabalho remoto. Diante das dificuldades para notificar a mineradora do prazo de 10 dias para se manifestar no processo em que a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) pede a suspens�o da licen�a para explora��o na Serra do Curral, o judici�rio intimou pessoalmente, ontem, Cristiano Pinto Caetano da Cruz, um dos diretores da Tamisa.
“� interesse da empresa o imediato e completo esclarecimento de todo e qualquer questionamento judicial, pelo que seu diretor j� entrou em contato com Secretaria da 22ª Vara Federal se colocando � disposi��o para receber qualquer mandado judicial de intima��o ou cita��o, inclusive nos finais de semana”, l�-se em comunicado enviado pela Tamisa ao Estado de Minas.
H� dois dias, o juiz federal Carlos Roberto de Carvalho deu 10 dias para que a empresa e o governo se manifestem sobre a liminar solicitada por Belo Horizonte. Com a dificuldade de encontrar representantes da Tamisa, por�m, o prazo ainda n�o come�ou a correr. A Procuradoria-Geral do Munic�pio (PGM) solicitou, ent�o, a cita��o por “hora certa”. O mecanismo permite que o per�odo estipulado comece a contar sem que haja a efetiva ci�ncia da companhia. Para isso, basta Cristiano ser encontrado em casa.
Na quinta-feira, uma emiss�ria do Poder Judici�rio esteve no pr�dio onde a Tamisa informou estar baseada. A porteira do edif�cio – na Avenida Oscar Niemeyer, em Nova Lima – no entanto, afirmou n�o ver funcion�rios da mineradora no local h� cerca de dois anos. Segundo a mineradora, a sede permaneceu fechada por causa das restri��es impostas pela pandemia COVID-19.
“O funcionamento se deu em regime de home office, regime este que prepondera at� a presente data”, apontam os representantes. “Ap�s a concess�o das licen�as junto aos �rg�os ambientais competentes, os diretores e consultores da empresa est�o empenhados em in�meras atividades externas, que englobam tanto aquelas necess�rias ao atendimento das condicionantes que devem ser cumpridas, quanto pelo empenho e dedica��o no esclarecimento de d�vidas e questionamentos de autoridades e meios de imprensa”, continua a empresa.
A decis�o da Justi�a pela intima��o pessoal a Cristiano da Cruz veio horas ap�s a Prefeitura de BH anexar, ao processo pela suspens�o da licen�a, a comunica��o da oficial informando o fracasso na tentativa de contato com a Tamisa. Em dezembro do ano passado, outra emiss�ria do Judici�rio foi ao pr�dio em Nova Lima para informar a empresa sobre uma a��o civil p�blica do Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG). Tamb�m n�o houve sucesso.
“A minera��o da serra que d� nome a Belo Horizonte j� exige cautelas por si s�. Com ainda mais raz�o agora que se sabe que a empresa tem uma sede com ind�cios de ser de fachada, como certificado, com f� p�blica, pelo oficial de Justi�a ao colher o relato do porteiro do pr�dio de que ‘n�o tem visto funcion�rios da empresa no local’ h� mais de um ano”, apontou o subprocurador-geral do Contencioso, Caio Perona, ao pedir a Justi�a a cita��o por “hora certa”.
O magistrado Carlos de Carvalho, por sua vez, apontou “suspeita de oculta��o”. “Diante da suspeita de oculta��o da empresa, dever� ser feita a cita��o por hora certa”, l�-se em trecho do despacho do juiz Carlos Roberto de Carvalho, da 22° Vara Federal.
Segundo as informa��es cadastrais da Tamisa, apresentadas � Receita Federal, o quadro societ�rio tem, al�m de Cristiano da Cruz, o diretor Guilherme Augusto Gon�alves Machado. A empresa tem rela��es com a Cowan, construtora respons�vel pelo viaduto Batalha dos Guararapes, que caiu sobre um �nibus em 2014, em Belo Horizonte. O acidente matou duas pessoas e feriu 23. (GP)
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