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Estado de Minas CEMIT�RIO DO BONFIM

Visita guiada ao Bonfim: a capital que os mortos revelam

Entre t�mulos ornamentados por esculturas, passeios pela mais antiga necr�pole de BH d�o acesso �s v�rias faces da mem�ria da cidade


29/04/2023 04:00 - atualizado 29/04/2023 09:43

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Distribu�dos por 54 quadras, os t�mulos refletem diferentes fases art�sticas do Bonfim e guardam os restos mortais de an�nimos e famosos, como Arlinda Corr�a (jazigo acima), que d� nome a galeria de arte em BH (foto: Leandro Couri/EM/D.A press)
Soa estranho fazer uma visita guiada por um cemit�rio? A exemplo do P�re-Lachaise, em Paris, e do La Recoleta, em Buenos Aires, Belo Horizonte tamb�m tem um projeto de visita guiada � mais antiga necr�pole da capital: o Cemit�rio do Bonfim, que completou 126 anos em mar�o. O passeio, gratuito, acontece todo �ltimo domingo do m�s, sempre com um tema diferente. E amanh� (30/4), �s 9h, a visita apresenta um pouco da literatura mineira e brasileira observada nas alamedas do cemit�rio.

Cercado de lendas e mist�rios, o Bonfim guarda muito da hist�ria e da mem�ria da capital mineira em jazigos que s�o verdadeiras obras de arte. Ali est�o enterradas figuras ilustres, que participaram da vida social, pol�tica e cultural da cidade. O conjunto de esculturas, de valor art�stico inestim�vel, se estende por todo o cemit�rio e chama aten��o at� mesmo do visitante mais desatento. As obras dialogam com o crescimento da capital e d�o pistas de como certas correntes marcam a produ��o art�stica da cidade.

Primeira necr�pole p�blica da capital, onde pobres e ricos eram enterrados lado a lado, o Bonfim, assim como Belo Horizonte, tamb�m nasceu da vis�o de criar uma cidade completamente planejada. “Foi o primeiro cemit�rio oficial da nova capital, estrategicamente planejado longe da cidade para mascarar os odores da morte”, conta Marcelina das Gra�as de Almeida, historiadora e professora da Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), idealizadora do projeto de visitas guiadas no Cemit�rio do Bonfim. A pesquisadora acompanhou a reportagem do Estado de Minas em um passeio pelo cemit�rio.
 
Inaugurado �s pressas com a morte de Berthe Ad�le, jovem belga de 19 anos, filha de um engenheiro da comiss�o construtora da capital, o cemit�rio j� nasceu laico, desvinculado da Igreja. “Um passo importante para que a capital trouxesse esse ar de modernidade, rompendo com o modelo colonial, era construir um cemit�rio p�blico, fora da igreja”, relata a historiadora.

O t�mulo de Berthe � um dos mais singelos do cemit�rio, protegido por um gradil, esculpido em ferro por seu pai, em 1877. Cercado de mist�rio, curiosamente, brotou no local um cipreste, que hoje cobre de sombra o jazigo, onde h� apenas uma cruz de madeira e uma l�pide de m�rmore com o nome da falecida. A origem da �rvore ati�a a imagina��o de quem frequenta o cemit�rio. “Ningu�m sabe o motivo da sua morte, nem como essa �rvore veio parar aqui”, conta Marcelina.



Arco

A visita ao Bonfim come�a j� no imponente arco de entrada do cemit�rio, cravado pelos dizeres em latim: ‘morituri mortuis’. “� um ‘memento mori’, ou seja, uma lembran�a da nossa mortalidade, de que esse � o destino de todos, independentemente de classe social”, explica Marcelina.

Considerado um museu a c�u aberto, � bom que o visitante v� preparado, j� que o passeio dura cerca de tr�s horas e � realizado quase todo sob o sol, ent�o � importante proteger-se: �culos, chap�u, protetor solar e sombrinha s�o bem-vindos. Usar cal�ado fechado e cal�a comprida ajuda na prote��o contra animais pe�onhentos: logo na entrada, o visitante � informado sobre a presen�a de escorpi�es por l�. Os interessados em participar das visitas guiadas ao cemit�rio devem se inscrever, gratuitamente, pelo site Sympla. O agendamento � liberado 10 dias antes da data de cada visita. As vagas para a atividade s�o limitadas.
 
Apesar de p�blico, as suntuosas esculturas nos jazigos marcam as distin��es sociais at� mesmo na hora da morte. “Era a forma de a fam�lia mostrar seu status social, ent�o, os t�mulos precisavam se destacar", explica a historiadora. Com olhar atento, Marcelina caminha pelas quadras do cemit�rio elencando escultores e artistas famosos, outros nem tanto, respons�veis por talhar cuidadosamente as l�pides.



Divididas em 54 quadras, as obras refletem diferentes fases art�sticas do Bonfim. Os primeiros t�mulos foram constru�dos em m�rmore, material recorrente nas primeiras edifica��es de BH. A partir da d�cada de 1930, fica evidente a explora��o do bronze, para ornamentar imagens de santos, anjos e cristos crucificados. Em seguida, apareceu o granito.

Um dos mausol�us mais imponentes � o de Raul Soares, ex-governador de Minas Gerais, que d� nome � pra�a na Regi�o Centro-Sul de BH e ao hospital no Bairro Santa Efig�nia. Rico em detalhes, o altar em bronze e granito foi esculpido pelo artista italiano Ettore Ximenes, reconhecido por suas obras tumulares com refer�ncias religiosas e mitol�gicas. No mausol�u est�o significativas refer�ncias ao pol�tico, como a est�tua da Rep�blica, elementos da Justi�a e outros que remetem ao amor � p�tria.

“� um t�mulo que foi pago com dinheiro p�blico. Quando ele morreu, em 1924, houve uma como��o geral na cidade. Ele era muito querido. Ele foi enterrado em um t�mulo modesto e o governo mineiro decidiu construir uma homenagem a ele, inaugurada dois anos ap�s sua morte”, detalha a historiadora.

Death metal


fã sobe em tumulo no Bonfim
Estado de Minas flagrou um f� emocionado subindo no t�mulo para registar sua paix�o pela banda Sarc�fago, cuja capa de um �lbum foi feita no cemit�rio Bonfim (foto: Leandro Couri/EM/D.A.Press)


Mas o Bonfim abriga um t�mulo em especial que atrai visitantes de todas as regi�es do Brasil e at� do mundo. A curiosidade n�o � pelo falecido, que at� hoje ningu�m sabe quem �, mas pelo jazigo ter sido pano de fundo para a capa do �lbum de uma banda brasileira de death metal, chamada Sarc�fago, primeiro grupo de metal de Belo Horizonte, formado antes mesmo do sucesso da banda Sepultura.

A produ��o, lan�ada em 1987, foi pol�mica na �poca, j� que os integrantes usavam uma pintura facial, mais tarde popularizada pela banda norte-americana Kiss, e por estarem em um cemit�rio. Para compor a capa, eles utilizaram os dizeres I.N.R.I., sigla em latim que significa “Jesus Nazareno, o Rei”, cravada na l�pide para formar o nome do disco.
 
Na visita ao cemit�rio, o Estado de Minas flagrou um f� emocionado subindo no t�mulo para registar sua paix�o pela banda. Ele aproveitou a folga no trabalho para conhecer de perto um dos maiores �cones do grupo. “Eu curto muito a banda. Sa� de Santa Luzia s� para vir aqui, tinha que tirar essa foto”, celebra sorridente Richard Santos, de 20 anos.

A ousadia de Richard em subir em cima do t�mulo, no entanto, n�o deve ser tomada como exemplo. Apesar de ser um local aberto e p�blico, que guarda um grande acervo art�stico cultural, Marcelina lembra a import�ncia do respeito � fam�lia e tamb�m � mem�ria do falecido. “N�o � permitido subir nos t�mulos. Muitos o fazem na tentativa de conseguir melhores �ngulos para fotos, mas nem precisamos comentar, n�? Isso tudo a gente refor�a no in�cio da visita”, destaca a historiadora.




Roteiro atualizado


O roteiro dos passeios est� em constante processo de pesquisa e atualiza��o. Al�m de pesquisadores e especialistas na �rea, a constru��o das visitas tamb�m conta com a parceria de personagens significativos, mas muitas vezes inviabilizados na hist�ria dos cemit�rios: os coveiros.

“Eu pesquiso o cemit�rio h� muitos anos, e ainda n�o conhe�o tudo. Sempre tento descobrir mais coisas, principalmente com as pessoas que trabalham aqui. Eles me ajudam a pesquisar, se envolvem nesse processo de localizar e identificar os t�mulos para construirmos um trabalho ainda mais bacana”, ressalta Marcelina. Entre as v�rias personalidades que repousam no Cemit�rio do Bonfim, o �ltimo a ser descoberto pelos coveiros foi o t�mulo do c�lebre jornalista mineiro Jos� Lino Souza Barros, que morreu em janeiro deste ano.
 
A programa��o tem um dia dedicado � presen�a feminina no espa�o cemiterial, por�m, Marcelina ainda faz quest�o de incluir refer�ncias �s mulheres em todas as visitas. “Nossa hist�ria � muito marcada pelo masculino, a gente fala muito de homens, ent�o, � muito importante trazer as mulheres � cena”, enfatiza.

Entre as personalidades de destaque est� a artista belga Jeanne Louise Milde, que, como muitas mulheres na hist�ria, usava um pseud�nimo masculino para esconder seu primeiro nome, assinando suas obras apenas como J. Milde. “Ela era uma mulher fant�stica. N�o era casada, ent�o, voc� imagina, em 1929, uma mulher artista ter essa coragem. Se hoje Belo Horizonte ainda � uma cidade provinciana, imagine naquela �poca”, elogia Marcelina. A professora e artista pl�stica mineira Arlinda C�rrea, que d� nome � galeria de arte da Funda��o Cl�vis Salgado, � outro importante nome citado na visita.

Mais mist�rios


Uma das lendas mais conhecidas � da Loira do Bonfim. A vers�o mais comum � que um taxista conduziu uma linda mulher do Centro at� o Bonfim. Ela pede que ele aguarde alguns minutos antes de entrar no cemit�rio e o alerta que, caso n�o retorne, v� at� um endere�o escrito em um papel pegar o valor da corrida. O taxista foi ao endere�o onde estava uma senhora que afirma n�o ter autorizado ningu�m a pegar t�xi em seu nome. Ela permite que o homem entre em sua casa e v�, em cima da cristaleira, a foto da mo�a. Ao comentar que aquela era a mo�a que procurava, a senhora informou ser imposs�vel, pois ela, sua filha, havia morrido fazia tr�s anos e estava enterrada no Bonfim.



Confira os temas das pr�ximas visitas:


  • 30 de abril: O cemit�rio do Bonfim e a literatura: di�logos surpreendes
  • 28 de maio: Imigra��o e imigrantes: a hist�ria da cidade e o cemit�rio
  • 25 de junho: Signos e s�mbolos no espa�o cemiterial
  • 30 de julho: As ruas da cidade e sua conex�o com o Bonfim
  • 28 de agosto: Esporte e esportistas no cemit�rio do Bonfim
  • 24 de setembro: Religi�o e religiosidade no espa�o cemiterial
  • 22 de outubro: A paisagem cemiterial e a paisagem da cidade: aspectos inexplorados
  • 26 de novembro: Personagens e personalidades


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