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Estado de Minas VIOL�NCIA NAS ESCOLAS

Rede de apoio � fundamental para conter amea�as a docentes

Compet�ncias socioemocionais podem contribuir para que a categoria se sinta mais segura e reduza o n�mero de casos de ansiedade e depress�o


30/04/2023 04:00 - atualizado 29/04/2023 20:41

Especialista diz que professores precisam ter habilidades que vão além da sala de aula, como partilhar experiências e angústias
Especialista diz que professores precisam ter habilidades que v�o al�m da sala de aula, como partilhar experi�ncias e ang�stias (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

 

Em raz�o dos afastamentos ocorrerem por m�ltiplos fatores, a solu��o para o problema � complexa. A especialista em educa��o, Priscila Boy, por�m, aponta alguns caminhos. Para ela, a escola precisa incluir, na forma��o continuada do professor, a dimens�o socioemocional.

 

“Estamos vendo que sem as compet�ncias socioemocionais, n�o vamos dar conta de viver nesse mundo din�mico, violento e cada dia mais individualista. ï¿½ preciso desenvolver as compet�ncias de empatia, coopera��o e �tica. Sou formadora de professores e sempre tenho procurado trazer para as minhas forma��es, n�o s� a dimens�o cognitiva, do conhecimento, do saber, das estrat�gias pedag�gicas, mas a dimens�o relacional. Trabalhar em equipe, partilhar experi�ncias e ang�stias”, afirma.

 

 

 

Ela diz que incentiva os professores a serem uma rede de apoio. Al�m disso, na vis�o da especialista, a escola precisa providenciar profissionais que possam mediar essa rede de apoio. “Para que os colegas se sintam seguros uns com os outros. Os pr�prios professores s�o pares de apoio, em que um professor comenta com o outro, o outro d� um apoio, partilha uma atividade, uma experi�ncia exitosa. Redes de apoio s�o a solu��o mais vi�vel para enfrentar esses dilemas que se colocam diante de n�s”, ressalta.

 

Leia tamb�m: Avi�o da FAB voa em c�rculos sobre BH e vira mist�rio 

 

Priscila acredita ainda que o poder p�blico e as institui��es privadas devem se unir e financiar programas de cuidado para os professores. “A escola deveria investir em profissionais de apoio, para ajudar esse professor no autocuidado, na autogest�o na alimenta��o, com t�cnicas de sono e trabalho de gest�o do tempo.”

 

Segundo ela, isso faz com que a institui��o mostre ao professor que est� investindo nele e n�o apenas extraindo dele o melhor na presta��o de servi�o. “O professor deve ser muito bem cuidado, porque ele tem sido, �s vezes, o maior apoio dos alunos, que tamb�m est�o com emocional abalado. Temos visto um alto �ndice de suic�dios, de casos de depress�o, ansiedade. E, muitas vezes, esses jovens n�o t�m apoio nem di�logo com a fam�lia. Esses alunos veem no professor um apoio. Ent�o cuidar do professor � garantir tamb�m, por tabela, um cuidado com o aluno.”

 

Iniciativas do poder p�blico  PBH informou que tem um N�cleo de Interven��o em Sa�de Funcional permanente. Segundo a administra��o municipal, “a metodologia dessa equipe consiste em intervir no processo de trabalho quando identificado um adoecimento f�sico ou mental que resulte na incapacidade laborativa parcial, que pode afetar a adapta��o e o desempenho do agente p�blico e a realiza��o das atividades inerentes ao seu cargo”.

 

O n�cleo atua tamb�m no monitoramento durante o processo de readapta��o funcional e no processo de inclus�o do agente p�blico com defici�ncia (PCD), de acordo com a PBH.

 

O munic�pio tamb�m faz a��es de promo��o � sa�de, de preven��o de agravos e de interven��o em sa�de funcional. O objetivo � “desenvolver a��es que atuem no desafio permanente de manter a sa�de f�sica e mental no ambiente de trabalho”, diz a prefeitura.

 

J� o governo estadual destaca que a Diretoria Central de Sa�de Ocupacional (DCSO), da Seplag, desenvolveu uma s�rie de a��es de cuidado com a sa�de do servidor, incluindo a sa�de mental.

 

Uma das medidas � o acompanhamento dos servidores em readapta��o funcional. “Dada a import�ncia desse acompanhamento, a DCSO estabeleceu um processo transversal de comunica��o entre as chefias, os setores de RH e a coordena��o central na Superintend�ncia Central de Per�cia M�dica e Sa�de Ocupacional (SCPMSO), que se d� por meio de um sistema on-line de acompanhamento. Para aperfei�oar a utiliza��o desse sistema, t�m sido realizados, periodicamente, treinamentos de gestores de RH das diversas secretarias e regionais.” 

Tratamento

Segundo a administra��o estadual, em paralelo, para estruturar um programa que pudesse dar mais aten��o aos casos graves de adoecimento mental, a DCSO criou, em julho de 2020, o Projeto de Avalia��o de Sa�de do Servidor (PASS). “O objetivo � alcan�ar principalmente os servidores que poderiam se beneficiar de um acompanhamento mais pr�ximo relacionado � sa�de mental, buscando engaj�-los no tratamento, bem como fortalecer suas rela��es sociais no contexto do trabalho.”

 

De acordo com a Seplag, o projeto conta com uma equipe multidisciplinar composta por servi�o social, psicologia, m�dico do trabalho e m�dico refer�ncia em sa�de mental, para avalia��o e direcionamento.

 

A DCSO implantou, ainda, um programa de parceria com cl�nicas-escola de cursos de gradua��o em psicologia para garantir vagas gratuitas de psicoterapia para os servidores que se interessarem. “A primeira parceria do programa j� foi assinada com a Faminas-BH e as vagas come�aram a ser preenchidas desde o semestre passado. Os atendimentos ser�o feitos ao longo do ano e poder�o ser on-line ou presenciais, individuais ou em grupo, conforme a necessidade do servidor. O programa busca facilitar o acesso do servidor a um servi�o que, em muitos casos, � de grande custo financeiro e indispon�vel na regi�o.”

 

Em abril de 2020, tamb�m foi criada a p�gina do Instagram da Sa�de Ocupacional (@saudeocupacionalmg), na qual s�o transmitidos conte�dos de sa�de f�sica, mental, nutri��o, ergonomia e orienta��es diversas. “No canal, s�o transmitidas ao vivo diariamente aulas de gin�stica laboral (manh�) e gin�stica de relaxamento (tarde). N�o � necess�rio cadastro pr�vio, basta se conectar no hor�rio programado ou acessar as redes sociais da Sa�de Ocupacional (Instagram/YouTube - Sa�de Ocupacional MG) no hor�rio mais adequado.”  

Faca na sala de aula

J., de 36 anos, � professora h� 12. Trabalha em dois per�odos, em uma escola da rede estadual de ensino em Belo Horizonte. Tem medo de se identificar e sofrer repres�lia por parte da institui��o de ensino

 

“No fim de fevereiro, tive 10 dias de afastamento, por um problema com um aluno que levou uma faca para a sala de aula. Nem foi comigo o problema, mas a presen�a daquele aluno na sala de aula me assustava. A escola tenta sempre minimizar, colocar “panos quentes” na situa��o. ‘As coisas n�o s�o assim como voc�s est�o pensando. O menino n�o sabia o que estava fazendo’, eram coisas ditas pela dire��o. A gente tendo que estar dentro de sala, com o menino olhando com olhares amea�adores, eu n�o dei conta de lidar. Todas as vezes em que eu tinha que dar aula para ele era muito problem�tico. Foi muito assustador aquilo. Os meninos da sala tamb�m ficaram assustados.

 

A escola tamb�m tem uma cobran�a em cima da gente, quer que fa�amos coisas que n�o temos que fazer, aumenta o nosso servi�o demais. Temos muitos prazos, �s vezes entra algum projeto que temos que fazer, mas que n�o faz sentido para aquele momento. Mas querem que a gente d� conta. O di�rio n�o funciona e a gente recebe as cobran�as como se ele funcionasse. Se eu n�o fechar meu di�rio no prazo, assino uma advert�ncia, mesmo se ele n�o funcionar.

 

J� fa�o tratamento para ansiedade e a sensa��o que eu tinha � que os rem�dios n�o estavam mais fazendo efeito. Na hora de ir para a escola, eu tinha crise de ansiedade no estacionamento e tinha que esperar para sair do carro. Ano passado, tive v�rios afastamentos pelos mesmos motivos: excesso de trabalho e um quadro depressivo. O �ltimo afastamento foi de cinco dias, a partir de 17 de abril.

 

No in�cio do ano, quando as aulas iam ser distribu�das, a diretora pedag�gica me impediu de pegar aulas. O motivo seriam meus afastamentos. N�o aconteceu s� comigo, mas com outros dois professores. Quando apresento os atestados, n�o recebo nenhum apoio da escola. Antes eu ficava chateada. � muito dif�cil algu�m (da dire��o) reconhecer que a gente se afasta porque estamos doentes. Mas quando um funcion�rio se afasta, ele n�o faz isso porque n�o quer trabalhar. Nossa rotina � muito pesada, lidamos com alunos que t�m problemas graves em casa. Muitas vezes, procuram a gente para desabafar, na inten��o de querer que a gente resolva os problemas deles. Da mesma forma, t�m alunos que est�o ali revoltados.

 

A gente vai adoecendo, � um ambiente muito pesado. A professora que teve o aluno com a faca na sala dela, por exemplo, est� afastada por 60 dias. Tem outro professor que fez boletim de ocorr�ncia recentemente depois de receber amea�a de um aluno. Isso mata a gente aos poucos.” 

Silenciar � mais f�cil

L., de 47 anos, � professor h� 27. Trabalha como professor em uma escola da rede estadual e como vice-diretor em outra da rede municipal de Belo Horizonte. Tem medo de se identificar e sofrer repres�lia por parte da institui��o de ensino

 

“Nesse momento p�s-pandemia, a gente tem tipos de viol�ncia que se intensificaram. Quando o professor vive a viol�ncia no ambiente escolar, � uma cadeia. Logo, ele pede uma assist�ncia � sua chefia imediata. O grupo ao qual eu perten�o na rede municipal lida com a viol�ncia do aluno, a que o professor vive com o aluno. E o professor pressiona esse gestor. Essa cobran�a j� vem acompanhada de um n�vel de estresse enorme.

 

No p�s-pandemia, ningu�m ficou preocupado em nos dar uma assessoria, seja ela psicol�gica, legislativa. O professor chega na sua sala violentado de todas as formas e o que a v�tima de viol�ncia quer do superior? Uma resolu��o imediata ou pelo menos um apoio. Mas a pessoa que deveria dar o apoio, quando voc� chega com o seu caso, ela j� est� lidando com outros 10.

 

S�o muitos tipos de viol�ncia que o gestor tem que lidar. Pais e m�es que perderam o emprego e ficaram em trabalho remoto e que nunca tinham, ao longo da vida da crian�a, passado tanto tempo com elas dentro de casa.

 

Estamos vivendo algo muito s�rio: as viol�ncias dom�sticas que respingam nas escolas, abusos sexuais. � esse tipo de problema que n�s, da escola p�blica perif�rica, estamos lidando. Tem um conselho tutelar que n�o est� preparado para lidar com o problema. Uma Secretaria Municipal ou Secretaria do Estado de Educa��o que n�o tem compet�ncia para te assessorar. Voc� fica no meio de 500 conflitos de 'p�s e m�os atados'.

 

A primeira viol�ncia � psicol�gica, porque voc� quer receber um problema, mas n�o � um profissional preparado para isso. O que est� acontecendo nesse momento � que quando come�amos a pressionar, a cobrar uma postura dos �rg�os, viramos - ao contr�rio de mediadores do problema - as v�timas. Porque estamos sendo perseguidos, ca�ados, exonerados. � mais f�cil silenciar.

 

Agora como professor, a maior viol�ncia � que n�s n�o temos respaldo, por exemplo, quando vira cotidiano um aluno do Ensino Fundamental, s�ries sinais, te xinga com um palavr�o, te agride com uma carteira jogada quando voc� est� no quadro escrevendo. Professoras tomando socos, coices, chutes. Qualquer pedido m�nimo de socorro nos leva a uma cassa��o pol�tica dentro das escolas. Ent�o, a gente vai se silenciando e vivendo isso at� o ponto de termos que procurar um profissional da sa�de mental e nos afastarmos. Eu estive afastado por cinco meses porque n�o suportei a viol�ncia psicol�gica.

 

Eu tive uma crise de p�nico que veio seguida de outras v�rias. Eu perdi 30kg. Perdi a fome, fiquei recluso. Eu n�o atentei contra minha vida porque a minha m�e chegou na hora. Fiquei doente, cinco dias na cama, sem tomar banho nem comer um gr�o de arroz. � isso que est� nos consumindo e nos matando dentro da sala de aula. � isso que est� elevando, a cada dia, o n�mero de afastamentos dentro das redes Federal, Estadual ou Municipal.  

 

Eu retornei, insisto em me manter vivo, mas n�o foi e n�o est� sendo f�cil. Toda hora que entra um pai pelo port�o da escola, voc� pensa: vou morrer. Qual � o pepino dessa vez? Preocupado se aquela pessoa tem uma arma na cintura, se vai me agredir. Mas, nesse momento, foi cobrado da gente que devemos dar aula normalmente. Qual foi o suporte emocional que eu tive nesse momento? S� ouvi a frase: 'Diga aos professores para dar aula como se n�o houvesse amanh�'. E a gente ouve da Secretaria de Educa��o que o atestado psiqui�trico � porque o professor tem pregui�a de dar aula. Eu ouvi isso v�rias vezes.”

 

 


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