Uma cidade mineira reza pela volta de seus santos: "N�o descansaremos"
Fi�is de Ouro Branco n�o se conformam com furto de 1994, e t�m f� que pe�as voltar�o. Confira a lista de cidades que t�m mais imagens sacras desaparecidas
Elvira N�brega, do N�cleo de Acervos Museol�gicos, e o promotor de Justi�a Marcelo Maffra com pe�as sacras no Museu Mineiro: luta pela preserva��o do patrim�nio do estado (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A. Press)
A esperan�a move comunidades do interior mineiro que perderam bens culturais, muitas vezes na calada da noite, ap�s arrombamentos a igrejas, museus e outros monumentos centen�rios. “N�o descansaremos enquanto n�o recuperarmos tudo o que foi levado da Matriz de Santo Ant�nio”, afirma Wilton Fernandes Guimar�es, da Associa��o Sociocultural Os Bem-Te-Vis, do distrito de Itatiaia, em Ouro Branco. O munic�pio da Regi�o Central � apenas um dos muitos em Minas que tiveram parte de seu patrim�nio saqueado ao longo dos s�culos, como mostra desde o �ltimo domingo a reportagem “Hist�ria resgatada”.
Atuante em redes sociais e presente em reuni�es ligadas ao patrim�nio, Wilton e outros associados divulgam fotos e dados sobre as 18 pe�as furtadas na madrugada de 16 de novembro de 1994, entre elas as imagens de Nossa Senhora do Ros�rio, Santa Rita de C�ssia e S�o Miguel Arcanjo. Os ladr�es levaram 21 objetos de f�. Desses, foram recuperadas as esculturas de S�o Domingos Gusm�o e S�o Jo�o Batista Menino, al�m de um crucifixo de madeira maci�a, com 102 cent�metros de altura.
Essas pe�as da igreja tombada em 1980 pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) cumpriram uma via-cr�cis que come�ou em Ouro Branco, passou por Sete Lagoas e Belo Horizonte, at� serem vendidas em S�o Paulo (SP), onde foram adquiridas por um colecionador, cujo nome nunca foi divulgado.
O crucifixo, especificamente, foi encontrado gra�as a uma den�ncia an�nima, que levou a equipe da Coordenadoria das Promotorias de Justi�a de Defesa do Patrim�nio Cultural e Tur�stico de Minas Gerais (CPPC/MPMG) a intensificar a investiga��o e notificar o colecionador, que fez a devolu��o sem resist�ncia. Cadastrada no banco de dados do acervo procurado pelo Minist�rio P�blico, a pe�a estava com a base serrada para dificultar a identifica��o.
Entre as pe�as sacras do Memorial da Arquidiocese de BH, tamb�m h� itens � espera de identifica��o para volta �s origens
“�s vezes, brincamos que nosso acervo foi ‘dar uma voltinha’ e j� retorna. Na verdade, sempre confiamos na justi�a divina e dos homens, e rezamos para que as pessoas devolvam nossos bens culturais e espirituais”, afirma Wilton. Em Minas, a grande campanha pelo resgate de bens culturais desaparecidos completa 20 anos, e as fotos das imagens, com informa��es detalhadas, encontram-se no cadastro da CPPC, dispon�veis para consulta pela plataforma Somdar (somdar.mpmg.mp.br), que re�ne 2,5 mil itens.
Segundo o coordenador da CPPC, promotor de Justi�a Marcelo Maffra, j� foram recuperados cerca de 700 bens culturais e mais mil documento hist�ricos mineiros, em a��es diversas, incluindo opera��es com outras institui��es federais e estaduais, apreens�es em com�rcio clandestino pela internet e devolu��es espont�neas, essas no objetivo da rec�m-lan�ada campanha Boa F�.
Acervo
No Museu Mineiro, vinculado � Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), no Circuito Liberdade, em BH, Maffra observa alguns dos 130 objetos, entre esculturas, tocheiros e fragmentos de talha, que ainda aguardam identifica��o para retorno aos locais de origem. A coordenadora do N�cleo de Gest�o de Acervos Museol�gicos da Diretoria de Museus/Secult, Elvira N�brega, mostra tamb�m algumas das pe�as em exposi��o no local.
Entre elas est�o as imagens de Nossa Senhora da Piedade, em terracota, apreendida pelo MPMG em 2003, em Belo Horizonte, na Opera��o Pau Oco 1, e de S�o Sebasti�o, identificada naquele mesmo ano, em S�o Paulo (SP), nesse caso pela Pol�cia Federal. H� pe�as apreendidas tamb�m no Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha), no Memorial da Arquidiocese de BH e no Museu da Inconfid�ncia, em Ouro Preto.
Ca�a aos tesouros de Minas
1,8 mil
bens culturais est�o desaparecidos de igrejas, capelas, museus e outros monumentos
688 bens
j� foram resgatados em opera��es especiais, apreens�es devolu��es e outras a��es
2,5 mil
� o total de bens que est�o no cadastro do Minist�rio P�blico de Minas Gerais (entre procurados e resgatados)
Anos com maior n�mero de furtos, em Minas: 1981 (34), 1990 (30), 1994 (92), 1997 (28), 2003 (80) e 2008 (55)
Munic�pios com maior n�mero de bens desaparecidos:
1)Nova Era, na Regi�o Central 58
2)Ouro Preto, Regi�o Central 48
3) Barra Longa, Zona da Mata 39
4) Mariana, Regi�o Central 37
5) Oliveira, Centro-Oeste 36
6) Santa B�rbara, Regi�o Central 36
7) Tiradentes, Campo das Vertentes 36
8) Campanha, Sul de Minas 30
9) Serro, Vale do Jequitinhonha 27
10) Diamantina, Vale do Jequitinhonha 26
11) Ibituruna, Centro-Oeste 23
12) Sabar�, Regi�o Metropolitana de BH 22
13) Concei��o do Mato Dentro, Regi�o Central 20
14) Conselheiro Lafaiete, Regi�o Central 18
15) Ouro Branco, Regi�o Central 18
16) Bom Jesus do Amparo, Regi�o Central 16
17) Bonfim, Regi�o Central 14
18) Minas Novas, Vale do Jequitinhonha 14
19) Nazareno, Campo das Vertentes 14
20) S�o Jo�o del-Rei, Campo das Vertentes 13
FONTE: CPPC/MPMG
Esfor�o pela prote��o
A seguran�a dos monumentos, em especial igrejas e capelas, � fundamental para garantir a integridade dos bens culturais que essas estruturas abrigam. O assessor especial da presid�ncia do Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico (Iepha), Lu�s Mundim, diz que a institui��o, nos seus mais de 50 anos, sempre se preocupou com a prote��o de pe�as do patrim�nio de Minas, incluindo aquelas furtadas e desaparecidas. “Nesses anos, v�rias a��es e campanhas foram desenvolvidas no sentido de coibir o desaparecimento, al�m de tentar localizar e restituir �s comunidades diversos bens culturais que foram alvo de furto.”
Mundim destaca entre os projetos implementados o invent�rio do acervo das igrejas tombadas pela institui��o, a instala��o de c�meras e alarme em bens protegidos, a elabora��o de banco de dados de objetos culturais desaparecidos e apreendidos, al�m das campanhas de restitui��o de bens furtados.
O instituto tamb�m tem participa��o em apreens�es, al�m de ser respons�vel por laudos e semin�rios sobre o tema, entre dezenas de outras a��es executadas pela institui��o ou em apoio � Pol�cia Federal, Minist�rio P�blico e Pol�cia Civil. “Mais recentemente, o Iepha participou de duas importantes a��es: o Somdar e o apoio � elabora��o da Lista Vermelha de bens desaparecidos do Brasil, com medidas normativas para combativo ao tr�fico”, afirma. “O caminho ainda � longo, mas atuamos, em parceria com outros �rg�os e institui��es, para prevenir, localizar e restituir os bens culturais mineiros a suas comunidades de origem”, observa Mundim.
Cuidado
J� o Iphan, em nota, alerta compradores em potencial para ficarem atentos � proced�ncia de pe�as � venda. “Sem cuidados adequados, adquirem-se inadvertidamente pe�as furtadas ou roubadas. Para contribuir no combate a esse mercado ilegal, h� a��es preventivas simples, como a checagem da proced�ncia e, em caso de d�vidas ou suspeita, consulta ao Iphan, ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e outras bases de dados dispon�veis em seus sites.”
Todos os comerciantes de bens art�sticos e hist�ricos, inclusive leiloeiros, devem estar no Cadastro Nacional de Negociantes de Antiguidades e Obras de Arte (Cnart), adverte o Iphan. “O cadastro protege o vendedor de se ver envolvido inadvertidamente em crimes de recepta��o de bem furtado e de lavagem de dinheiro por meio de obras de arte”, completa o instituto.
Cruzada pelo patrim�nio
O Estado de Minas publica desde o �ltimo domingo a s�rie “Hist�ria resgatada”, que retrata os 20 anos de mobiliza��o pela recupera��o de pe�as do patrim�nio mineiro saqueadas ao longo de s�culos. A primeira reportagem mostrou que os frutos da campanha Boa F�, de devolu��o espont�nea de itens indevidamente retirados de igrejas e museus, s�o o cap�tulo mais recente de uma batalha que come�ou em 2003, ano cr�tico para furtos de bens hist�ricos. Ontem, em entrevista ao EM, o coordenador das Promotorias de Defesa do Patrim�nio de Minas Gerais, Marcelo Azevedo Maffra, fez um balan�o positivo da atua��o do MP nas �ltimas duas d�cadas, embora reconhe�a que ainda h� muito a ser feito.
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