Diego Amorim
Enviado especial

Cidade do Vaticano – Fiel nos gestos ao nome que escolheu, o papa Francisco mostrou desde as primeiras horas de pontificado a inten��o de seguir, � frente da Igreja, os passos do santo que o inspirou. O argentino Jorge Mario Bergoglio, escolhido sucessor de Bento XVI, usou as palavras para defender o evangelho e as atitudes para sinalizar novos tempos no Vaticano. Na sua primeira homilia, na mesma Capela Sistina onde havia sido eleito na v�spera, pediu que a Igreja se mantenha ligada �s ra�zes e evite as tenta��es da modernidade. “Se n�s n�o professarmos Jesus Cristo, nos converteremos em uma ONG piedosa”, declarou diante dos demais 114 cardeais eleitores. Uma de suas primeiras medidas sinalizou o di�logo entre religi�es.
Como o ineditismo do nome pontif�cio, as primeiras atitudes do papa mostraram um sutil rompimento com os antecessores. J� na primeira apari��o, na sacada da Bas�lica de S�o Pedro, ele chamou a aten��o pelo fato de n�o ostentar todos os paramentos pr�prios do Sumo Pont�fice. Ele surgiu para a multid�o todo de branco, sem a mur�a – capa vermelha usada comumente em momentos solenes. Jo�o Paulo II e Bento XVI vestiam o adorno quando as cortinas se abriram para eles, em 1978 e 2005, respectivamente. A estola papal, outra veste lit�rgica, tamb�m s� foi usada por papa Francisco na hora de aben�oar a multid�o. Ele dispensou o crucifixo de ouro designado aos papas e usou um de a�o.
Mais tarde, o novo pont�fice se reuniu com os cardeais para celebrar a elei��o. Ao propor um brinde, brincou: “Que Deus os perdoe (pela escolha)”, arrancando risos dos colegas. Ele teria repetido o gesto de Jo�o Paulo I, em 1978. No card�pio, a habitual salada de entrada, com massa ou carne como prato principal e sorvete e frutas para sobremesa. Na hora de retornar � resid�ncia Santa Marta, papa Francisco dispensou o carro oficial para seguir no micro-�nibus com os cardeais, tendo ao lado o presidente da Confer�ncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Raymundo Damasceno.
O primeiro compromisso p�blico como papa, de manh�, foi uma visita � Bas�lica de Santa Maria, a maior e mais antiga igreja dedicada � Virgem em Roma. O pont�fice decidiu entrar por uma das portas laterais, como os fi�is comuns. Ap�s deixar um buqu� de flores no altar, rezou sozinho por cerca de 10 minutos. No caminho para a bas�lica, papa Francisco parou na Casa Internacional do Clero, onde ficou hospedado durante o pr�-conclave, para pagar as di�rias e recolher seus poucos pertences. � tarde, na Capela Sistina, celebrou a missa de encerramento oficial do conclave. Vestido com um simples traje dourado e coberto pela mitra papal, papa Francisco fez a celebra��o em latim, mas proferiu a homilia em perfeito italiano (ele fala v�rios idiomas).CONTRASTE O serm�o do papa Francisco foi um marco de contraste com o antecessor, Bento XVI, que leu sua primeira homilia em latim em 2005, estabelecendo sua ampla vis�o para a Igreja. O pont�fice falou em “caminhar, edificar, confessar”. “Nossa vida � um caminho: quando paramos, n�o vamos para a frente”, disse. “Temos de andar sempre na presen�a do Senhor, na luz do Senhor, sempre tentando viver de forma irrepreens�vel”, disse ele, em uma homilia simples e carregada de refer�ncias b�blicas. “Quando andamos sem a cruz, quando n�s constru�mos sem a cruz e quando n�s proclamamos Cristo sem a cruz, n�o somos disc�pulos do Senhor. Somos mundanos”, disse ele. “N�s podemos ser bispos, padres, cardeais, papas, tudo isso, mas n�o somos disc�pulos do Senhor”, afirmou. Ele disse que aqueles que constroem sobre os valores mundanos em vez dos valores espirituais eram como crian�as construindo castelos de areia. “Ent�o, tudo desmorona”, disse.
Ades�o total a Cristo
Gustavo Werneck
F�, cruz e caminhada, sem perder a dire��o. Na primeira missa do seu pontificado, celebrada na manh� de ontem na Capela Sistina, em Roma, diante dos 114 cardeais que o elegeram, o papa Francisco disse que a Igreja Cat�lica deve se concentrar no evangelho de Jesus Cristo, para n�o correr o risco de se transformar numa “ONG piedosa”. Para especialistas, o papa foi no cerne da quest�o. “O que caracteriza a Igreja n�o � um simples ideal, mas o fato de a pessoa aderir a Jesus Cristo – e isso ocorre pela f�”, afirma o padre Danilo C�sar dos Santos Lima, titular da Par�quia de Sant’ana, no Bairro Serra, na Regi�o Centro-Sul de BH, formado em liturgia em Roma e professor da PUC Minas. Para o religioso, sendo a Igreja “a esposa de Jesus Cristo”, n�o � poss�vel aos cat�licos cultivar um ideal como faz uma ONG, seja em rela��o � prote��o do meio ambiente, dos animais e de outros setores da comunidade. “Na verdade, devemos manter o evangelho e a f�.”
O padre destacou tr�s pontos importantes da homilia do papa Francisco, que disse que quando os fi�is “caminham sem a cruz, edificam sem a cruz e professam sem a cruz, n�o s�o disc�pulos do Senhor”. S�o tr�s a��es importantes: caminhar, edificar e confessar Jesus Cristo crucificado, observou o padre Danilo C�sar. “Cruz n�o no sentido de dor e sofrimento, mas de entrega. Cruz que representa amor � vida, mesmo estando presa �s costas”, afirmou, lembrando que se trata de um tema para reflex�o, j� que os cat�licos vivem o tempo da quaresma. Na homilia, o papa disse, de forma simples e com refer�ncias b�blicas, que “temos de andar sempre na presen�a do Senhor, na luz do Senhor, sempre tentando viver de forma irrepreens�vel”, disse, em uma fala simples e carregada de refer�ncias b�blicas.
CATEQUESE
O chefe do Departamento de Filosofia da PUC Minas, padre Ibraim Vitor de Oliveira, lembrou que o cardeal Jorge Mario Bergoglio j� afirmara, anteriormente, “que o catequista que n�o faz a experi�ncia perante Deus, n�o merece o t�tulo de catequista. Esse coment�rio, na avalia��o do padre, se complementa ao coment�rio de agora, sobre a “ONG piedosa”. “Trata-se de uma organiza��o que n�o tem v�nculo interior. Ningu�m � verdadeiramente crist�o se n�o faz a experi�ncia com Deus. Mesmo que haja uma reuni�o de um grupo de pessoas, � preciso ter um sentimento em rela��o a Deus.”
Sobre a caminhada, padre Ibraim diz que isso se traduz por envolvimento com a Igreja. “Ningu�m pode se considerar completo, que � santo, que a caminhada terminou. � preciso continuar seguindo para edificar. Outra frase presente na homilia, que durou sete minutos, disse o seguinte: “Quem n�o reza ao Senhor reza ao diabo, j� que quando n�o se proclama Cristo, se proclama a mundanidade do diabo, do dem�nio”. Para o padre Ibraim, diabo, nesse caso, significa a mediocridade e a desordem. A missa foi celebrada em latim, com algumas leituras em italiano. O novo papa fala pelo menos cinco idiomas: espanhol, italiano, alem�o, ingl�s, franc�s, al�m de um pouco de portugu�s. A celebra��o encerrou o conclave que elegeu o cardeal argentino Jorge Bergoglio como 266º pont�fice da Igreja Cat�lica.